Acórdão nº 217/16.6GAVRS.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 21 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelJOÃO GOMES DE SOUSA
Data da Resolução21 de Março de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. n° 217/16.6GAVRSE1 Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: A - Relatório: No processo sumário que correu termos no Tribunal de Faro – Tavira, SCG, J2 - com o número supradito, por sentença de 02 de Agosto de 2016 foi o arguido BB condenado pela prática, em 17 de Julho de 2016, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelos artigos 292.º, n.º 1 e 69.º, n.º1, alínea a), ambos do Código Penal: - numa pena de 70 (setenta) dias de multa, à taxa diária de 6,00 € (seis euros), o que perfaz uma multa no valor de 420,00 € (quatrocentos e vinte euros); - na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 3 (três) meses; - mais foi condenado no pagamento da taxa de justiça em 2 UC's reduzida a metade por força da confissão mais acréscimos legais.

*Inconformado com uma tal decisão, dela interpôs o arguido o presente recurso, pedindo a sua absolvição, com as seguintes conclusões: 1. O arguido BB foi condenado por sentença datada de 02-08-2016, como autor material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. nos artigos 292.°, n. 1 e 69.°, n. 1, alínea a) do Código Penal na pena de 70 (setenta) dias de multa, à taxa diária de €6,00 (seis euros), o que perfaz uma multa no valor de 420,00 € (quatrocentos e vinte euros) e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 3 (três) meses.

  1. A sentença recorrida é nula porquanto não contém as menções referidas no artigo 389º-A, n. 1 do Código de Processo Penal, conforme dispõe o artigo 379.°, n. °1, alínea a) do Código de Processo Penal.

  2. Tais preceitos corporizam a exigência consagrada no artigo 205.°, n. 1 da CRP - o dever de fundamentaçào das decisões do tribunal que nào sejam de mero expediente.

  3. Dever de fundamentação que, reportado à sentença, abrange a matéria de facto e a matéria para que tal peça processual contenha os elementos que, por via das regras ou dos critérios lógicos, conduziram o tribunal a proferir aquela decisão e não outra.

  4. Da conjugação dos mencionados preceitos legais decorre que a sentença deve ser fundamentada, o que não sucedeu in casu.

  5. Logo, a sentença recorrida é nula por não estar devidamente fundamentada.

  6. Da sentença recorrida não consta a exposição concisa dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão, conforme dispõe o artigo 389.

    0-A, n. 1, alínea b) do Código de Processo Penal.

  7. A sentença recorrida é nula por não conter as menções referidas no artigo 389.

    0-A, n. 1, alínea b) do Código de Processo Penal.

  8. Termos em que deverá a sentença recorrida ser declarada nula nos termos do disposto no artigo 379.°, n. 1, alínea a) do Código de Processo Penal.

    Sem prescindir, 10. Andou o douto tribunal "a quo" ao indeferir o requerido por considerar que não se verifica a nulidade prevista no artigo 120.°, n. 2, alínea d) do Código de Processo Penal.

  9. Ou seja, resulta dos factos dados como provados que o arguido é diabético - tipo I e dependente de insulina, tendo sido especificado pelo arguido que toma insulina uma vez antes das refeições e outra à meia-noite, que é de absorção lenta, ou seja que tem a duração de 24 horas.

  10. Porém, não foi investigado e deveria ter sido pelo Ministério Público, de que forma, é que a insulina interfere com o álcool ingerido, e bem assim como é que a insulina influencia ou não a concreta taxa de álcool no sangue.

  11. Tratando-se assim de uma nulidade prevista no artigo 120.°, n. 2, alínea d) do Código de Processo Penal, pois estamos perante uma insuficiência do inquérito e foi omitida uma diligência que se reputa essencial para a descoberta da verdade material.

  12. O que é intolerável que num Estado de Direito democrático, como é o nosso, haja uma violação gritante dos direitos do arguido, pois o arguido invocou em tempo útil a nulidade e o tribunal "a quo" pura e simplesmente fez tábua rasa do invocado, apoiando-se no princípio da livre apreciação da prova e nas regras de experiência comum do julgamento.

  13. A sentença recorrida viola assim grosseiramente os mais elementares dos direitos fundamentais previstos na nossa constituição.

  14. Pelo exposto, o despacho recorrido é inconstitucional por violar o disposto nos artigos 32.°, n. 1 da nossa Constituição, e bem assim o disposto no artigo 6.°, paragrafo 1. da CEDH.

  15. Termos em que deverá a sentença recorrida ser revogada por se verificar a nulidade invocada prevista no artigo 120.°, n. 2, alínea d) do Código de Processo Penal, uma vez que não foi realizada a perícia se a toma da insulina com a ingestão de bebidas alcoólicas se interfere ou não na concreta taxa de álcool no sangue.

  16. Acresce que o douto Tribunal "a quo" ao considerar que não se verificava a invocada nulidade prevista no artigo 120.°, n. 2, alínea d) do CPP, através da qual formou a sua livre convicção violou, entre outros o princípio da livre apreciação da prova, princípio esse que está consagrado no artigo 127.° do CPP.

  17. Assim violou o julgador o já aludido artigo 127.°, determinando tal vício a nulidade por força do artigo 379.°, n. 1, c) do CPP, devendo ser a decisão considerada nula e ser o arguido absolvido.

  18. Para além de ter sido violados os princípios da Presunção da Inocência e "ln Dúbio Pro Reu”: Princípios nucleares do nosso processo penal, que enforma toda a sua estrutura acusatória, que tem consagração no artigo 32.°, n. 2 da Constituição e elemento do fato típico e ilícito que a suporta, bem como o dolo ou a negligência garantir a não aplicação de qualquer pena sem prova suficiente dos elementos do fato tipico e ilícito que a suporta, bem como o dolo ou a negligência do seu autor.

  19. Pois não nos foi possível aferir com a exatidão precisa e concreta que se exige a uma condenação se a insulina em conjunto com o álcool interfere ou não com a taxa de álcool no sangue.

  20. É assim, evidente, a insuficiência da para a decisão da matéria de fato provada.

  21. O que nos leva a estarmos perante uma violação do Princípio "ln Dúbio Pro Reu': segundo qual o Julgador deve decidir sobre toda a matéria que não seja afetada pela dúvida, de forma a que quanto aos fatos duvidosos, o princípio da livre convicção não fornece, nem pode fornecer qualquer critério decisório.

  22. Quer isto dizer, que nos presentes autos ficou criada uma claríssima dúvida razoável quanto aos factos pelos quais vinha o arguido acusado e quanto à culpa deste, é evidente a insuficiência para a decisão da matéria de fato provada, pelo que a absolvição do arguido, aqui recorrente nos parece ser a única e legítima decisão a adoptar 25. Termos em que deverá a douta sentença recorrida ser revogada e em consequência ser o arguido, ora recorrente absolvido.

  23. Por outro lado, o arguido é jardineiro - técnico de manutenção de campos de golfe em Castro Marim, necessitando de conduzir diariamente para o pleno desempenho das suas funções, na medida em que o local onde exerce a sua atividade profissional dista 6 km da sua residência e não está abrangido pela rede de transportes públicos.

  24. Aplicar ao Recorrente a sanção acessória de inibição de conduzir será colocar em risco a sua actividade profissional, bem como a manutenção do seu posto de trabalho e, consequentemente, a estabilidade económica do seu agregado familiar, na medida em que vive com a sua mãe de 81 anos de idade e é o recorrente que financia as despesas quotidianas da casa.

  25. A entidade empregadora também não tem condições financeiras, nem condições estruturais para contratar outro trabalhador ou para assegurar as suas deslocações casa-trabalho e trabalho-casa.

  26. Desta forma a aplicação efectiva da sanção acessória de inibição de conduzir, implicará graves consequências, não só a nível profissional, mas, também a nível financeiro e pessoal.

  27. Salvo melhor opinião, entendemos que a sanção acessória não deverá colidir com o direito ao trabalho, um direito constitucionalmente assegurado, devendo a mesma ser aplicada apenas aos fins-de-semana, que são os dias que o recorrente tem livres, ficando este assim privado de atividades de lazer e lúdicas, não prejudicando a finalidade última da sanção acessória de inibição de conduzir.

  28. Uma vez que não se admite a suspensão da sanção acessória de inibição de conduzir, esta deveria ser aplicada ao arguido, ora recorrente apenas aos fins-de-semana, ou seja quando o arguido não necessita da carta de condução para se deslocar para o seu local de trabalho.

  29. Da aplicação da sanção acessória de inibição de conduzir não pode resultar consequências gravosas e/ou desnecessárias para o condenado ou terceiros dele dependentes, uma vez que as restrições dos direitos devem limitar-se ao estritamente necessano para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, devendo ainda a restrição ser apta para o efeito (artigo 18° da C.R.P.) 33. ln casu, deve aplicar-se a sanção acessória de inibição de conduzir apenas aos fins-de-semana, sob pena de tal ser considerada inconstitucional, na medida em que, no presente caso, a sua não aplicação colide com direitos fundamentais do recorrente, nomeadamente o direito ao trabalho e a exercer uma profissão, os quais se encontram constitucionalmente consagrados (artigo 47º...

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