Acórdão nº 305/21.7T9STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 16 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA CLARA FIGUEIREDO
Data da Resolução16 de Dezembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - Relatório.

Nos presentes autos de recurso de contraordenação que correm termos no Juízo de Competência Genérica do Entroncamento, do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, com o n.º305/21.7T9STR.E1, foi a arguida (…), com sede na Rua (…), condenada pela prática de duas contraordenações: - Uma contraordenação grave relativa ao incumprimento dos requisitos na área de serviço – instalação por forma a evitar a propagação de fumos e cheiros – prevista no n.º 1, al. b) e n.º 2 do artigo 123.º, conjugado com o n.º 3 do artigo 126.º do Decreto-Lei n.º 10/2015, de 16 de janeiro, na sua redação atual, e punível nos termos da subalínea iii) da alínea a), do n.º 1 do artigo 143.º do mesmo diploma legal; - Uma contraordenação grave relativa à de falta de sinalização, com modelo de interdição ou condicionamento de fumar, conforme modelo aprovado no Anexo I, da Lei n.º 37/2007, prevista no n.º 1 do artigo 6.º, em conjugação com o n.º 1 do artigo 4.º, ambos da Lei n.º 37/2007, de 14 de agosto, na sua redação atual, e punível pela alínea c), do n.º 1 e n.º 2 do artigo 25.º do mesmo diploma.

*Inconformada com tal decisão, veio a arguida interpor recurso da mesma, tendo apresentado, após a motivação, as conclusões que passamos a transcrever: “1. O Tribunal a quo condenou a Arguida pela prática de uma contraordenação de incumprimento dos requisitos na área de serviço – instalação por forma a evitar a propagação de fumos e cheiros, prevista no n.º 1 alínea b) e n.º 2 do artigo 123º, conjugado com o n.º 3 do artigo 126º da Decreto-Lei n.º 10/2015, de 16 de janeiro, na sua redação atual, e punível pela subalínea iii) alínea a) do n.º 1 do artigo 143º do mesmo diploma com a coima mínima de € 8.200,00.

  1. Entendeu o Tribunal a quo ter havido uma atuação com dolo dos empregados da Arguida, por se tratar de local utilizado diariamente para o trabalho pelos trabalhadores da Arguida, que estes não podiam deixar de saber o estado da agindo assim como dolo e não com negligência quanto aos factos em questão.

  2. A responsabilidade contraordenacional das pessoas coletivas ou equiparadas não tem carácter objetivo, já que pressupõe a prática do facto típico pelos seus “órgãos” no exercício das suas funções, entendendo-se como tal as pessoas físicas que têm a seu cargo decidir e atuar pelas pessoas coletivas – artigo 7º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro – não existindo responsabilidade quando a contraordenação tenha sido praticada por pessoas físicas que tão-só mereçam a qualificação de agentes ou auxiliares, como é o caso dos empregados.

  3. Ora, não ficou provado qualquer conhecimento da situação em apreço por parte do legal representante da Arguida, tendo, ao invés, ficado provado que: “11.-a data dos factos em causa nos presentes autos coincidiu com um período de tempo em que o legal representante da Arguida, por motivos de saúde, viu-se impedido de controlar tudo o que se passava nos diversos estabelecimentos da Arguida. 12.- O Legal representante da Arguida sofreu, nessa altura, um aneurisma, motivo que determinou o seu internamento hospital.” 5. Encontrando-se o legal representante, em face do estado grave de saúde, impedido de controlar o estado e o que se passava nos diversos estabelecimentos, resulta evidente que o legal representante desconhecia a situação concreta em que se encontrava a tubagem daquele estabelecimento em concreto.

  4. Assim, deveria ter sido reconhecida a situação de erro sobre as circunstâncias alegada em sede de impugnação, a qual afasta o dolo, em conformidade com o disposto no artigo 8º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27/10, ficando ressalvada a negligência.

  5. Sendo imputável à Arguida a prática da contraordenação em apreço, a título de negligência, sempre se impõe a redução a metade da coima aplicada, em face do disposto no artigo 143º, n.º 6 do Decreto-Lei n.º 10/2015, de 16 de Janeiro.

  6. O Tribunal a quo fez assim uma errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 7º e 8º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro.

  7. O Tribunal a quo recusou a aplicação à Arguida da medida de Admoestação, no entanto, considerando a atuação negligente da Arguida, sendo o seu grau de culpa reduzido e a gravidade da infração é em si mesma reduzida, estão verificados os pressupostos do artigo 51º do Regime Geral das Contraordenações.

  8. Interpretando o referido artigo 51º à luz do disposto no n.º 3 do artigo 9º do Código Civil, temos de entender que a classificação das contraordenações como grave não obstaculiza a opção pela aplicação da admoestação (Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 18/04/2012, Proc. N.º 430/11.2TBMLD.C1).

  9. Na aferição da gravidade da infração e da culpa do agente o Tribunal, tem de se atender, nomeadamente, se houve ou não benefício económico, se existiu ou não dolo e qual a conduta do agente anterior e posterior à prática da contraordenação.

  10. Sendo a conduta da Arguida negligente, não existindo qualquer benefício económico e sendo a Arguida primária, nada obsta à aplicação da medida de Admoestação, não se podendo aceitar o entendimento constante da sentença recorrida de que tal medida não satisfaz as exigências de prevenção e sancionamento.

  11. Fez, assim, o Tribunal a quo uma errada interpretação e aplicação do artigo 51º do Regime Geral das Contraordenações.

  12. Caso assim não se entenda, sempre se invoca que a sentença recorrida está ferida de nulidade por falta de fundamentação, nos termos do artigo 379º, n.º 1, alínea a) conjugada com o artigo 374º, n.º 2 ambos do Código de Processo Penal, na medida em que é totalmente omissa quanto à enunciação dos critérios que determinaram a fixação da coima única.

  13. A fixação da coima única é obrigatória e exige uma decisão fundamentada (Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 11/11/2008, Proc. 2490/08-1), constituindo a concretização do dever constitucional de fundamentação expressa e acessível dos atos lesivos (artigo 268.º, n.º 3, da C.R.P.) e, sobretudo, a consagração da garantia constitucional do direito à defesa (artigo 32.º, n.º 10, da C.R.P), visando habilitar o arguido a adversar a existência e valoração dos elementos concretamente considerados com vista à contestação e diminuição do montante da coima que lhe fo fixada. 16.Considerando que as coimas individuais aplicadas a cada uma das contraordenações se fixaram no seu limite mínimo, deveria a coima única, considerando os parâmetros consagrados no artigo 19º do Regime Geral das Contraordenações, também ser fixada em valores próximos dos limites mínimos, a qual seria equilibrada e proporcional à responsabilidade da Recorrente pelas contraordenações cometidas.”*Termina pedindo a revogação da sentença recorrida e a sua substituição por outra que, “em face da atuação meramente negligente da Arguida, aplique uma medida de Admoestação ou, caso assim não se entenda, declare nula, por falta de fundamentação a decisão de aplicação de coima única”.

    *O recurso foi admitido.

    Na 1.ª instância, o Ministério Público pugnou pela improcedência do recurso e pela consequente manutenção da decisão recorrida, tendo apresentado as seguintes conclusões: “1.ª Os trabalhadores da ora recorrente atuaram com dolo quanto à incorreta instalação do sistema de exaustão por falta isolamento da tubagem que não evitava a propagação de fumos e cheiros.

    1. A atuação é geradora da responsabilidade coletiva nos termos do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, em que se integram os trabalhadores ao seu serviço, desde que atuem no exercício das suas funções ou por causa delas 3.ª A conduta dolosa dos trabalhadores que se encontravam ao serviço, e que responsabiliza a sociedade arguida, é incompatível e afasta a aplicação do erro sobre as circunstâncias previsto no artigo 8.º n.º 2 do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro.

    2. A simples admoestação não satisfaz as exigências de prevenção e sancionamento dos factos que basearam os ilícitos contraordenacionais pelos quais a arguida foi condenada, que não revestem gravidade reduzida.

    3. O Tribunal determinou as coimas correspondentes a cada uma das contraordenações, nos montantes de 250, 00, ambas pelo limite mínimo, tendo aplicado uma coima única nos termos do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro.

    4. A sentença recorrida encontra-se fundamentada e fez uma determinação ponderada e correta das coimas aplicadas à ora recorrente e não violou o artigo 7.º, 8.º, 51.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro.”*O Exmo. Procurador Geral Adjunto neste Tribunal da Relação emitiu parecer, tendo-se pronunciado no sentido da...

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