Acórdão nº 5/02.7ZRCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Maio de 2009
Magistrado Responsável | VASQUES OSÓRIO |
Data da Resolução | 20 de Maio de 2009 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
-
RELATÓRIO No 1º Juízo do Tribunal Judicial da comarca do ....., mediante acusação do Ministério Público, foram submetidos a julgamento, em processo comum com intervenção do tribunal colectivo, os arguidos, A...
, casado, empresário, residente na Covilhã, F..., casada, residente no ....., J..., casado, operário têxtil, nascido na Covilhã e aí residente, S..., solteiro, , residente em Alçaria, ....., E..., viúva, doméstica, residente no ..... e, M..., casado, taxista, ; - Um crime de auxílio à imigração ilegal agravado, na forma continuada, p. e p. pelo art. 134º, nºs 1 e 2, do Dec. Lei nº 244/98, de 8 de Agosto (com as alterações introduzidas pelo Dec. Lei nº 4/2001, de 10 de Janeiro) com referência aos arts. 13º, 14º, 33º, 34º, 36º e 136º, do mesmo diploma e ao art. 30º, nº 2, do C. Penal [posteriormente p. e p. pelo art. 134º-A, nºs 1 e 2, do mesmo diploma, com a redacção do Dec. Lei nº 34/2003, de 25 de Fevereiro, e actualmente p. e p. pelo art. 183º, nºs 1 e 2, da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho]; - Um crime de angariação de mão-de-obra ilegal agravado, na forma continuada, p. e p. pelo art. 136º-A, nºs 1 e 2, do Dec. Lei nº 244/98, de 8 de Agosto (com as alterações introduzidas pelo Dec. Lei nº 4/2001, de 10 de Janeiro), com referência aos arts. 13º, 14º, 33º, 34º, 36º e 136º, do mesmo diploma e ao art. 30º, nº 2, do C. Penal [posteriormente p. e p. pelo art. 136º-A, nºs 1 e 2, do mesmo diploma, com a redacção do Dec. Lei nº 34/2003, de 25 de Fevereiro, e actualmente p. e p. pelo art. 185º, nºs 1 e 2, da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho]; - Um crime de lenocínio agravado, na forma continuada, p. e p. pelos arts. 30º, nº 2 e 170º, nºs 1 e 2, do C. Penal [actualmente, p. e p. pelo art. 169º, nºs 1 e 2, b) e d), do C. Penal].
Por acórdão de 18 de Julho de 2008, foi decidido: - Absolver todos os arguidos da prática do acusado crime de auxílio à imigração ilegal agravado, na forma continuada, da prática do acusado crime de angariação de mão-de-obra ilegal agravado, na forma continuada, e da prática do acusado crime de lenocínio agravado, na forma continuada; - Condenar cada um dos arguidos, A..., F..., J..., S... e E..., pela prática, em co-autoria, de um crime de lenocínio simples, na forma continuada – resultante da convolação do acusado crime de lenocínio agravado – p. e p. pelo art. 170º, nº 1, do C. Penal, na pena de dois anos e seis meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período.
* Inconformado com o acórdão, dele recorre o arguido A..., formulando no termo da sua motivação as conclusões que se transcrevem: “ (…).
-
A condenação de todos recorrentes, está alicerçada nos depoimentos para memória futura, previstos no artigo 271º do C.P.P.
-
Estatui o n.º 1 do artigo 271º do C.P.P., "Em caso de doença grave ou deslocação para o estrangeiro de uma testemunha, que previsivelmente a impeça de ser ouvida em julgamento. " os pressupostos em que devem ser prestados tais depoimentos.
-
Tendo em conta o teor da informação prestada pelo SEF de fls 2693 e 2694, que nenhuma daquelas circunstâncias se verifica, ou seja, não se trata de ocorrência de doença grave ou da possibilidade ausência para o estrangeiro.
-
Com efeito, com excepção da testemunha B..., que o SEF informa desconhecer a sua localização, todas as restantes testemunhas se encontravam em Portugal à data da realização do julgamento, algumas delas com o processo de expulsão administrativa, pendente dos presentes autos.
-
Encontram-se nesta circunstância as testemunhas, C..., D... e Z....
-
As testemunhas E..., G... e H..., tinham autorização de permanência válida, respectivamente, até 20/07/08, 03/08/09 e 22/06/2012.
-
Verifica-se assim que, todas as testemunhas referidas poderiam e deveriam ter comparecido na audiência de julgamento, pelo que a prestação de depoimento para memória futura, por ausência de fundamento legal, não poderá servir de alicerce para a fundamentação da matéria de facto dada como provada.
-
Verifica-se assim que, todas as testemunhas referidas poderiam e deveriam ter comparecido na audiência de julgamento, pelo que a prestação de depoimento para memória futura, por ausência de fundamento legal, não poderá servir de alicerce para a fundamentação da matéria de facto dada como provada.
-
Ora, como resulta do douto acórdão recorrido, o mesmo, não aprecia as questões suscitadas pelos arguidos, na 3ª sessão da audiência de julgamento, dia 6-11-2008, quanto à legalidade de tais depoimentos.
-
Por outro lado, para que se encontrem preenchidos os requisitos exigidos pelo n.º 1 do artigo 170º do Código Penal, à data dos factos, era necessário que se provasse que os arguidos, "profissionalmente ou com intenção lucrativa, fomentavam, favoreciam ou facilitavam o exercício por outra pessoa de prostituição ou prática de actos sexuais de relevo".
-
Refere o Acórdão da Relação de Coimbra de 18 de Junho de 1996, Secção Criminal, "Não comete o crime de lenocínio a pessoa que arranja uma casa, onde as prostitutas se juntam e são escolhidas por clientes, e lucra com o aluguer de quartos e venda de bebidas aos procuram o local para com elas manter actos sexuais".
-
Assim, por não se encontrarem preenchidos os requisitos que tipificam o crime de lenocínio, face à jurisprudência do referido acórdão da relação de Coimbra, o presente recurso deve proceder.
-
O douto acórdão recorrido, por errada interpretação, violou o estatuído no n.º 1 do artigo 271º do C. P. P, e artigo 170º do C. P.
-
E por via do supra referido, devem, todos os recorrentes sem excepção, ser absolvidos.
(…)”.
* Respondeu ao recurso o Digno Procurador da República junto do Círculo Judicial da Covilhã, formulando no termo da sua contramotivação as conclusões que se transcrevem: “ (…).
-
Os depoimentos prestados, para memória futura, durante a fase de inquérito, foram ordenados na previsibilidade de que estas testemunhas se deslocassem para o estrangeiro e que não pudessem ser ouvidas em julgamento; 2. Mesmo que, posteriormente, na fase de julgamento, eventualmente se tenha verificado que podiam ser ouvidas em julgamento, essa circunstância não afecta de qualquer ilegalidade a decisão anterior de prestação de declaração para memória futura, que transitou em julgado; 3. Quanto muito, podia ser ordenada ou requerida a comparência dessas testemunhas para serem ouvidas na audiência de julgamento, mas, como se vê, nem os arguidos nem o Ministério Público o requereram nem o Tribunal o ordenou, por não haver fundamento legal para o efeito; 4. Dizem os recorrentes que não se encontrem preenchidos os requisitos exigidos pelo n.º 1 do artigo 170.º do Código Penal, pois era necessário que se provasse que os arguidos, "profissionalmente ou com intenção lucrativa, fomentavam, favoreciam ou facilitavam o exercício por outra pessoa de prostituição ou prática de actos sexuais de relevo"; 5. Mas, foi precisamente isso que foi dado por provado, conforme se alcança do n.º 1 ao n.º 203 dos factos dados por provados pelo douto acórdão; 6. Esta norma incriminadora visa a protecção de um bem jurídico qual seja: para uns, a liberdade individual, no aspecto sexual, e, para outros, o interesse geral da sociedade na preservação da moralidade sexual e do ganho honesto; 7. A incriminação desta conduta é matéria de política criminal, que ao abrigo do princípio da dignidade humana, levou o legislador penal a descriminalizar o rufianismo, mas já não o proxenetismo, ou seja a exploração profissional, ou com intenção lucrativa, de fomento, favorecimento ou facilitação do exercício por outra pessoa de prostituição ou a prática de actos sexuais de relevo; 8. O proxeneta é um mediador, que fomenta, favorece ou facilita a prática da prostituição ou de actos sexuais de relevo, e esta foi a actividade levada a cabo pelos recorrentes, que está sobejamente dada por provada pelo douto acórdão; 9. O citado acórdão do TRC, de 18.06.1996 refere-se a uma situação de rufianismo, que foi descriminalizado pela norma incriminadora em causa, pelo que não é aqui aplicável; 10. Assim, encontrando-se provados factos que tipificam a prática, pelos recorrentes, do crime de lenocínio e não tendo sido violada pelo douto acórdão recorrido qualquer norma penal ou processual penal, deverá ser negado total provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.
(…)”.
* Na vista a que se refere o art. 416º, nº 1 do C. Processo Penal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no qual, expressando o entendimento de que, porque o recurso não tem por objecto a reapreciação da prova gravada, foi interposto para além do prazo de vintes dias, concluiu pela sua rejeição.
Foi cumprido ao disposto no art. 417º, nº 2 do C. Processo Penal, tendo respondido o recorrente, pronunciando-se no sentido da tempestividade do recurso.
Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.
* * * * II. FUNDAMENTAÇÃO.
Dispõe o art. 412º, nº 1 do C. Processo Penal que a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido.
Por isso é entendimento unânime que as conclusões da motivação constituem o limite do objecto do recurso, delas se devendo extrair as questões a decidir em cada caso (cfr. Prof. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, 2ª Ed., 335, Cons. Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6ª Ed., 2007, 103, e Acs. do STJ de 24/03/1999, CJ, S, VII, I, 247 e de 17/09/1997, CJ, S, V, III, 173).
Assim, atentas as conclusões formuladas pelo recorrente, as questões a decidir, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, são: - A omissão de pronúncia quanto à legalidade dos depoimentos para memória futura; - A invalidade da prova que tem por objecto os depoimentos para memória futura; - A falta de preenchimento do tipo do art. 170º, nº 1, do C. Penal.
* Para a resolução destas questões importa ter presente o que de relevante consta da decisão recorrida. Assim:
-
-
No acórdão...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO