Acórdão nº 186/18.8T8OLH.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelMÁRIO COELHO
Data da Resolução26 de Maio de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Sumário: (…) Acordam os Juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: No Juízo de Comércio de Lagoa, correm autos de inquérito judicial a sociedade em que são Requerentes: 1. (…); 2. (…); e 3. (…).

São, por seu turno, Requeridos: 1. Sociedade da (…), S.A.; 2. (…); 3. (…); e, 4. (…).

Sumariamente, alega-se que o capital da sociedade 1.ª Requerida se encontra dividido em partes iguais por dois grupos familiares, obrigando-se com a assinatura de dois administradores representando cada um desses grupos. Sucede que as contas do exercício de 2016 não foram elaboradas pelo conselho de administração nem aprovadas pela assembleia geral, o que se ficou a dever a manipulação de contas operada por um dos administradores (o 2.º Requerido), o que motivou o outro administrador (o 3.º Requerente) a recusar a assinatura do relatório e contas de 2016 e, posteriormente, a renunciar ao cargo, na assembleia geral convocada para aprovação dessas contas. Mais se alega que o 4.º Requerido, fiscal único da sociedade, nomeou a 3.ª Requerida administradora da sociedade, contra a vontade de accionistas representando metade do capital social, motivando providência cautelar para suspensão do exercício de funções por parte da 3.ª Requerida.

Formulam assim os seguintes pedidos: · ao abrigo do artigo 67.º do Código das Sociedades Comerciais, a nomeação de um administrador exclusivamente encarregado de, em prazo a fixar, elaborar o relatório de gestão, as contas do exercício de 2016 e os demais documentos de prestação de contas previstos na Lei e os submeter ao órgão competente da sociedade, podendo a pessoa judicialmente nomeada convocar a assembleia geral para o efeito; · caso assim não seja entendido, a nomeação de um administrador para, nos termos do artigo 292.º, n.º 3, do Código das Sociedades Comerciais:

  1. Propor e seguir, em nome da sociedade, acções de responsabilidade, baseadas em factos apurados no processo; b) Assegurar a gestão da sociedade, se, por causa de destituições fundadas na alínea a), for caso disso; c) Praticar os actos indispensáveis para reposição da legalidade.

Nas contestações (oferecidas em 10 e 11.04.2018), afirma-se que foi nomeada outra administradora da sociedade, que o conselho de administração já aprovou as contas de 2016 e ainda que foi convocada assembleia geral para aprovação das mesmas, que iria ter lugar algumas semanas após o termo do prazo de contestação, o que motivaria a inutilidade superveniente da lide. Mais se excepciona a ineptidão da petição inicial por cumulação ilegal de pedidos, o erro na forma de processo, e impugna-se a matéria da petição inicial.

Consta o seguinte de despacho datado de 23.03.2020: «Dispõe o artigo 554.º, n.º 1, do Código de Processo Civil que podem formular-se pedidos subsidiários. Diz-se subsidiário o pedido que é apresentado ao tribunal para ser tomado em consideração somente no caso de não proceder o pedido anterior. Por sua vez, o n.º 2, do mesmo artigo dispõe que a oposição entre pedidos não impede que sejam deduzidos nos termos do número anterior, mas obstam a isso as circunstâncias que impedem a coligação de autores e réus.

Um dos obstáculos que impede a coligação é a diferente forma de processo – artigo 37.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

A acção de inquérito judicial à sociedade é uma acção especial que tem duas tramitações distintas, consoante se pretenda a prestação de informações e junção de documentos ou a prestação de contas. No primeiro caso, segue tramitação regulada nos artigos 1048.º e seguintes do Código de Processo Civil e, no segundo caso, a tramitação prevista no artigo 67.º do Código das Sociedades Comerciais, por expressa remissão do n.º 3, desta disposição legal.

No presente caso, embora os requerentes pretendam, por um lado, que sejam prestadas as contas relativas ao exercício de 2016 que não foram atempadamente aprovadas, e que se subsume no pedido inerente a uma acção de inquérito judicial a sociedade a tramitar nos termo do artigo 67.º do Código das Sociedades Comerciais, por outro, pretendem a nomeação de um administrador nos termos do artigo 292.º, n.º 3, do Código das Sociedades Comerciais, que tem na sua base uma recusa de informação pedida nos termos dos artigos 288.º e 291.º do mesmo Código, e cuja tramitação é a prevista no artigo 1048.º do Código de Processo Civil.

Atentas as especificidades da tramitação de uma e outra acção, que implicam, em determinada fase, a intervenção de técnicos para prática de determinados actos concretos diferentes consoante o objecto da acção, torna incompatível a sua tramitação conjunta.

Pelo exposto, convido os requerentes a, em 10 dias, esclarecerem qual das pretensões pretendem ver apreciada nestes autos.

No caso de pretenderem a apreciação da primeira, deverão esclarecer, face aos factos alegados na contestação, se as contas de 2016 já foram apresentadas e aprovadas e, na afirmativa, quando; No caso de pretenderem a apreciação da segunda, deverão clarificar os factos alegados de forma a que objectivamente se compreenda que informação/documentos lhes foram negados pela sociedade e quando os pediram.» Notificados deste despacho, os Requerentes apresentaram o seguinte requerimento, em 17.06.2020: 1.

Foram, efectivamente, deduzidos nos autos dois pedidos com tramitação distinta, uma vez que os Requerentes consideraram (e consideram) que tal tramitação, embora distinta, não é incompatível entre si, nos termos do disposto no artigo 37.º, n.º 2 e 3, do Código de Processo Civil.

2.

Sucede que, atenta a posição expressa no douto despacho a que se responde, não podem os Requerentes deixar de esclarecer que têm interesse em ambos os pedidos.

3.

Porém, tendo em vista a rápida resolução do litígio, vêm os Requerentes, pelo presente, e de no seguimento do convite que lhes foi endereçado, indicar a pretensão que pretendem que prossiga nos presentes autos.

Para tanto, 4.

Cumpre analisar a tramitação que foi seguida até à presente data, para, por razões de economia processual e celeridade, escolher a pretensão a prosseguir.

5.

Analisadas as tramitações de ambos os pedidos, previstas no artigo 67.º e ss. do CSC quanto ao pedido principal e artigo 1048.º a 1050.º do CPC quanto ao pedido subsidiário, constata-se que a tramitação seguida nos presentes autos seguiu o previsto no artigo 1048.º do CPC, razão pela qual, informam os Requerentes a V. Exa. que pretendem ver apreciada a segunda pretensão apresentada, ou seja, a nomeação de um administrador nos termos do artigo 292.º, n.º 3, do Código das Sociedades Comerciais, 6.

Sem prejuízo de, no seguimento de eventual absolvição da instância da primeira pretensão, reservam o direito de apresentar nova acção, nos termos e para os efeitos do previsto nos artigos 278.º, n.º 1, alínea e) e 279.º do CPC.

(…) 46.

Aqui chegados, é manifesto que não foram prestadas aos Requerentes diversas informações pelos mesmos solicitadas e que foram prestadas informações falsas, incompletas ou não elucidativas pelo conselho de administração, em conjunção de esforços com o Fiscal Único.

Em suma, 47.

Pelo exposto, sempre se dirá que os pontos de facto relativamente aos quais pretendem ver apreciados nos presentes autos, por meio de inquérito à sociedade são: - A manipulação das amortizações; - A emissão de facturas falsas e/ou não relacionadas com o objecto social da sociedade requerida; - O levantamento ilegítimo de dinheiro da sociedade Requerida; - A existência de vantagens fiscais ilícitas e cálculo de impostos em dívida; - A existência de informação falsa nos Relatórios e Contas da sociedade Requerida; 48.

Assim, atento tudo o supra exposto, requerem a V. Exa. se digne ordenar o prosseguimento dos autos quanto à segunda pretensão apresentada, 49.

Para, nesse seguimento, o processo judicial correr os usuais trâmites legais, nos termos e para os efeitos do artigo 1049.º, n.º 1 e 2, do CPC.

Em sentença de 09.12.2021, apreciando a questão da incompatibilidade dos pedidos, após citação de parte relevante do anterior despacho, consta a seguinte decisão: «Verificando-se a incompatibilidade dos pedidos, de harmonia com o previsto nos artigos 6.º, n.ºs 1 e 2 e 7.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, foram os requerentes notificados dessa incompatibilidade e convidados a esclarecer relativamente a qual dos pedidos pretendiam prosseguir, tendo estes, a 17 de Junho de 2020, optado por prosseguir com o segundo dos pedidos, ficando sanada a referida excepção.» Após, apreciaram-se os requisitos do inquérito judicial regulado nos artigos 1048.º e seguintes do Código de Processo Civil e 292.º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais, concluindo-se que “não foram alegados factos que integrem os fundamentos legais previstos no artigo 292.º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais, para a realização de inquérito à sociedade”, pelo que o pedido foi julgado manifestamente improcedente.

Os Requerentes interpõem recurso desta decisão e ainda do “despacho proferido em 23 de Março de 2020, apenas susceptível de impugnação a final, nos termos do disposto no artigo 644.º, n.º 3, do Código de Processo Civil” (sic), concluindo o seguinte: A. Por douto despacho proferido em 23 de Março de 2020 foi decidido, ao abrigo dos artigos 37.º e 554.º do Código de Processo Civil, que os pedidos...

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