Acórdão nº 80/17.0JALRA.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Setembro de 2022
Magistrado Responsável | ANA BACELAR |
Data da Resolução | 13 de Setembro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação do Évora I.
RELATÓRIO Nos presentes autos, de processo comum, com o n.º 80/17.0JALRA do Juízo Central Criminal de ... [Juiz 2] da Comarca de ..., em que figura como Arguido AA [[1]], realizada a audiência a que alude o artigo 472.º do Código de Processo Penal, procedeu-se ao cúmulo jurídico da pena neles imposta com as penas impostas no processo n.º 169/14...., acabando fixada a pena única de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de prisão e as penas acessórias de proibição de exercer profissão, emprego, funções ou atividades, públicas ou privadas, cujo exercício envolva contacto regular com menores, e de proibição de assumir a confiança de menor, em especial a adoção, tutela, curatela, acolhimento familiar, apadrinhamento civil, entrega, guarda ou confiança de menores, ambas por um período de 5 (cinco) anos.
Inconformado com tal decisão, o Arguido dela interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [transcrição]: «I- Vem o presente recurso interposto do Acórdão, proferido pelo Tribunal “a quo”, que operou cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas no âmbito dos presentes autos e do Processo Comum Coletivo, com o número 169/14.....
II- No âmbito do processo número 169/14...., foi o Arguido, condenado, por sentença transitada em julgado a 11 de janeiro de 2021, pela prática, em autoria material, na forma consumada, de 1 (um) crime de abuso de confiança, p. e p. pelo artigo 205.º n.º 1 do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão; de 2 (dois) crimes de falsificação de documento p. e p. pelos artigos 256.º n.º 1, alíneas a) e e) do Código Penal, na pena de 8 (oito) meses de prisão, por cada um dos crimes praticados; de 14 (catorze) crimes de falsificação de documento p. e p. pelos artigos 256.º n.º 1 alíneas a) e e) e n.º 3 do Código Penal, na pena de 16 (dezasseis) meses de prisão, por cada um dos crimes praticados e, III- Em cúmulo jurídico, na pena única de 5 (cinco) anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período e sujeita a regime de prova e ainda subordinada à condição de o arguido pagar as quantias fixadas aos demandantes cíveis até ao termo do prazo de suspensão da execução da pena de prisão, para reparação dos danos que lhe foram causados.
IV- No âmbito dos presentes autos, foi o Arguido condenado, por acórdão transitado em julgado em 16 de junho de 2021, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de 1 (um) crime de pornografia de menores agravado, p. e p. pelos artigos 176.º n.º4 e 177.º n.º 1 alínea c), ambos do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão, na pena acessória de proibição de exercer profissão, emprego, funções ou atividades, públicas ou privadas, cujo exercício envolva contacto regular com menores, prevista no artigo 69.º-B, n.º 2, do Código Penal e na pena acessória de proibição de assumir a confiança de menor, em especial a adoção, tutela, curatela, acolhimento familiar, apadrinhamento civil, entrega, guarda ou confiança de menores, prevista no artigo 69-C, n.º 2 do Código Penal, a qual foi suspensa na sua execução por igual período, sujeita a regime de prova e subordinada ao dever de o Arguido entregar à Associação Portuguesa ... a quantia de € 2.000,00 (dois mil Euros) e de comprovar nos autos esse pagamento no prazo de 1 (um) ano, contado do trânsito em julgado da referida decisão.
V- Ao Arguido, foram aplicadas, penas de prisão suspensas na sua execução e subordinadas ao cumprimento de deveres e uma pena acessória.
VI- O Arguido, nunca foi condenado em qualquer outro processo judicial e não tinha, quaisquer antecedentes criminais à data do trânsito em julgado do acórdão condenatório proferido no âmbito do processo com o número 169/14.....
VII- Em 02.02.2022, foi realizado o cúmulo jurídico, face ao conhecimento superveniente de concurso de condenações sofridas nos autos e no processo número 169/..., tendo o Arguido, sido condenado na pena única de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de prisão efetiva e na pena acessória de proibição de exercer profissão, emprego, funções ou atividades, públicas ou privadas, cujo exercício envolva contacto regular com menores, prevista no artigo 69.º-B n.º 2 do Código Penal, por um período de 5 (cinco) anos e na pena acessória de proibição de assumir a confiança de menor, em especial a adoção, tutela, curatela, acolhimento familiar, apadrinhamento civil, entrega e guarda prevista no artigo 69-C n.º 2 do Código Penal, por um período de 5 (cinco) anos.
VIII- As penas de prisão, suspensas na sua execução, de respetivamente, 5 e 2 anos, aplicadas em cada um dos processos em que foi o arguido condenado, foram substituídas por uma pena única de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de prisão efetiva.
IX- Entende o Recorrente que, os elementos fornecidos nos autos impõem decisão diversa quanto à medida concreta da pena resultante do cúmulo jurídico, nomeadamente, a aplicação de uma pena única mais favorável, uma pena, no máximo, de 5 (cinco) anos de prisão, suspensa na sua execução.
X- Foi dada como provada, entre outras, a seguinte factualidade: “5) AA vive no ... com a companheira, cuidadora de idosas, há cerca de quatro anos.
6) O casal ocupa um imóvel arrendado, cujo espaço interior é constituído por uma sala, dois quartos, cozinha e casa de banho, o que proporciona adequadas condições habitacionais.
7) A nível económico, AA goza de uma situação estável, tendo como principais despesas fixas mensais, a renda de casa, no montante de €300,00 (trezentos euros) e as despesas domésticas de água, gás, eletricidade e comunicações, bem como os encargos relacionados com alimentos da filha menor que tem de uma anterior relação.
8) A mãe da filha menor não tem capacidade económica, pelo que AA assume economicamente o encargo da filha, apesar de a mesma viver com a mãe, em ....
9) Os contactos entre pai e filha são frequentes, não existindo qualquer dificuldade no âmbito do processo de visitas e mantendo uma boa dinâmica de relacionamento com a mãe da filha.
10) AA não desenvolve qualquer atividade de lazer estruturada; sendo o seu tempo livre passado em casa junto de familiares, a tocar guitarra, a passear de moto ou a conviver com amigos.
11) Os pais de AA vivem no ... há largos anos, numa casa que dista cerca de cem metros da residência do mesmo.
12) A situação de proximidade familiar leva a uma boa dinâmica de relacionamento familiar, bem como de vizinhança, uma vez que AA residia com os pais antes de ter arrendado a atual habitação.
13) A nível de trajetória de vida, AA é natural de ..., mas viveu sempre no ... e em ....
14) Devido às obrigações laborais dos pais, AA iniciou o seu percurso escolar em ..., localidade onde tinha outros familiares (avós) que lhe podiam prestar um acompanhamento mais consistente.
15) Todos os familiares lhe procuraram transmitir valores de honestidade, rigor e hábitos de trabalho.
16) Após o 9.º ano de escolaridade, AA foi estudar para o ..., tendo, posteriormente, concluído a licenciatura... na Universidade ....
17) A sua experiência profissional prende-se com o exercício da ....
18) Ao nível das suas relações afetivas, AA assume ter sempre privilegiado relações com pessoas mais velhas, tal como é o caso da mãe da filha e da sua atual companheira.
XI- Sendo estes os únicos factos provados no douto Acórdão acerca das atuais condições de vida do Recorrente, impunham ao Tribunal “ad quo” a formulação de um juízo crítico favorável, acerca daquela que é a personalidade do Arguido.
XII- O douto Tribunal recorrido, deveria, também, ter dado como provado que “Na comunidade, o arguido tem uma imagem normativa.”, e que “Atualmente, encontra-se empenhado na estabilidade do seu projeto de vida.”, conforme resulta do Relatório da Direção Geral ... datado de 24.01.2022.
XIII- Não resulta provado que o Recorrente, revela dificuldade de interiorização da importância dos bens jurídicos liberdade e autodeterminação sexual, propriedade e segurança e credibilidade no tráfego jurídico – probatório, ou que mantém uma significativa predisposição para a assunção de comportamentos atentatórios dos referidos valores, evidenciando uma patente desconsideração pelas Regras e pelo Direito.
XIV- Também não resulta provado que, atendendo à personalidade do Arguido, às suas condições de vida, à sua condição anterior e posterior aos crimes, a simples censura do facto e a ameaça de prisão não realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
XV- E que não se verifica qualquer manifestação de arrependimento por banda do Arguido e que este não denota interiorização da gravidade meramente objetiva dos seus atos.
XVI- Em sede de fundamentação, concluiu Tribunal recorrido, que o Arguido não se mostra arrependido e que não interiorizou a gravidade dos seus atos, bem como, lhe são indiferentes as consequências da sua conduta e que o circunstancialismo que levou o Arguido a avançar nos meandros da criminalidade se mantém e em nada se alterou.
XVII-Não resulta da matéria dada como provada que o Arguido revela dificuldade no controlo dos impulsos relacionados com a satisfação das necessidades mais imediatas, fator de risco na assunção de comportamentos anti normativos.
XVIII- No entanto, foram estes os fundamentos alegados no douto acórdão recorrido para a aplicação ao Recorrente de uma pena unitária de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de prisão efetiva, apesar dos mesmos não resultarem da matéria de facto dada como provada.
XIX- Os factos dados como provados colidem, inconciliavelmente, com a fundamentação da decisão recorrida, sendo notória e evidente, a sua insuficiência para fundamentar a solução adotada pelo douto Tribunal “ad quo” em condenar o Arguido numa pena de prisão unitária e efetiva de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses, razão pela qual o acórdão recorrido padece do vício previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal, insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, e...
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