Acórdão nº 92/22.1YREVR de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA FILOMENA SOARES
Data da Resolução07 de Junho de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Criminal (1ª subsecção) do Tribunal da Relação de Évora: I No âmbito do processo comum, com intervenção do Tribunal Colectivo, nº 326/13.3 TALLE, do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo Central Criminal, Secção 1, Juiz 3, a Mmª Juíza de Direito, AA, veio deduzir, ao abrigo do disposto nos artigos 43º, nºs 1 e 4 e 45º, nº 1, alínea a), do Código de Processo Penal, escusa para intervir nos identificados autos invocando para o efeito e, em síntese, os seguintes fundamentos: “(…) - o referido processo foi distribuído para julgamento ao Juiz 1 (…), sendo a signatária Juiz Adjunta

- BB, advogado e marido da signatária, foi indicado como testemunha na contestação apresentada pelo arguido CC (…) Todavia (…) o marido da signatária fora prescindido como testemunha (…)

- Sucede que, no pretérito dia 3 de maio de 2022, em audiência de julgamento, o arguido CC prestou declarações, nas quais, por diversas vezes invocou reuniões profissionais com o marido da signatária, a propósito dos factos que lhe são imputados na acusação, porquanto aquele intervinha como advogado de DD, ex-sócio de co-arguido nos autos e que assume a qualidade de testemunha no processo

- Para além disso, requereu a junção aos autos de várias mensagens de correio electrónico trocadas entre ambos, cuja admissibilidade ficou sujeita à apreciação do Tribunal Coletivo até à próxima sessão da audiência já agendada

- Finda a referida sessão da audiência de julgamento, e colocada aos restantes membros de coletivo a questão de considerar absolutamente necessário dar a conhecer aos intervenientes processuais as relações pessoais entre a signatária e o BB, em face da consequente suspeição que tal poderia gerar naqueles acerca da sua imparcialidade, pelo Mmo. Juiz que preside à audiência, foi comunicado à signatária que o seu marido havia já em fase de julgamento junto aos autos procuração como mandatário da testemunha DD e formulado alguns requerimentos a propósito da notificação daquela, facto que não lhe suscitou qualquer reserva no momento

- Ora, neste momento, vê-se a signatária perante a necessidade, enquanto membro do Tribunal Coletivo, de apreciar documentos em que é interveniente o seu marido, e perante a possibilidade, que não pode descartar, de o mesmo poder vir a ser indicado como testemunha, ao abrigo do disposto no artigo 340.º do Código de Processo Penal, se tal se revelar necessário para a descoberta da verdade material e para a boa decisão da causa (face às declarações que o arguido CC já prestou), suscitando-se em audiência de julgamento o incidente de quebra de sigilo profissional nos termos do artigo 135.º do mesmo diploma, ou de o mesmo comparecer na audiência como mandatário da testemunha DD, acompanhando-a

- É do conhecimento da signatária que efetivamente DD, testemunha indicada na decisão instrutória de pronúncia, se mantém na atualidade cliente e amigo pessoal do marido da signatária (designadamente, convidado para o respectivo casamento)

(…)”

Neste Tribunal da Relação de Évora, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, afirmando, em suma, que “(…) os fundamentos invocados pela Ex.ma Juíza Sr. Drª AA apresentam a seriedade e gravidade suficientes para que se considere verificada uma legítima situação de escusa (…)”. Em consequência, conclui pela procedência do pedido de escusa em apreço

Foi efectuado exame preliminar e colhidos os vistos legais

Foi realizada a Conferência

Cumpre apreciar e decidir

II Estatui o artigo 39º, nº 1, do Código de Processo Penal que: “1. Nenhum juiz pode exercer a sua função num processo penal:

  1. Quando for, ou tiver sido, cônjuge ou representante legal do arguido, do ofendido, ou de pessoa com a faculdade de se constituir assistente ou parte civil ou quando com qualquer dessas pessoas viver ou tiver vivido em condições análogas às dos cônjuges; b) Quando ele, ou o seu cônjuge, ou a pessoa que com ele viver em condições análogas às dos cônjuges, for ascendente, descendente, parente até 3.º grau, tutor ou curador, adoptante, ou adoptado do arguido, do ofendido ou de pessoa com a faculdade de se constituir assistente ou parte civil, ou for afim destes até àquele grau; c) Quando tiver intervindo no processo como representante do Ministério Público, órgão de polícia criminal, defensor, advogado do assistente ou da parte civil ou perito; ou d) Quando, no processo, tiver sido ouvido ou dever sê-lo como testemunha

    1. (…)

    2. (…).” Por seu turno, dispõe o artigo 40º, do mesmo diploma legal que: “1- Nenhum juiz pode intervir em julgamento, recurso ou pedido de revisão relativos a processo em que tiver: a) Praticado, ordenado ou autorizado ato previsto no n.º 1 do artigo 268.º ou no n.º 1 do artigo 269.º; b) Dirigido a instrução; c) Participado em julgamento anterior; d) Proferido ou participado em decisão de recurso anterior que tenha conhecido, a final, do objeto do processo, de decisão instrutória ou de decisão a que se refere a alínea a), ou proferido ou participado em decisão de pedido de revisão anterior

    e) Recusado o arquivamento em caso de dispensa de pena, a suspensão provisória ou a forma sumaríssima por discordar da sanção proposta

    2 - Nenhum juiz pode intervir em instrução relativa a processo em que tiver participado nos termos previstos nas alíneas a) ou e) do número anterior

    3 - Nenhum juiz pode intervir em processo que tenha tido origem em certidão por si mandada extrair noutro processo pelos crimes previstos nos artigos 359.º ou 360.º do Código Penal.”

    E, o artigo 43º, do Código de Processo Penal, dispõe: “1 - A intervenção de um juiz no processo pode ser recusada quando correr o risco de ser considerada suspeita, por existir motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade

    2 - Pode constituir fundamento de recusa, nos termos do n.º 1, a intervenção do juiz noutro processo ou em fases anteriores do mesmo processo fora dos casos do artigo 40º

    3 - A recusa pode ser requerida pelo Ministério Público, pelo arguido, pelo assistente ou pelas partes civis

    4 - O juiz não pode declarar-se voluntariamente suspeito, mas pode pedir ao tribunal competente que o escuse de intervir quando se verificarem as condições dos n.ºs 1 e 2

    5 - Os actos processuais praticados por juiz recusado ou escusado até ao momento em que a recusa ou a escusa forem solicitadas só são anulados quando se verificar que deles resulta prejuízo para a justiça da decisão do processo; os praticados posteriormente só são válidos se não puderem ser repetidos utilmente e se se verificar que deles não resulta prejuízo para a justiça da decisão do processo.”

    Por sua vez, prescreve o artigo 45º, nº 1, alínea a), do citado diploma, que “O requerimento de recusa e o pedido de escusa devem ser apresentados, juntamente com os elementos em que se fundamentam, perante o tribunal imediatamente superior.”

    Acresce que o artigo 7º, do Estatuto dos Magistrados Judiciais, sob a epígrafe “Garantias de imparcialidade”, estatui: “É vedado aos magistrados judiciais:

  2. Exercer...

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