Acórdão nº 3/17.6 GASLV.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA FILOMENA SOARES
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Criminal (1ª Subsecção) do Tribunal da Relação de Évora: I No âmbito do processo comum, com intervenção do Tribunal Colectivo, nº 3/17.6 GASLV, do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo Central Criminal de Portimão, mediante pronúncia, precedendo contestação [na qual, em síntese, os arguidos negam o cometimento dos factos e arguiram nulidades], foram submetidos a julgamento os arguidos LL e TT, (devidamente identificados nos autos), e por acórdão proferido e depositado em 05.11.2018 foi decidido: “(…) condenar cada um dos arguidos LL e TT, pela prática de um crime de tráfico, previsto e punido pelo artigo 21º nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93 de 22 de Janeiro, na pena de 7 (sete) anos e 8 (oito) meses de prisão.

* Pelos motivos supra expostos, e nos termos do art. 212º nº 1 al. b) do Código de Processo Penal, o Tribunal decide ainda manter a medida de coacção de prisão preventiva a que os arguidos estão sujeitos.

* O Tribunal condena os arguidos ao pagamento das custas do processo, fixando a taxa de justiça em 4 UC (art. 8º do Regulamento das Custas Processuais, com referência à Tabela III do mesmo diploma).

* Por fim, o Tribunal manda restituir, declara perdidos a favor do Estado, e destina os objectos apreendidos à ordem destes autos nos precisos termos vertidos supra na fundamentação de direito do presente acórdão, sem prejuízo dos direitos de terceiros de boa fé a que alude o art. 36º-A do Decreto-Lei nº 15/93.

(…)”.

Inconformados com esta decisão, dela recorreram os arguidos, extraindo da respectiva motivação de recurso as seguintes conclusões: “1.

Por acórdão datado de 05-01-2018 foram os arguidos condenados pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes na pena de sete anos e oito meses de prisão.

  1. Os arguidos não se conformam com o acórdão recorrido e consideram que foram incorretamente julgados e apreciados pelo tribunal “a quo” os factos provados n.º 4, 5, 6, 7, 12, 13, 14, 15 e 16.

  2. Os depoimentos prestados pelos assistentes FF desde o minuto 00:00 a 19:27 e da assistente MM ao minuto 00:00 a 10:39 impõem decisão diversa da ora recorrida.

  3. Desde logo deveriam estes ter sido valorizados uma vez que resulta que estes não conhecem os arguidos, nunca os viram.

  4. Encontram-se ainda incorretamente julgados os factos n.º 9,10 e 11 porquanto os autos de busca e apreensão se encontram feridos de nulidade e como tal tais factos nunca poderiam ter sido dados como provados.

  5. Resultando ainda do depoimento prestado pelas testemunhas RP ao minuto 00:00 ao 29:34 e da testemunha AB ao minuto 00:00 a 16:02 que os arguidos/visados não foram devidamente informados e assistidos por interprete e por defensor conforme é legalmente obrigatório.

  6. Assim e de toda a prova supra elencada deverá a matéria de facto impugnada ser dada como não provada.

  7. Os factos impugnados impõem decisão diversa da ora recorrida e mostram-se em contradição com a decisão proferida.

  8. Mais se refere que deverá existir um acrescento à matéria de facto dada como provada e da mesma deverá constar que as chaves dos imóveis sitos na Gateira encontravam-se em cima de um frigorífico e acessíveis a todos.

  9. Termos em que deverá o acórdão recorrido ser revogado e em consequência deverão as provas supra indicadas serem renovadas, conforme estatui o artigo 412º, n.º 3, al. c) e 430º do C.P.P.

  10. Da matéria de facto dada como provada consta que os arguidos encontravam-se em Portugal desde janeiro de 2017 e foram detidos em 7 de março de 2017, resultando das regras da experiencia comum que são precisos mais do que 1 mês ou dois meses para produzir uma plantação de cannabis, o que significa que tais culturas a terem ocorrido são anteriores à chegada dos arguidos a Portugal.

  11. Por outro lado os arguidos não arrendaram nenhuma das casas e os próprios militares da GNR vieram prestar depoimentos contraditórios, tais factos à luz das regras da experiencia comum e à lógica normal da vida não poderiam ter sido dados como provados, pois mostram-se desde logo não verificados.

  12. O que faz com que estejamos perante um erro notório da apreciação da prova, devendo o acórdão recorrido ser revogado.

  13. Resulta ainda que a matéria de facto dada como provada em 6, 7 e 12 se encontra em manifesta contradição com a matéria de facto dada como não provada na alínea b) e i), pois não pode resultar provado que os arguidos tenham agido com o propósito de venderem as substância psicotrópicas e de auferirem lucros se resulta não provado que os arguidos agiram com o propósito de, pessoalmente, venderem tais substâncias no mercado.

  14. Motivo pelo qual deverá o acórdão recorrido ser anulado por a matéria de facto dada como provada se encontrar em manifesta contradição com a matéria de facto dada como não provada, nos termos do disposto no artigo 410º, n.º 2, al. c) do C.P.P.

  15. O erro em questão, quando resulta da decisão recorrida, constitui vício que implica a anulação daquela e o reenvio do processo para novo julgamento (artigo 410.º, n.º 2, alínea c), 426.º e 436.º todos do Código de Processo Penal. (Acórdão do STJ de 98.11.18, Proc.º n.º 615/98).

  16. Mostra-se ainda violado o princípio da presunção na inocência e “In Dúbio Pro Reo”, devendo a decisão recorrida ser anulada e deverá ser proferida outra que absolva os arguidos nos termos do artigo 32.º, n.º 2 da nossa Constituição.

  17. Os arguidos, ora Recorrentes invocaram a nulidade do auto de busca de fls. 69 a 75, 115 a 116, e 122 a 127 e dos demais actos subsequentes em virtude de o mesmo estar assinado por arguido que não entende, nem compreende a língua portuguesa, tendo assim sido preteridos os direitos, liberdades e garantias consagrados no artigo 120.º do Código de Processo Penal e constitucionalmente no seu artigo 32.º, n.º1 e 5 da CRP.

  18. Tendo o tribunal “a quo” entendido que quando estamos perante a realização de buscas ordenadas judicialmente, não se verifica a exigência de estar presente um intérprete ou mesmo um defensor, pois que a diligência deverá ser realizada independentemente da prévia autorização ou consentimento do visado.

  19. De facto tal é verdade as buscas autorizadas judicialmente ocorreram quer o visado queira ou não.

  20. Porém olvida-se o douto tribunal “a quo” que numa busca, acto que é de extrema violência para o visado e para terceiros, tal como ocorreu no caso concreto em que houve destruição de várias portas e que temos uma situação de grande stress em que o visado é colocado.

  21. A acrescentar temos dois arguidos que não entendem, nem falam português, a lei exige, quanto a nós no seu artigo 12.º, n.º 2, alínea c) do CPP a nomeação de interprete no caso em que temos o arguido a assinar, a comprovar um facto descrito num determinado documento e como aliás resulta também do artigo 92.º do CPP.

  22. E dispõe o artigo 64.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Penal que é obrigatória a assistência de defensor em qualquer acto processual, à excepção da constituição de arguido, sempre que o arguido for desconhecedor da língua portuguesa.

  23. Ora, in casu temos que para além de uma total ausência de intérprete durante a busca, certo é que os arguidos, desconhecedores da língua portuguesa não foram assistidos por nenhum defensor, o que consubstancia uma nulidade insanável nos termos do disposto no artigo 119.º, alínea c) do Código de Processo Penal.

  24. Sem prescindir, sempre se dirá que caso assim não se entenda estamos perante uma nulidade prevista no artigo 120.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Penal, pois constitui nulidade dependente de arguição a falta de nomeação de intérprete nos casos em que a lei considerar obrigatória, nulidade essa que o ora recorrente só tomou conhecimento em sede de audiência de discussão e julgamento e aquando da inquirição dos OPC’s, tendo de imediato arguido a nulidade, logo quando teve conhecimento da mesma, considerando-se assim que se estava em tempo para arguir a nulidade, devendo a mesma ser declarada procedente.

  25. Veja-se a este propósito aquele que tem sido o entendimento dominante da nossa jurisprudência, nomeadamente o vertido no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, processo n.º 256/16.7PAPVZ-B.P1, datado de 29-03-2017.

  26. Assim o tribunal “a quo” violou o disposto no artigo 92.º n.º 2 do Código de Processo Penal, uma vez que, apesar de resultar dos autos que os recorridos não conhecem, e muito menos dominam a língua portuguesa, não lhe foi nomeado intérprete aquando da realização de busca, quer a domiciliária, quer a do armazém.

  27. A inobservância da regra de nomeação de interprete, consubstância uma nulidade prevista no artigo 120.º n.º 2 alínea c) do Código de Processo Penal.

  28. Apesar de constar dos autos que os arguidos são cidadãos de nacionalidade britânica, e não são conhecedores, e muito menos dominam a língua portuguesa foi também violado o disposto no artigo 64.º alínea d) do Código de Processo Penal, aquando da autorização e da realização da busca domiciliária, os recorrentes não estavam representados por defensor.

  29. Tal situação constitui uma nulidade insanável prevista no artigo 119.º alínea c) do Código de Processo Penal, embora se admita que possa ter sido atabalhoadamente alegado pela defesa a verdade é que o facto de os arguidos/visados desconhecerem a língua portuguesa, não se encontrarem acompanhados de intérprete e de defensor irá acarretar forçosamente a nulidade de todos os demais actos subsequentes, pois estamos a falar de autos que fazem e valem como prova pré-constituída. Não podemos considerar que os arguidos são sujeitos passivos e que não necessitam de ver os seus direitos assegurados e bem assim os actos traduzidos para língua que compreendam.

  30. Mais se refere que o auto de apreensão não poderá valer como prova, pois o OPC que apreendeu a droga não foi ouvido, nem foi indicado como testemunha, motivo pelo qual não poderá o auto de apreensão servir de prova pré-constituída.

  31. Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 122.º do Código de Processo Penal, as nulidades tornam...

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