Acórdão nº 90/17.7GASRP-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 11 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelARTUR VARGUES
Data da Resolução11 de Outubro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO 1. Nos autos com o NUIPC 90/17.7GASRP, do Tribunal Judicial da Comarca de … – Juízo de Competência Genérica de …, foi lavrado despacho, aos 05/01/2022, que declarou perdidas a favor do Estado três armas de fogo, que concretamente identifica

  1. O condenado AA não se conformou com a decisão e dela interpôs recurso, tendo extraído da motivação as seguintes conclusões (transcrição): A) Por sentença transitada em julgado em 11 de junho de 2021, o arguido e aqui recorrente AA foi como autor material, na forma consumada de um crime de violência doméstica, punido e previsto pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 do Código Penal (doravante designado CP) na pena de 3 anos, O meses e O dias de prisão, suspensa por 3 anos, O meses e O dias, com a condição de arguido pagar à assistente a quantia de €5.000,00, no período de 3 anos

    1. A sentença proferida pelo Tribunal a quo foi omissa relativamente aos objetos do arguido apreendidos à ordem dos autos, a saber; 1) Uma espingarda de caça, marca Browning, n.º …, de um cano, calibre 12, classe D, com livrete n.º …, emitido em ……..1998; 2) Uma arma de fogo, marca …, com número …, de dois canos, calibre …, classe D, com o livrete n.º …, registada em nome de BB, desde ……..1927; 3) Arma de fogo longa de um cano, marca "…", n.º …, calibre …, classe D

    2. O Ministério Público promoveu a perda das armas apreendidas a favor do Estado apenas após o transito em julgado da sentença, o que veio a ser decidido favoravelmente por despacho com a referência citius …, datado de 05-01-2022 e de que ora se recorre

    3. Ora, "Após a prolação de urna sentença e, tratando-se de bens ou objectos apreendidos que tenham natureza e características licitas, os mesmos devem ser restituídos às pessoas que tiverem direito a eles, não podendo ser declarados perdidos a favor do Estado, em despacho proferido após a sentença."- vide Ac. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 22-05-2018 Processo:174/11.5GDGDM-1.11-5, Relator: SIMÕES DE CARVALHO

    4. Também nesse sentido, o Ac. do Tribunal da Relação de Évora, de 16/4/2013, disponível em www.dgsi.pt: "Se o bem ou objeto em causa é, por sua própria natureza, algo cuja detenção é proibida por particulares, o seu perdimento a favor do Estado deve ser declarado em despacho autónomo, mesmo após o trânsito em julgado da sentença onde, com desrespeito pelo estatuído no art.º 374.º, n.º 3, al. c),do Cód. Proc. Penal, se omitiu o destino a dar-lhe. Com efeito, carece de qualquer razoabilidade permitir, por exemplo, que ao abrigo do disposto no art.º 186.º, n.º 2 do CPP seja devolvido ao arguido condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, a droga que lhe foi apreendida, se o tribunal omitiu na decisão final o destino a dar-lhe. Se, porém, o objeto tem, em si, natureza lícita (rectius, se em abstrato a sua detencão por particulares é permitida por lei), então a sentença é o único momento em que pode ser declarado o seu perdimento a favor do Estado, verificados os pressupostos de que depende essa decisão.”( Sublinhado nosso)

    5. Consequentemente, "(...) se o Ministério Público entendesse que tais bens deveriam ser declarados perdidos a favor do Estado, deveria - no tempo certo - interpor recurso da sentença que tal não decidira. Como não o fez: sibi imputet!"- Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, Processo: 970/18.2JAPRT-C.P1- sobrevindo a extemporaneidade do pedido

    6. Acresce que a sentença de 1.ª instancia não deu como provados factos que nos permitam concluir que as armas apreendidas foram, em algum momento, utilizadas no cometimento do crime de violência doméstica em que o arguido foi condenado, nem o arguido tem qualquer outra condenação ou indicio por uso indevido de armas de fogo, não se encontra preenchida a previsão no art.º 109.º, n.º 1 do Código Penal, dispositivo no qual o Tribunal alicerça a sua decisão

    7. Esta é , aliás, a opinião sufragada pela jurisprudência nacional a qual e a título de exemplo se refere; Relação de Coimbra (Ac. de 6.11.2019, proc. 78/17.JACBR.C1, relatado pelo Juiz Desembargador Vasques Osório; no mesmo sentido, cf., entre outros, os Acórdãos da Relação do Porto de 29.1.2014, proc. 549/11.OJAPRT-A, de 2.7.2017, proc. 803/14.9JABRG-A, da Relação de Lisboa de 2.7.2020, proc. 4/17.4V1313-811, de 22.5.2018, proc. 174/11.SGDGDM-1, da Relação de Évora de 12.4.2016, proc. 1072/11.8GTABF-B, de 16.4.2013, proc. 28/11.SGRORQ, e da Relação de Guimarães de 21.10.2013, proc. 316/09.01ABRG-F, todos em www.dgsi.pt)

    8. Razão pela qual o despacho ora recorrido é ilegal por violação do disposto nos artigos 186.º, n.º 2 e 374.º, n.º 3, alínea c) do Código de Processo Penal

    Termos em que: Deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se o despacho ora recorrido, que deverá ser substituído por outro que ordene a restituição ao arguido e aqui recorrente, AA, das armas identificadas na alínea B) das conclusões, fazendo-se, assim, JUSTIÇA! 3. O recurso foi admitido, a subir imediatamente, em separado e com efeito devolutivo

  2. O Magistrado do Ministério Público junto do tribunal a quo apresentou resposta à motivação de recurso, pugnando pelo seu não provimento

  3. Neste Tribunal da Relação, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer nos seguintes termos (transcrição): Recurso do arguido sobre a declaração de perda das armas a favor do Estado, após o trânsito em julgado da sentença condenatória

    Suscitam-se no presente recurso duas questões distintas: - o poder jurisdicional para decidir o destino das armas esgotou-se ou não com o trânsito em julgado da sentença condenatória; - as armas devem ou não ser declaradas perdidas a favor do Estado

    Em nosso entender, o que resulta da letra da lei processual penal é que o momento próprio para ser proferida a decisão sobre o destino dos bens apreendidos é na sentença/acórdão, tanto para aqueles que devam ser declarados perdidos a favor do Estado ou que devam ser devolvidos ao arguido ou...

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