Acórdão nº 744/16.5T8EVR-B.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelALBERTINA PEDROSO
Data da Resolução14 de Setembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 744/16.5T8EVR-B.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Évora[1]*****Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]: I – RELATÓRIO 1. AA, Administrador Judicial no processo de insolvência acima identificado, não se conformando com o despacho proferido no dia 2 de Maio de 2017 que o destituiu das funções de Administrador da Insolvência, veio dele interpor o presente recurso de apelação, finalizando as respectivas alegações com as seguintes conclusões: «2. No caso em apreço, os critérios estabelecidos no artigo 56.º do CIRE, não foram cumpridos, dado que o Recorrente, os devedores e os demais credores não foram notificados para se pronunciarem quanto à destituição.

  1. O despacho de destituição carece de fundamentação legal, dado que o mesmo apenas aponta uma conduta negligente ao aqui recorrente, mas em momento algum no despacho recorrido é apontada a existência e a fundamentação de justa causa de destituição.

  2. Estamos perante um despacho que padece de nulidade nos termos do artigo 56.º do CIRE.

  3. O despacho de destituição proferido pelo tribunal ad quo deve ser declarado nulo, com todos os efeitos legais.

  4. A conduta do Sr. AI na situação concreta em debate nos autos não preenche os requisitos da justa causa de destituição.

  5. Nenhum dos preceitos legais específicos que constituem justa causa de destituição, se encontram preenchidos, uma vez que: 1. O recorrente não adquiriu quaisquer bens ou direitos compreendidos na massa insolvente, nos termos do artigo 168.º do CIRE; 2. A assembleia de credores realizou-se em 12 de Julho de 2016, pelo que não decorreu o prazo de um ano, sem que o processo tenha sido encerrado, nos termos do artigo 169.º do CIRE; e 3. Não estamos perante questões de existência de falta de idoneidade nos termos do artigo 16.º n.º 4 do Estatuto do Administrador Judicial.

  6. Para além dos preceitos legais específicos que constituem justa causa de destituição, não se verificou, ter existido qualquer outro comportamento, conduta ou ato praticado pelo AI destituído, que possa ser enquadrado no conceito de justa causa, mencionado no artigo 56.º n.º 1 do CIRE.

  7. O conceito de justa causa é um conceito vago, aberto e indeterminado, que ocorre quando são praticados atos ilegais ou inconvenientes para a massa insolvente em virtude do administrador não ser um gestor criterioso e zeloso e que pressupõe a violação grave dos deveres de exercício das respetivas funções.

  8. Nos autos de insolvência para os quais foi nomeado, o recorrente cumpriu escrupulosamente com as tarefas atinentes ao exercício da sua atividade, tendo após a sua nomeação, rececionado as reclamações de créditos, elaborado a lista provisória de credores, elaborado o relatório e procedido à notificação de todos os interessados. Para além disso, procedeu à apreensão de bens dos insolventes, após ter investigado o património daqueles, bem como procedeu à resolução a favor da massa de negócios praticados pelos insolventes nos dois anos anteriores à insolvência, agindo na sua conduta sempre no intuito de prosseguir com a liquidação do património dos insolventes e de cumprir com as suas obrigações legais.

  9. O recorrente prestou informações aos autos do estado da liquidação, após ter sido notificado pelo tribunal ad quo, mais concretamente dos imóveis que havia apreendido e dos negócios cuja resolução incondicional em benefício da massa insolvente havia efetuado, bem como informou que apenas aguardava a emissão de certidão para que pudesse proceder ao registo da respetiva apreensão. O recorrente requereu também a avaliação dos imóveis apreendidos, junto dos credores hipotecários, tendo inclusive pedido ao tribunal ad quo uma prorrogação do prazo de liquidação pelo período de 90 dias ao qual não obteve qualquer resposta.

  10. O recorrente informou o tribunal ad quo, da causa justificativa, para não ter ainda naquela data procedido à abertura do apenso de liquidação e do apenso de reclamação de créditos, tendo referido o seguinte quanto ao apenso da liquidação: “(…) uma vez que só com a resolução incondicional em benefício da massa é que permitia apreender bens para a massa insolvente e por sua vez os liquidar, nos termos da Lei, com abertura do apenso de Liquidação (…)”e referiu o seguinte quanto ao apenso da reclamação de créditos “(…) com a apreensão destes bens é que a lista de reclamação de créditos podia ser apresentada, quanto à sua natureza, porque vários dos credores reclamaram os seus créditos, nos termos do 128.º do CIRE, requereram os créditos com natureza de garantidos, sob os bens que foram doados aos dois filhos (…)” 13. Ainda que o recorrente não tenha sido o mais célere nas comunicações efetuadas com o tribunal ad quo, o mesmo nunca deixou de cumprir com as suas funções de Administrador, de uma forma criteriosa e zelosa, não tendo em momento algum incumprido com os seus deveres no exercício das respetivas funções.

  11. A conduta do aqui recorrente, não pode ser considerada grave ao ponto de inviabilizar, em termos de razoabilidade, a manutenção das suas funções.

  12. Os motivos para o atraso na abertura dos respetivos apensos de Reclamação de créditos e de Liquidação, não se devem à conduta do recorrente mas sim a factores externos à sua conduta e à sua responsabilidade.

  13. Inexiste culpa na conduta do administrador, o que por si só afasta de imediato a inexistência de justa causa para a destituição, uma vez que a justa causa é sempre aferida tendo em consideração o grau de culpa do administrador e resulta da prática de atos ou omissões graves e intencionais ou reveladores de inaptidão ou incompetência para o exercício das funções de administrador.

  14. O recorrente poderia e deveria ter sido mais célere nas comunicações que efetuou com o tribunal ad quo, mas tal conduta nunca seria suficientemente grave para preencher o conceito de justa causa de destituição.

  15. O Administrador de Insolvência, não pode ser destituído apenas e só por qualquer atitude que tenha que simplesmente desagradado ao Insolvente, aos credores ou aos demais intervenientes processuais. Para que possa ser destituído o administrador tem de ter cometido uma falta grave que justifique o seu afastamento e tem de ter com o seu comportamento lesado a massa insolvente e/ou prejudicado algum dos credores, o que in casu, nunca aconteceu.

  16. Inexiste justa causa para a destituição do ora recorrente, pelo que o despacho que procedeu à destituição do recorrente deverá ser revogado.

  17. O despacho recorrido violou, assim, o preceituado nos artºs 56º, 59º,60º, 63º, 82º, 128º, 129º, 168º e 169º, todos do CIRE».

  18. Não foram apresentadas contra-alegações.

  19. A Senhora Juíza pronunciou-se, entendendo que não se verifica qualquer nulidade.

  20. Observados os vistos, cumpre decidir.

    *****II. O objecto do recurso.

    Com base nas disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil[3], é pacífico que o objecto do recurso se limita pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo evidentemente das questões cujo conhecimento oficioso se imponha, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas conclusões do recurso, mas apenas as questões suscitadas, e não tendo que se pronunciar sobre as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.

    Assim, as questões submetidas a apreciação no presente recurso são as de saber se: a) se verifica a invocada nulidade processual, por violação do contraditório; b) se verifica a nulidade do despacho, por falta de fundamentação; c) e, finalmente, se existe ou não justa causa para a destituição do administrador da insolvência.

    III – Fundamentos III.1. – De facto A tramitação processual relevante para a decisão do presente recurso é a seguinte[4]: 1. Na sentença proferida em 30 de Maio de 2016, que declarou a insolvência de BB e CC, foi nomeado Administrador da Insolvência AA, ora Recorrente.

  21. No dia 12 de Julho de 2016 foi realizada a Assembleia de Credores, na qual foi dada a palavra ao Administrador Judicial[5], o qual manteve e confirmou o teor do relatório por si apresentado no sentido de os autos prosseguirem para liquidação, tendo os credores presentes deliberado, por unanimidade, prescindir da constituição da comissão de credores, e aprovar o prosseguimento dos autos para liquidação.

  22. Por despacho proferido em 04-08-2016 foi decidido «relegar para o momento em que for proferido despacho de encerramento do processo de insolvência a prolação do despacho de apreciação liminar sobre o pedido de exoneração do passivo restante», e determinada a notificação do Sr. AJ para, no prazo de dez dias, juntar aos autos o respectivo apenso de apreensão de bens.

  23. Por despacho proferido em 06-09-2016 foi determinado se insistisse «junto do Sr. Administrador da insolvência para, em dez dias, vir juntar aos autos o apenso de apreensão de bens, sob pena de, não o fazendo no aludido prazo, ou no caso de nada vir dizer, será condenado em multa por falta de colaboração com o Tribunal».

  24. Em 30-09-2016 foi proferido o seguinte despacho: «Condeno o Administrador de Insolvência em multa, no montante de 1 (uma) UC, por falta de colaboração com o tribunal.

    Insista pelo cumprimento do despacho que antecede, concedendo novo prazo de dez dias, e voltando a advertir da possibilidade de condenação em multa, desta vez superior à ora aplicada».

  25. Por fax com a data de 07-10-2016 o Sr. AJ informou que se encontrava a diligenciar no sentido de resolver alguns contratos de compra e venda, como era do conhecimento do tribunal, requerendo a «prorrogação» do prazo para apresentação do auto de apreensão pelo período de 15 dias, o que foi deferido por despacho proferido em 13-10-2016.

  26. Por fax com a data de 21-10-2016 o Sr. AJ informou ter já expedido as cartas registadas com aviso de recepção para a resolução incondicional dos actos de doação dos insolventes aos seus filhos, juntando as respectivas cópias; ter diligenciado junto do...

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