Acórdão nº 2078/15.3T8EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 27 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelALBERTINA PEDROSO
Data da Resolução27 de Abril de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 2078/15.3T8EVR.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Évora[1]*****Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]: I – RELATÓRIO 1.

AA... – COMPANHIA DE SEGUROS ..., S.A.

, instaurou a presente acção comum, contra BB, pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia de 12 901,00€ (doze mil, novecentos e um euros), acrescida de juros à taxa legal vencidos e vincendos desde a citação.

Em fundamento, alegou, em síntese, ter direito de regresso contra o réu, seu segurado, por este ter sido responsável pelo acidente de viação de que resultaram danos no valor de 13 101,00€, cujo pagamento efectuou ao lesado, tendo-lhe o Réu liquidado já a quantia de 200,00€.

Mais alegou que o Réu acusou uma taxa de álcool no sangue de 2,16 g/l, tendo sido essa circunstância que causou o acidente, uma vez que o mesmo conduzia desatento e com as suas faculdades perceptivas e reflexos acentuadamente diminuídos.

  1. Regularmente citado, o réu contestou, invocando que não existe qualquer relação causal entre o acidente e a condução com uma taxa de álcool no sangue superior à legalmente permitida, e aduzindo que foi acusado pela prática de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, do qual foi absolvido por não se ter logrado apurar que o perigo provocado pela respectiva actuação apresentasse uma relação causal com o seu estado de embriaguez, devendo, também, ser absolvido do peticionado nestes autos.

  2. Foi dispensada a realização de audiência prévia, sendo proferido despacho saneador tabelar, dispensando-se a identificação do objecto do litígio e enunciação dos temas da prova, e designando-se logo o dia para a audiência final.

  3. Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi seguidamente proferida sentença que julgou a presente acção procedente e, em consequência, condenou o réu no pedido.

  4. Inconformado, o Réu apresentou o presente recurso de apelação, encerrando as suas alegações com as seguintes conclusões: «1. Deveria ter ficado provado que o acidente teve origem na travessia de um cão na estrada, o que provocou que o R. se tenha visto obrigado a guinar a sua viatura automóvel, no propósito confesso de o contornar, tal como exarado no âmbito do Proc. n.º 9/13.4GDARL, que correu termos junto do Tribunal Judicial de Arraiolos.

  5. Ora, tais factos foram novamente demonstrados, através da inquirição das testemunhas infra indicada, cujas transcrições supra efectuadas, se dão por integralmente por reproduzidas (…) 3. Tal factualidade foi alegada pelo R. na sua contestação e foi objecto de discussão em sede de audiência final, pelo que deveria ter sido valorada – cfr. art.5.º n°. 2, al. b) do CPC.

  6. O R. ilidiu a presunção de culpa ao ter demonstrado de forma inequívoca que o que esteve na origem do acidente, não foi o facto de conduzir com uma TAS de 2,16, nem ter culposamente infringido o CE, mas o facto de um cão se ter atravessado na estrada.

  7. Ainda que se considerasse que não foi ilidida tal presunção, o R. goza da presunção decorrente do estabelecido no artigo 624.° do CPC, a qual, prevalece sobre quaisquer presunções de culpa estabelecidas na lei civil.

  8. O R. não teve qualquer culpa na ocorrência do acidente, nem existiu uma relação causal na ocorrência do mesmo, decorrente da TAS apresentada.

  9. Não se encontram reunidos os pressupostos do direito de regresso reclamado pela A. - Cfr. D.L. 291/2007, de 2118.

  10. O Tribunal não interpretou correctamente as normas legais indicadas na presente peça.

  11. O peticionado pela A. deveria ter sido objecto de integral improcedência e em consequência, deveria o R. ter sido absolvido do pedido».

  12. A Ré apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso, e concluindo que: «I. Esteve bem o Tribunal a quo, em não considerar provado, que o acidente de viação teve origem na travessia de um cão, tendo em conta, por um lado, os depoimentos das testemunhas JM e JO, cujas transcrições supra efetuadas se dão aqui por integralmente reproduzidas, mas que no essencial depuseram no sentido de não terem visto qualquer canídeo, referem não terem visto nenhum canídeo e, por outro lado, tomando em consideração que as únicas testemunhas que referem o atravessamento do cão, são os ocupantes do veículo que o Recorrente conduzia, e com o qual aqueles têm um relação de amizade.

    1. Mesmo que se tivesse provado, sem conceder, a presença de um canídeo na faixa de rodagem do Recorrente, este continuava a ser o responsável pelo acidente, pois não seria adequado guinar a sua viatura, invadindo a faixa contrária, causando danos noutro veículo e colocando em perigo a vida do outro condutor.

    2. Nos acidentes a que seja já aplicável o regime do Decreto-Lei nº 291/2007, para ser reconhecido direito de regresso à seguradora que satisfez a indemnização basta ter sido alegado e provado que o condutor deu causa ao acidente e conduzia com uma taxa de alcoolemia superior à permitida por lei, dispensando-se a alegação e prova de nexo de causalidade adequada entre a etilização e o acidente».

  13. Observados os vistos, cumpre decidir.

    *****II. O objecto do recurso.

    Com base nas disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil[3], é pacífico que o objecto do recurso se limita pelas conclusões das respectivas alegações, evidentemente sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas conclusões do recurso, mas apenas as questões suscitadas, e não tendo que se pronunciar sobre as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.

    Assim, vistos os autos, as questões a apreciar no presente recurso consistem em saber se: - deve ou não proceder-se à reapreciação da matéria de facto; - o direito de regresso depende da demonstração do nexo de causalidade entre o acidente e a condução sob a influência de álcool.

    *****III – Fundamentos III.1. – De facto Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos: 1. No dia 4 de Novembro de 2012, pelas 6:35 horas, ao Km 78,200 da E.N. 251, no concelho de Mora, distrito de Évora, circulava o veículo automóvel ligeiro de passageiros de marca Fiat, modelo Punto, matrícula ...-...-FD, conduzido pelo Réu, e o veículo automóvel ligeiro de passageiros da marca Renault, modelo Clio, com a matrícula ...-NF-..., conduzido por JM; 2. Nesse local, a faixa de rodagem configura uma recta com duas vias de trânsito – uma em cada sentido - separadas por um traço contínuo, seguida de uma curva à esquerda, atento o sentido Mora – Pavia; 3. O veículo NF seguia pela sua via de trânsito, no sentido Mora – Pavia, sendo que a viatura FD seguia em sentido inverso; 4. Nesse momento, o FD ultrapassou o referido traço contínuo e invadiu a via de trânsito por onde seguia o NF; 5. Não obstante ter travado e virado para direita, o condutor do NF não conseguiu evitar a colisão; 6. A qual se verificou sensivelmente a meio da via de trânsito por onde seguia; 7. Causando estragos na parte lateral e frontal esquerdas do seu veículo; 8. No seguimento do embate, as autoridades policiais, que compareceram no local do sinistro, não submeteram o aqui Réu ao teste de álcool no sangue, em virtude de o mesmo se encontrar ferido, tendo sido feita colheita do sangue no Hospital Distrital de Évora; 9. Tendo este acusado uma taxa de 2,16 g/l no sangue; 10. O veículo do condutor do NF apresentou uma taxa de álcool no sangue de 0,00 g/l; 11. Foi transferida para a Autora a responsabilidade civil emergente de acidentes de viação com o veículo ...-...-FD, conforme apólice n.º 291837; 12. A Autora pagou ao proprietário do veículo NF, no dia 14.02.2013, a quantia de € 13.101,00 (treze mil, cento e um euros); 13. O valor comercial desse veículo à data do embate era de € 15.500,00 (quinze mil e quinhentos euros); 14. O valor do respetivo salvado era de € 2.399,00 (dois mil, trezentos e noventa e nove euros); 15. A Autora contactou o Réu para que este lhe pagasse a referida quantia de € 13.101,00; 16. O Réu propôs o pagamento mensal desse montante em prestações de € 200,00 (duzentos euros), tendo liquidado, apenas, a 1.ª prestação; 17. O Réu, no seguimento do embate, foi acusado, no âmbito do processo n.º 9/13.4GDARL, que correu os seus termos do Tribunal Judicial de Arraiolos, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez e um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, previsto e punido pelos artigos 291.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 e 69.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal; 18. Nesse processo, foi proferida sentença, em 29 de Novembro de 2013, já transitada em julgado, onde se...

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