Acórdão nº 47/18.0PALGS-C.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 03 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelBEATRIZ MARQUES BORGES
Data da Resolução03 de Dezembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na 2ª subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I. RELATÓRIO 1. Da acusação Nos autos n.º 47/18.0PALGS-C o Ministério Público acusou o arguido JV pela prática, em autoria material, sob a forma consumada e em concurso real, de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21.º, n.º 1 do DL 15/93, de 22/01, e de um crime de resistência e coação sobre funcionário, previsto e punido pelo artigo 347.º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal (cf. fls. 789-801).

* 2. Do pedido de abertura da instrução O arguido requereu abertura da instrução onde reagiu apenas em relação a parte dos factos que, em conjunto com outros, integram a narração relativa ao crime de tráfico de estupefacientes.

* 3. Da decisão do JIC A Meritíssima Juíza de Instrução Criminal rejeitou liminarmente o requerimento do arguido para a abertura da instrução com fundamento na sua inadmissibilidade legal ao abrigo das normas conjugadas dos artigos 286.º, n.º 1 e 287.º, n.º 3, ambos do Código de Processo Penal.

* 4. Do recurso do arguido Inconformado com a decisão do Tribunal a quo o arguido interpôs recurso extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões: 1.No conceito de «inadmissibilidade legal da instrução» constante do n.º 3 do artigo 287.º do Cód. do Processo Penal não cabem aquelas situações em que o arguido requerente da instrução não procura fazer naufragar in totum o libelo acusatório.

  1. Como tem vindo a ser dominantemente decidido pelos Tribunais Superiores, a expressão “inadmissibilidade legal”, usada no n.º 3 do artigo 287.º do CPP, aponta para os casos (e apenas esses) em que a lei exclui a própria possibilidade de ser requerida a instrução, expressamente, como acontece nas formas de processo especiais (artigo 286.º, n.º 3, do CPP), ou implicitamente, como sucede quando falta a legitimidade ao requerente, quando a instrução é requerida contra desconhecidos ou contra pessoa ou quanto a factos que não foram investigados no inquérito, ou ainda quando é requerida pelo assistente em crime particular (Acórdão do STJ de 19/6/2019).

  2. É inconstitucional, por violação do disposto no n.º 1 do artigo 32.º da CRP a interpretação conjugada dos artigos 287.º, n.º 3 e 286.º, n.º 1 do Cód. do Processo Penal, segundo a qual deve o requerimento para a abertura da instrução ser liminarmente rejeitado quando, de acordo com o mesmo, o arguido não procura eximir-se ao julgamento pela totalidade dos factos vertidos na acusação 4.Pelo exposto Vossas Excelências deverão revogar o despacho recorrido e ordenar a abertura da instrução * 5. Das contra-alegações do Ministério Público ao recurso interposto pelo arguido em primeira instância Motivou o Ministério Público, na 1.ª Instância, concluindo, ter a Meritíssima JIC violado o disposto nos artigos 287.º, n.º 3 e 286.º, n.º 1 do CPP e o artigo 32.º, n.º 1 da CRP, devendo ser concedido provimento ao recurso, revogando-se o despacho recorrido * 6. Do parecer do MP em 2.ª instância Na Relação o Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de ser julgada a improcedência total do recurso interposto pelo arguido.

    * 7. Da tramitação subsequente Observado o disposto no n.º 2 do artigo 417.º do CPP o arguido pugnou pela procedência do recurso.

    Efetuado o exame preliminar e colhidos os vistos teve lugar a conferência.

    Cumpre apreciar e decidir.

    1. FUNDAMENTAÇÃO 1. Objeto do recurso De acordo com o disposto no artigo 412.º do CPP e atenta a Jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19/10/95, publicado no DR I-A de 28/12/95 o objeto do recurso define-se pelas conclusões apresentadas pelo recorrente na respetiva motivação, sem prejuízo de serem apreciadas as questões de conhecimento oficioso.

    No caso tratando-se de um despacho de não admissão da abertura da instrução onde são indicados os normativos em que a Meritíssima Juíza assentou a sua posição não resulta ter ocorrido qualquer vício que afete a decisão e que deva ser conhecido oficiosamente.

    * 2. Questões a examinar Analisadas as conclusões o recurso está limitado às seguintes questões de direito, a saber: 2.1.

    Se o Tribunal a quo podia ou não rejeitar o pedido de abertura da instrução, formulado pelo arguido, com fundamento em inadmissibilidade legal.

    2.2.

    Se foram violadas as disposições legais dos artigos 287.º, n.º 3 e 286.º, n.º 1 do CPP e do artigo 32.º, n.º 1 da CRP. * 3. Apreciação 3.1.

    Da decisão do Juiz de Instrução O Tribunal a quo pronunciou-se proferindo decisão sobre o pedido de abertura da instrução formulado pelo arguido, no essencial, com o seguinte teor: 1. Nos presentes autos o Ministério Público acusou o arguido JV pela prática, em autoria material, sob a forma consumada e em concurso real, de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22/01, e de um crime de resistência e coação sobre funcionário, previsto e punido pelo artigo 347.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal (cf. fls. 789-801).

  3. Notificado da acusação, o arguido requereu a abertura da instrução pela forma que consta a fls. 830-834 onde reagiu apenas em relação a parte dos factos que, em conjunto com outros, integram a narração relativa ao crime de tráfico de estupefacientes.

  4. É esta a única reação que se recolhe do requerimento de abertura de instrução como, à margem de qualquer dúvida, se antolha pela respetiva leitura, requerimento onde, aliás, nem sequer se solicita a prolação de despacho de não pronúncia por qualquer um dos dois crimes imputados.

  5. Se assim é então o requerimento não pode ser recebido. Vejamos porquê.

  6. As finalidades legais da instrução estão previstas no artigo 286.º, n.º 1 do Código de Processo Penal.

  7. Resumem-se, em uma síntese muito apertada, em averiguar se a decisão de acusar surgiu de modo fáctico e regular como consequência da atividade precedente, o inquérito.

  8. Quando assim suceda, nas mais das vezes, o(a) arguido(a) será submetido(a) a julgamento.

  9. Quando tal não ocorra o processo será arquivado.

  10. A instrução configura um puro momento de controlo de uma atividade pretérita destinada a evitar a prossecução da causa para a fase do julgamento.

  11. Esta atividade de averiguação (comprovação) está incumbida a uma entidade distinta da acusadora, o Juiz, e não tem carácter oficioso.

  12. Depende de um impulso de terceiro. Este impulso, que se...

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