Acórdão nº 2575/07.4GBABF.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 12 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelSÉRGIO CORVACHO
Data da Resolução12 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA I. Relatório No processo comum nº 2575/07.4GBABF, que corre termos no Juízo Local Criminal de Albufeira do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, em que é arguido, entre outros, E…, pela Ex.ª Juiz titular dos autos foi proferido, em 30/4/2019, um despacho do seguinte teor: «E…, por sentença transitada em julgado a 24.02.2011, foi condenado pela prática de um crime de ofensa à integridade física grave, p. e p. pelo art. 144.º, al. d) do CP, na pena de 4 (quatro) anos de prisão, suspensa por idêntico período, subordinada a regime de prova e ao cumprimento de deveres, nomeadamente: entregar à A… a quantia de €750 até ao final do período de suspensão, juntando aos autos o respetivo comprovativo, responder a convocatórias e receber visitas dos técnicos de reinserção social, informando-os de qualquer alteração de residência ou comunicando a ausência da mesma por período superior a oito dias. Posteriormente, por acórdão transitado a 28/10/2013, foi efetuado cumulo jurídico da presente pena, com as condenações sofridas nos processos n.º 652/09.6GDPTM do 1.º Juízo Criminal de Portimão (injuria agravada, resistência e coação e desobediência), 1036/04.8GBMTA do 3.º Juízo Criminal de Moita (ameaça), 923/09.1GDPTM do 1.º Juízo Criminal de Portimão (condução de veiculo em estado de embriaguez), 784/08.8GESLV do 2.º Juízo de Silves (desobediência) e 1036/08.9GDPTM do 2.º Juízo Criminal de Portimão (violência domestica), no âmbito do qual foi condenado na pena única de 5 anos de prisão, suspensa na sua execução por idêntico período, sujeita a regime de prova, de acordo com plano de reinserção social a elaborar pela DGRSP. Todavia, durante o período de suspensão, o arguido foi novamente condenado no âmbito do processo 3/14.8GDABF pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, na pena de 8 meses de prisão efetiva. Já apos o referido período de suspensão, o arguido sofreu nova condenação no processo 267/16.2PASNT, pela prática de um crime de falsas declarações, na pena de 2 meses de prisão efetiva. Com vista a ponderar a revogação da suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido nos presentes autos, em face da anterior informação, o arguido prestou declarações a este Tribunal, dando-se assim cumprimento ao direito de audição. No decurso da audição, o arguido manteve um discurso confuso e desornado, misturando as diversas condenações sofridas e alegando desconhecer que não poderia praticar ilícitos criminais durante o período da suspensão da execução da pena de prisão. Mais declarou que, na presente data, labora numa lavandaria de hotel, auferindo uma renumeração de €580,00. Vive com dois irmãos, cunhada e três sobrinhos, numa habitação arrendada, contribuindo com o montante de €250 para as despesas do agregado familiar. Tem três filhos, um dos quais maior de idade, procedendo ao pagamento da quantia de €150,00 a titulo de pensão de alimentos devidos aos dois filhos menores de idade. Posteriormente, veio a Digna Magistrada do Ministério Público promover a revogação da suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido nos presentes autos, invocando que: «Determinou a suspensão o tribunal ter ponderado a natureza dos crimes praticados, antes e depois, e ter decidido, sem mais fundamentos, conceder uma oportunidade de se redimir mediante a ameaça de prisão – v. sentença a fls. 721-722. Ora, o arguido praticou novamente, durante o período de suspensão, uma condução em estado de embriaguez – crime por que já antes havia sido condenado, e alargou ainda mais a panóplia de bens jurídicos violados com a sua atuação ao ser condenado também pela prática de um crime de falsas declarações. Atentando nas suas declarações prestadas ressalta algum desnorte e alheamento, a fazer temer que não se afaste da prática de novos ilícitos. A prática dos factos por que foi condenado no processo 3/14.8GDABF e o que mais resulta dos autos a respeito do seu percurso criminoso, infirma irremediavelmente o juízo de prognose favorável que determinou a suspensão da execução da pena nestes autos». Nos termos do disposto no artigo 495.º n.º 2 do Código de Processo Penal cumpre decidir. Dispõe o artigo 56º, n.º 1, alínea b), do Código Penal que “A suspensão da execução da pena é revogada sempre que, no seu decurso, o condenado cometer crime pelo qual venha a ser condenado e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas.” A condenação por crime doloso cometido durante o período da suspensão não provoca automaticamente a revogação da suspensão da pena aplicada. Com efeito, a prática de um crime só deve constituir causa de revogação da suspensão quando por ela se demonstre que não se cumpriram as expectativas que motivaram a concessão da suspensão da pena – cfr., neste sentido, Ac. TRL de 08-01-2003, de 11-03-2003 e de 28-01-97, todos sumariados em www.dgsi.pt. Esclarece este último aresto que a revogação da suspensão não é uma consequência ope judicis, de punição de outro crime durante o período da suspensão e, ope legis do cometimento, entretanto, de crime doloso punido com pena de prisão, dependendo antes de dois pressupostos cumulativos: a perpetração, no decurso da suspensão, de crime objeto de condenação e a revelação de que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas. As causas de revogação não devem, pois, ser entendidas com um critério formalista, mas antes como demonstrativas das falhas do condenado no decurso do período da suspensão. O arguido deve ter demonstrado com o seu comportamento que não se cumpriram as expectativas que motivaram a concessão da suspensão da pena (cfr. Leal-Henriques e Simas Santos, “Código Penal Anotado”, 1º Volume, Rei dos Livros, 2002, pág. 711). Uma dessas expectativas é afastar o arguido da criminalidade, especialmente do cometimento de crimes de natureza análoga àqueles que estiveram na base da sua condenação, o que vai ao encontro dos objetivos de ressocialização e de reintegração inerentes às finalidades das penas (cfr. art. 40º nº 1 do Código Penal). Não abona a favor do arguido, os seus antecedentes criminais, nos quais consta nove condenações pela prática de crimes rodoviários, dois crimes de desobediência, um crime de ameaça, um crime de injúria agravada, um crime de resistência e coação, um crime de falsificação e contrafação de documentos e um crime de violência domestica, não só pela panóplia de crimes distintos (com predominância dos crimes rodoviários) e bens jurídicos afetados, mas igualmente pelas penas substitutivas diferentes em que foi sendo condenado, sem surtir o efeito dissuasor pretendido. Muito menos abona a seu favor o facto de ter sido condenado após os factos dos presentes autos pela prática de novo ilícito penal, ainda que por crime de natureza distinta – crime de condução sob efeito de álcool, mas de especial acuidade face à gravidade dos bens jurídicos visados, e sobretudo atendendo que já havia sofrido nove condenações anteriores pela prática desse mesmo ilícito. Acresce que, já apos o período da suspensão, o arguido foi novamente condenado, mas nesse processo (267/16.2PASNT), pela prática de crime de falsas declarações. Não obstante tal condenação não relevar em termos de revogação da pena tais como estipulados no art. 58.º do CP, revela contudo um padrão de contínua e persistente desconsideração pelo arguido das normas sociais e pratica reiterada de ilícitos de diferente natureza. Essa conduta de menosprezo pelas normas e o perigo sistemático que provoca com a violação de tais normas é revelador de uma falta de perceção da gravidade dos factos por si cometidos, evidenciado, alias, pelo seu discurso confuso e titubeante, em que o mesmo manifestou alheamento quanto às condenações sofridas e os bens jurídicos por si afetados. Todavia, joga a seu favor o facto de este se encontrar familiar, social e profissionalmente integrado, elo que não se visa quebrar, funcionando tal ligação como uma base de segurança e um forte estímulo para...

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