Acórdão nº 565/14.0TASTB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Março de 2020
Magistrado Responsável | SÉRGIO CORVACHO |
Data da Resolução | 10 de Março de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA I. Relatório No Processo Comum nº 565/14.0TASTB, que correu termos no actual Juízo Competência Genérica de Grândola do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal, pela Exª Juiz titular dos autos foi ditado para a acta da audiência de julgamento, realizada em 19/12/2017, um despacho do seguinte teor: «Veio o arguido no passado dia 15 de Dezembro (sexta-feira), já após o hora de fecho da secretaria judicial, requerer a alteração e o adicionamento ao rol de uma testemunha.
O Ministério Público pronunciou-se no sentido da inadmissibilidade da alteração ao rol e consequente deferimento do requerido.
Dispõem o artigo 316° nº1 do Código do Processo Penal que "O Ministério Público, o assistente, o arguido ou as partes civis podem alterar o rol de testemunhas, inclusivamente requerendo a inquirição para além do limite legal, nos casos previstos nos n.ºs 7 e 8 do artigo 283.°, contanto que o adicionamento ou a alteração requeridos possam ser comunicados aos outros até três dias antes da data fixada para a audiência".
Atenta a data da entrada do requerimento o mesmo só pôde ser comunicado ao Ministério Público na segunda - feira dia 18, não podendo assim ser observado o prazo a que alude o artigo 316° nº 1 do Código do Processo Penal.
Face à intempestividade de alteração e adicionamento ao rol indefere-se o requerido.
Notifique. " Do despacho transcrito interpôs recurso devidamente motivado o arguido JCFS, formulando as seguintes conclusões: 1 - Veio o arguido requerer ao Meritíssimo Juiz o aditamento de testemunha, tendo o Meritíssimo Juiz indeferido, de que se recorre, por estar inibido da busca da verdade material.
2- O despacho viola claramente regras constitucionais, 12°, 13°, 16°, 17º, 18º, 20º, 21º, 25º, 26º, 27º, 29º, 30º, 32º, 51º e 52º da CRP.
3- Foram violados os artigos 609°, 615° do CPC; artigos 116°, n° 1 e 117-B, n° 1 e 2 do CRP, 2078° do C. C., art.30, n° 3 do CPC, 12°, 13°, 16°, 17°, 18°, 20°, 21°, 25°, 26°, 27°, 29°, 30°, 32°, 51°, 52°, da CRP) e) artigos 8°) 311, n° 3 a) do CPP, 302, n° 1, 292, 299, 316 ° do CPP.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente nos termos legais.
Assim se fará a devida justiça! O recurso interposto do despacho de 19/12/2017 foi admitido com subida nos próprios autos, juntamente com o recurso interposto da decisão final e efeito devolutivo.
No processo identificado supra, foi proferida sentença, em 5/1/2018, com o seguinte dispositivo: Face ao exposto, julgo a acusação totalmente procedente, por provada e, em consequência: a) - Condeno o arguido JCFS como autor material de um crime de desobediência, previsto e punido pelo artigo 348.°, n.º 1, alínea b), do Código Penal, na pena de 80 (oitenta) dias de multa, à razão diária de 5€ (cinco euros), ou seja, na multa de 400€ (quatrocentos euros).
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- Condeno ainda o arguido no pagamento de 2 (duas) UC de taxa de justiça, e demais encargos com o processo.
Com base nos seguintes factos, que então se deram como provados: 1. No dia 25 de Maio de 2013, pelas 11 horas, na rua da I…, em C……., P…….., a Guarda Nacional Republicana procedeu à apreensão, nos termos do art. 162°, n° 1, al. f), do Código da Estrada, do veículo automóvel ligeiro de passageiros, matricula……. propriedade da ………………………, SA, por circular na via pública sem possuir seguro de responsabilidade civil.
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O arguido ficou com o dito veículo como fiel depositário, com a obrigação de o não utilizar ou alienar por qualquer forma, de o entregar quando tal lhe fosse exigido, tendo sido notificado de que a utilização ou alienação do veículo o faria incorrer no crime de desobediência.
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Porém, pese embora tal notificação, o arguido, no dia 5 de Setembro de 2013, pelas 17 horas, no ….., ao Km ……. junto a ……, em ……………a, circulava no dito veículo onde foi surpreendido numa acção de fiscalização das mesmas forças policiais.
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Ao ser notificado naquela data, teve o arguido pleno conhecimento das obrigações que sobre si impendiam, nomeadamente, a não utilização ou alienação do veículo, bem como teve consciência da ordem que lhe foi dada e das consequências em que incorria caso não a observasse.
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Agiu com o firme propósito de usar o veículo, bem sabendo que o mesmo se encontrava apreendido, que tal apreensão tinha sido efectuada por autoridade competente e que por isso não o podia conduzir, agindo com o claro intuito de desrespeitar a ordem emanada da autoridade competente.
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O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal.
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O arguido não tem antecedentes criminais.
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Vive sozinho em casa própria.
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Exerce a profissão de taxista esporadicamente.
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Estudou até ao 4° ano de escolaridade.
Mais se provou da Certidão Permanente da Empresa……………e da Certidão de Nascimento de ……………………….., juntas aos autos, respectivamente a fls. 513 a 518 e 520 11. O arguido foi administrador único da mencionada sociedade entre a data da sua constituição e a data de renúncia a 20-12-2006.
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Em 16-09-2009 e até ao cancelamento da matrícula da sociedade, que ocorreu em 15-09-2016 foi administrador único da mencionada sociedade BSSS.
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BSSS, nascida a ………. é filha do ora arguido.
Da referida sentença o arguido JCFS veio interpor recurso com devida motivação, tendo formulado as seguintes conclusões: 1- O Sr Juiz não deveria dado como provado os factos provados na sentença 1 a 6, por não ter feito prova da mesma em audiência e julgamento.
2- E deveria ter dado como provado o vertido na contestação do arguido.
3- Com base nas declarações da arguido, obtém-se uma versão, de que a sua conduta nunca foi dolosa, que o arguido teve uma conduta de defesa da posse, perante ordem ilegal.
3- O arguido não tinha o carro a transgredir qualquer regra estradal, pelo que as autoridades não deveriam ter intervindo.
4- O arguido não estava a conduzir, não desobedeceu:
a) Ordem ou mandado, a ordem era ilegal, por inexistir violação regra de trânsito; b) Legalidade substancial e formal da ordem ou mandado; c) Competência da autoridade ou funcionário para a sua emissão; d) Regularidade da sua transmissão ao destinatário; 5- Pelo que se não verificam os pressupostos de crime de desobediência. - tinha seguro.
6- Além de que o Tribunal ultrapassou os limites na livre apreciação da prova testemunhal e documental, nos termos do art. 128°, 129° e 355 do CPP, devendo ter dado como provado o inexistir de intenção dolosa do arguido em desobedecer.
7- Os restantes documentos não foram confirmados na audiência, não tendo qualquer valor probatório, nos termos do n° 1 do art. 355° do CPP.
8- Em nome do princípio m dubio pro reo o arguido deveria ter sido absolvido por falta de prova, nos termos do art. 32 n° 2 da CRP, 14, n° 2 do pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, art. 6 n° 2 da Convenção Europeia para a protecção dos Direitos e Liberdades Fundamentais e art. 11° da Declaração Universal dos Direitos do Homem.
9- Além de que o Tribunal ultrapassou os limites na livre apreciação da prova testemunhal e documental, nos termos do art. 128, 129 e 355 do CPP.
10- O tribunal violou os artigos 3° e 32 n° 2 da CRP, n° 1 do art. 355° do CPP, art. 128° n° 1 do CPP, art. 129 n° 1 e n° 2 do CPP, n° 2 do art. 374° do CPP, art. 11 da Declaração Universal dos Direitos do Homem, art. 6 n° 2 da Convenção Europeia para a protecção dos Direitos e Liberdades Fundamentais e art. 14 n° 2 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, art. 348° do CP.
11- Deveria o Tribunal, como único silogismo e corolário lógico objectivo acordado em absolver o arguido, face à falta de prova e presunção da sua inocência.
12- Deveria o Tribunal aplicar ao arguido uma pena diferente, nomeadamente, mais reduzida, atento o inexistir de precedentes, quanto ao mesmo.
Termos em que deve a sentença recorrida ser revogada, absolvendo-se o arguido.
Assim se fará a devida JUSTIÇA! O recurso interposto da sentença foi admitido com subida imediata nos próprios autos, e efeito suspensivo.
O MP respondeu à motivação do recorrente, pugnando pela manutenção do decidido, mas sem formular conclusões.
A Digna Procuradora-Geral Adjunta junto desta Relação emitiu parecer sobre o mérito do recurso, defendendo a respectiva improcedência.
O parecer emitido foi notificado ao arguido, a fim de se pronunciar, o que ele não fez.
Foram colhidos os vistos legais e procedeu-se à conferência.
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Fundamentação Nos recursos penais, o «thema decidendum» é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, as quais deixámos enunciadas supra.
Encontramo-nos perante dois recursos, interpostos pelo mesmo arguido, um deles visando um despacho interlocutório proferido em audiência de julgamento, que lhe indeferiu, por extemporâneo, um aditamento ao rol de testemunhas e o outro a sentença condenatória.
A sindicância da sentença recorrida, expressa pelo recorrente nas suas conclusões, desdobra-se nas seguintes questões:
a) Impugnação da matéria de facto, com pedido de absolvição do arguido da acusação; b) Subsidiariamente, impugnação da medida da pena aplicada.
Ainda que o recurso interposto do despacho interlocutório não questione a validade do processado anterior à sentença, a sua procedência é susceptível, pelo menos em abstracto, de...
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