Acórdão nº 69/18.1T9CCH.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Janeiro de 2022
Magistrado Responsável | JOSÉ SIMÃO |
Data da Resolução | 25 de Janeiro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em Conferência, os Juízes que compõem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório Por sentença de 9 de Julho de 2020, proferida no processo comum singular com o nº acima mencionado do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém (Juízo de Competência Genérica de Coruche) decidiu-se julgar a acusação parcialmente provada e procedente e, em conformidade: a. convolar o crime de ameaça agravada p. e p. nos artigos 153.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, alínea a) do Código Penal de que o arguido JA vem acusado por forma a que lhes seja imputada a prática em autoria material de um crime de coação na forma tentada p. e p. no artigo 154.º, n.º 1 e 2, do Código Penal
b. Absolver o arguido JA, enquanto autor material e na forma consumada 1 (um) crime de ameaça agravada, p. e p. pelos artigos 153.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, alínea a) do Código Penal; c. Condenar o arguido JA, enquanto autor material e na forma consumada, pela prática de 1 (um) crime de consumo de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 40.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22.01, por referência à tabela I-C anexa na pena de 100 (cem) dias de multa à taxa diária de € 5,00 (cinco) euros que perfaz a quantia de € 500,00 (quinhentos) euros; d. Condenar o arguido JA, enquanto autor material e na forma tentada 1 (um) crime de coação tentada, p. e p. pelos artigos 154.º, n.º 1 e 2, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão
e. Condenar o arguido JA, enquanto autor material e na forma consumada por 1 (um) crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86º, n.º 1, alínea c) da Lei n.º 5/2006 de 23 de fevereiro, na pena de 7 (sete) meses de prisão; f. Condenar o arguido JA em cúmulo jurídico daquelas penas parcelares, na pena única de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão suspensa na sua execução, nos termos do artigo 50.º, n.ºs 1, 2 e 5, do Código Penal, pelo período de 2 (dois) anos acompanhada de regime de prova; e na pena de 100 (cem) dias de multa à taxa diária de € 5,00 (cinco) euros que perfaz a quantia de € 500,00 (quinhentos) euros; g. Condenar o arguido JM, enquanto autor material e na forma consumada, pela prática de 1 (um) crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86.º, n.º 1, alínea d) da Lei n.º 5/2006 de 23 de fevereiro, na pena de 160 (cento e sessenta) dias de multa à taxa diária de € 5,00 (cinco) euros que perfaz a quantia de € 800,00 (oitocentos) euros; h. Condenar o arguido JM, pela prática, em autoria material e na forma consumada de 1 (um) crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro, com referência ao disposto nos artigos 121.º, n.º 1 e 122.º, n.º 1 do Código da Estrada, na pena de 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 (um) ano, subordinada ao cumprimento de regime de prova assente num plano a elaborar pela DGRSP que deverá incidir na sensibilização do arguido para a problemática da condução sem habilitação legal e das elevadas taxas de sinistralidade rodoviária que assolam o nosso país; Desta decisão foi interposto recurso para o Tribunal da Relação, que por acórdão de 23 de Fevereiro de 2021 manteve as penas de prisão aplicadas aos arguidos e considerou procedente o recurso apresentado pelo Ministério Público, revogando-se a decisão recorrida, na parte em que determinou a suspensão da execução das penas e determinou: - que o arguido JA cumpra a pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão efectiva
- em relação ao arguido JM, a reabertura da audiência para se apurarem os pressupostos formais em falta a fim de, se aplicar o regime de permanência na habitação (consentimento do condenado e dos maiores de 16 anos que com ele convivam e das condições de instalação dos meios técnicos de controlo à distância na habitação do mesmo) e procedendo-se de seguida, à elaboração de nova sentença, em conformidade com o referido
Por decisão de 28 de Junho de 2021, julgou-se a acusação parcialmente procedente por provada e em conformidade decidiu-se manter a condenação do arguido JM pelo crime de detenção de arma proibida, p. e p. no artº 86º nº 1, al.d) da lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro, na pena de 160 (cento e sessenta) dias de multa à taxa diária de € 5,00 (cinco) euros e pelo crime de condução de veículo sem habilitação legal p. e p. no artº 3º, nºs 1 e 2 do DL nº 2/98, com referência ao disposto nos arts 121º nº 1 e 122º nº 1 do código da Estrada, na pena de seis meses de prisão
O tribunal determinou a execução desta pena de prisão, em regime de permanência na habitação, na morada sita no …, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, sendo o cumprimento desta obrigação fiscalizado pelo Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais
O arguido JM interpôs recurso desta decisão (quanto à execução da pena), tendo concluído a motivação do seguinte modo: «1. O recorrente, em sede de julgamento aceitou e não se opôs a que o cumprimento da pena a que foi condenado fosse executada em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios eletrónicos de controlo à distância
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Sucede que o recorrente tem filhos menores e é unicamente com os rendimentos do seu trabalho, como trabalhador agrícola, que o agregado subsiste
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O recorrente trabalha de segunda-feira a sexta-feira, como trabalhador agrícola na zona do … em …, na colheita do pimentão
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Mostra-se, pois, pertinente e assaz humanitário não privar o recorrente de, com o seu trabalho, proporcionar bem-estar à sua família
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Bem sabendo que, o tribunal “a quo” cumpriu exemplarmente o determinado no douto acórdão e que os limites daquela decisão se encontravam perfeitamente balizados, o recorrente pretende uma douta decisão deste tribunal superior que permita uma alteração da execução da pena de acordo com o preceituado no n.º 3 do art.º 43.º do Código Penal
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Ou seja, que no limite, seja permitido ao recorrente ausentar-se da sua residência para o exercício da sua atividade laboral, nos dias uteis, entre as 7 horas e as 19 horas
Nestes termos, nos melhores de Direito e com o sempre mui douto suprimento desse Venerando Tribunal, deve o presente recurso ser considerado procedente e, por via disso, deve a douta sentença recorrida ser alterada e decidir-se no sentido de a condenação do recorrente a executar em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios eletrónicos autorizar a sua ausência para exercício da sua atividade profissional, nos dias uteis da semana e nas horas em que tal se mostrar pertinente»
O Ministério Público respondeu ao recurso dizendo: «1. O recorrente JM foi condenado, pela prática, em autoria material e na forma consumada de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2 do Decreto – lei n.º 2/98, de 3 de janeiro, com referência ao disposto nos art.ºs 121.º, n.º 1e 122.º, n.º 1 do Código da Estrada, na pena de seis meses de prisão, a executar em regime de permanência na habitação, sita no … com fiscalização com meios técnicos de controlo à distância, sendo o cumprimento dessa obrigação fiscalizado pela Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais
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Inconformado com o teor da decisão veio o arguido, ora recorrente, requerer uma alteração da execução da pena de acordo com o preceituado no n.º 3 do art.º 43.º do Código Penal, por forma a que lhe seja permitido ausentar-se da sua residência para o exercício da sua atividade laboral, na zona do … em ..., na colheita do pimentão, nos dias uteis, de segunda-feira a sexta feira, entre as 7 horas e as 19 horas
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À pena de Jorge Gonçalves, in “A Revisão do Código Penal: Alterações ao Sistema Sancionatório Relativo às pessoas Singulares”, pág. 22, “O novo artigo 44º, com a epígrafe Regime de permanência na habitação, veio estabelecer uma forma de execução domiciliária da prisão, podendo ser entendida como uma nova pena de substituição (pelo menos em sentido impróprio), a aplicar-se como alternativa ao cumprimento da prisão nos estabelecimentos prisionais, em condenações até um ano, ou quando estejam em causa condenações superiores, mas em que o remanescente a cumprir não exceda um ano, descontado o tempo de detenção, prisão preventiva ou obrigação de permanência na habitação. Excepcionalmente, pode ser uma alternativa em penas até dois anos”
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regime de permanência na habitação é, como diz Germano Marques da Silva, um desafio permanente à vontade do condenado” (…) que não tem grades em casa…”. Deverá até (como defende o mesmo autor) ser assegurada a sua compatibilização com saídas para o trabalho ou outras actividades sociais necessárias à sua reintegração social: só assim será uma pena verdadeiramente eficaz”
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Não nos surgem dúvidas de que quando o Tribunal a quo condenou o arguido na pena de seis meses e determina o seu cumprimento em regime de permanência na habitação, não excluiu, sem mais, que com a mesma se possibilitará ainda o exercício de actividade laboral pelo condenado e, com ela, a efectiva reinserção social
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Tal é manifesto pela alusão feita de que o arguido tem trabalho, sendo certo, de que para construir um processo que permita criar uma identidade não criminal é essencial ter um trabalho e da adesão ao entendimento de Germano Marques da Silva da compatibilização do regime com as saídas para o trabalho
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E, na verdade, não vislumbramos incompatibilidade alguma entre o conteúdo e a natureza da pena de permanência na habitação e as saídas para o exercício pelo condenado de actividade laboral, desde que a sua periodicidade e duração se mostrem compatíveis com as finalidades de prevenção que lhe estão subjacentes e tendo em atenção o consignado no artigo 3º, nº 2, da Lei nº 122/99, de 20/08 (sublinhado nosso)
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Cumpre não olvidar, tratar-se ainda de um cumprimento de prisão intramuros, uma privação de liberdade, pelo que, as saídas e respectiva duração devem sempre se mostrar proporcionais e adequadas às finalidades de prevenção geral e especial que o caso supõe
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