Acórdão nº 23/04.OTAVNO.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelORLANDO GONÇALVES
Data da Resolução08 de Outubro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em Conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra.

Relatório Por despacho de folhas 655 a 657, proferido pela Ex.ma Juíza Presidente do Tribunal Colectivo do Tribunal Judicial de Ourém, na acta de audiência de julgamento de 14 de Maio de 2008, foi decidido que a única questão que haverá a debater nessa audiência será a eventual suspensão de pena já imposta ao arguido JF, atenta a nova redacção introduzida pela Lei 59/07 ao art.50.º do Código Penal e, consequentemente, não se procederá nem à audição do ofendido, nem à realização da perícia às faculdades mentais do arguido.

Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal Colectivo, por acórdão proferido a 21 de Maio de 2008, decidiu indeferir o requerido pelo arguido JF e, em consequência, determinam o cumprimento efectivo da pena de três anos e seis meses de prisão que, por acórdão proferido, nestes autos, em 9 de Novembro de 2005, lhe foi imposta, como pena única, resultante do cúmulo jurídico das penas parcelares que lhe foram impostas, pela prática, como autor material, em concurso real, de um crime de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo art.172.º, n.º1 do CP, (pena de dois anos e seis meses de prisão) e de um crime de violação, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 164.º, n.º l, 22.º, 23.º e 73.º do CP (pena de dois anos de prisão).

Inconformado com o despacho proferido de folhas 655 e seguintes e com o acórdão proferido a 21 de Maio de 2008,, deles interpôs recurso o arguido JF, concluindo a sua motivação do modo seguinte:

  1. O art.2/4 do C. P., anterior redacção, já previa a aplicação da lei penal mais favorável, até ao trânsito em julgado da sentença.

b) O art.2/4 do C.P., na actual redacção, prevê a aplicação da lei penal mais favorável, mesmo após o trânsito em julgado; c) A disposição inovadora do artigo 371‑A CPP visa permitir uma audiência, de acordo com as normas legais, a fim de aplicar lei penal mais favorável.

d) Para aplicar a lei penal mais favorável o Tribunal tem que aplicar o "novo" direito aos factos dados como provados, e) Não pode limitar‑se a analisar a verificação ou não dos pressupostos de que depende a suspensão da execução da pena; f) Por ser esse o entendimento a extrair da última parte do artigo 2/4 do C. P.

g) A douta decisão em recurso interpretou e aplicou, incorrectamente, o disposto do art.2/4 C.P. e 371‑A, 343 e 345, do Código de Processo Penal h) A interpretação e aplicação deveria ter sido no sentido de possibilitar declarações sobre os factos, por parte do arguido e testemunhas, i) E, após, aplicar a nova lei aos factos.

Razão porque se requer seja a mesma revogada e substituída por outra que proceda à realização de audiência e aplicação da nova lei aos factos.

O Ministério Público na Comarca de Ourém respondeu ao recurso pugnando pela manutenção do acórdão proferido na sequência da reabertura da audiência.

O Ex. Procurador Geral Adjunto neste Tribunal da Relação emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso e manutenção das decisões recorridas.

Foi dado cumprimento ao disposto no art.417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal.

Colhidos os vistos cumpre decidir.

Fundamentação É o seguinte o teor do despacho recorrido: « No seu requerimento para reabertura de audiência nos termos e para os efeitos do art.371.º A, do C.P.P., o arguido JF suscitou, além do mais, as seguintes questões: 1ª ‑ A eventual aplicação da lei penal no tempo, face às alterações introduzidas no Código Penal, pela Lei 59/07, de 04 de Setembro, e consequentemente à eventual nova configuração dos crimes de abuso sexual de crianças, previsto e punível à data pelo art.172.º, n.º 1, e ao crime de violação p. e p. à data pelo art.164.º, n.º 1; 2ª ‑ A alegada inimputabilidade do arguido.

O Acórdão em lª Instância foi proferido no dia 9 de Novembro de 2005 (fls. 243 a 264).

Por Acórdão proferido no Tribunal da Relação de Coimbra em 12 de julho de 2006 (fls. 337 a 349) foi confirmada a condenação proferida em lª Instância.‑ Por Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido em 22 de Fevereiro de 2007 (fls. 411 a 421) foi julgado inadmissível o recurso que o arguido interpôs daquele outro Acórdão da Relação de Coimbra.‑ O código penal na redacção introduzida pela Lei 59/07 de 04 de Setembro, refere no seu art. 2.º, n.º 4, prevê a possibilidade da alteração da decisão, transitada em julgado, por efeito da sucessão de leis penais no tempo, restrita, exclusivamente, à execução de pena e aos efeitos penais de condenação, de harmonia , aliás, com o disposto com o arto 371.º A, C.P.P., que apenas permite a reabertura da audiência para aplicação da lei mais favorável em concreto, resultante de alteração às leis penais, mas apenas e só quanto à execução da pena já imposta. Nem de outro modo se compaginaria esta possibilidade com o princípio do caso julgado.‑ De qualquer forma, as alterações legislativas consagradas na Lei 59/07 só entraram em vigor no dia 15 de Setembro do mesmo ano, portanto, cerca de 7 meses depois do Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça nestes autos.‑ Nesta sequência, e pela mesma ordem de razões também não haver lugar à apreciação da inimputabilidade do arguido.

A condenação que lhe foi imposta nestes autos traduziu‑se na imposição de 2 penas de prisão, cumuladas na pena única de 3 anos e 6 meses de prisão, o que pressupõe, a vontade livre e consciente do arguido, ou seja a imputabilidade.‑ Transitada que se encontra nesta parte a decisão, não pode este tribunal voltar a apreciar a susceptibilidade do arguido ser sujeito da aplicação de uma pena.‑ Assim sendo, por força do que fica exposto e das disposições conjugadas do art. 2.º, n.º 4, do Código Penal e 371.º A, do C.P.P., nas suas actuais redacções, a única questão que haverá a debater nesta audiência será a eventual suspensão de pena já imposta, atenta a nova redacção introduzida pela Lei 59/07, ao art.50.º do C.Penal e, consequentemente, não se procederá nem à audição do ofendido, nem à realização da perícia às faculdades mentais do arguido.

Notifique.».

* A matéria de facto apurada e respectiva convicção constante do acórdão recorrido é a seguinte: Factos provados 1. Em 9 de Novembro de 2005, o arguido foi condenado como autor material, em concurso real, de um crime de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo art. 172.º n.ºl do...

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