Acórdão nº 250/18.3T9STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 18 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelANA BACELAR CRUZ
Data da Resolução18 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação do Évora I.

RELATÓRIO Nos autos de instrução que, com o n.º 250/18.3T9STR, correm pelo Tribunal da Instrução Criminal de Santarém da Comarca de Santarém, em 18 de setembro de 2019, foi proferida decisão judicial que considerou ocorrer renúncia tácita a queixa apresentada contra uma das pessoas neles denunciada pela prática, em comparticipação, de um crime de difamação, previsto e punível pelos artigos 180.º, n.º 1, 182.º e 183.º, n.º 2, todos do Código Penal.

E, em consequência, ordenou-se a notificação dos Arguidos nos termos e para os efeitos previstos no n.º 3 do artigo 51.º do Código de Processo Penal.

Inconformado com tal decisão, o Assistente HH dela interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [transcrição]: «1ª – Em sede de inquérito, o Ministério Público entendeu não terem sido recolhidos indícios da prática de crime pelo arguido BB, expressamente indicando as disposições legais em que se baseou para tanto, os artigos 71.º, n.ºs 1 e 3 e 35.º n.º 1 da Lei da Televisão – “o diretor referido no artigo 35.º apenas responde criminalmente…”, “Cada serviço de programas televisivo deve ter um diretor responsável pela orientação e supervisão do conteúdo de emissões.”; 2ª – Nesse seguimento, o assistente não deduziu acusação particular contra o arguido BB, e no subsequente despacho de arquivamento quanto a tal arguido, o Ministério Público deixou consignado que “a sua abstenção de acusar BB não pode ter-se por injustificada, na medida em que, como demos a entender a fls. 203, a Lei da Televisão e dos Serviços Audiovisuais a Pedido não estende a responsabilização criminal pelos conteúdos de um programa televisivo como aquele em apreço nos autos ao Diretor Geral do canal de televisão, posição exercida precisamente pelo arguido BB”; 3ª – Resultou do inquérito que aquele arguido não teve qualquer comparticipação nos factos em apreço, isto é, não teve qualquer intervenção (participação) na prática do crime, posição expressamente assumida pelo Ministério Público em sede de inquérito e com o que veio o assistente a concordar nesse passo e quanto a tal arguido, deduzindo acusação particular apenas contra os restantes; 4ª – Não foi invocado, defendido ou decidido em sede de instrução que aquele arguido tenha efetivamente comparticipado nos factos em apreço ou que disso haja qualquer indício, pelo que não há qualquer desistência de queixa relativamente a um dos comparticipantes nem isso aproveita ou pode aproveitar aos demais arguidos; 5ª – De outra forma e vingando o entendimento perfilhado na decisão recorrida, antes acaba por traduzir um convite/imposição da prática de atos perfeitamente inúteis, preconizando-se deva o assistente acusar também o arguido que o inquérito revelou não ser comparticipante, e para que venha este a ser injustificadamente sujeito a julgamento ou instrução; 6ª – O assistente não se absteve de acusar quem nos factos tenha comparticipado; 7ª – O assistente foi notificado para, querendo, deduzir acusação particular, não para deduzir ou fundamentar qualquer arquivamento (que os próprios autos justificam), para o que nem sequer tem legitimidade, nem aquela invocação cabe ou pode caber numa acusação particular (artigos 285.º e 283.º 3, 7 e 8 do CPP); 8ª – Atendendo à investigação e às especificidades que os autos revelam, não há nem pode considerar-se qualquer desistência de queixa que aproveite os demais arguidos, devendo assim a decisão proferida, que violou o disposto nos artigos 115.º, 116.º e 117.º do CP, 285.º e 283.º do CPP, ser revogada e substituída por outra que determine o prosseguimento dos autos relativamente a todos os restantes arguidos.

E assim será feita JUSTIÇA!» O recurso foi admitido.

Respondeu o Ministério Público, junto do Tribunal recorrido, formulando as seguintes conclusões [transcrição]: « 1.ª Em crimes de natureza particular, o Assistente pode deduzir acusação independentemente da do MP e, no caso de procedimento dependente de acusação particular, ainda que aquele a não deduza (artigo 69.º n.º 2 alínea b) do Código de Processo Penal).

  1. Trata-se de uma exceção ao n.º 1 do mesmo preceito legal, segundo o qual os Assistentes têm a posição processual de colaboradores do MP, a cuja atividade subordinam a sua intervenção no processo, salvas as exceções da lei.

  2. Por outra forma, fez-se entender o STJ no AUJ n.º 5/2011 de 11 de março, publicado no DR n.º 50, série I, de 11-03-2011, quanto a parte dos poderes do Assistente sem dependência da subordinação ao MP quando fixou a seguinte jurisprudência: 4.ª “Em processo crime público ou semipúblico, o assistente que não deduziu acusação autónoma nem aderiu à acusação pública pode recorrer da decisão de não pronúncia, em instrução requerida pelo arguido, e de sentença absolutória, mesmo não havendo recurso do Ministério Público.” 5.ª Perante tal jurisprudência, dúvidas não há que, mesmo em casos de crimes públicos e semipúblicos em que, normalmente, poderá cair-se mais facilmente no erro da subordinação permanente à atividade do MP por parte do Assistente, tal subordinação é, muitas vezes, mitigada ou, mesmo, inexistente em certas fases do processo penal.

  3. Defende-se, por isso, nesta resposta, a tese segundo a qual o Assistente poderá, em caso de crime particular, deduzir acusação apenas quanto a alguns indivíduos por si denunciados anteriormente, sem que tal signifique renúncia ao direito de queixa contra todos os denunciados em caso de comparticipação.

  4. Bastando, para tal, que explique sinteticamente e no local próprio (no momento em que deduz acusação particular) a razão pela qual o não faz, sem que tal signifique falta de legitimidade do Assistente para o efeito, sendo certo que, também por este meio, o Assistente sempre logrará evitar a prática de qualquer ato inútil.

  5. Daqui se retira que o despacho sob recurso deverá ser mantido na íntegra, por ter feito correta interpretação e aplicação da Lei e do Direito.

Mas V. Excelências, Senhores Juízes Desembargadores farão, como sempre JUSTIÇA!!!» Responderam os Arguidos JP e JF, junto do Tribunal recorrido, formulando as seguintes conclusões [transcrição]: «I – O procedimento criminal aqui em causa, de natureza particular, depende da verificação de diversos requisitos processuais, designadamente: apresentação de queixa, constituição de...

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