Acórdão nº 00751/11.4BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução15 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:*I Relatório A Administração do Porto da Figueira da Foz, SA, devidamente identificada nos autos, no âmbito da ação administrativa comum, intentada pela EFP, Lda, peticionando a sua condenação no pagamento de 100.000€ a titulo de indemnização por facto ilícito, e subsidiariamente a sua condenação à reparação a seu cargo dos danos verificados, em prazo não superior a 4 meses, em decorrência da degradação do seu edifício sede sito na M….., na Figueira da Foz, em resultado da falta de conservação da faixa de terreno adjacente que levou a que, em preia-mar, a água atingisse o seu edifício, degradando a sua estrutura, inconformada com a Sentença proferida em 29 de março de 2017, no TAF de Coimbra, na qual a ação foi julgada “totalmente procedente”, veio interpor recurso jurisdicional da mesma, em 26 de maio de 2017 (Cfr. fls. 935 a 968 Procº físico), no qual concluiu: “I-A Ré/ Recorrente, com a alegação fáctica e jurídica plasmada sob os itens 26º a 32º da sua contestação, suscitou ao Tribunal a apreciação do seu direito à compensação “com hipotética e virtual responsabilidade que lhe possa vir a ser assacada nos presentes autos ” pelo montante de € 73.487,31.

II-Tal factualidade foi relevada na douta sentença a quo, mormente, sob os pontos 20, 21 e 33 dos factos provados e permitiria conhecer o direito à compensação invocado pela Ré/ Recorrente.

III- Sendo a compensação uma exceção perentória à luz do disposto no nº 3 do artigo 576º do CPC, o tribunal a quo dela teria de conhecer porquanto a mesma foi alegada pela parte a quem aproveita, conforme preceitua o artigo 579º do CPC.

IV-A douta sentença recorrida ao não conhecer de questão que lhe foi suscitada pela Ré/Recorrente – o facto extintivo da compensação- violou o disposto nos artigos 608º, nº 2, primeira parte, e artigo 615º, nº 1, al. d) ambos do CPC, padecendo de nulidade.

V-Ademais, sob o ponto B) De Direito, a douta sentença recorrida subsume a apreciação da responsabilidade da Ré/Recorrente ao regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas consagrado na Lei nº 67/2007, de 31 de dezembro.

VI-Porém, em trecho algum, da douta sentença recorrida se vislumbra referido qualquer preceito da versada Lei nº 67/2007, que consinta a sua aplicação para apuramento da responsabilidade civil extracontratual da Ré/Recorrente, APFF, S.A..

VII-Cingindo-se o tribunal a quo a assentar que a Ré/ Recorrente foi criada através do DL 210/2008, de 3 de novembro, sob a forma de sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos e sendo manifesto que a mesma não tem a natureza jurídica de entidade pública ou pessoa coletiva de direito público, enferma a douta sentença recorrida de nulidade por violação do disposto na primeira parte da al. d) do nº 1 do artigo 615º do CPC, a qual se deixa expressamente alegada.

VIII-A douta sentença recorrida não apreciou, como devia, uma questão que se lhe impunha conhecer, qual seja a do afastamento do regime-regra da reconstituição natural para reparação dos danos apurados nos autos, consagrado quer no nº 1 do artigo 3º da Lei nº 67/2007, de 31 de dezembro, quer na segunda parte do nº 1 do artigo 566º do C. Civil.

IX-A douta sentença recorrida é de todo omissa quanto à motivação para afastar a reparação dos danos apurados no imóvel dos autos mediante a sua reconstituição natural tendo aderido, sem fundamento legal, à preferência da Autora pela indemnização em dinheiro.

X-Atenta a factualidade dada por assente sob os pontos 22 a 28 da douta sentença recorrida, a reconstituição natural afigura-se não só materialmente possível como suficiente para a reparação dos danos em causa nos autos sendo certo que não se vislumbra ter o tribunal a quo considerado a reconstituição natural meio impróprio ou inadequado à luz do disposto no nº 1 do artigo 566º do C. Civil.

XI-Enferma, pois, a douta sentença recorrida da nulidade tipificada na al. d) do nº 1 do artigo 615º do CPC, ou caso assim se não entenda, de erro de julgamento consubstanciado na errónea aplicação das normas insertas nos nº 1 e 2 do artigo 3º da Lei nº 67/2007, de 31 de dezembro e artigos 562º e 566º, nº 1, ambos do C. Civil, à factualidade dada por provada nos autos, mormente, no que aos danos concerne.

XII-A douta sentença recorrida enferma de erro na apreciação da matéria de fato, tendo considerado incorretamente julgados os factos 6, 14,15 16, 17, 18, 22 e 31 do ponto III. – Fundamentação

  1. De facto.

    XIII-Outrossim a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar não provados os factos relevantes para a decisão do mérito da causa, nela elencados sob as alíneas A e G.

    XIV-Desde logo, para alicerçar a sua convicção quanto ao fato provado 6 o Tribunal recorrido valorizou o teor do relatório pericial apresentado pelos Senhores Peritos o qual não mereceu na douta sentença recorrida qualquer reparo ou afastamento do respetivo resultado.

    XV-Assim, tendo os Senhores Peritos no relatório de fls… dos autos, respondido ao quesito 2 “ O prédio da Autora encontra-se implantado à margem do cais, no local indicado no ortofotomapa, sujeito à ação erosiva das águas e influência das marés e das cheias “, impunha-se que a douta sentença recorrida na resposta dada ao facto provado 6 não tivesse omitido, como sucedeu, que o prédio da Autora/Recorrida está implantado em local sujeito à influência das marés.

    XVI-Não tendo sido tal asserção infirmada por qualquer dos meios probatórios elencados pela MMº Juiz a quo na motivação do facto provado 6 e em cumprimento do disposto na al. c) do nº 1 do artigo 640º do CPC, aplicável ex vi do artigo 1º do CPTA, deveria ter sido proferida decisão sobre o facto provado 6 com o seguinte teor: “ O prédio da Autora foi implantado em local cujas características naturais, mormente, o solo, encontra-se sujeito à ação erosiva das águas e influência das marés e das cheias ”.

    XVII-Outrossim, no que tange aos factos provados 14, 15, 16, 17 e 18 a douta sentença recorrida firmou, sem que exista nos autos estribo probatório para tal, o momento temporal e a factualidade nela descrita.

    XVIII-Sublinha-se que no relatório pericial de 8 de maio de 2014, a fls... dos autos, os Senhores Peritos foram unânimes na afirmação do seu desconhecimento ou inexistência de condições, sublinhe-se, técnicas e científicas, para balizar no tempo a factualidade aludida nos quesitos 13, 14, 15,16 e 17.

    XIX-Excluída a valência probatória do saber pericial, entendeu o douto tribunal a quo valorar o depoimento de duas testemunhas da A. / Recorrida, uma delas seu antigo gerente e atual consultor, LC e a outra AB, seu trabalhador, desde 1971 a 2012.

    XX-No entanto, perscrutados os respetivos depoimentos e ao invés do assestado a fls. 12 da douta sentença recorrida, deles se não alcança a concreta e precisa referência temporal vertida nos factos provados 14, 15, 16, 17 e 18.

    XXI-Desde logo, no que ao depoimento prestado em juízo por LC, a instâncias do ilustre mandatário da Autora/Recorrida, retira-se tão só uma alusão espontânea ao ano de 2007 e, por sugestão, ao ano de 2008.

    XXII-De igual guisa, do depoimento prestado em juízo pela testemunha AB se colhem tão só referências temporais difusas e muito anteriores ao ano de 2008, nenhuma delas consentindo ao Tribunal a quo fixar os factos provados dos pontos 14 e 15 ou sequer que os mesmos ocorreram “ a partir de finais de 2008” bem como firmar que os factos provados dos artigos 16 a 18 ocorreram e que tais eventos se tenham produzido, respetivamente, “ a partir de meados de 2010” e “ desde pelo menos março de 2010”.

    XXIII-Sufraga-se, pois, que o depoimento das testemunhas convocadas na fundamentação de fls. 12 da douta sentença recorrida não consente firmar os factos provados 14 a 18 inclusive, pelo menos no que às referências temporais neles foi dada por assente.

    XXIV-Realçando-se que, enferma a douta sentença a quo de clamoroso erro de julgamento ao propalar consonância do depoimento das referidas testemunhas “ na indicação do momento a partir do qual se verificou ao abatimento da faixa de terreno que constitui parte da margem nascente da Doca ” quando é exuberante a divergência entre ambos nas remissões temporais e a respetiva oscilação entre o ano de 2007 e as décadas finais do século XX.

    XXV-Ademais, quer o relatório de 16 de março de 2010 junto à petição inicial e subscrito pela testemunha LDF quer o respetivo depoimento são esclarecedores quanto à verificação da factualidade assestada nos pontos 14, 15, 16, 17 e 22 em momento temporal muito anterior aos ficcionados na douta sentença a quo, respetivamente, “ a partir de finais de 2008 “, “ a partir de finais de 2010 ” e “a partir de meados dezembro de 2008 ”.

    XXVI-O Tribunal a quo desconsiderou que a testemunha LDF no seu relatório (página 6) afirmou “ no final da década de 80, a Junta Autónoma do Porto da Figueira da Foz, levou a cabo uma empreitada para remoção dos molhes da doca dos bacalhoeiros. (…) O rebaixamento do molhe implicou que em preia-mar, a doca não tenha qualquer tipo de proteção em relação às condições meteo-marítimas adversas, uma vez que o molhe fica totalmente submerso e a exposição do interior da doca aumenta para mais do dobro…” .

    XXVII-Outrossim o Tribunal a quo desconsiderou que nas conclusões do seu relatório (página 14) a testemunha LDF afirma “ a ondulação conforme se tem feito sentir no interior da doca dos bacalhoeiros, desde a remoção parcial do molhe poente, deu origem à degradação da obra aderente e consequentemente à fuga de materiais de aterro para o interior da doca. Os abatimentos no terrapleno, resultantes da fuga de materiais de aterro tem dado origem a degradação das estruturas contíguas, nomeadamente ao prédio da E.F.P.(…), pondo em causa a estabilidade do mesmo”.

    XXVIII-Concatenadas tais asserções do relatório da testemunha LDF com o depoimento prestado em juízo é percetível que foi o...

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