Acórdão nº 713/19.3T8BJA.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 16 de Dezembro de 2021
Magistrado Responsável | MOISÉS SILVA |
Data da Resolução | 16 de Dezembro de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO Apelante: Cimbal - Comunidade Intermunicipal do Baixo Alentejo, pessoa coletiva de direito público (ré).
Apelado: P… (autor).
Tribunal Judicial da Comarca de Beja, Juízo do Trabalho.
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O autor veio intentar a presente ação sob a forma de processo comum emergente de contrato individual de trabalho contra a ré, pedindo ao tribunal que: a) declare que entre o autor e ré vigorou, no período compreendido entre 2 de dezembro de 2010 e 31 de janeiro de 2019, um contrato de trabalho; b) declare ilícito o despedimento do autor promovido pela ré e, em consequência: 1. Condene a ré a pagar ao autor as retribuições contabilizadas desde 26.02.2019 até ao trânsito em julgado da presente sentença, tendo por referência a retribuição mensal de € 2 972,40, e ainda, desde a mesma data, as férias, subsídios de férias e de Natal, vencidos nesse mesmo período, contabilizados à mesma razão, no valor de € 47 558,40, aos quais acrescem os juros de mora vencidos, à taxa legal, desde a data de vencimento de cada uma das prestações.
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Condenar a ré no pagamento ao autor de uma indemnização de 30 dias de retribuição base, tendo-se em consideração o valor de retribuição de € 2 972, por cada ano completo ou fração de antiguidade, reportando-se esta a 02.12.2010, até ao trânsito em julgado da presente decisão judicial.
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Condenar a ré no pagamento de juros de mora desde a data da citação, à taxa legal.
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Condenar a ré no pagamento da quantia de € 5 944,80, a título de retribuição de férias e subsídio de férias vencidos em 01.01.2019 e de proporcionais de férias e de subsídios de férias e de Natal do ano da cessação, € 247,70x 3= € 743,10.
Para o efeito alegou, em síntese, que trabalhou desde dezembro de 2010 até janeiro de 2019, primeiro para a AMBAAL e depois para a ré - por força da fusão da primeira na segunda -, como diretor do Jornal explorado pela ré, devendo qualificar-se tal contrato como contrato de trabalho, por se verificarem todos os indícios de laborabilidade do artigo 12.º do Código do Trabalho, e que em fevereiro de 2019 a ré contratou outra pessoa para exercer essas funções, o que configura despedimento ilícito do autor, porque não se baseia em facto imputável ao trabalhador e não foi precedido de procedimento disciplinar, devendo a ré, enquanto empregadora, pagar-lhe uma indemnização em substituição da reintegração; as prestações intercalares desde a data da sentença até ao trânsito em julgado da decisão e ainda créditos de férias não gozadas e subsídio de férias vencidos em 01.01.2019 e de proporcionais de férias e de subsídios de férias e de Natal do ano da cessação.
Juntou documentos e arrolou testemunhas.
Foi designada data para audiência de partes, e frustrada a mesma, foi a ré notificada para contestar.
A ré contestou a ação, por exceção e por impugnação.
Alegou a inexistência de vínculo laboral entre o autor e a ré, invocando que, pese embora a existência de alguns dos indícios laborais alegados pelo autor, a intenção das partes sempre foi manterem um vínculo de prestação de serviços e que, a não ser assim, sempre teria de se entender que a relação entre o autor e a AMBAAL já teria findado quando se verificou a fusão entre aquela e a ré e existir abuso de direito por parte do autor que nunca quis manter qualquer vínculo laboral com a ré. Por último refere que, procedendo a pretensão do autor no reconhecimento da existência de vínculo laboral entre as partes, as prestações intercalares e a indemnização devem ter por pressuposto a retribuição mensal que o autor receberia como funcionário público e não aquela que o autor reclama.
Conclui pela improcedência da ação e pela condenação do autor como litigante de má-fé.
Juntou documentos e arrolou testemunhas.
O autor respondeu às exceções alegadas pela ré.
Foi proferido despacho que, procedendo ao saneamento dos autos, dispensou a seleção da matéria de facto.
Frustrada a conciliação das partes, realizou-se a audiência de julgamento como consta da ata respetiva.
Após, foi proferida sentença com a decisão seguinte: Pelo exposto, julgo procedente por provada a ação e, em consequência: - Reconheço a existência de um contrato de trabalho por tempo indeterminado entre o autor e a ré, com início a 1 de janeiro de 2011 e fim a 31 de janeiro de 2019; - Declaro a ilicitude do despedimento do autor por parte da ré e, em consequência: - Condeno a ré a pagar ao autor uma indemnização que fixo em 30 (trinta) dias de retribuição por cada ano ou fração de antiguidade, desde a data de celebração de cada contrato até ao trânsito em julgado da decisão de despedimento, e que, à presente data (04.05.2020), perfaz o valor de € 27 767,17 (vinte e sete mil, setecentos e sessenta e sete euros e dezassete cêntimos) e respetivos juros de mora vencidos desde a data do trânsito em julgado da presente decisão, à taxa legal de 4%, até efetivo e integral pagamento.
- Condeno a ré a pagar ao autor as retribuições que este deixou de auferir, incluindo férias, subsídio de férias e de Natal, desde a data do despedimento (31.01.2019) até ao trânsito em julgado da sentença tendo por base o valor da remuneração mensal do Trabalhador de € 2 972,40 (dois mil, novecentos e setenta e dois euros e quarenta cêntimos) e o acréscimo dos juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos, até efetivo e integral pagamento, desde a data do vencimento de cada prestação, sem prejuízo das legais deduções previstas nas alíneas a) a c), do n.º 2 do artigo 390.º n.º 2 do Código do Trabalho.
- Condeno a ré a pagar ao autor a quantia de € 5 944,80 (cinco mil novecentos e quarenta e quatro euros e oitenta cêntimos), a título de retribuição por 22 (vinte e dois) dias de férias não gozadas e respetivo subsídio, bem como a quantia de € 743,10 (setecentos e quarenta e três euros e dez cêntimos) a título de proporcionais de férias, subsídios de férias e de Natal do ano de cessação de facto do contrato, a que acrescem juros de mora à taxa cível desde a data da cessação do contrato (31.01.2019) até efetivo e integral pagamento.
Custas pela ré que saiu vencida, cfr. artigo 527.º do Código de Processo Civil.
Valor da ação: € 34 455,07 (trinta e quatro mil, quatrocentos e cinquenta e cinco euros e sete cêntimos) - artigos 296.º, 297.º, 299.º n.º 4 e 306.º todos do Código de Processo Civil.
Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação onde, além do mais estava em causa a competência material do tribunal do trabalho.
Foi proferido acórdão que julgou materialmente incompetente o tribunal do trabalho e absolveu a ré da instância.
O autor, inconformado, recorreu para o Tribunal de Conflitos, o qual decidiu que o Tribunal do Trabalho é competente em razão da matéria para apreciar a questão dos autos.
Assim, devolvido o processo, cabe apreciar as demais questões colocadas pela ré no recurso de apelação que interpôs da sentença de primeira instância.
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Conclusões apresentadas pela ré no recurso que interpôs da sentença proferida em primeira instância: A. O Tribunal a quo considerou-se competente para apreciar e julgar a presente ação, invocando para o efeito o disposto no artigo 126.º n.º 1, alínea b), da Lei da Organização do Sistema Judiciário, aprovada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, e do artigo 4.º n.º 4, alínea b), do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro; B. Nessa sequência, considerou procedentes os pedidos do autor recorrido, tendo reconhecido «… a existência de um contrato de trabalho por tempo indeterminado entre o autor e a ré, com início a 1 de janeiro de 2011 e fim a 31 de janeiro de 2019», assente na presunção de laboralidade prevista no artigo 12.º do Código do Trabalho, e concluído pela existência de um despedimento ilícito do recorrido, bem como pela condenação da CIMBAL no pagamento das quantias peticionadas a título de indemnização, retribuições alegadamente deixadas de auferir e férias não gozadas; C. A recorrente não concorda com a decisão recorrida, porquanto considera verificar-se i) Incompetência material do Tribunal a quo; ii) Impossibilidade aplicação do artigo 12.º do Código do Trabalho, na situação sub judice; e iii) Violação do direito fundamental previsto no n.º 2 do artigo 47.º da Constituição da República Portuguesa; D. É certo que, como a sentença recorrida afirma, em sede de aplicação das normas de competência jurisdicional, a determinação da competência concreta do tribunal em razão da matéria é feita em função dos termos em que é formulada a pretensão do autor na respetiva petição inicial, sendo relevante a forma como se apresentam a causa de pedir e o pedido à data da propositura da ação, sendo também certo que o recorrido alega na sua petição inicial a existência de um contrato individual de trabalho entre si e a CIMBAL; Porém, E. Como bem esclarece o Acórdão do Tribunal de Conflitos de 02 de fevereiro de 2016, a «… competência material não é, salvo casos manifestos, decidida antes da apreciação do mérito da causa, sobretudo, quando a qualificação da relação jurídica em que assenta a pretensão do demandante é factualmente controvertida (…). Sendo controvertida a matéria de facto só após a produção da prova o Tribunal fará o seu julgamento em relação à competência material.» (sublinhado nosso); F. Na situação em apreço, verifica-se que, realizado o julgamento (audiência final), o Tribunal a quo deu como provada a celebração entre a CIMBAL e o recorrido de dois contratos de prestação de serviços, ambos adjudicados na sequência de procedimento de contratação pública (vidé pontos 5. a 14., 41. a 45. Dos Factos Provados) e no âmbito da legislação sobre emprego público; Pelo que, G. O objeto do presente litígio teria que ter sido reconfigurado pelo Tribunal a quo face ao inicialmente desenhado pelo recorrido, passando a assentar apenas na discussão da qualificação jurídica a dar aos contratos de prestação de serviços para exercício de funções...
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