Acórdão nº 2749/15.4T9FAR.E3 de Tribunal da Relação de Évora, 09 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelJOÃO AMARO
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - RELATÓRIO

Nos autos de Processo Comum (Tribunal Singular) nº 2749/15.4T9FAR, do Juízo Local Criminal de Faro (Juiz 3), e mediante pertinente sentença (proferida em 19-06-2020), a Exmª Juíza decidiu nos seguintes termos: “- Decido julgar a acusação totalmente procedente por provada e, em consequência:

  1. Condeno o arguido M…, pela prática de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, na forma continuada, previsto e punido nos termos dos artigos 107º, 105º, nºs 1, 4 e 7, do RGIT, em conjugação com o artigo 30º, nº 2 e 79º, nº 1, do Código Penal, na pena de 12 (doze) meses de prisão; b) Substituo a pena de prisão por 72 (setenta e dois) períodos de prisão em Estabelecimento Prisional, com duração individual de 48 (quarenta e oito) horas, períodos esses que deverão ter início às 20 (vinte) horas de Sexta-feira e termo às 20 (vinte) horas de Domingo, a começar na primeira Sexta-feira decorridos que sejam 30 (trinta) dias após o trânsito da sentença; c) Condeno a arguida S…, pela prática de um crime de abuso de confiança à segurança social, na forma continuada, previsto e punido nos termos dos artigos 107º, 105º, nºs 1, 4 e 7, conjugados com o artigo 7º, nºs 1 e 3, todos do RGIT, e com os artigos 11º, 30º, nº 2, e 79º, nº 1, do Código Penal, na pena de multa correspondente a 300 (trezentos) dias, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), o que perfaz a quantia de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros); d) Condeno os arguidos nas custas criminais, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) Uc's, reduzida a metade por força da confissão (artigo 344º, nº 2, aI. c), do Código de Processo Penal)

    - Decido julgar o pedido de indemnização civil formulado nos autos totalmente procedente, por provado nos termos expostos e, em consequência:

  2. Condeno os arguidos/demandados no pagamento ao Instituto de Segurança Social, I.P. da quantia de € 37.152,16 (trinta e sete mil cento e cinquenta e dois euros e dezasseis cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, calculados nos termos supra expostos, contabilizando-se os vencidos até setembro de 2016 em € 4.795,79 (quatro mil setecentos e noventa e cinco euros e setenta e nove cêntimos); b) Custas pelos demandados/arguidos

    Fixo ao enxerto cível o valor de € 41.947,85 (quarenta e um mil novecentos e quarenta e sete euros e oitenta e cinco cêntimos)”

    * O arguido M… recorre da sentença proferida, extraindo da motivação do recurso as seguintes conclusões (em transcrição): “I - A 19 de Junho de 2020 o Tribunal a quo proferiu nestes autos a decisão de que ora se recorre, e que antes intentara publicar sem leitura pública e sem a presença do arguido, o que motivara recursos do arguido e do MP, que tiveram provimento

    II - O TRE doutamente decidiu que a sentença tinha que ser lida publicamente, e que a sentença nova a ler seria global, não podendo haver duas sentenças parciais e divididas, uma civil e outra criminal

    III - Sem prejuízo de não se considerar afetada pela nulidade assim declarada a audiência de discussão e julgamento já realizada nos autos e de se considerar estabilizada a matéria criminal resultante dessa audiência

    IV - Foi deste modo marcada pela Mmª Juiz de 1ª Instância data para a leitura da nova sentença global, criminal e civil, que assim ia ser proferida em 19.06.2020

    V - O arguido tem o direito de estar presente na leitura das decisões que lhe respeitam, notadamente na Leitura da sentença; e quis estar presente, o que se demonstra até pelo recurso que antes deduziu contra a publicação por correio

    VI - Para esta leitura de 19.06.2020 o Tribunal não considerou que a presença do arguido fosse dispensável; e notificou-o pessoalmente para estar presente; e, bem assim, o Arguido nunca manifestou ou requereu vontade de não estar presente naquele ato, que ele mesmo tacitamente solicitara ao recorrer da falta de leitura

    VII - O arguido informou o Tribunal, antes da abertura do ato da leitura, que tinha dado entrada no Hospital …., em …, onde passou toda a tarde de dia 19 de junho de 2020, em tratamento e sob observação médica, por doença que o acometeu subitamente

    VIII - O mandatário do arguido, que estava presente no Tribunal, informado pelo telefone dessa situação, também deu da mesma conhecimento aos autos, quer à secção onde corre o processo, quer, de seguida, na ata de julgamento. E, com base nisso, requereu o adiamento

    IX - Entendeu a Mmª Juiz indeferir o requerido adiamento, o que deixou também em ata do Julgamento. No exercício da defesa do arguido, o mandatário presente arguiu a nulidade da decisão constante desse Despacho de indeferimento do adiamento, arguindo ainda que se não ocorresse nulidade ocorria, ao menos, irregularidade

    X - Não obstante, a Mmª Juiz proferiu Despacho onde declara não ocorrer qualquer nulidade ou irregularidade; e passou de imediato para a leitura da decisão

    XI - Ora, estipula o artigo 334º, nº 2, do CPP, que sempre que o arguido se encontrar praticamente impossibilitado de comparecer à audiência, nomeadamente por doença grave, pode requerer ou consentir que a audiência tenha lugar na sua ausência; mas o Arguido não só não requereu ou consentiu a leitura na sua ausência, como deixou manifestada a intenção de estar presente, notadamente quando requereu o adiamento face à doença de que foi acometido

    XII - O Adiamento não implicava qualquer prejuízo para o bom andamento dos autos ou para a boa aplicação da justiça; e, face à situação concreta, e bem assim ao historial deste processo, nada obstava a que o Tribunal tivesse adiado a leitura, aguardando pela justificação da falta que fora desde logo comunicada e explicada

    XIII - Ao invés, e sem ter aguardado pela justificação que entrou no dia útil imediatamente seguinte, o Tribunal decidiu passar à leitura da decisão, o que mal se entende, pois que se o Tribunal tinha tal consideração sobre a dispensabilidade de o arguido estar presente, não o deveria sequer ter convocado; e, apesar disso, convocou-o

    XIV - Ao assim agir, contra a vontade expressa do arguido, e contra o pedido de adiamento validamente deduzido por este, o Tribunal violou as disposições do artigo 334º, nº 2, do CPP, e, desse modo, incorreu na nulidade resultante, novamente, da falta de leitura na presença do arguido de uma decisão que necessariamente lhe diz respeito

    XV - Nulidade que se deixa arguida para todos os efeitos legais

    XVI - Os direitos de defesa do arguido foram assim violados, em contravenção do que dispõe o artigo 32º da CRP, pelo que a interpretação do artigo 334º, nº 2, do CPP, no sentido de que em caso de doença do arguido e sem que este tenha requerido ou consentido que prossiga a audiência sem a sua presença, pode o Tribunal avançar com os trabalhos de audiência e não proceder ao adiamento, ainda que requerido, é claramente inconstitucional, por violação não só desta norma do CPP mas também a do artigo 32º da CRP, ao não assegurar todas as garantias que a lei processual penal confere ao arguido

    XVII - Inconstitucionalidade que se deixa aqui arguida para todos os efeitos legais

    XVIII - Face a tanto, deve a decisão da Mmª Juiz, de ter procedido à leitura sem a presença do arguido justificada por circunstâncias de doença e face ao historial destes autos, ser declarada nula, revogada e substituída por outra que declare que a leitura da decisão integral deve ser feita na presença do arguido. MAIS: XIX - A prolação da nova decisão, que nos termos também do TRE tem que ser integral, abrangendo, portanto, decisão criminal e decisão civil, é necessariamente uma nova decisão que substitui as anteriores, pelo que desta nova decisão, agora proferida, e muito embora não se possa recorrer de matéria de facto -- porque a matéria penal decorrente da audiência se considera estabilizada --, cabe recurso quer civilmente, quer penalmente

    XX - E, penalmente, quanto mais não seja, quanto à medida da pena e matéria de direito, uma vez que, com a matéria apurada e estabilizada não era nem é obrigatório que a sentença seja aquela que foi anteriormente tirada

    XXI - Embora a Mmª Juiz tenha, quer antes, quer agora nesta nova sentença, considerado que não se justificava a pena de prisão, mas sim uma pena substitutiva desta, como por duas vezes decidiu (antes; e agora na nova sentença)

    XXII - Sucede, porém, e ademais, que, nesta sentença, e considerando a matéria criminal apurada e já estabilizada, o Tribunal a quo acaba por proferir uma decisão criminal, a 19-06-2020, aplicando uma pena que, entretanto, deixou de existir na Lei penal Portuguesa, qual seja a prisão por dias livres

    XXIII - O artigo 45º do CP, que anteriormente...

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