Acórdão nº 118/11.4PBCTB.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Maio de 2012

Data09 Maio 2012
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório: 1.

No âmbito do processo n.º 118/11.4PBCTB, o Ministério Público deduziu acusação, no âmbito de processo sumário, contra os arguidos: - A...

, residente na Rua … ; e - B...

, residente na … , aos quais imputou a prática, em co-autoria material, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1, do Código Penal.

* 2.

“W... -, Lda.” deduziu pedido de indemnização civil contra os dois arguidos, nos precisos termos constantes da acta de julgamento a fls. 49/55, impetrando a condenação dos demandados no pagamento à demandante, sob a forma solidária, da quantia global de € 7.666,50, a título de indemnização civil pelos danos que refere terem sido provocados pela conduta ilícita descrita na acusação.

* 3.

No 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Castelo Branco, após julgamento, foi proferida sentença, no dia 11-03-2011, que condenou cada um dos arguidos, pela prática, em co-autoria material, de um crime de furto, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 90 dias de multa, à razão diária de € 5,00.

Relativamente ao pedido civil, foi decidido julgá-lo parcialmente procedente e, em consequência, condenar os arguidos/demandados a pagar à demandante: - A quantia de 54,00 €, relativa ao custo do combustível furtado e que não irá ser utilizado; - O montante de € 250,00, para substituição dos tampões estroncados; e - O que se vier a liquidar em incidente de liquidação quanto aos custos que a demandante terá de suportar com a transfega do combustível e a limpeza dos tanques e circuito de alimentação das três máquinas em causa e, bem assim, o custo do combustível que existia no interior do tanque, que não foi furtado mas que não irá ser usado pelos receios que a sua utilização suscita.

* 4.

Interposto recurso pelo arguido, esta Relação de Coimbra, por acórdão de 19-10-2011, conferindo-lhe provimento, declarou a nulidade da sentença recorrida, ao abrigo do disposto nos artigos 374.º, n.º 2 e 379.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Penal, para que fosse «proferida nova decisão onde se procedesse não só à análise da admissibilidade da prova produzida como à sua valoração e exame crítico, exteriorizando ou fazendo constar esse exame e processo lógico do julgador na motivação da matéria de facto (…)».

* 5.

No tribunal a quo foi proferida, em 12-12-2011, nova sentença, que manteve a condenação dos arguidos/demandados nos precisos termos referidos no n.º 4 do relatório do presente acórdão.

* 6.

Ainda não conformados, os arguidos recorreram de novo, conjuntamente, tendo extraído da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: São as conclusões que delimitam o objecto do recurso, tal como se refere no Acórdão de 92.06.24, D.R.I.S.-A de 92.08.06 (disponível em www.dgsi.pt).

Os Recorrentes recorrem de facto e de direito.

  1. - Desde logo os arguidos recorrem porque estão inocentes não tendo praticado o crime pelo qual foram condenados. E pugnarão pela reposição da verdade até ao fim, tendo a prova produzida em audiência sido apreciada de forma errada, dando-se por provado o que não o poderia ter sido.

  2. - Na verdade e sempre com o devido respeito, não se podem conformar os ora recorrentes quer da matéria de facto dada como provada, quer da pena aplicada decorrente da primeira.

  3. - Aliás, neste particular ponto cumpre afirmar que para os ora recorrentes, a condenação que lhes foi imposta e que ora se impugna é, salvo melhor opinião a saber, desadequada, excessiva e desproporcional para as circunstâncias do caso.

  4. - Daí que se discorde, também, do direito aplicado e da desajustada dosimetria da pena, bem sustentada sim numa equívoca apreciação da prova produzida em julgamento, como adiante se detalhará.

  5. - Os aqui recorrentes, recorreram da primeira sentença proferida nos autos, cujo recurso veio a ser admitido e dado provimento pelo Tribunal da Relação de Coimbra, concluindo que: “Mostrando-se insuficiente a fundamentação da matéria de facto dada como provada nos termos explicitados, a conclusão a tirar é a de que estamos perante uma nulidade de sentença, nos termos dos artigos 374.º, n.º 2 e 379.º, n.º 1, ambos do Código Processo Penal”.

  6. - De uma leitura atenta da sentença inicialmente proferida e da sentença que agora se recorre, verificamos que a única alteração efectivamente efectuada, foi no sentido de o tribunal a quo, ter vindo tentar fazer uma análise crítica da prova, acrescentando na sentença anteriormente proferida apenas o seguinte: “Assente a admissibilidade de valoração pelo tribunal do depoimento dos dois agentes da PSP ouvidos em julgamento, quer na parte em que aqueles referem que, quando chegaram ao local dos factos, encontraram os arguidos no passeio junto a um buraco existente na rede que vedava o acesso ao local onde se encontravam as máquinas de onde foi retirado o combustível, tendo junto de si as vasilhas com o gasóleo e mangueiras; quer na parte em que no seu depoimento afirmam terem ouvido da boca dos arguidos que tinham sido eles a retirar o gasóleo das máquinas; diremos que a convicção do Tribunal acerca da matéria de facto vertida nos pontos 1 a 5 (de 2.1.1.) teve na sua base esses depoimentos dos referidos agentes da FSP, segundo os quais: - no dia, hora e local dos factos, em giro de patrulha, quando avistaram os arguidos (ainda antes de terem assumido essa condição e apenas enquanto meros cidadãos que ali se encontravam) verificaram que aquelas tinham junto deles as duas vasilhas com o combustível e as mangueiras apreendidas nos autos; e bem assim; - que tendo perguntado aqueles que ali se encontravam, na sequência da denúncia que haviam recebido de que alguém andaria a furtar combustível naquele local, se tinham sido eles os autores dos factos.

    Ao que os arguidos (ainda antes de o serem no processo e apenas como meros suspeitos) responderam que sim! Assim, da conjugação destes depoimentos com o facto de os arguidos terem sido encontrados na sua posse com as vasilhas com o combustível, junto a uma abertura na rede que dá entrada ao local onde estava parqueada a maquinaria, e bem assim com mangueiras, tudo isto conjugado com as regras da experiência e da normalidade do acontecer - a explicação encontrada pelo Tribunal para aquela sucessão de actos é a mais lógica e não se descortina outra consentânea com o facto de os arguidos no local terem admitido serem eles que andavam a furtar gasóleo e terem junto de si, nas imediações do acesso às máquinas, os objectos aptos à sua extracção e transporte - leva-nos a concluir, na falta de melhor explicação, que foram eles os autores do furto”.

  7. - Com o devido respeito, tal análise, não é mais do que aquilo que já havia sido dito anteriormente, ou seja, a sentença que agora se recorre continua a não efectuar uma análise crítica da prova, chegando mesmo o tribunal a quo a concluir com a seguinte expressão, que não nos pode deixar de merecer realce “(...) leva-nos a concluir, na falta de melhor explicação, que foram eles os autores do furto”, negrito nosso.

  8. - Daí a razão de ser da interposição do presente recurso.

  9. - Ou seja, em nada se encontram alterados os pressupostos de facto e de direito anteriormente expostos no recurso anterior.

  10. - Da audiência de discussão e julgamento e dos documentos juntos aos autos, com interesse para a resolução da causa, resultaram provados os factos ali constantes.

  11. - Desde logo os arguidos voltam a recorrer desta nova decisão porque estão inocentes não tendo praticado o crime pelo qual foram condenados. E pugnarão pela reposição da verdade até ao fim, tendo a prova produzida em audiência continuado a ser apreciada de forma errada, dando-se por provado o que não o poderia ter sido.

  12. - Existiu assim erro notório na apreciação da prova.

  13. - Na verdade, não existe nenhuma prova nos autos de que os arguidos tenham procedido ao furto pelo qual foram condenados, porquanto não foram vistos a furtar nem tão pouco no interior do estaleiro de onde foram furtados os litros de gasóleo.

  14. - Sendo este, entre outros, um dos pontos com os quais não se concorda com o decidido, como seguidamente se especifica.

  15. - Os arguidos ora recorrentes, durante toda a fase do processo optaram pelo seu direito ao silêncio, conforme alude o art. 61.º, n.º l, al. d), do Código Processo Penal, não prestando declarações em nenhuma das fases processuais.

  16. - O princípio nemo tenetur se detegere, tem um significado literal de “não produzir provas contra si mesmo”, sendo chamado pela doutrina de princípio da presunção de inocência ou ainda princípio do estado de inocência.

  17. - O silêncio do arguido, traduz-se como exercício da individualidade e personalidade, inserindo-se também no direito à privacidade e fulcrado no vector maior que é o princípio da dignidade da pessoa humana e que rege as relações entre o Estado e o indivíduo.

  18. - Na precisa lição de Germano Silva Marques o princípio da presunção de inocência consagrado no art. 32.º, n.º 2 da CRP integra uma norma directamente vinculativa e constitui um dos direitos fundamentais do cidadão (art. 18.º, n.º l da CRP)[1].

  19. - O direito à prova no processo penal tem ligação com o princípio da verdade material, fazendo uma tensão com o princípio da não inculpação, em especial no direito ao silêncio, ora examinado. Formando-se uma antinomia entre este direito, o direito da investigação criminal por parte do Ministério Público e o direito do arguido de não fornecer qualquer elemento de prova ao Estado, que deverá obtê-la por seus próprios meios. No âmbito da prova a tensão estabelecida deita raízes no ónus da prova e no princípio in dubio pro reo.

  20. - A palavra prova vem do vocábulo probation, que significa verificação, exame, confirmação, reconhecimento e é utilizado em dois sentidos, sendo um sentido comum ou vulgar significa tudo aquilo que pode levar o conhecimento de um facto de uma qualidade, da existência ou exactidão de uma coisa, com o significado jurídico, representa os actos e os meios usados pelas partes e reconhecido pelo Juiz como...

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