Acórdão nº 1261/18.4T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 23 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelCRISTINA DÁ MESQUITA
Data da Resolução23 de Abril de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Apelação n.º 1261/18.4T8STR.E1 (1.ª Secção) Relator: Cristina Dá Mesquita Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Évora: I. RELATÓRIO I.1. (…), autora na ação declarativa de condenação sob a forma de processo comum que moveu contra a (…), Seguros Gerais, SA e (…), interpôs recurso do despacho saneador-sentença proferido pelo Juízo Central Cível e Criminal de Évora, Juiz 3, do Tribunal Judicial da Comarca de Évora, o qual julgou verificada a exceção dilatória de ilegitimidade ativa da autora e, em consequência, absolveu os réus da instância no que ao pedido formulado por aquela diz respeito. É o seguinte o teor do despacho saneador-sentença recorrido: «[…] Saneamento O Tribunal é absolutamente competente. Inexistem nulidades que afetem todo o processado. *Da ilegitimidade ativa da Autora (…) veio intentar ação declarativa comum contra (…), Seguros Gerais, S.A. e (…) peticionando o pagamento de uma indemnização decorrente do incumprimento do contrato de mandato celebrado entre o 2.° Réu e a sociedade «(…), Lda.». Alega a Autora, em síntese, que é sócia da sociedade «(…), Lda.» que foi objeto de dissolução administrativa, tendo sido registrados o encerramento da liquidação e o cancelamento da matrícula. Convidada a Autora a alegar os factos dos quais resultam a sua legitimidade processual, veio a mesma invocar o artigo 164.° do Código das Sociedades Comerciais. Cumpre apreciar e decidir. Estabelece o artigo 26°, n.º 1, do Código Processo Civil, que o «O autor é parte legítima quando tem interesse direto em demandar (...)», apreciando-se este interesse pela utilidade derivada da procedência da ação (cfr. n.º 2 do mesmo preceito legal). Ainda, no n.º 3 daquela disposição legal consta que, «Na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida tal como configurada pelo autor». Desta forma, admite-se a existência da relação jurídica alegada e, perante a configuração a ela dada pelo autor, verificar-se-á se ele pode ou não ser o seu sujeito. Veio a Autora intentar a presente ação, conforme por si alegado, na qualidade de sócia da sociedade «(…), Lda.» que conforme resulta da certidão permanente de fls. 20 e 55. foi objeto de dissolução administrativa, tendo sido encerrada em 28/03/2018. Invoca a Autora que aquela sociedade mandatou o 3.° Réu, advogado, para a representar no âmbito do processo judicial n.º 79/14.8T80RM, sendo que o mesmo veio a interpor recurso da decisão final que foi desfavorável, no entanto não fez o mesmo acompanhar-se das alegações, facto que determinou que fosse julgado deserto, tudo ao arrepio das instruções dadas pela «(…), Lda.». Vem, então, invocar que na sequência daquela atuação a «(…), Lda.» ficou privada de um ativo de valor não inferior a € 1.200.000,00, sendo que se não fosse esse facto a quota da Autora valeria no mínimo 50% desse valor, isto é, € 600.000,00, precisamente o valor que peticiona. Os artigos 162.º e 163.º do Código das Sociedades Comerciais, distinguem e regulam dois modos diferentes de fazer intervir os sócios em ação instaurada por dívida da sociedade extinta, consoante a ação esteja pendente à data da extinção da sociedade, ou seja, instaurada após a extinção da sociedade. Efetivamente, extinguindo-se a sociedade, com a sua extinção – equiparada à morte civil – não podem os seus ex sócios propor ações para defesa de direitos que à extinta sociedade pertenciam, sob pena de se cair no absurdo de poder-se litigar em nome de entidade extinta, sem prejuízo, porém, do estatuído no artigo 164° do Código das Sociedades Comerciais (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 18/01/2018, Relator Jorge Teixeira, disponível em www.dgsi.pt). O legislador estipulou expressamente o regime a que fica sujeita a existência de ativo superveniente, prescrevendo no artigo 164.°, n.ºs 1 e 2, do Código das Sociedades Comerciais que, «verificando-se, depois de encerrada a liquidação e extinta a sociedade, a existência de bens não partilhados, compete aos liquidatários propor a partilha adicional pelos antigos sócios, reduzindo os bens a dinheiro, se não for acordada unanimemente a partilha em espécie», sendo que, «as ações para cobrança de créditos da sociedade abrangidos pelo disposto no número anterior podem ser propostas pelos liquidatários, que, para o efeito, são considerados representantes legais da generalidade dos sócios; qualquer destes pode, contudo, propor ação limitada ao seu interesse». Decorre desta última disposição legal que os sócios podem, enquanto liquidatários, propor ações para cobrança de créditos da sociedade após a extinção desta. Tendo em conta o supra exposto, desde logo se perfilam dois problemas. O primeiro diz respeito ao facto da presente ação ter como finalidade obter a condenação no pagamento de uma indemnização decorrente do incumprimento de um contrato de mandato, que alegadamente terá ocorrido nos anos de 2014 e 2015 (cfr. fls. 108 e 151), isto é, em data anterior à dissolução que foi objeto de registo em 28/03/2018. Logo, não está em causa um crédito superveniente, tal como se exige para aplicação do citado artigo 194.° do Código das Sociedades Comerciais. Efetivamente, o sócio nomeado liquidatário da sociedade, não pode exigir o pagamento de créditos a terceiros pré-existentes à dissolução, através de ação proposta em data posterior à data do registo de encerramento da dissolução. O segundo problema diz respeito ao facto da Autora, sócia da «(…), Lda.», não ser liquidatária da sociedade, pelo que ao abrigo da citada disposição legal (n.º 2) não lhe cabe a si a legitimidade para agir judicialmente. Desta forma, forçoso é concluir que não alegou a Autora os competentes factos para que se afira a sua legitimidade processual – por um lado, ser o crédito anterior à liquidação, e por outro lado ser a liquidatária – razão pela qual não se pode concluir que seja titular...

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