Acórdão nº 173/20.6GCSTB-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Abril de 2021

Magistrado Responsável´JOSÉ SIMÃO
Data da Resolução13 de Abril de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em Conferência, os Juízes que compõem a 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I- Relatório Nos autos de inquérito, com o número acima mencionado, que correm termos pelos Serviços do Ministério Público do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal (Juízo de Instrução Criminal de Setúbal – Juízo 2), o Mmo Juiz de Instrução determinou por despacho de 13-11-2020, proferido após o primeiro interrogatório judicial, que o arguido PMFB aguardasse os ulteriores termos do processo sujeito às seguintes medida de coação: - Proibição do arguido permanecer na propriedade dos seus avós (tanto na casa dos avós, como no anexo a tal casa – onde residem os seus pais – ou no jardim ou logradouros de tal propriedade, sita em …, …); - Proibição de contactar, por qualquer meio, com a ofendida (sua avó, COMFF), com sujeição a vigilância eletrónica, mediante o uso de meios técnicos de controlo eletrónico à distância, fixando-se o perímetro de execução em 150 metros, quer tanto à zona de proteção fixa, quer quanto à zona de proteção dinâmica. O arguido deu o seu consentimento à execução da vigilância eletrónica para fiscalização da proibição de contactos, restando apenas recolher igual consentimento da ofendida, o qual previsivelmente será prestado, tendo em vista a vontade manifestada e sucessivamente reiterada por esta de ter o arguido longe dela. Notifique. Informe a ofendida, pelo meio mais célere, das medidas de coação aplicadas ao arguido. Comunique à DGRSP com vista à instalação dos meios técnicos de controlo à distância, devendo de imediato informar o tribunal caso não se verifiquem condições para tal (artigo 35.º, n.º 4, da Lei 112/2009, de 16 de setembro). O ofício deve ser remetido de imediato e com carácter de urgência, solicitando o imediato cumprimento da medida, com cópia do presente auto. Cumpram-se os mandados emitidos pelo Processo n.º 9143/17.0 T8STB, com vista a conduzir o arguido de acolhimento, na sequência da medida de promoção e proteção aplicada naquele processo. Comunique as medidas de coação ora aplicadas ao Processo n.º 9143/17.0 T8STB Notifique e, após, remetam-se os autos ao Ministério Público. Inconformado o Ministério Público recorreu, tendo extraído da motivação as seguintes conclusões: «1. Em face da prova reunida até ao momento no supra identificado processo, na sequência da sua detenção e tendo em conta o teor do requerimento apresentado pelo Ministério Público, nos termos do qual lhe é imputado a prática, com dolo directo e em concurso efectivo, de um crime de violência doméstica agravado, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 152.°, nº 1, aI. d) e nº 2, al. a) do Código Penal, em concurso efectivo com um crime de roubo agravado, na forma tentada, p. e. p. pelas disposições conjugadas dos artigos 210º, n.º 1 e 2, al. b), 204º, nº 1, al. b) e nº 2, al, f), 22.° e 23.° do Código Penal, por referência ao artigo 4.° do Decreto-Lei 48/95 de 15 de Março, ambos na pessoa da avó materna COMFF, foi o arguido PMFB apresentado a 1.° interrogatório judicial nos termos do preceituado no art." 141.°, do Código de Processo Penal. 2.Reconhecendo a forte indiciação dos factos descritos no sobredito requerimento de apresentação, aqui dados por integralmente reproduzidos, e a verificação dos perigos de continuação da actividade criminosa e de perturbação do inquérito, o Mmo, Juiz de Instrução decidiu aplicar ao arguido PB, além do TIR, as medidas de coacção de proibição de permanecer na propriedade dos seus avós e da proibição de contactar, por qualquer meio, com a ofendida (sua avó, CF). Não se pode acolher a decisão proferida pelo Mmo Juiz de Instrução

  1. Os aludidos ilícitos penais (violência doméstica agravada e roubo agravado na forma tentada) integram o conceito de criminalidade violenta, mostrando-se inequívoco o preenchimento do requisito estabelecido no artigo 202º, nº1, al. b), do Cód. de Proc, Penal, atenta a sua forte indiciação. 4.Tal como exarado em sede de 1 ° interrogatório de arguido detido, entende o Ministério Público que a prisão preventiva é a única medida de coacção adequada e suficiente para a satisfazer as exigências cautelares do caso concreto, sendo por isso justificada a sua necessidade dentro do seu carácter subsidiário. 5.Deste modo, ao ter aplicado ao arguido PB, como aplicou, as medidas coactivas referidas em 2, o Mmo. Juiz de Instrução não só olvidou a gravidade e contornos da actividade delituosa fortemente indiciada nos autos e as exigências cautelares existentes, como subverteu todos os princípios fundamentais do processo penal. 6.No caso concreto, verificam-se todos os perigos consagrados no artigo 204º do Código de Processo Penal. 7. Existe perigo de fuga desde logo porque, com reconhecido pelo Mmo, Juiz a quo, os factos fortemente indiciados revelam que o arguido tem uma personalidade pautada pela imaturidade e irreverência para com as decisões dos tribunais, incumprindo despudoradamente a medida de promoção e protecção que lhe aplicada em seu beneficio, fugindo da Casa de Acolhimento sempre que para lá é encaminhado e nunca lá permanecendo um dia completo _ cfr. factos 11 a 13; 8. O arguido, por duas vezes, fugiu da Casa de Acolhimento em que deveria estar acolhido no âmbito de medida de promoção e protecção que foi aplicada em seu beneficio, refugiando-se, primeiramente, "numa casa abandonada" e depois na casa dos pais e avós, após se assegurar que não seria mais procurado na residência dos seus progenitores. Aí permaneceu por meses, com a total conivência daqueles, tendo se apercebido que, com a ajuda dos pais, podia manter o seu paradeiro desconhecido do Tribunal e inviabilizar a sua condução à sobredita Casa de Acolhimento e a medida de promoção e protecção que lhe foi aplicada, num claro desprezo pelo Tribunal e pelas decisões dele emanadas. 9. Conjugando tal facto com a circunstância de que os crimes pelos quais o arguido está fortemente indiciado são graves e podem resultar na aplicação de uma pena de prisão, ainda que suspensa na sua execução, parece-nos, salvo melhor entendimento, ser manifesta a existência de um perigo de fuga intenso, podendo logicamente, assumir-se, que um jovem que deliberadamente ocultou, de forma tão prolongada, o seu paradeiro ao Tribunal, aos agentes policiais e à Casa de Acolhimento em que deveria estar, o possa fazer no âmbito de processo crime em que muito mais está em causa, nomeadamente, a sua liberdade. 10. Liberdade essa que não é posta em crise apenas quando seja de aplicar pena de prisão efectiva, mas igualmente quando estiver em causa pena de prisão suspensa na sua execução, sobretudo quando sujeita a regime de prova. E uma vez que, como resulta dos autos, o arguido já mostrou não se coibiu em se evadir à execução de uma medida de promoção e protecção aplicada em seu beneficio, não será descabido considerar que pode tentar se evadir a este processo e, em última análise, ao cumprimento das obrigações decorrentes da eventual suspensão de pena de prisão com regime de prova. 11. Pelo exposto, ao considerar não verificado perigo de fuga, o Mmo. Juiz a quo interpretou erroneamente os factos, violando o disposto no artigo 2040, al. a) do Cód. Proc. Penal, erro esse que importa obviar pela revogação do despacho recorrido nesta parte e substituição por outro que considere verificado o sobredito perigo de fuga. 12. Como reconhecido no despacho recorrido, verificam os perigos de continuação da actividade criminosa e de perturbação do inquérito. 13. Verifica-se igualmente o perigo de grave perturbação da tranquilidade pública, porquanto o crime violência doméstica que se mostra fortemente indiciado nos autos é um crime que tem vindo a proliferar, sendo a sua ocorrência motivo de elevada preocupação. Dados oficiais relatam que neste ano de 2020 trinta mulheres foram já assassinadas em contesto de violência doméstica. Ante a gravidade do crime em questão, a sua repressão e a segurança da vítima, nomeadamente, atentos a sua idade avançada e problemas de saúde, colocam em destaque o recurso a medidas de prevenção de futuros crimes. Cabe cada vez mais aos Tribunais a tarefa de evitar a proliferação da chaga social e humana - que é a violência doméstica - quer com medidas a jusante (condenações)- quer a montante (medidas preventivas), sempre e quando tal se justifique. 14. As medidas de coação aplicadas ao arguido não são minimamente adequadas para fazer face às necessidades cautelares existentes no caso concreto. 15. Atento os factos indiciados, o arguido já mostrou não se importar minimamente com a avó, ora ofendida, que não respeita e que maltrata de todas as formas que consegue, dentro da própria casa, sem qualquer oposição, uma vez que conta com a conivência total dos progenitores que, não assumindo o seu papel de educadores, não colocam qualquer "travão" nos maus tratos perpetrados pelo filho contra a avó materna. 16. Por sua vez, considerando que a postura de desprezo total do arguido em relação às decisões que foram proferidas, em seu beneficio, no processo de promoção e protecção existem sérias dúvidas que o mesmo aceitará permanecer na Casa de Acolhimento …, na medida em que por duas vezes já dali se evadiu, escondendo-se na casa dos pais e avós. Também existem dados objectivos no processo que nos leva a duvidar que o arguido se manterá afastado da casa dos pais e dos avós e que não tentará contactar novamente a vítima, para, nomeadamente, exercer represálias sobre a mesma e continuar a actividade criminosa indiciada nos autos. 17. A tudo isto acresce o facto de o arguido estar prestes a fazer 18 anos de idade (o seu aniversário é já no próximo dia …), altura em que a sua permanência no … não poderá ser imposta pelo Tribunal de Família. Segundo o entendimento plasmado no despacho recorrido, a partir dessa altura" ( .. .) existe a informação nos autos de que o arguido poderá ir residir para a casa de um irmão, salvaguardando também por essa via (quando for extinta a medida de promoção e proteção) a...

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