Acórdão nº 346/06.4GTAVR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Janeiro de 2008

Data23 Janeiro 2008
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em audiência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório 1.

No processo comum n.º 346/06.4GTAVR do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Ílhavo, A....foi condenado: pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.º2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de 11 (onze) meses de prisão; pela prática de um crime de desobediência, p. e p. pelo artigo 348.º, n.º1, alínea a), do Código Penal, com referência ao artigo 387.º, n.º2, do Código de Processo Penal, na pena de 2 (dois) meses de prisão. Em cúmulo jurídico, foi condenado na pena unitária de 12 (doze) meses de prisão.

  1. Inconformado com tal sentença, o arguido interpôs o presente recurso, formulando, na motivação, as seguintes conclusões (transcrição): 1 - Por sentença de 26 de Junho de 2007 foi o arguido condenado como autor material, sob a forma consumada, e em concurso real, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art° 3°, n.º 2 do DL n.º 2/98 de 03.01 e de um crime de desobediência, p. p. pelo art° 348°, n.º 1, al. a) do Código Penal, com referência ao art.º 387°, n.º 2 do Código de Processo Penal.

    2 - Ponderando a culpa, as exigências de prevenção geral, as exigências de prevenção especial, considerou a M.ma Juiz a quo "adequada a fixação das penas parcelares de 11 meses pelo crime de condução sem habilitação legal e 2 meses pela prática do crime de desobediência - operando o cúmulo jurídico de tais penas parcelares, nos termos do art.º 77° do Código Penal, tendo em consideração a gravidade dos factos e a personalidade evidenciada pelo arguido, foi o mesmo condenado na pena unitária de 12 meses de prisão.

    3 - Considerou a M.ma Juiz a quo, face às circunstâncias objecto de ponderação, estar excluída a possibilidade de suspensão da execução da pena de prisão.

    4 - Não tendo estado presente na audiência do julgamento efectuado nos presentes autos, o arguido compareceu à leitura da sentença objecto do presente recurso.

    5 - A decisão recorrida sofre de nulidade por omissão de pronúncia já que, tendo o tribunal "a quo" aplicado a pena unitária de 12 meses de prisão e tendo entendido não ser de suspender a execução daquela pena, por os antecedentes criminais do recorrente não possibilitarem a opção por tal pena de substituição, não ponderou, todavia, a substituição da pena aplicada pela pena de substituição prevista no art. 58.º do Código Penal: a prestação de trabalho a favor da comunidade - conforme o doutamente decidido pelos Venerandos Juízes Conselheiros do Supremo tribunal de Justiça por Acórdão de 21 de Junho de 2007 (in ITIJ Bases Jurídico-Documentais, Processo 07P2059, N.º do Documento: SJ200706210020595); 6 - O tribunal não é livre de aplicar ou deixar de aplicar tal pena de substituição, pois não detém uma faculdade discricionária; antes, o que está consagrado na lei é um poder/dever ou um poder vinculado, tal como sucede com a suspensão da execução da pena.

    7 - E não se pode dizer que, se não estavam reunidos os pressupostos para a suspensão da execução da pena, também não estavam reunidos os pressupostos para a sua substituição nos termos do art. 58.º do CP, pois a prestação de trabalho a favor da comunidade não tem a mesma natureza (salvo a de ser também uma pena de substituição), nem as mesmas exigências, nem obedece às mesmas práticas de reinserção social, que a suspensão da execução da pena.

    8 - A não ponderação pelo tribunal "a quo" da possibilidade de substituição da pena aplicada pela pena de prestação de trabalho a favor da comunidade constitui nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do n.º 1, alínea c) do art. 379.° do CPP.

    9 - Essa nulidade pode ser conhecida oficiosamente, mesmo que não tenha sido arguida.

    10 - Nos termos do n.º 1 art. 58.º do CP "se ao agente dever ser aplicada pena de prisão em medida não superior a 1 ano, o tribunal substitui-a por prestação de trabalho a favor da comunidade, sempre que concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição".

    11- Uma vez verificados os respectivos pressupostos, o tribunal não pode deixar de aplicar a pena de substituição.

    12 - Esses pressupostos são os seguintes: ser de aplicar pena de prisão em medida não superior a 1 ano; ser de concluir que a substituição da pena de prisão por trabalho a favor da comunidade satisfaz as finalidades da punição.

    13- Se é inquestionável que o tribunal “a quo" considerou expressamente, ainda que de forma sumária, que a substituição da pena aplicada por pena de suspensão da execução da pena não encontrava fundamento por não estarem reunidos os respectivos pressupostos, sobretudo em atenção aos antecedentes criminais do recorrente, a verdade é que não ponderou de todo a possibilidade de substituição da pena aplicada por trabalho a favor da comunidade.

    14 - Ora, não tendo o tribunal "a quo" emitido pronúncia acerca dessa pena de substituição, cometeu a nulidade prevista no art. 379.°, n.º1, alínea c) do CPP - nulidade que pode ser conhecida oficiosamente em recurso nos termos do n.º 2 do mesmo artigo e art. 425.°, n.º 4, ambos do mesmo diploma legal.

    15 - Com a revisão introduzida pela Lei n.º 59/98, de 25-08, foi aditado ao mencionado preceito o seu actual n.º 2, que, para além de consagrar na lei o entendimento jurisprudencial anterior (expresso no Ac. do Plenário das Secções Criminais do STJ n.º 1/94, DR I-A, de 11-02-94) de que as nulidades da sentença enumeradas no n.º 1 desse artigo não têm de ser arguidas necessariamente nos termos estabelecidos na al. a) do n.º 3 do art. 120.° do CPP, podendo sê-lo em motivação de recurso para o tribunal superior, veio impor (com a expressão «ou conhecidas em recurso») o conhecimento de tais nulidades pelo tribunal ad quem, independentemente de arguição (cfr. Ac. do ST J de 22-03-01, Proc. n.º 353/01 - 5.ª, de 18-10-01, Proc, n.º 3066/01 - 5.ª, de 06-02-02, Proc. n.° 4106/01 - 3.ª, e de 14-05-03, Proc. n.º 518/03 - 3.ª).

    16 - Nestes termos, tendo em conta as considerações supra expostas, no seguimento do doutamente decidido pelos Venerandos Juízes Conselheiros no Acórdão de 21-06-2007, deve ser considerada nula a decisão recorrida por omissão de pronúncia quanto à possibilidade de substituição da pena aplicada ao arguido por trabalho a favor da comunidade para que o tribunal “a quo” se pronuncie sobre tal questão, se necessário com produção de prova suplementar.

  2. O recurso foi admitido, tendo respondido o Ministério Público no sentido da improcedência.

  3. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer, pronunciando-se, a fls. 110 e 111, no sentido de que o recurso não merece provimento, entendendo, porém, que o crime de desobediência se encontra descriminalizado, face à nova redacção do artigo 387.º, do Código de Processo Penal.

  4. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º2, do Código de Processo Penal, foram colhidos os vistos, após o que realizou-se a audiência nos termos legais.

    II – Fundamentação 1.

    Conforme jurisprudência constante e pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (entre muitos, os Acs. do S.T.J., de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242; de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271).

    Muito embora tenha havido gravação da...

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