Acórdão nº 12475/12.0TDPERT.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 18 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA LEONOR ESTEVES
Data da Resolução18 de Abril de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: 1. Relatório No termo do inquérito que, com o nº 12475/12.0TDPERT, correu termos nos serviços do MºPº de Albufeira, foi deduzida acusação particular pela assistente MH contra os arguidos JP e TP, estes como aquela devidamente identificado nos autos, imputando-lhe a prática dos crimes de injúria e de ameaça agravada, ps. e ps., respectivamente, pelos arts. 181º e 153º e 155º nº 1 al. a), todos do C. Penal.

O MºPº acompanhou esta acusação no que aos crimes de natureza particular respeita, deduzindo também acusação pública contra os mesmos arguidos, a cada um dos quais também imputou a prática de um crime de ameaça agravado, na forma continuada, p. e p. pelos arts. 153º nº 1, 155º nº 1 al. a) e 30º nº 2, todos do C. Penal.

Discordando dessas imputações, pretendendo infirmar os indícios recolhidos nos autos em ordem a ser proferido despacho de não pronúncia, os arguidos requereram a abertura da instrução.

E, realizada esta, foi proferido despacho de não pronúncia em relação a ambos os arguidos e a todos os ilícitos criminais cuja prática lhes havia sido imputada.

Inconformada com a decisão instrutória, dela interpôs recurso a assistente, pretendendo que seja anulada e reenviado o processo para a fase instrutória para que seja proferida outra que pronuncie os arguidos por todos os crimes de que haviam sido acusados, formulando as seguintes conclusões: 1º - O presente recurso e respectiva motivação têm por objecto uma nulidade e a discordância quanto à matéria de facto e de direito constante na decisão instrutória – arts. 410º e 412º do C.P.P..

  1. - A assistente MH apresentou a fls. 376 e segs. a sua Acusação Particular pugnando pela condenação dos arguidos pelo crime p. e p. do art.º 181º do C.P., sendo que o MP a fls. 398 e segs. acompanhou a acusação particular e acusou pelos crimes de injúria e igualmente pelo crime de ameaças agravado.

  2. - Posteriormente vieram os arguidos a fls. 420 requerer a abertura da instrução, tendo pugnado, a final pela sua não pronúncia.

  3. - Na Decisão Instrutória proferida, o meritíssimo J.I.C., decidiu: “NÃO PRONUNCIAR os arguidos JP e TP pela prática, em autoria material e sob a forma consumada: - Do crime de ameaça agravado p. e p. pelos artigos 153.°, n.° 1 e 155.°, n.° 1, al. a), ambos do Código Penal, ilícito que lhes foi imputado na acusação pública deduzida a fls. 397 e s.; - Do crime de iniúria.

    p. e p. pelo artigo 181.° e 183.°, ambos do Código Penal, este, por sua vez, imputado na acusação particular deduzida a fls. 376 e s.. Tudo nos termos do artigo 308.°, n.° 1, parte final, do Código de Processo Penal” 5º - O presente recurso versa igualmente sobre a Nulidade subjacente à omissão da utilização das declarações da arguida para a decisão da instrução.

  4. - Veio o J.I.C. antes de proferir a decisão instrutória, comunicar que, as declarações prestadas pela arguida TP perante o seu colega (J.I.C.) no Tribunal de Albufeira a 13 de Maio de 2014, haviam desaparecido – cfr. despacho de fls. 669.

  5. - Não se conformando com a douta decisão instrutória, dela veio a assistente interpor o presente recurso para este Venerando Tribunal e, para o efeito, solicitou a 10 de Abril de 2015, junto da 2ª secção J1 de Instrução Criminal do Tribunal de Portimão lhe fosse fornecida a gravação da prova gravada, nomeadamente da tomada de declarações ao arguido JP.

  6. - Ao reproduzir o CD que lhe foi entregue com a gravação, veio o mandatário da assistente a verificar que as declarações da arguida TP afinal existem integralmente no sistema, pois constam do referido CD que lhe foi fornecido pelo Tribunal de Portimão. Tais declarações constam de suporte digital com número 20140513150455,tendo duração de cerca de 30 minutos.

  7. - tal situação, a que é manifestamente alheia a assistente, vem pôr em causa a decisão instrutória proferida, pois tais declarações constituem dado essencial que permitiria ao J.I.C., se tomadas em consideração, aferir da realidade/factualidade de modo absolutamente distinto e nesse sentido decidir certamente de forma igualmente diversa.

  8. - A arguida nas suas declarações assume/confessa em várias passagens, factos que constam da acusação do M.P. e da Acusação Particular.

    Tudo cfr. - declarações digitalmente gravadas nº 20140513150455.

  9. - Daqui resultam duas consequências: 1º - a de que a fundamentação da decisão foi amputada de uma das suas partes mais relevantes, ou seja, as declarações da arguida vão manifestamente ao encontro dos factos vertidos nas acusações e como tal, constituindo-se veículo seguro que permitiria ao J.I.C. considerar a existência das razões de facto e de direito que conduziriam ao despacho de pronuncia dela e eventualmente do outro arguido.

    A decisão instrutória constitui-se como um despacho, no caso, um despacho de não pronuncia – art.º 97º, nº 1, b) do CPP, estando subjacente e sendo imperativa a necessidade da adequada fundamentação. Está é fundamental para que se assegure o respeito real pelo princípio da legalidade da decisão judicial que, não se compadece com omissões de provas que podem conduzir, como no caso vertente, à distorção da justiça. Daí dizer-se que efectivamente a decisão em causa foi amputada de uma parte fundamental tendo pois ficado coxa.

    Tal facto conduz à 2ª consequência a que supra se fez menção, ou seja, a nulidade da decisão instrutória.

    Assim, se é dado adquirido na doutrina e jurisprudência que “ [...] é inequívoco que a documentação é obrigatória e que a sua omissão – seja por absoluta ausência de documentação das declarações prestadas em audiência, seja por deficiência da mesma – determina a nulidade” – Ac. do TRE de 14/07/2010; Ac. TRC de 18/01/2012; Ac. RE de 01/07/2010.

  10. - Pelo que se pugna pela declaração de Nulidade da Instrução.

  11. - Mesmo na remota hipótese, que só academicamente se admite, de V.Exas. não declararem a nulidade da Instrução, sempre se alegará e concluirá no que à matéria fáctica concerne, no sentido de pôr em causa a decisão proferida.

    14ª – Diz o JIC que: “O horizonte de discordância vem vertido no requerimento de abertura da instrução deduzido a fls. 420 e s., artigos 3.° a 24.°.

    De acordo com o libelo e em torno da referida imputação relevam os factos alegados nos artigos 3°, 6°. 7° e 8.°.” 15º - Assim, narrou-se; «3.° No dia 29/4/2012 o arguido JP via “Facebook enviou à assistente duas mensagens com o seguinte teor:” ela ameaçou matar-se, n sei dela, minha vida acabou, mas eu vou acabar com a tua também, comigo n brincas, se lhe acontecer alguma coisa eu mato-te, dou-te um tiro, não apareças na minha frente sequer, nem imaginas do que sou capaz “ e “Ainda vai haver mortes com este andar, estou completamente passado com isto e vou estoirarem direcção a ti cuidado... pensa nisso”.

    1. » O(s) arguido(s) agiu(ram) livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que, as expressões mencionadas (nas mensagens “SMS”, 'e-mail”) no “Facebook” enviadas para a assistente MH eram de molde a provocar-lhe justificado receio pela sua vida e integridade física, dada a forma intimidatória como se Ihe(s) dirigiu(ram).

    Ao dirigir(em) tais expressões. o(s) arguido(s) agiu(ram) com o propósito de provocar temor à assistente MH, ciente(s) de que as suas condutas eram aptas a provocá-lo tal como efectivamente veio a acontecer.

    8” Sabia{m) ser tal conduta proibida e punida por lei».”.

    Face a isto diz o JIC: “O arguido já no Inquérito, cf. fls. 344-345, havia negado estes factos. Voltou a fazê-lo nas declarações que prestou na instrução.

    Explicite-se: o arguido não negou ter mantido contactos com a assistente. Admitiu mesmo que lhe enviou «montes de mensagens» mas que nunca lhe fez qualquer ameaça.

    Admitiu também que enviou à assistente uma mensagem quando soube que a sua esposa tinha dado entrada no hospital. Mas essa mensagem não teria o conteúdo narrado no artigo 3.º. O contexto seria o de ter sido surpreendido com o telefonema onde lhe foi dado conhecimento da entrada da esposa no hospital, que não escreveu algo que fosse uma ameaça dirigida directamente para a assistente… …Este horizonte carregado é uma circunstância evidente que a simples leitura dos autos faculta.

    E se isto trazemos, claramente, à liça é porque tal contexto e seus matizes reflecte-se, em potência, nas declarações recolhidas nos autos, que primam por serem extremadas, e por aqui, maior será a necessidade de verificar se existem outros elementos probatórios, externos e de cariz objectivo, que possam firmar a factualidade vertida no libelo… 16º - Na acusação pública constam, para o plano objectivo, os seguintes factos: No artigo 4º narra-se: «De igual modo, também em dias e horas não concretamente apuradas, entre o período compreendido entre o dia 10/2/2012 e o dia 22 de Novembro de 2012 a arguida TP começou a enviar mensagens “sms” para o telemóvel 962 836 841 da assistente onde lhe referia que a iria matar».

    Por sua vez, no artigo 5.” consta: «Neste contexto, no dia 20 de Novembro de 2012 a arguida TP enviou, entre outras, uma mensagem via “mail” onde lhe dizia que “só por acaso escapaste! Como a sorte não aparece muitas vezes é melhor começares já hoje a ter cuidado!!!”».”.

  12. - Da prova produzida, que na óptica da assistente foi suficiente, entendeu o J.I.C. que:- “…em nosso entender as simples declarações de uma e de outros, quando sejam antagónicas, não constituirão elemento suficiente para, só por si poderem alçapremar ao patamar da indiciação suficiente com as implicações que daqui brotam, a factualidade normativamente entendida e teleologicamente votada à submissão a julgamento.

  13. - Face a isto diz o JIC que: “Ora, em uma primeira ponderação fácil será concluir que os referidos elementos probatórios, elementos recolhidos e indicados na acusação para sustentarem a factualidade nela referida, portanto, os elementos que deveriam ser produzidos, analisados ou examinados em sede audiência de julgamento, imediatamente atrás discriminados e anotados, não têm...

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