Acórdão nº 6/20.3GARMZ.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelFÁTIMA BERNARDES
Data da Resolução13 de Setembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência na Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Évora: 1. RELATÓRIO 1.1. Neste processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, n.º 6/20.3GARMZ, do Tribunal Judicial da Comarca de Évora – Juízo de Competência Genérica do Redondo, foram os arguidos AA e BB, melhor identificados nos autos, acusados da prática, em coautoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelos artigos 21º, n.º 1 e 25º, al. a), do Decreto-Lei n.º 15/93 de 22 de janeiro, com referência à Tabela I-C anexa ao mesmo diploma legal.

1.2. Realizado o julgamento, foi proferida sentença em 13/01/2022, depositada na mesma data, com o seguinte dispositivo: «(...) decide-se: • Absolver a arguida BB, pela prática, em autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p.p. pelo artigo 21º, nº 1, e 25º, alínea a), do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, por referência à tabela I-C do mesmo diploma legal.

• Condenar o arguido AA, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p.p. pelo artigo 21º, nº 1, e 25º, alínea a), do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, por referência à tabela I-C do mesmo diploma legal, na pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período.

• Condenar o arguido AA no pagamento das custas e nos encargos do processo, fixando-se a taxa de justiça devida em 3(três) UC’s.

• Declarar perdidas a favor do Estado todas as substâncias estupefacientes aprendidas nos autos.

• Determinar a restituição aos arguidos dos objectos identificados no ponto 10) /vi), com sujeição ao regime previsto no art. 186º, nº 3, do Código de Processo Penal.

(…)».

1.3. Inconformados com o assim decidido, recorreram o Ministério Público e o arguido para este Tribunal da Relação, extraindo da motivação de recurso, as seguintes conclusões: 1.3.1.

Conclusões do recurso interposto pelo Ministério Público: «1. Na douta decisão proferida pelo Tribunal a quo a arguida BB foi absolvida da prática do crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1 e 25.º, alínea a) do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, por referência à tabela I-C do mesmo diploma legal.

  1. Para tanto o Tribunal a quo entendeu dar como não provados os seguintes factos: g) A arguida BB sabia que não estava autorizada a deter canábis por não lhe ser permitido cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, oferecer, pôr à venda, vender, distribuir, comprar, ceder ou, por qualquer título, receber, proporcionar a outrem, transportar, importar, exportar, fazer transitar ou deter produtos estupefacientes, e, ainda assim, decidiu deter tais substâncias, o que representou e quis e h) a arguida BB agiu de forma voluntária, livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

  2. No fundo, o Tribunal a quo, considerou erroneamente que a arguida BB atuou com negligência, uma vez que entendeu que esta não era conhecedora de que a plantação de canábis não estava autorizada pelas entidades competentes e como tal, a mesma atuou com negligência e como o tipo legal em questão não é punível a título de negligência, decidiu absolver a arguida do crime pelo qual a mesma vinha acusada.

  3. Todavia, não concordamos com tal decisão, uma vez que é nosso entendimento que a arguida sabia perfeitamente que a plantação de canábis que se encontrava no interior da estufa da Herdade ..., onde reside a arguida, não tinha autorização de nenhuma entidade, nomeadamente do Infarmed para cultivo de canábis para fins medicinais.

  4. Com efeito, resulta das declarações prestadas pela arguida em audiência e discussão de julgamento, relativamente à plantação de canábis na Herdade ..., a mesma a instâncias do Mmo. Juiz referiu que “Estava ao corrente das plantações, mas não era parte participante” e que tinha acesso à estufa e que inclusive a própria arguida confirmou que regava a plantação de canábis.

  5. Mais afirmou a arguida em audiência e discussão de julgamento que estava ao corrente de todo o canábis que se encontrava no interior da sua residência, canábis este que foi apreendido no dia das buscas realizadas à Herdade ... e no qual se encontrava a arguida.

  6. Por outro lado, a própria arguida em sede de primeiro interrogatório judicial, a instâncias da Mma. Juiz se a plantação de canábis da Herdade ... tinha ou não licença, a arguida foi perentória a responder que não.

  7. Ora, perante esta factualidade, não temos dúvidas de que a arguida BB tinha perfeito conhecimento que a plantação de canábis que se encontrava no interior da Herdade ..., tanto na estufa como no interior da residência, e da qual a mesma procedeu à sua rega, não tinha nenhuma licença emitida por entidade competente, designadamente o Infarmed.

  8. Pelo que, não se percebe como é que o Tribunal a quo, perante esta factualidade entendeu que a arguida agiu com negligência, quando é a própria arguida a admitir que não havia qualquer autorização por parte das entidades competentes para plantar o canábis.

  9. Sem prescindir, sempre se diga que a arguida, é uma pessoa com formação académica superior, licenciada em direito, que tinha conhecimento das reuniões que o arguido, seu companheiro AA encetou com diversas entidades com vista a obter o licenciamento da plantação de canábis, tendo inclusive a própria, como sócia da empresa F... Lda., titular do projeto ..., ter que entregar o seu certificado de registo criminal, o que a mesma confirmou em sede de audiência e discussão de julgamento, assim como a testemunha CC.

  10. Além do mais, a arguida BB, como sócia da empresa F... Lda., tinha a obrigação de saber, confirmar e diligenciar pela obtenção do licenciamento para a plantação de canábis.

  11. Até porque, sendo sócia da referida empresa, tendo canábis plantado numa estufa de uma herdade da qual a mesma também é proprietária e procedendo ela mesmo à rega de canábis, não podia descurar de obter a devida autorização das entidades competentes e diligenciar junto das mesmas pela sua obtenção.

  12. Pelo exposto, considerando as declarações da arguida BB produzidas em sede de audiência e discussão de julgamento, bem como no primeiro interrogatório judicial, assim como as declarações da testemunha CC e da demais prova documental constante nos autos, entendemos que dever-se-á dar como provado os seguintes factos da acusação: g) a arguida BB sabia que não estava autorizada a deter canábis por não lhe ser permitido cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, oferecer, pôr à venda, vender, distribuir, comprar, ceder ou, por qualquer título, receber, proporcionar a outrem, transportar, importar, exportar, fazer transitar ou deter produtos estupefacientes, e, ainda assim, decidiu deter tais substâncias, o que representou e quis.

    1. A arguida BB agiu de forma voluntária, livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

  13. E em consequência a arguida BB ser condenada pela prática, em co-autoria material e na forma consumada de 1 (um) crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1 e 25.º, alínea a) do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, por referência à tabela I-C do mesmo diploma legal.

  14. Quanto à pena a aplicar em concreto à arguida BB, atendendo aos critérios estabelecidos no artigo 71.º do Código Penal e uma vez que o crime em questão é apenas punido com pena de prisão de 1 a 5 anos, tendo em conta que a prevenção geral é alta, mas considerando que a prevenção especial se mostra reduzida atento a que a arguida se encontra pessoal, familiar e socialmente integrada e a ilicitude também se mostra reduzida, considerando as motivações que estavam inerentes à plantação do canábis, entendemos que a deverá a arguida BB ser condenada na pena de 1 ano e 1 mês de prisão.

  15. Relativamente à suspensão da execução da pena de prisão, uma vez que se encontram reunidos os pressupostos do artigo 50.º, n.º 1 do Código Penal, atendendo ao facto de a arguida não ter antecedentes criminais, de se encontrar inserida profissional e socialmente, entendemos que a referida pena de prisão deverá ser suspensa na sua execução por igual período.

    Nestes termos e nos mais de Direito, requer-se Mui Respeitosamente a V. Exas. que seja dado provimento ao presente Recurso e a Douta Decisão Recorrida seja revogada e substituída por outra que dê como provados os factos constantes dos pontos G) e H) da matéria de facto dada como não provada na sentença ora recorrida (essencialmente no que ao tipo subjetivo diz respeito) e assim se condenando a arguida BB pela prática, em co-autoria material e na forma consumada de 1 (um) crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1 e 25.º, alínea a) do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, por referência à tabela I-C do mesmo diploma legal, na pena de 1 (um) ano e 1 (um) mês de prisão, suspensa na sua execução por igual período.

    V. Exas, porém, e como sempre, farão Justiça!» 1.3.2.

    Conclusões do recurso interposto pelo arguido:

    1. O arguido foi condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelos artigos 21.º, n.º 1 e 25.º, do Decreto-Lei n.º 15/03, de 22 de Janeiro, por referência à tabela I-C do mesmo diploma legal, na pena de um ano e dois meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período de tempo.

    2. Na sua contestação foram invocadas questões de Direito, mormente nulidades e inconstitucionalidades, cuja resposta lhe parece importante, e porque aí foram invocadas. Estarão sujeitas ao conhecimento do tribunal todas as matérias que não sendo irrelevantes (claro está), são levadas ao conhecimento do tribunal pelo arguido, que considera, naturalmente, importantes as nulidades, ilegalidades e inconstitucionalidades que invocou junto do tribunal.

    3. da notícia do crime: no dia 11 de Julho, a notícia do alegado crime foi dado por um terceiro, que...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT