Acórdão nº 4604/15.9T9STB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 21 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelJOÃO GOMES DE SOUSA
Data da Resolução21 de Janeiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: A - Relatório: No Tribunal Judicial de Setúbal – Central Criminal J2 - correu termos o processo comum colectivo supra numerado no qual foi condenado o arguido AA, divorciado, nascido em 13/04/1961, natural de S. Sebastião, Setúbal, filho de …, residente na Rua…, Setúbal, imputando-lhe a prática, em autoria material, na forma consumada e em concurso real, de: - Um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea d), 2, 4, 5 e 6 do Código Penal.

- Dois crimes de violação agravada, previsto e punido pelos artigos 164.º, n.º 1, alínea a), 177.º, n.º 1, alínea a) e 177.º, n.º 7 do Código Penal.

* A final - por acórdão lavrado a 09 de Abril de 2019 - veio a decidir o Tribunal recorrido condenar o arguido AA pela prática, como autor material e na forma consumada, e em concurso real, de: - Um crime de violência doméstica, agravado, p. e p. pelo art.º 152º, n.º 1 al. b), n. 2 e n.º 4 do Código Penal, na pena de 2 anos 6 meses - Um crime de violação agravada, p. e p. pelo art. 164º, º, al. a), e art. 177º, nº 7, do Código Penal, na pena de 6 anos; - Um crime de violação agravada, p. e p. pelo art. 164º, º, aI. a), e art. 177º, nº 7, do Código Penal, na pena de 6 anos.

Em cúmulo jurídico foi o arguido AA condenado na pena única de 8 anos e 6 meses de prisão.

* O arguido, não se conformando com a decisão, interpôs recurso formulando as seguintes (transcritas) conclusões: 1. O presente Recurso tem por Objecto a Nulidade do Acórdão por Falta de Exame Critico da Prova, a Inconstitucionalidade da Norma constante do Artigo 127.º do Código de Processo Penal na dimensão normativa com que foi aplicada pelo Tribunal a quo no Acórdão Recorrido, a Matéria de Facto, a Matéria de Direito e a Dosimetria da Pena, Parcelares e Única, aplicada, pelo Tribunal a quo ao Recorrente, no Acórdão Recorrido e a Suspensão da sua Execução.

  1. Em termos de Matéria de Facto impugna o Recorrente o teor do Acórdão Recorrido por manifesto Erro de Julgamento da Matéria de Facto submetida a apreciação do Tribunal a quo e pela Insuficiência da Prova produzida em Audiência de Julgamento, bem assim, como daquela que se encontra entranhada nos Autos para a Decisão da Matéria de Facto Provada.

  2. Já no que respeita à Matéria de Direito impugna o Recorrente o teor do Acórdão Recorrido pela violação dos Princípios da Presunção da Inocência e In Dubio Pro Reo referente à sua Condenação pelos Crimes de Violência Doméstica Agravada e Violação Agravada.

    Densificando, 4. O Acórdão Recorrido enferma de Nulidade por Falta de Exame Crítico da Prova visto que, não obstante referir nas páginas 10 a 17 dessa Decisão que para dar como provada essa factualidade socorreu-se das Declarações prestadas pelo Arguido, dos Depoimentos da alegada Vítima e das sete Testemunhas indicadas na Acusação e arroladas na Contestação e dos Relatórios de Exame Pericial e demais Documentos juntos aos Autos, as considerações tecidas, a esse propósito, pelo Tribunal a quo são manifestamente vagas e imprecisas e totalmente inexistentes no que respeita à Prova Pericial e Documental.

  3. Com efeito, para esta finalidade, o Tribunal a quo não especificou, em termos minimamente aceitáveis, o motivo pelo qual entendeu que as Declarações do Arguido são desprovidas de credibilidade sejam por si sós, sejam por confronto com a restante Prova existente no Processo e produzida em Audiência de Julgamento, da mesma forma que não especificou ou sequer concretizou, de modo suficientemente claro e objectivo, o motivo pelo qual retirou credibilidade à restante Prova Testemunhal produzida em Audiência de Julgamento em face do que depôs a Testemunha FS.

  4. A bem de ver, o Tribunal a quo, limitou-se a dar como provados determinados factos enunciando em seguida qual a Prova de que se terá socorrido para dar como demonstrados esses factos, e não se preocupou em especificar, nomeadamente, o motivo pelo qual, em termos lógicos essa prova difere, contraditando-a ou atestando-a, da restante.

  5. Todavia, como V/Ex.ªs melhor sabem, o certo é que se impunha, em vista do exame crítico das Provas a que se refere a última parte do N.º 2 do Artigo 374.º do Código de Processo Penal, que se explicitasse de modo concreto e objectivo, designadamente, as razões que levaram o Tribunal a quo a descredibilizar, e porquê, as Declarações do Arguido, bem assim, como a considerar mais relevante o Depoimento de uma Testemunha do que todas as demais inquiridas no decurso do Processo e ouvidas em Audiência de Julgamento.

  6. E assim sendo, tendo em conta o que se encontra articuladamente disposto no N.º 2 do Artigo 374.º e na alínea a) do N.º 1 do Artigo 379.º do Código de Processo Penal, está ferido de Nulidade que V/Ex.ªs sabiamente decretarão.

  7. O Acórdão Recorrido padece de Erro de Julgamento da Matéria de Facto, porquanto, através do Julgamento da matéria que lhe foi dada a apreciar, deu por provados factos que se apresentam manifestamente inconciliáveis quer com a Prova produzida em Audiência de Julgamento, quer com a que se encontra junta aos Autos.

  8. Em rigor, o que se teve como Provado está em manifesta desconformidade com o que realmente se provou e não provou em Audiência de Julgamento, desde logo, porque as conclusões vertidas no Acórdão Recorrido são claramente ilógicas e inaceitáveis.

  9. A condenação do Recorrente, no âmbito da factualidade dada por provada, emerge de tudo o que se encontra vertido nos pontos 4 a 15 dos factos provados no Acórdão Recorrido, não obstante, a Prova produzida em Julgamento não permitir extrair estas ilações, ou, menos ainda, autoriza que se possam verter essas conjecturas na factualidade provada do Acórdão Recorrido.

  10. A Prova produzida em Julgamento e incorporada nos Autos, na sua máxima avaliação, não permite considerar como praticados estes factos pelo Recorrente, é isto que resulta daquilo que se produziu em Julgamento, e dos próprios meios de Prova invocados pelo Tribunal a quo na sua motivação.

  11. Sendo certo que a Prova que se produziu em Julgamento e toda aquela que se encontra junta aos Autos permite atestar que o Recorrente, nas circunstâncias de tempo, modo e espaço ali descritas, não agrediu, maltratou, ofendeu por que forma fosse ou violou a sua filha.

  12. Acontece que a Prova que foi utilizada para fundamentar estas factualizações exige e impõe precisamente o seu contrário, isto é, a apreciação probatória de tudo o que se produziu em Julgamento, neste particular, exigia que o Tribunal a quo tivesse dado estes factos como Não Provados.

  13. Dessas Declarações, Depoimentos e Documentação extrai-se que o Recorrente nada tem que ver com a prática dos Ilícitos que se descrevem ter ocorrido naquelas circunstâncias de tempo, modo e lugar, é isso que ressalta do Acervo Probatório constante dos Autos, melhor elencados na fundamentação do Acórdão Recorrido, e da demais Prova produzida em sede de Julgamento.

  14. Escrutinados todos os Depoimentos prestados em Audiência de Julgamento constata-se que, com excepção do prestado por FS, nenhum facto com ressonância criminal, relacionado com os crimes de violência doméstica ou violação ou de qualquer outro, resulta demonstrado ter sido praticado pelo Recorrente, bem ao contrário disso, todas as Testemunhas foram peremptórias ao afirmar que o Recorrente sempre pautou a sua postura e comportamento como um pai preocupado, presente e dedicado com o salutar crescimento e desenvolvimento pessoal, académico e social da sua filha e que nunca percepcionaram ou lhes foi reportado por outrem qualquer agressão verbal ou física à FS.

  15. Da Prova Testemunhal, isoladamente considerada ou em complemento com a demais Prova, advêm um conjunto de questões - cujas respostas foram totalmente descuradas pelo Tribunal a quo em sede de apreciação probatória - que assaltam não só o espirito do homem médio chamado a decidir como o do especialmente qualificado nesta matéria, da mesma forma que dos Relatórios de Exame Pericial e demais Documentação indicada no teor do Acórdão Recorrido, nada se retira que se possa afirmar que o Recorrente praticou qualquer um dos factos em que foi condenado.

  16. O Tribunal a quo suportou a prática destes factos pelo Recorrente, única e exclusivamente, no que a FS depôs, isto mesmo, quando foram diversas as Testemunhas ouvidas em Julgamento, umas com mais outras com menos proximidade ao Recorrente, que afiançaram que a FS não tinha pudor em mentir fosse em que circunstância fosse e de que matéria se tratasse.

  17. O Tribunal a quo, além do mais, deu sinais no teor do Acórdão Recorrido de ter efectuado uma apreciação probatória manifestamente tendenciosa e pró versão que pretendeu fazer vingar em sede de Decisão, o que para lá de ilegal é refractário da Prova produzida.

  18. Para o atestar, bastará deitar os olhos na fundamentação do Acórdão Recorrido, em rigor no 3.º parágrafo da página 14 e no 2.º parágrafo da página 15, para se constatar que no entendimento do Tribunal a quo o Depoimento da Testemunha MG, num primeiro momento, não merece qualquer credibilidade, mas, num segundo momento, quando aproveitado para fundamentar a perspectiva que lhe interessa já tem todo o valor.

  19. No caso concreto dos presentes Autos, contraria de forma flagrante não só as regras da experiência comum como a própria normalidade do acontecer que a alegada vitima dos factos (agressões verbais, físicas e violação), uma jovem à data de 12/13 anos de idade (de maturidade intelectual manifestamente superior à idade biológica), os venha reportar cerca de três anos depois deles terem ocorrido.

  20. Sobretudo quando teve inúmeras possibilidades de o fazer às mais variadas pessoas, umas que lhes eram próximas, outras que lhe eram afastadas e nos mais diversos momentos.

  21. E é por este conjunto de razões e motivos, e outros melhor explanados na motivação recursória, que se entende que o Depoimento prestado por FS não merece qualquer credibilidade e fiabilidade. Não o merece porque é...

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