Acórdão nº 151/16.0 YREVR de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA FILOMENA SOARES
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Criminal (1ª subsecção) do Tribunal da Relação de Évora: I No âmbito do processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, nº ---/15.7 T9EVR, da Comarca de Évora, Instância Local de Évora, Secção Criminal, J2, a Mmª Juíza de Direito, MS, veio deduzir, ao abrigo do disposto no artigo 43º, nº 4, do Código de Processo Penal, escusa para intervir nos identificados autos invocando para o efeito os seguintes fundamentos: “(…) 1) O Ministério Público deduziu acusação em processo comum e com intervenção do tribunal singular contra RMF pela prática, contra o Sr. Procurador da República Dr. SM, de um crime de difamação agravada, previsto e punido pelos artigos 180.º, n.

01, 188.

0, n.

01, alínea a) e 184.

0, por referência ao artigo 132.º, n.º 2, alínea 1), todos do Código Penal.

2) São testemunhas indicadas na douta acusação deduzida quer o Dr. SM (ofendido e Procurador da República a exercer funções no Tribunal …) quer a Dra. MI (Juiz de direito a exercer funções no Tribunal de …).

3) A requerente conhece quer o Dr. SM quer a Dra. MI, privando com os mesmos dos pontos de vista profissional e social, sendo de realçar os diversos convívios realizados entre magistrados a exercer funções na Comarca de Évora, que incluem refeições conjuntas e outro género de eventos nos quais os mencionados magistrados participaram.

4) A requerente mantém igualmente contacto com os magistrados em exercício de funções no Tribunal de Execução de Penas, incluído os sub judice, nomeadamente para discussão de matérias/entendimentos perfilhados por uma e outros e que concernem a processos de que a requerente é titular na Instância Local-Secção Criminal-J2 e bem assim a processos a correr termos no Tribunal de Execução de Penas e que a requerente tenha que despachar por força dos turnos que aí realizou/realiza.

5) A requerente realiza turnos (de férias e fins-de-semana) na Comarca de Évora (não estando excluída a possibilidade de poder ter que vir a realizá-los com o Sr. Procurador da República ofendido), incluindo, como já referido, no Tribunal de Execução de Penas.

6) Atenta a factualidade constante da acusação (e que demandará que em sede de audiência de discussão e julgamento seja discutida a veracidade ou não dos factos invocados pelo arguido no escrito que dirigiu ao processo de liberdade condicional em que é recluso e se tais factos serão ou não difamatórios para o ofendido no âmbito das funções que exerce) e o conhecimento, antecipado, que a requerente possui de duas das três testemunhas indicadas pelo Ministério Público, uma das quais o próprio ofendido, pese embora não se sinta afectada na sua imparcialidade certo é que podem gerar-se suspeitas (v.g. por parte do arguido) sérias sobre tal imparcialidade.

Pelo exposto, requer-se a V. Exa. que lhe conceda escusa de intervir nos presentes autos.

Contudo V. Exa. melhor decidirá, (…)”.

Os autos foram instruídos com os elementos indicados pela requerente do presente incidente.

A Exmª Procuradora-Geral Adjunta, nesta Relação, emitiu parecer afirmando, em suma, que, “(…) Temos dúvidas que o Arguido tenha conhecimento dos convívios entre Magistrados que exercem funções em diferentes Tribunais de Évora, designadamente da Instância Local e do Tribunal de Execução de Penas, não estando fisicamente no mesmo edifício. Igualmente, ser-lhe-á estranho o facto de os mesmos Magistrados trocarem impressões sobre diferentes questões jurídicas, ou que se realizem turnos de férias e fins-de-semana com participação conjunta de Magistrados dos mesmos Tribunais. Os factos apresentados são comuns a todos os Magistrados a prestar serviço na Instância Local de Évora.

(…)”. Mais afirma que “(…) entendemos que, por o ofendido ser um Magistrado do Mº Pº que exerce funções no Tribunal de Execução de Penas de Évora, atento o disposto no artº 23º do Código de Processo Penal, a Secção Criminal da Instância Local da Comarca de Évora é territorialmente incompetente para proceder ao julgamento dos Autos de Processo Comum Singular nº ---/15.7T9EVR.

(…)”.

Efectuado o exame preliminar, colhidos os vistos legais, o processo foi à Conferência.

Cumpre apreciar e decidir.

II Em jeito de questão prévia, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta, neste Tribunal da Relação, suscita a questão da competência da Instância Local da Comarca de Évora, Secção Criminal, para conhecer do processo comum, com intervenção do Tribunal Singular que foi distribuído à Mmª Juíza requerente do presente incidente de escusa.

Ressalvado o sempre e muito devido respeito, [não se desconhecendo o entendimento da Exmª Procuradora-Geral Adjunta, nem aqueloutro de que dá nota o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 20.05.2015, proferido no processo nº 2320/12.2 TALRA-A.C2, disponível in www.dgsi.pt] trata-se, porém, de questão em absoluto estranha àquela que suscita a intervenção desta instância, chamada tão só a apreciar e decidir se deve ou não ser concedida escusa à Mmª Juíza requerente. Dito de outra forma, a questão da competência agora veiculada pela Exmª Procuradora-Geral Adjunta traduz questão nova que não foi suscitada, nem discutida, nem apreciada e decidida na primeira instância, não podendo, consequentemente esta Relação dela conhecer.

Estatui o artigo 39º, nº 1, do Código de Processo Penal que: “1. Nenhum juiz pode exercer a sua função num processo penal:

  1. Quando for, ou tiver sido, cônjuge ou representante legal do arguido, do ofendido, ou de pessoa com a faculdade de se constituir assistente ou parte civil ou quando com qualquer dessas pessoas viver ou tiver vivido em condições análogas às dos cônjuges; b) Quando ele, ou o seu cônjuge, ou a pessoa que com ele viver em condições análogas às dos cônjuges, for ascendente, descendente, parente até 3.º grau, tutor ou curador, adoptante, ou adoptado do arguido, do ofendido ou de pessoa com a faculdade de se constituir assistente ou parte civil, ou for afim destes até àquele grau; c) Quando tiver intervido no processo como representante do Ministério Público, órgão de polícia criminal, defensor, advogado do assistente ou da parte civil ou perito; ou d) Quando, no processo, tiver sido ouvido ou dever sê-lo como testemunha.

    1. (…).

    2. (…).

    ” Por seu turno, dispõe o artigo 40º, do mesmo diploma legal que: “Nenhum juiz pode intervir em julgamento, recurso ou pedido de revisão relativos a processo em que tiver:

  2. Aplicado medida de coacção prevista nos artigos 200.º a 202.º; b) Presidido a debate instrutório; c) Participado em julgamento anterior; d) Proferido ou participado em decisão de recurso anterior que tenha conhecido, a final, do objecto do processo, de decisão instrutória ou de decisão a que se refere a alínea a), ou proferido ou participado em decisão de pedido de revisão anterior.

    e) Recusado o arquivamento em caso de dispensa de pena, a suspensão provisória ou a forma sumaríssima por discordar da sanção proposta.

    ”.

    E, o artigo 43º, do Código de Processo Penal, dispõe: “1. A intervenção de um juiz no processo pode ser recusada quando correr o risco de ser considerada suspeita, por existir motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade.

    1. Pode constituir fundamento de recusa, nos termos do n.º 1, a intervenção do juiz noutro processo ou em fases anteriores do mesmo processo fora dos casos do artigo 40º.

    2. (…).

    3. O juiz não pode declarar-se voluntariamente...

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