Acórdão nº 68/14.2T8VRS-B.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelALBERTINA PEDROSO
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 68/14.2T8VRS-B.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Faro[1] *****Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]: I. RELATÓRIO 1. LL, Agente de Execução nomeada na presente ação de divisão de coisa comum para proceder à venda, por meio de leilão eletrónico, do prédio objeto deste processo, tendo sido notificada do despacho proferido em 30.09.2022 (Ref.ª 10373322), que deferiu a reclamação apresentada pelas partes, considerando injustificado o pedido de remuneração adicional por si apresentado, e não se conformando com o mesmo, interpôs o presente recurso de apelação formulando as seguintes conclusões [transcrição]: «1. A Portaria 282/2013 visou, essencialmente, juntar, organizando e regulamentando de forma clara, coerente e num único diploma, toda a até aí vasta colecção de normas avulsas e dispersas que regulamentavam os trâmites da acção executiva, mormente os actos dos AEs, e delineou assim a forma de actuação, prática dos Actos e demais responsabilidades, deveres e obrigações dos mesmos, aí regulamentando vários institutos essenciais e inerentes a estas funções, onde se destaca o recurso ao leilão electrónico.

  1. Os AEs encontram-se vinculados a esta Portaria para a prática de todos os actos relativos á venda de imóveis em leilão electrónico, como descritos, nomeadamente, nos artigos 19º e seguintes, daquela Portaria, mesmo que tais actos sejam praticados no âmbito de um processo não-executivo.

  2. Nesse regime se inclui a matéria relativa à remuneração dos AEs aferida não ao facto de se restringir tal atuação aos processos de natureza executiva, mas sim àqueles actos em si, praticados que sejam no âmbito de processos judiciais, de natureza executiva ou não.

  3. A interpretação da norma constante do artigo 50º, nº 5, al. a) da Portaria 282/2013 adoptada pelo Douto Despacho a quo no sentido de excluir a sua aplicação as atuações do AE fora do processo executivo, mostra-se injustificadamente restritiva, criando diferenciação onde a mesma não existe e mostra-se assim, violadora do princípio constitucional da igualdade, previsto no artigo 13º da CRP.

  4. Com efeito, a AE pratica os mesmos atos, cumpre exatamente as mesmas funções, observa as mesmas normas e regras ao proceder á venda em leilão eletrónico quer no âmbito de processo executivo, quer no âmbito de processo civil, como é o caso dos presentes autos.

  5. Ao restringir a aplicação da remuneração adicional ao AE ao âmbito do processo executivo, ignorando a aplicabilidade dos mesmos institutos e figuras no âmbito das restantes formas processuais, o que não possui fundamento na letra ou espírito da Portaria, levaria a que não fosse possível então o recurso às modalidades de venda ou outros actos dos AEs fora dessa forma processual, levando, em ultima ratio, à inaplicabilidade de todo o diploma nas restantes áreas processuais, e à necessidade de regulamentação de figuras semelhantes para os restantes ramos do direito processual! 7. O que não faz sentido nem literal nem sistemicamente é a possibilidade de os tribunais ora entenderem recorrer a certas normas do diploma, recusando outras com tal fundamento relativo ao tipo processual! 8. Dando cumprimento ao princípio da igualdade, deverá a remuneração a atribuir ser semelhante em quaisquer dos casos, atenta a natureza e igualdade daquelas funções e respectivo conteúdo, seja qual for a forma processual em causa! 9. A aplicação das normas ínsitas na Portaria 282/2013 aos actos praticados pelos AE abrange tais actos, mesmo que aplicados fora do âmbito do processo executivo, aí se incluindo a remuneração devida ao AE pela venda do bem imóvel por meio de leilão eletrónico.

  6. Mal andou, assim, o Douto despacho recorrido ao recusar a aplicação da norma contida no artigo 50º, nº 5, al. a) da Portaria 282/2013, devendo ser anulado e substituído por outro que reconheça aquela remuneração adicional à AE.

  7. Caso assim se não entenda, sempre haveria nos autos lugar a uma remuneração adicional a liquidar á AE, por via do próprio Regulamento das Custas Processuais, no seu artigo 17º, nº 6, norma essa que, apesar de invocada expressamente pela recorrente no seu requerimento de resposta á reclamação suscitada pelos requerentes, foi ignorada e não aplicada pelo Mmo Juiz a quo, assim se configurando omissão ou recusa de aplicação da norma no Douto despacho recorrido.

  8. Entende a ora recorrente que, ainda que se entendesse que a Portaria 282/2013 não seria passível de aplicação, como se entendeu no Douto Despacho recorrido, então sempre deveria o Douto Tribunal determinar, em alternativa, o montante da remuneração a atribuir, nos termos do disposto no artigo 17º, nº 5 do RCP, através da aplicação de uma percentagem até 5% daquele valor da venda.

  9. Na determinação desse valor percentual nada impediria o Tribunal de se socorrer da norma ínsita no artigo 50º, nº 5, al. a) da Portaria, como factor de cálculo, até por semelhança com o mesmo tipo de funções, quando exercidas no âmbito do processo executivo.

  10. O Douto Tribunal recorrido entendeu claramente que a AE tinha exercido todos os actos necessários para o sucesso da venda, e que a sua actuação foi relevante e determinante para a venda do imóvel, o que constitui factor fundamental para a aplicação daquela remuneração adicional.

  11. Ainda que se entendesse que o valor calculado pela AE se mostrava excessivo por aplicação da norma da Portaria, sempre deveria o Douto Tribunal a quo proceder á sua redução, justificando a mesma, e determinar um valor que considerasse ajustado, por aplicação da norma contida no artigo 17º, nº 6 do RCP, atribuindo uma remuneração pelo trabalho prestado.

  12. A remuneração dos colaboradores e intervenientes processuais deve ser vista de forma condigna e desprovida de falsos pudores ou preconceitos; as normas jurídicas preveem essa remuneração, não cabendo aos aplicadores e intérpretes do Direito obstaculizar a tal pagamento de forma aleatória ou diferenciada.

  13. Ao não aplicar a norma contida no artigo 17º, nº 6 do RCP, violou o Douto Tribunal recorrido aquele princípio da igualdade, plasmado no artigo 13º da nossa CRP, permitindo assim que o trabalho executado pela AE nos autos ficasse desprovido daquela remuneração adicional, em flagrante desigualdade com o exercício das mesmas funções no âmbito do processo executivo.

  14. Mesmo que se concluísse pela não aplicabilidade directa da norma constante na Portaria 282/2013 ao caso dos autos, sempre deveria o Tribunal ter aplicado a norma constante do artigo 17º, nº 6 do RCP para atribuir um valor remuneratório adicional à AE, ainda que diverso do por ela reclamado; nessa determinação do valor aplicado, poderia ainda o Douto Tribunal recorrido socorrer-se da norma contida no artigo 50º, nº 5, al. a) da Portaria para fundamentar o cálculo do valor a pagar.» 2.

    Pelas partes foram apresentadas contra-alegações, defendendo que a situação dos Autos não se trata de uma ação executiva para cobrança e/ou recuperação de qualquer valor em dívida, que a nomeação e a intervenção da agente de execução nos autos foi-o tão só pela impossibilidade de acesso da secretaria dos tribunais à plataforma eletrónica para venda de bens, e pugnando pela improcedência do recurso.

  15. Observados os vistos, cumpre decidir.

    *****II.1. – Objeto do recurso Com base nas disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil[3], é pacífico que o objeto do recurso se limita pelas conclusões das respetivas alegações, evidentemente sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas conclusões do recurso, mas apenas as questões suscitadas, e não tendo que se pronunciar sobre as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.

    Assim, vistos os autos, a única questão a apreciar no presente recurso é a de saber se é ou não devida à Agente de Execução (AE) a pretendida remuneração adicional, e, em caso negativo, se o Tribunal devia ter aplicado a norma constante do artigo 17.º, n.º 6, do RCP, para atribuir um valor remuneratório adicional à AE, ainda que diverso do valor por ela reclamado.

    *****II.2. – Incidências processuais relevantes Para além do que se extrai do despacho recorrido, que infra se transcreverá, para a decisão do presente recurso importa ainda considerar que: 1. Na conferência de interessados que teve lugar nos autos de divisão de coisa comum, em 22.03.2012, foi consignado que: «Iniciada a conferência, (…) por ambas as partes foi dito que não lograram obter acordo quanto à adjudicação do prédio objecto da presente acção, pretendendo então que o mesmo seja vendido, podendo os consortes concorrer à venda, nos termos do Art.º 1056, nº 2 do CPC.

    Para valor base propõem o que é indicado no relatório pericial junto aos autos, ou seja, 430.000,00€ (quatrocentos e trinta mil euros), fls. 214 e seguintes.

    De seguida, pelo Mm.º Juiz de Direito foi proferido o seguinte DESPACHO: "Considerando a posição assumida pelos interessados, determina-se que seja efectuada a venda do imóvel objecto dos presentes autos, nos termos da aludida disposição legal, podendo os consortes concorrer à mesma.

    Tal venda assumirá a forma de propostas em carta fechada designando-se oportunamente data abertura das mesmas e publicitação».

  16. Pelos despachos proferidos em 26.09.2012 e 02.10.2012, foi designada data para abertura de propostas em carta fechada, (dia 28 de Novembro de 2012, às 10.00 horas), fixando-se em 70% do valor da avaliação do bem, constante do relatório pericial de fls. 214 e ss, o valor da venda a anunciar (ou seja, 301.000,00€).

  17. Cumpridas as formalidades legais, em 28.11.2012, no auto de abertura de propostas verificou-se não existir qualquer proposta em carta fechada, tendo a Mmª Juiz proferido despacho a determinar a venda do bem através de negociação particular, tendo sido concedido às interessadas presentes o prazo requerido para virem indicar...

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