Acórdão nº 1923/15.8T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 23 de Março de 2017
Magistrado Responsável | MATA RIBEIRO |
Data da Resolução | 23 de Março de 2017 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
ACORDAM OS JUÍZES DA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA ... - Mediação Imobiliária, Unipessoal, Lda.
, instaurou ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra G...
, a qual corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Faro (Faro – Instância Central – 1ª Secção Cível – J3), peticionando a condenação do réu no pagamento da quantia de € 307.500,00, acrescida de IVA à taxa legal, a título de comissão, bem como juros desde a citação até integral pagamento ou, subsidiariamente, caso seja declarada a nulidade do contrato de mediação imobiliária por falta de forma legal, a condenação do réu no pagamento de igual quantia, correspondente ao serviço prestado a restituir.
Como fundamento do peticionado, alega, em síntese, que celebrou com o réu contrato de mediação imobiliária, verbal, tendo por objeto o prédio urbano que identifica, diligenciou pela angariação do comprador e não foi paga a comissão acordada. Caso se entenda que o contrato é nulo, por não observar a forma legal, invoca que a restituição dos serviços prestados importa o pagamento do respetivo valor, correspondente à quantia peticionada.
Citado, o réu vem contestar invocando a verificação da exceção dilatória de ilegitimidade passiva, a nulidade do contrato por falta de forma legal, a falta de atribuições legais para a autora intervir no negócio realizado, a caducidade do contrato e do direito da autora, a caducidade da licença de mediação imobiliária, impugnando na generalidade os factos alegados, concluindo pela improcedência da ação e pedindo a condenação da autora como litigante de má-fé em multa e indemnização não inferior a € 5.000,00.
Na resposta, a autora defendeu a improcedência das exceções invocadas.
No saneador julgou-se improcedente a exceção dilatória de ilegitimidade, prejudicada a apreciação das exceções perentórias de caducidade do contrato e do direito da autora e a caducidade da licença de mediação imobiliária, após o que foi proferida decisão que julgou parcialmente improcedente a ação, absolvendo o réu do pedido formulado com fundamento na celebração de contrato de mediação válido.
Os autos prosseguiram seus termos com vista a apurar se autora e réu celebraram contrato de mediação nulo e se aquela tem direito a ser paga pelos serviços prestados, tendo sido realizada audiência final e após proferida sentença cujo dispositivo reza: “Pelo exposto, ao abrigo dos citados preceitos legais, na presente acção declarativa intentada por ... - Mediação Imobiliária, Unipessoal, Lda., contra G... julgo procedente, por provado, o pedido formulado pela autora de condenação do réu no pagamento da quantia de € 307.500,00, correspondente à retribuição da prestação efetuada, acrescida de IVA, à taxa legal, no total de € 378.225,00, e de juros de mora, à taxa de juros civis, a contar desde a data do trânsito em julgado da sentença até integral pagamento.
Custas pelo réu, (artº 527º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil).
[1] Custas dos incidentes de litigância de má-fé a cargo do réu, com taxa de justiça que se fixa em 2 (duas) U.C´s para cada incidente, no total de 4 (quatro) U.C´s (artº7º, nº4 do Regulamento das Custas Processuais).
”* Irresignado, veio o réu interpor recurso de apelação, terminando por formular as seguintes conclusões que se transcrevem: “Previamente:
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Nas declarações de parte do Réu criou-se uma confusão linguística com relevo e influência na decisão final.
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Quando o Réu utilizou o termo “dealings” referia-se em termos genéricos a relações informais, contactos, negociações, dado que a raiz do termo, o verbo “deal” reporta-se à ação de “tratar de” ou “tratar com” (i will deal with something ou I will deal with somenone) mas não se referia, seguramente, à celebração de nenhum acordo, de algum contrato formal ou mesmo da comissão de alguma tarefa ou mandato.
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Estes dois últimos termos, acordo ou contrato formal, em língua inglesa, são sempre designados por written agreement ou contract.
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Este mal-entendido linguístico, com origem na tradução e confusão de conceitos jurídicos, levou ao desfecho do processo com a decisão de que ora se recorre, quando, devidamente interpretadas, as declarações de parte têm um sentido diferente daquele que o tribunal lhes deu.
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A nosso ver, este facto constitui nulidade parcial do julgamento, dado que equivale à impercetibilidade do depoimento que, em última análise, leva a uma decisão fundada, não em erro de julgamento, mas antes e a montante, na decisão viciada pela absoluta falta de apreensão do verdadeiro teor do depoimento contido nas declarações de parte do Réu.
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Este fundamento é, aqui a agora, invocável nos termos do disposto no artigo 199.º do CPC (uma vez que só com a sentença foi possível aferir o significado dado pelo tribunal a quo às referidas expressões, para efeitos decisórios e de apreciação da matéria de facto), o que ora se faz, requerendo-se seja determinada pela Veneranda Relação a repetição parcial do julgamento com a repetição da prestação de declarações de parte do Réu, na presença de intérprete idóneo com conhecimentos de direito, assim como de inglês jurídico.
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O que ora expressamente se invoca e requer.
Da Reapreciação da Matéria de facto 1) O Tribunal a quo deu como provados - sob os pontos 6, 10, 11 e 21 dos factos provados constantes da douta sentença recorrida - a seguinte matéria de facto: 6 - Há cerca de dois anos, o réu encarregou a autora de diligenciar no sentido de conseguir um comprador para o referido prédio; 10 - O acordo celebrado entre autora e réu foi meramente verbal (acordo); 11 - Na mesma altura o réu celebrou acordos semelhantes com outras empresas de mediação imobiliária, tendo o prédio sido anunciado para venda por diversas outras empresas do ramo.
21 - O réu, já depois de estar em contacto direto com D..., informou A..., vendedor da autora, de que não pagaria qualquer comissão e pediu que o imóvel fosse retirado do seu portefólio, conforme documento de fls.41, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
2) O n.º 6 dos factos provados não se encontra provado da forma como o foi, ou seja, que não está simplesmente provado que “Há cerca de dois anos, o réu encarregou a autora de diligenciar no sentido de conseguir um comprador para o referido prédio”.
3) Na verdade, o que ficou provado foi que há cerca de dois anos, o réu aceitou que a autora mostrasse a propriedade, no seguimento da autora espontaneamente o ter procurado nesse sentido, por ser prestigioso para aquela ter o tipo de propriedades como a do Réu no seu portefólio.
4) O facto n.º 10 dos factos provados, em que se refere que “O acordo celebrado entre a autora e o réu foi meramente verbal (acordo)”, para além de não se encontrar provado, padece logo à partida de conceptualizações jurídicas que nada têm que ver ou podem ser confundidos com a matéria de facto.
5) Tal facto deve ser considerado não provado.
6) Relativamente ao facto n.º 11 dos factos provados “Na mesma altura o réu celebrou acordos semelhantes com outras empresas de mediação imobiliária, tendo o prédio sido anunciado para venda por diversas outras empresas do ramo”, os mesmos argumentos avançados para o facto n.º 10 são aqui aplicáveis, nomeadamente a circunstância do tribunal, ao referir que o réu “celebrou acordos semelhantes com outras empresas de mediação imobiliária”, fazer um exercício de qualificação jurídica e não de apreciação de facto, ademais quando também não foi feita prova nos autos da existência de quaisquer acordos (muito menos semelhantes ao celebrado entre a Autora e o Réu uma vez que, como se demonstrou supra, o mesmo inexiste) celebrados entre o Réu e outras empresas de mediação imobiliária.
7) Também aqui andou mal o tribunal a quo, errando igualmente neste ponto, que deverá ser corrigido por essa Veneranda Relação alterando a redação do facto dado como provado no sentido de referir que: O Réu foi contactado por outras mediadoras para publicitação do imóvel, sem nunca ter sido celebrado qualquer acordo ou sequer sido estabelecido um “acordo de cavalheiros” sobre o valor da comissão.
8) Relativamente ao facto n.º 21.º dos factos provados refere-se que “O réu, já depois de estar em contacto direto com D..., informou A..., vendedor da autora, de que não pagaria qualquer comissão e pediu que o imóvel fosse retirado do seu portefólio, conforme documento de fls.41, cujo teor se dá por integralmente reproduzido” (sublinhado nosso).
9) Mais uma vez, mal andou o tribunal a quo, pelo que o facto n.º 21 dos factos provados deverá ser corrigido por essa Veneranda Relação alterando a redação do facto dado como provado no sentido de referir tão só que o réu informou A..., vendedor da autora, de que não pagaria qualquer comissão e pediu que o imóvel fosse retirado do seu portefólio, conforme documento de fls.41, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
Da apelação A apelação versa sobre os seguintes temas apreciados pelo tribunal a quo: i. A existência de qualquer acordo entre a Autora e o Réu; ii. A qualificação jurídica de tal acordo; iii. A retribuição da Autora; 10) Relativamente à existência de acordo entre a Autora e o réu, resulta da reapreciação da prova que não existiu qualquer acordo entre a Autora e o Réu, quando muito, o que terá ocorrido, foi um relacionamento entre estes, em que foi a Autora quem procurou e contactou o Réu para promover o imóvel deste, pois era prestigioso para ela ter aquele tipo de propriedades no seu portefólio.
11) Na verdade, todos os elementos de prova, exceto evidentemente o da parte interessada – a testemunha A... -, apontam para a inexistência de qualquer acordo mesmo que meramente verbal...
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