Acórdão nº 21/03.1 GTGRD-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Janeiro de 2008

Magistrado ResponsávelJORGE GONÇALVES
Data da Resolução16 de Janeiro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório 1.

No processo n.º 21/03.1GTGRD, do Tribunal Judicial de Celorico da Beira, A..

.foi condenado, por sentença de 14 de Fevereiro de 2003, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelos artigos 292.º, n.º1 e 69.º, n.º1, alínea a), do Código Penal, na pena de oito meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de quatro anos.

2.

Por despacho de 9 de Julho de 2007, o tribunal a quo, invocando que o ora recorrente tinha sido condenado pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez cometido no decurso do prazo de suspensão, decidiu revogar a suspensão da execução da pena de prisão que lhe havia sido aplicada no âmbito deste processo, determinando o cumprimento da pena de prisão de oito meses 3.

Inconformado, recorreu A...desse despacho, concluindo a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): «1.ª Em 2003 - nestes autos - foi o arguido condenado a oito meses de prisão, pena suspensa por 4 anos.

  1. Transitou a sentença.

  2. Em 11 de Julho de 2006 transitou em julgado o Acórdão desta Relação que manteve a pena de 10 meses de prisão no processo 158/05.2 TBGRD - sentença da Guarda.

  3. Esta pena foi agravada e não suspensa por ter o arguido para além do mais a pena suspensa nestes autos.

  4. Ou seja: foi tida na devida conta esta condenação.

  5. Cumprir a pena que havia sido suspensa representa mesmo uma violação do princípio “ne bis in idem”.

  6. Voltar à cadeia é socialmente inaceitável, humanamente degradante e moralmente injusto, 8.ª Até porque o T.E.P. o considerou em condições de poder retomar a vida e o trabalho.

  7. A solução legal passaria sempre por manter a suspensão da pena ou 10.ª Sem prescindir, realizar o cúmulo jurídico.

  8. Existe violação do instituto da revogação da suspensão e, bem assim, do artigo 56° do C. Penal, 12.ª E má interpretação do regime do concurso de coimas - artigo 77° do C.P .

  9. Além disso já não se verifica a necessidade da revogação da suspensão por ter acabado de cumprir uma pena de 10 meses de prisão.

Revogando-se o douto despacho, mantendo-se a suspensão ou, sem prescindir, ser feito o cúmulo jurídico se fará JUSTIÇA.» 4.

O recurso foi admitido e o Ministério Público junto do tribunal a quo respondeu, sustentando a sua improcedência.

5.

Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso deverá merecer provimento, concluindo da seguinte forma: «Face ao exposto, somos pois de parecer que o recurso do arguido deverá obter provimento, revogando-se assim o despacho que lhe revogou a suspensão da pena e determinou o cumprimento da mesma, o qual deverá ser substituído por outro que determine a audição pessoal do arguido, convocando-o para o efeito, bem assim possa eventualmente proceder a outras diligências mais precisas conducentes a determinar a sua exacta postura face à suspensão da pena que lhe foi concedida.» 6.

Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º2, do Código de Processo Penal (diploma doravante designado de C.P.P.), foram colhidos os vistos, após o que o processo foi à conferência, cumprindo apreciar e decidir.

II – Fundamentação 1.

Conforme jurisprudência constante e pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.

Assim, as questões a decidir consistem em saber: se, com o fundamento do artigo 56.º, n.o1, alínea b) do Código Penal, estará ou não correcta a revogação da suspensão da execução da pena de prisão imposta ao recorrente; se o cumprimento de tal pena representa uma violação do princípio “non bis in idem”; se deverá ser realizado cúmulo jurídico de penas.

2.

Os elementos relevantes para a decisão são os seguintes: 1) Por sentença de 14 de Fevereiro de 2003, transitada em julgado, o recorrente foi condenado, no processo n.º 21/03.1GTGRD, do Tribunal Judicial de Celorico da Beira, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelos artigos 292.º, n.º1 e 69.º, n.º1, alínea a), do Código Penal, na pena de oito meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de quatro anos.

2) Em 30 de Janeiro de 2006, no âmbito do Processo Abreviado n.º 158/05.2 GTGRD, que correu seus termos pelo Tribunal Judicial da Guarda, foi o recorrente condenado, por sentença que transitou em julgado, pela prática, em autoria material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292.º, do Código Penal, na pena de dez meses de prisão, por factos ocorridos no dia 29 de Setembro de 2005.

3) Em 9 de Julho de 2007, o M.mo Juiz a quo proferiu o seguinte despacho: «Compulsado o CRC de fls. 79-83, bem como a certidão de fls. 61-74, constata-se que, no decurso do prazo de suspensão da pena de prisão que lhe foi aplicada nos presentes autos, o condenado cometeu e veio a ser condenado pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, precisamente o mesmo tipo crime por cuja prática foi condenado nestes autos.

Ora, é manifesto que, no caso vertente, a simples censura do facto e a mera ameaça da prisão não se mostraram suficientes nem adequadas para realizar as finalidades da punição.

Assim sendo e perante a desnecessidade de operar contraditório em casos como o dos autos (cfr. fls. 77), ao abrigo do disposto no art. 56.°, n.º 1, al. b), do Código Penal, revogo a suspensão da execução da pena de prisão e, consequentemente, determino que o condenado cumpra a pena de 8 meses de prisão que lhe foi aplicada nestes autos.

Notifique.

Oficie como promovido e, após trânsito: a) no caso de o condenado já ter cumprido a pena de prisão que lhe foi aplicada no Processo referido a fis. 61, emita os competentes mandados de detenção e condução; b) no caso de não ter ainda cumprido, oficie ao Processo referido a fis. 61 para que, quando o arguido terminar o cumprimento da pena em que aí foi condenado, ser colocado à ordem destes autos, a fim de cumprir a pena de 8 meses de prisão » 4) Anteriormente, o M.mo Juiz havia proferido o seguinte despacho: «FIs.75: Salvo o devido respeito por entendimento diverso, é nosso entendimento que, diferentemente do que sucede quanto à infracção grosseira ou repetida dos deveres ou regras de conduta ou do plano individual de readaptação social, em que tal conduta poderá ser susceptível de justificação, aceitável, ou não, do condenado, nos casos em que o condenado comete novo crime doloso no decurso do prazo de suspensão - e, para mais, o mesmo tipo de crime -, a sua audição é perfeitamente inútil e, como tal, não há que operar qualquer contraditório.

Assim sendo, solicite novo CRC do arguido e, uma vez junto, abra vista ao Ministério Público.» 5) No decurso do cumprimento da pena de 10 meses de prisão aplicada ao ora recorrente no processo mencionado supra sob o n.º2, cumprido o mínimo legal, foi-lhe concedida a liberdade condicional, em Abril de 2007, até ao termo da pena previsto para 16.08.2007 3.

Decidindo 3.1.

Enquadramento geral 3.1.1. Estando em causa, no presente recurso, a revogação de uma suspensão da execução de pena de prisão, mostra-se conveniente começar por tecer algumas considerações, ainda que breves, sobre o regime e natureza desta pena. O artigo 50.º, n.º1, do Código Penal (doravante designado de C.P.), na redacção vigente à data da condenação do recorrente, dispunha: «O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente...

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