Acórdão nº 720/08.1TACBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA JOSÉ NOGUEIRA
Data da Resolução07 de Março de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

45 I. Relatório 1. No âmbito do processo comum n.º 720/08.1TACBR da Comarca do Baixo Vouga – Albergaria – A – Velha – Juízo de Instância Criminal, realizado o julgamento, por acórdão de 03.06.2011 decidiu o Tribunal Colectivo: “a) absolver o arguido A...

do crime de abuso de confiança de que vem pronunciado (p. e p. pelo artigo 205º, n.ºs 1 e 4, alínea a), do C. Penal); b) condenar os arguidos A...

, B...

, C...

, D...

e E...

pela prática, em co-autoria material, de um crime de fraude fiscal qualificada, previsto e punido pelos artigos 103º, nº 1, e 104º, nºs 1 e 2, do RGIT (aprovado pela Lei 5/2001, de 05-06), o primeiro na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão e cada um dos restantes na pena de 2 (dois) anos de prisão, todas suspensas na sua execução pelos períodos correspondentes de 1 (um) ano e 6 (seis) meses e de 2 (dois) anos, respectivamente (a contra do trânsito em julgado); c) condenar as arguidas W... – Moldes, Lda, UU…, Lda, e ZZ…, pela prática, igualmente em co-autoria material de um crime de fraude fiscal qualificada previsto e punido pelos artigos 7º, nº 1, 103º, nº 1, e 104º, nºs 1 e 2, do RGIT (aprovado pela Lei 5/2001, de 05-06), cada uma delas na pena de 400 (quatrocentos) dias de multa, sendo quanto à primeira da taxa diária de € 05,00, no total de € 2.000,00 (dois mil euros), e quanto à segunda e terceira à taxa diária de € 30,00, no total de € 12.000,00 (doze mil euros); (…).” 2. Inconformado com o, assim, decidido recorreu o arguido E..., extraindo da motivação as seguintes conclusões: 1. O douto acórdão não procedeu, como lhe está imposto ao exame crítico das provas que serviram para formar a sua convicção, sendo certo que é desta correcta indicação que se entende qual o raciocínio lógico do tribunal para apurar os factos.

2. E, prescreve o artigo 379º, n.º 1, alínea a), do C.P.P., que é nula a sentença que não contiver as menções referidas no artigo 374º, n.º 2, do C.P.P., as quais respeitam ao teor da fundamentação da sentença, sendo a nulidade de conhecimento oficioso em sede de recurso.

3. Ora, no acórdão ora posto em crise, tendo como indicação “a formação da convicção do Tribunal Colectivo teve por base a análise global da prova produzida em audiência, em conjugação e confronto, analisada e valorada segundo as regras da experiência comum e a lógica das coisas …”.

4. Na verdade, do texto da douta decisão constam meras referências genéricas a cada um dos depoimentos, não sendo contudo “criticamente” valorados.

5. Bem como, não faz referência aos depoimentos de algumas testemunhas, não explicando o porque de não os ter valorado.

6. Além de que omite as declarações do arguido A..., não explicando igualmente o porque de não o ter valorado.

7. Não havendo qualquer fundamentação “critica” aos diversos relatórios mencionados, não sendo valorado o seu conteúdo e teor, logo, não aferindo a sua credibilidade.

8. Temos por claro que a fundamentação apresentada na douta decisão recorrida, ou melhor dizendo, a respectiva ausência, não satisfaz o dispositivo legal em análise (art. 374º, n.º 2 do C.P.P.), tal como temos por imprescindível, sobretudo o exame critico dos relatório, cuja análise nos parece susceptível de pôr em causa o nexo de causalidade entre as condutas alegadamente praticadas e o crime em causa, já que se constata a presença de um elemento influenciador ou potenciador, e ainda da prova que serviu de suporte ao elemento subjectivo do crime – o dolo, entendido como dolo directo.

9. O Tribunal a quo devia, nos termos da lei, ter ponderado toda a prova produzida, tê-la analisado e examinado criticamente e só depois desse exame podia, de forma coerente, lógica e sobretudo garantística dos direitos fundamentais do recorrente, formar a sua convicção, devidamente sustentada nos meios probatórios no seu todo, e não de forma selectiva e insuficiente.

10. Pelo que, e desde logo, ofendeu, de forma directa e intolerável os direitos e garantias do arguido, com consequente violação do art. 32º, nº. 1 da Constituição da República Portuguesa.

11. Para além de que, com tal simplista e insuficiente indicação, não cumpre o douto acórdão recorrido, o disposto no art. 374º, n.º 2 do C.P.P., enformando do vício constante no disposto no artigo 379, nº 1, al. a) do C.P.P.; 12. De acordo com a decisão condenatória os arguidos obtiveram uma vantagem patrimonial ilegítima de € 28.805,81, sendo deste valor € 23.25,05 a título de IRC.

13, Contudo, em momento algum é mencionado qual a forma como se chegou a este valor de vantagem patrimonial ilegítima.

14. Além de não referir qual a taxa, também não é possível com os elementos existentes no processo saber qual o ganho obtido pela arguida W..., com a inclusão das facturas falsas na sua contabilidade.

15. A prova pericial é a única admissível como meio de prova quando a percepção ou a apreciação dos factos exija especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos, como é o presente caso.

16. Conforme tem vindo a ser entendimento da jurisprudência dos tribunais superiores, a violação da norma do artigo 163º do Código de Processo Penal é causa de anulação do julgamento.

17. Pelo exposto, deve ser anulado o julgamento para que, em novo julgamento, seja observado o disposto nos artigos 158º e 163º do C.P.P.

18. Daí que da conjugação do preceituado nos artigos 379º, nº 1, al. a), e 374º, nº 2 do Código de Processo Penal e ao abrigo do preceituado no artigo 426º, nº 1, do mesmo Código haja lugar ao reenvio do processo para novo julgamento relativamente à questão concreta que deixamos referida.

19. Por assim ser, e entendendo o recorrente que este exame implícito do tribunal não é correcto mais recorre da matéria de facto, pelo que se passa a invocar e valorar criticamente tal prova.

20. Antes de mais cumpre referir que, nenhuma das testemunhas arroladas e ouvidas na audiência, presenciou a prática dos factos imputados ao arguido.

21. De todos os outros meio de prova invocados, nomeadamente depoimento de outras testemunhas e prova documental junta aos autos e valorada para o efeito, nada resultou que pudesse implicar o arguido nos factos, bem pelo contrário no que diz respeito ao depoimento da testemunha ..., conforme abaixo demonstraremos, 22. Salvo o devido respeito, o Tribunal “a quo” julgou incorrectamente os seguintes factos, porquanto em relação aos mesmos não foi produzida prova. Senão vejamos, 23. O Tribunal deu como provado no ponto 7 e 8, que, 7) “No início de 1998, os arguidos E... e D..., encetaram contactos com a sociedade W... – Moldes, Lda., e seus gerentes, para fornecimento de aços comercializados pela UU… Portugal, que representavam o primeiro enquanto vendedor e o segundo enquanto gerente”; e 8) Na sequência desses contactos foi acordado entre os arguidos B..., A... e C..., em representação da W..., e os arguidos E... e D..., em representação da UU… Portugal que o aço a adquirir pela W..., seria facturado “seguindo a tabela de preços da ES” sendo a diferença devolvida após pagamento, sem registo contabilístico, através de cheque emitido pela empresa “mãe”, à ordem da W..., dos seus gerentes ou de pessoas da sua confiança, por forma a tais quantias não terem que ser declaradas, para efeitos fiscais, como proveitos ou ganhos desta sociedade e delas poderem fazer uso como entendessem”.

24. Acontece que, da análise da prova produzida resulta que não ficou demonstrado, nem sequer indiciariamente, que o recorrente tenha participado em alguma reunião que tivesse por fim o objectivo de utilizar um “esquema” para defraudar o Estado.

25. A verdade é que não esteve na reunião e não presenciou o que se terá passado na mesma, nem sequer se chegou a haver a dita reunião com esse objectivo.

26. Não se poderá dar como provado que foi nesta dita reunião que foi montado o tal “esquema”, dado que a testemunha ... afirmou que “não sabe o que lá se passou”.

27. Não se poderá dar como provado, conforme foi dado no ponto 8., que o recorrente tenha participado em alguma reunião com vista à elaboração do mencionado plano, e mesmo que se desse como provado que esteve presente numa reunião não se pode afirmar com toda a certeza o que lá foi tratado, e em que termos, quem propôs o quê, quem aceitou o quê … 28. Deste modo, não ficou provado que o recorrente tenha estado presente na reunião e muito menos que tenha sido esse o tema da referida reunião, dado que a testemunha não esteve presente na reunião, tendo-lhe sido unicamente dito, de forma indirecta, pelo único arguido que implica o recorrente nos factos, A… .

29. Pelo exposto, deveria ter sido considerado como provado que o recorrente não tinha participado em todas as vendas que eram feitas pela sua entidade patronal, isto é, havia negócios com a W... que não passavam pelas mãos do recorrente enquanto vendedor, sendo tratados directamente com a sede da entidade patronal.

30. Assim, dúvidas não existem que a haver algum “esquema” o recorrente não tinha qualquer responsabilidade no mesmo, já que ele até continuou a existir depois da sua saída da empresa.

31. Bem como segundo o depoimento da testemunha ... (depoimento prestado no dia 3 de Maio de 2011, conforme acta, (minuto 01.00 até 03.00 e 10.00 até 12.00), que afirmou ao Tribunal que “foi substituir o senhor E... no cargo de vendedora da UU….Potugal”, “não participava nas reuniões de gerência da UU... Portugal, nem tinha conhecimento do que se tratavam nessas reuniões”.

32. Isto é, a testemunha ocupou o lugar de vendedor do senhor E... na UU... Portugal, com as mesmas funções, sendo que esta confirma que nunca participou em nenhuma reunião de gerência nem tinha poderes de decisão.

33. Afirmou igualmente que “não sabia se eram pagas comissões à W...

”, e “nunca lhe foi dito para incluir comissões nos negócios”, “sabia que havia cheques mas não sabia do que se tratavam”, “não sabe à ordem de quem vinham os cheques”, “os cheques vinham directamente da Alemanha, não passavam por mim”.

34. Não é plausível configurar que duas pessoas...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT