Acórdão nº 1370/10.8TALLE.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 27 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelCLEMENTE LIMA
Data da Resolução27 de Junho de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 137/10.8TALLE.E1 Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I 1 – Nos autos de processo comum em referência, o arguido, BB, foi acusado, pelo Ministério Público, da prática de factos consubstanciadores da autoria material, na forma continuada, de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, previsto e punível (p. e p.) nos termos do disposto nos artigos 7.º n.º 1, 107.º e 105.º n.

os 1 e 4, do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), e no artigo 30.º n.º 2, do Código Penal (CP).

2 – De par, o arguido foi demandado, pelo INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, IP (ISS), pela quantia indemnizatória de € 4.392,58 e juros, relativos ao não pagamento das quotizações deduzidas pelo arguido das remunerações pagas aos trabalhadores.

3 – A acusação e o pedido de indemnização civil foram admitidos, por despacho de 3 de Março de 2012.

4 – O arguido não apresentou contestação.

5 – Precedendo audiência de julgamento, a Mm.ª Juiz do Tribunal recorrido, por sentença de 30 de Outubro de 2012, decidiu, no segmento que aqui importa, (a) condenar o arguido, pela prática de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, referente ao período de Setembro e Outubro de 2005, p. e p. nos termos do disposto nos artigos 6.º n.º 1, 107.º n.

os 1 e 2, 105.º n.

os 1 e 4, do RGIT, e do artigo 30.º n.º 2, do CP, na pena de 40 dias de multa à taxa diária de € 5,00, (b) condenar o arguido, pela prática de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, referente ao período de Janeiro de 2007 a Julho de 2009, p. e p. nos termos do disposto nos artigos 6.º n.º 1, 107.º n.

os 1 e 2, 105.º n.

os 1 e 4, do RGIT, e do artigo 30.º n.º 2, do CP, na pena de 90 dias de multa à taxa diária de € 5,00, (c) em cúmulo de tais penas parcelares, condenar o arguido na pena única de 100 dias de multa, à mesma taxa diária, e (d) não conhecer do pedido indemnizatório deduzido pelo demandante contra o arguido.

6 – O demandante interpôs recurso da sentença.

Formula o pedido nos seguintes termos: «Termos em que, deverá o presente recurso ser recebido, julgado procedente e, por via disso, ser proferido douto acórdão que revogue a decisão recorrida, na parte em que não conheceu do pedido de indemnização civil deduzido pelo Instituto da Segurança Social, I.P. contra BB, condenando-se o arguido/demandado a pagar ao demandante a quantia de € 5.739,39 (sete mil, setecentos e trinta e nove euros e trinta e nove cêntimos) ao qual deverão acrescer juros de mora vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento.» Extrai da respectiva motivação as seguintes conclusões: «1. O presente recurso encontra a sua fundamentação no art. 410° do CPP.

  1. As ações que têm por objeto os atas tributários de liquidação e execução de tributos e as ações de indemnização resultante da prática de crimes fiscais têm causas de pedir e pedidos diferentes.

  2. O objeto do pedido cível não é a dívida tributária da sociedade arguida mas os prejuízos, geradores de responsabilidade civil, provocados pela prática do crime de abuso de confiança contra a segurança social, por parte dos demandados e pelo qual foram condenados.

  3. O arguido foi condenado, em autoria, pela prática do crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, p. e p. nos artigos 107.° e 105.° do RGIT.

  4. Em consequência da prática do crime em causa, o recorrente viu-se privado de valores a que, por força da Lei, tinha direito, ou seja, a conduta do arguido foi causa direta e necessária de tal privação.

  5. O que está em causa, nos presentes autos, é, pois, a responsabilidade civil do arguido, emergente da prática do crime (abuso de confiança contra a Segurança Social) por que foi condenado.

  6. A responsabilidade civil determina-se pela aplicação das regras do Código Civil para onde remete o art. 129° do C.P. e o art. 3° do Regime Geral das Infrações Tributárias, pelo que a sentença recorrida, na parte em que não conheceu do pedido de indemnização civil deduzido pelo ISS, IP, violou, por erro de interpretação, o disposto nos mencionados artigos (art. 129.° do CP e art. 3.° do RGIT), bem como o disposto no art. 71.° do CPP e 483.° do CC.» 7 – O recurso veio a ser admitido por despacho de 30 de Outubro de 2015.

    8 – Não foi apresentada resposta ao recurso.

    9 – O Ministério Público, nesta instância, não emitiu parecer.

    10 – O objecto do recurso reporta ao exame da questão de saber se, do passo em que declinou o conhecimento do pedido de indemnização civil formulado pelo ISS, a Mm.ª Juiz do Tribunal a quo, incorreu em erro de julgamento, por indevida interpretação do disposto nos artigos 129.º do CP e 3.º, do RGIT, bem como do disposto no artigo 71.º do Código de Processo Penal (CPP) e no artigo 483.º do Código Civil (CC).

    II 11 – A Mm.ª Juiz do Tribunal recorrido apreciou a matéria de facto nos seguintes termos: «2.1.1- FACTOS PROVADOS Discutida a causa e produzida a prova, resultam assentes os seguintes factos: 1. BB é empresário em nome individual encontrando-se inscrito como contribuinte na Segurança Social no regime contributivo "000" (regime geral dos trabalhadores por conta de outrem).

  7. No decurso da sua actividade, o arguido teve vários trabalhadores ao seu serviço, e procedeu ao desconto de contribuições referentes aos salários dos seus trabalhadores, nos períodos e montantes infra discriminados, sem que tivesse procedido à sua entrega à Segurança Social.

  8. Assim, foi deduzido dos valores das remunerações pagas aos seus trabalhadores no montante total de € 5.739,39 (cinco mil, setecentos e trinta e nove euros e trinta e nove cêntimos), referente ao regime "000", nos meses de Setembro e Outubro de 2005 (no valor de € 333,04) e Janeiro de 2007 a Julho de 2009 (no montante de € 5.406,35), períodos durante os quais não foram efectuadas as entregas destas contribuições à Segurança Social.

  9. Nos referidos períodos foram regularmente entregues pelo arguido as folhas de remunerações, sendo celta que o pagamento de tais contribuições deveria ter sido efectuado até ao dia 15 do mês seguinte àquele a que respeitavam.

  10. No entanto, o arguido decidiu pela não afectação das referidas prestações à Segurança Social, fazendo-as suas.

  11. Nem tão pouco procedeu a esse pagamento 90 dias volvidos sobre o termo do prazo de entrega de cada uma delas.

  12. Em tudo O acima descrito, agiu o arguido de forma homogénea, aproveitando-se de poder continuar a apresentar as folhas de remunerações sem proceder aos respectivos pagamentos, porque durante esses períodos não foi sujeito a acção inspectiva por parte da Segurança Social.

  13. O arguido bem sabia que o pagamento de tais contribuições deveria ter sido efectuado até ao dia 15 do mês seguinte àquele a que respeitavam.

  14. Bem sabia o arguido que aquelas prestações não lhes pertenciam e que apenas tinha a qualidade de mera depositário das mesmas com a obrigação de fazer a sua entrega à sua legítima dona, a Segurança Social, 110 prazo de 90 dias e que a mesma não lhe permitia que desse outro destino às ditas prestações.

  15. Pretendeu e logrou assim o arguido subtrair aqueles meios económicos da titularidade da sua legítima titular, a Segurança Social, no montante global de € 5.739,39 (cinco mil, setecentos e trinta e nove euros e trinta e nove cêntimos).

  16. O arguido em tudo acima descrito agiu de forma consciente, livre e deliberada, bem sabendo que aquelas condutas eram proibidas e punidas por lei penal.

    Mais se provou que: 12. O arguido desempenhou trabalho temporário, durante o Verão, como empregado de mesa, mas actualmente encontra-se desempregado. Vive com uma mulher que actualmente se encontra a trabalhar, mas que vai ficar desempregada no próximo mês de Novembro. O arguido tem uma filha de 13 anos de idade que é estudante. O seu agregado familiar tem despesas com renda de casa, no valor de € 400,OO/mês, com um crédito, no valor de € 200,OO/mês, com água, luz, gás e alimentação. Actualmente, o arguido para fazer face às despesas do seu agregado familiar tem de pedir ajuda financeira aos seus familiares. Estudou até ao 10° ano de escolaridade.

  17. Em Julho de 2009, o senhorio do estabelecimento que o arguido explorava fechou esse estabelecimento à força, o que provocou o agravamento da situação financeira do arguido que já era frágil. O arguido apresentou-se à insolvência o que foi decretado por decisão proferida em IOde Março de 2011, tendo-se sido deferido o seu pedido de exoneração do passivo restante.

  18. Do certificado de registo criminal do arguido nada consta.

    2.1.2 - FACTOS NÃO PROVADOS Com interesse para a boa decisão da causa c referente ao objecto dos autos, não ficou provado que: a) O arguido agiu pressupondo que não teria de efectuar os pagamentos dos valores à Segurança Social.

    2.1.3 - MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO (…) 12 – Importa deixar apreciado, de ofício e muito em síntese (ressalvando-se a generalização), que, do texto e na economia da decisão revidenda, não se verifica qualquer dos vícios prevenidos no citado artigo 410.º n.º 2, do CPP.

    13 – Com efeito, investigada que foi a materialidade sob julgamento, não se vê que a matéria de facto provada seja insuficiente para fundar a solução de direito atingida, não se vê que se tenha deixado de investigar toda a matéria de facto com relevo para a decisão final, não se vê qualquer inultrapassável incompatibilidade entre os factos julgados provados ou entre estes e os factos julgados não provados ou entre a fundamentação probatória e a decisão, e, de igual modo, não se detecta na decisão recorrida, por si e com recurso às regras da experiência comum, qualquer falha ostensiva na análise da prova ou qualquer juízo ilógico ou arbitrário.

    14 – No que respeita à apreciação de jure, no particular atinente ao pedido de indemnização civil, a Mm.ª Juiz do Tribunal recorrido ponderou nos seguintes termos: «2.2.3 - DO PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CIVIL O demandante INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, LP. deduziu pedido de indemnização civil contra o demandado/arguido BB, no valor...

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