Acórdão nº 9/18.8GBODM.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelGILBERTO CUNHA
Data da Resolução07 de Maio de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: RELATÓRIO.

Decisão recorrida.

No processo sumário nº9/18.8GBODM, procedente do Juízo de Competência Genérica de Odemira (J2) do Tribunal judicial da Comarca de Beja, o arguido AA, com os sinais dos autos, sob acusação formulada pelo Ministério Público foi submetido a julgamento perante tribunal singular, vindo por sentença datada de 25-10-2018, proferida em cumprimento do acórdão deste Tribunal da Relação que declarou nula a que havia sido anteriormente prolatada, a ser condenado pela prática de um crime de desobediência, pp. pelo art.348º (e não 358º como por manifesto e evidente lapso consta da fundamentação e dispositivo da sentença recorrida), nº1, al. a) do Código Penal, por referência ao art.152º, nºs 1, al. a) e nº3 do Código da Estrada, na pena de doze (12) meses de prisão com execução suspensa por igual período de tempo, com regime de prova direcionado para o tratamento do alcoolismo, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de dezoito (18) meses (art.69º, nº1, al. c) [e não al. a) como por mero lapso consta do dispositivo da sentença] do C. Penal.

Recurso.

Inconformado com essa decisão dela recorreu o arguido pugnando pela sua absolvição ou quando assim se não entenda que a pena de prisão seja substituída por multa e a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor reduzida a limites proporcionais à gravidade da culpa do arguido., rematando a motivação com as seguintes (transcritas) conclusões: 1.º O art.º 45.º do Cód. Penal não se basta com as razões pelas quais o julgador optou pela pena privativa da liberdade em vez da pena não privativa.

Na verdade, 2.º O que este comando legislativo reclama é que, depois daquela escolha feita, se consignem as razões pelas quais o julgador não procede à comutação da pena de prisão por uma pena substitutiva, não privativa da liberdade; 3.º A substituição da pena de prisão não superior a 1 ano por pena não privativa da liberdade impõe-se, por regra, e tal substituição só não ocorrerá se o julgador argumentar, fundadamente, que a execução da pena de prisão é a única forma prevenir o cometimento de futuros crimes por parte do arguido.

Ora, 4.º A Mm.ª Juiz a quo não logrou cumprir tal determinação legal na sentença ora recorrida, pelo que é o arguido levado a concluir que se mantém, tal e qual, a nulidade que levou os Mm.ºs Desembargadores a decretarem a nulidade da sentença de 08-02-2018, e que agora determina, pelas mesmas razões, a nulidade da sentença ora em recurso; 5.º O arguido não foi submetido ao teste qualitativo, facto que resulta provado, não apenas das declarações do arguido, mas diretamente das contradições entre os depoimentos dos guardas RC e FC.

Com efeito, 6.º O guarda RC diz que foi ele que fez o teste, o guarda FC diz que afinal foi ele que fez o teste, e, por fim, admite ainda que possa ter sido o colega L, que não chegou a prestar depoimento; 7.º Acresce que nada existe nos autos que documente a realização desse teste, nem que tenha sido a taxa referida no facto provado n.º 3 a alegadamente detetada no teste qualitativo; 8.º Termos em que o facto provado n.º 3 deve ser retirado do rol dos factos provados e inserido no rol dos factos não provados com interesse para a decisão da causa; 9.º A não se entender assim, no mínimo, deve ser retirada do facto provado n.º 3 a alusão à taxa de alcoolémia; 10.º Resulta ainda do depoimento do guarda RC que o mesmo não perguntou ao arguido há quanto tempo aquele tinha ingerido a última bebida alcoólica quando lhe pediu para fazer o teste qualitativo; 11.º Resulta das declarações do arguido que este tinha estado a beber há cerca de 10 minutos antes de lhe ser pedido que fizesse o teste de despiste; 12.º Em consequência, deve ser acrescentado um novo facto ao rol dos factos considerados provados, com a redação sugerida acima; 13.º A Organização Internacional de Metrologia Legal (OIML), na sua recomendação n.º 126, publicada em 1998, relativamente aos requisitos metrológicos, veio advertir que, para efeitos de minimizar os erros máximos admissíveis (EMA), no uso dos aparelhos quantitativos dever-se-á ter em consideração a influência do Etanol no trato respiratório superior, devendo as autoridades nacionais optar por aparelhos quantitativos cujo instrumento de aprovação estabeleça disposições relativas ao uso dos mesmos; 14.º A observância desta Recomendação é obrigatória, de acordo com o art.º 4.º do Regulamento de Controlo dos Alcoolímetros, aprovado e publicado em anexo à Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro; 15.º Os alcoolímetros quantitativos estão sujeitos a controlo metrológico obrigatório, nos termos do art.º 7.º do Regulamento de Controlo dos Alcoolímetros, citado; 16.º Ainda assim, apresentam uma possibilidade de erro de cerca de 30% para um alcoolímetro com mais de 1 ano, para uma TAE superior a 2mg/L, de acordo com o Anexo ao Regulamento de Controlo dos Alcoolímetros; 17.º Os alcoolímetros qualitativos nem sequer à verificação anual estão sujeitos, apenas a uma calibragem esporádica, o que aumenta substancialmente a possibilidade de erros; 18.º Por tal motivo, a regra dos 20 minutos sobre a ingestão da última bebida alcoólica deve sempre ser empregue em todos os casos, mesmo no despiste qualitativo; 19.º Os guardas que prestaram depoimento sabiam disso, mas não a cumpriram, procurando obrigar o arguido a realizar a pesquisa pouco tempo depois da ingestão da última bebida.

Nestes termos, 20.º É de concluir que o arguido dispunha de motivo justificativo para a recusa à submissão ao teste qualitativo, devendo por isso ter sido absolvido da prática do crime de desobediência pelo qual vinha acusado; 21.º A fundamentação da sentença, quanto à aplicação da pena de prisão, é confusa e contraditória.

Com efeito, 22.º O Tribunal fundamenta a justeza da pena de prisão nos antecedentes crimes de condução de veículo em estado de embriaguez – quando é certo que o arguido vem acusado, nos presentes autos, da prática de um crime de desobediência – e, igualmente, no facto de o arguido já ter sido anteriormente punido pela prática de um crime de desobediência, em 2009, com pena de prisão, pelo que seria de manter a mesma escolha de pena.

Acresce que, 23.º Não dá cumprimento ao comando constante do n.º 1 do art.º 45.º do CP, na redação da Lei n.º 94/2017, de 23 de Agosto, quanto à obrigatoriedade de substituição da pena de prisão não superior a 1 ano por pena de multa ou outra pena não privativa de liberdade.

Por último, 24.º E considerando a postura processualmente colaborante do arguido, 25.º A confissão dos factos, 26.º O facto de demonstrar ter consciência da censurabilidade da sua conduta e ter sincero receio de ser condenado numa pena de prisão efetiva, 27.º Que já se encontra a frequentar consultas de alcoologia, e, ainda, 28.º Que está atualmente a trabalhar como agricultor, e encontra-se familiarmente inserido, sendo o sustento da casa dos seus pais, 29.º É de considerar a graduação da pena acessória de proibição de condução de veículos motorizados pelo período de 18 meses é claramente desproporcionada, pelo que deverá ser reduzida para seis meses, por tal duração se mostrar adequada aos fins de prevenção especial em evidência, ou, no máximo, para uma duração igual à do período de duração da suspensão da pena.

Pelo exposto, 30.º É de concluir que a douta sentença recorrida padece dos seguintes vícios:

  1. Nulidade, pelo facto de a douta sentença se ter deixado de pronunciar sobre questões que devia apreciar, nos termos do disposto na al. c) do n.º 1 do art.º 379º do CPPenal; b) Insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e erro notório na apreciação da prova (art.º 410.º/2-a) e c) do CPP) – conclusões 1.º a 8.º; c) Violação do disposto no art.º 152.º/3 do CE e do art.º 348.º/1-a) do CP, por não se verificarem os pressupostos dos quais depende a punibilidade pelo crime em evidência – conclusões 9.º 16.º; d) Violação do disposto nos artigos 70.º e 71.º do CP, pela fundamentação da escolha da pena de prisão e respetiva medida da pena – conclusões 17.º e 18.º; e) Violação do disposto nos artigos 40.º e 71.º do CP, pela desproporção da pena acessória aplicável, face à culpa apurada e a todas as circunstâncias que, em concreto, militam em favor do arguido – conclusões 19.º a 25.º.

    Termos em que, e nos mais de Direito aplicáveis, e sempre com o douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e, por via dele, ser revogada a sentença recorrida e substituída por acórdão que determine a absolvição do arguido do crime de desobediência.

    Caso assim se não entenda, seja a pena de prisão substituída por multa, e a pena acessória reduzida a limites proporcionais à gravidade da culpa do arguido.

    Contra motivou o Ministério Público na 1ª Instância, pugnando pela improcedência do recurso com a consequente manutenção da sentença recorrida, concluindo nos seguintes termos: A. Tanto comete o crime de desobediência quem se recusa a realizar o teste quantitativo como quem não realiza sequer o qualitativo (de despistagem) e o próprio arguido confessou ter-se recusado a realizar esse teste.

    1. O arguido entende que dispunha de motivo justificativo para a recusa à submissão ao teste qualitativo (cfr. conclusão 16.º) sucede que na sua conclusão 22.º pretende que se considere «o facto de demonstrar ter consciência da censurabilidade da sua conduta» e, nessa medida, tais conclusões revelam-se incongruentes e incompatíveis entre si e, por isso, deve o recurso ser rejeitado por manifesta improcedência, nos termos do art. 420.º, n.º 1, a) do CPP.

    2. O âmbito de aplicação da Recomendação n.º 126 da Organização Internacional de Metrologia Legal (OIML) circunscreve-se aos alcoolímetros que efectuam o teste quantitativo e nenhuma dúvida pode haver a esse respeito sendo que a redacção é, aliás, muito clara ao referir que «não se devem confundir estes...

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