Acórdão nº 100/08.9GBMIR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelLUÍS RAMOS
Data da Resolução09 de Maio de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência na 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra Nos autos supra identificados foi proferida a seguinte decisão: “O arguido A... foi condenado, no presente processo, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 70 dias de multa, à taxa diária de €5,50, perfazendo o total de €330,00 - cf. fls. 167 a 171.

O arguido não pagou a totalidade da multa em que foi condenado (tendo requerido o pagamento em prestações, que foi deferido, mas só pagou a primeira) nem justificou a omissão de pagamento, e mostrando-se inviável o pagamento coercivo, em conformidade com a promoção do Ministério Público, o tribunal converteu a pena de multa não paga em 30 dias de prisão subsidiária - cf. fls. 188 a 190, 204 e 296 e 297.

O arguido foi notificado desse despacho, por carta registada enviada para a sua morada (tendo a correspondência sido devolvida, com o motivo "não atendeu"), e por carta registada enviada para o domicílio profissional da sua defensora - cf. fls. 298 a 300.

Desde então, foram realizadas diversas diligências no processo, no sentido de notificar pessoalmente o arguido da conversão da pena de multa em prisão subsidiária, constante do despacho de fls. 296 e 297.

A fls. 304, o Ministério Público promoveu novas diligências, no sentido de encontrar o paradeiro do arguido e notificá-lo, por contacto pessoal, do dito despacho.

Porém, é meu entendimento que o despacho em questão não tem que ser objecto de notificação ao arguido por contacto pessoal.

O que está em causa é a forma de transmitir (notificar) o conteúdo de determinado acto processual (despacho proferido nos autos ao abrigo do artigo 49.º, nº 1, do Código Penal) ao arguido para, verificando-se os respectivos pressupostos, exercer o direito de recurso (que faz parte das garantias de defesa).

Desde logo, inexiste norma legal que imponha que a notificação ora em análise tenha que ser feita por contacto pessoal com o arguido, pelo que nada obsta, desse ponto de vista, a que a mesma se faça por via postal simples, nos termos previstos na alínea c) do n.º 1 do artigo 113.° e na alínea c) do n.º 3 do artigo 196.° do Código de Processo Penal.

Acresce ser meu entendimento que a notificação do arguido por via postal simples, para a morada constante do termo de identidade e residência, não configura uma violação das garantias de defesa do arguido previstas no n.º 1 do artigo 32.° da Constituição.

O Tribunal da Relação de Lisboa, no acórdão proferido no processo n.º 4129/2008-5, em 17.06.2008 (disponível para consulta em www.dgsi.pt). apreciou essa questão e concluiu que a Constituição não impõe que a notificação em análise tenha que ser feita através de contacto pessoal com o arguido, salientando que a conversão da pena de multa não paga em prisão subsidiária não altera a espécie da pena principal imposta na sentença condenatória (pelo que o despacho de conversão não traduz uma modificação superveniente do conteúdo da sentença transitada em julgado que tenha que ser notificada pessoalmente ao arguido), que os direitos de defesa do arguido se resumem, perante tal despacho, ao direito a recorrer (direito esse cujo exercício não pressupõe que o arguido tenha sido notificado pessoalmente do despacho, sendo certo que o seu defensor é notificado e é este quem intenta o recurso, em representação processual do arguido) e que o arguido mantém a possibilidade de, a todo o tempo, impedir a execução da prisão subsidiária, pagando a multa a que foi condenado ou provando que a falta de pagamento lhe não é imputável.

Efectivamente, como se diz nesse acórdão: A notificação da decisão que determinou a conversão da multa em pnsao subsidiária, efectuada ao defensor do arguido, garante os direitos deste, que se limitam à interposição de recurso, caso discorde de tal decisão, sendo certo que o arguido poderá, em qualquer momento (ou seja, mesmo depois de transitado em julgado o despacho notificado), proceder ao pagamento da multa em dívida, assim evitando o cumprimento da prisão subsidiária - o art. 49.º, n.º 2, do CP, diz expressamente que "o condenado pode a todo o tempo evitar ... a execução da prisão subsidiária, pagando ... " - como pode aquele vir a demonstrar que a razão do não pagamento da multa lhe não é imputável, podendo, nesse caso, a execução da prisão subsidiária ser suspensa (n.º 3, do mesmo normativo).

Por isso, não há diminuição grave ou mesmo relevante das garantias de defesa do arguido - já que pode recorrer, através do seu defensor (pessoalmente não o podia fazer), da decisão que procedeu à conversão da multa em prisão subsidiária, não sendo, apesar disso (ainda que aquela transite em julgado), definitiva aquela conversão, porquanto continua o arguido a poder pagar a multa em dívida ou provar que não lhe é imputável o incumprimento, evitando cumprir a pena detentiva -, evitando-se, por outro lado, a paralisia do processo quando é desconhecido o paradeiro do arguido. A exigência de notificação pessoal deste é, pois, injustificada no presente caso, acarretando desvantagens para o normal desenrolar do processo, sem quaisquer acrescidas garantias para o arguido.

Concordo com a argumentação aduzida nesse aresto, excepto quanto a um ponto. Entende-se aí que basta a notificação do despacho ao defensor, mas considero que também é conveniente notificar o próprio arguido.

É certo que o n.º 9 do artigo 113.° do Código de Processo Penal não contempla este caso como um daqueles em que a notificação tem que ser feita cumulativamente ao arguido e ao defensor (como sucede, por exemplo, com a notificação da acusação, da decisão instrutória e da sentença).

Todavia, ponderando os argumentos que constam do acórdão de fixação de jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 6/2010 acerca da forma abrangente como deve ser interpretada essa norma legal, no sentido de nela caber a notificação de outros actos relevantes para o cumprimento da pena, como o despacho de revogação da suspensão da execução da pena, considero que também o despacho de conversão da multa não paga em prisão subsidiária deve ser objecto de notificação ao arguido e ao defensor.

Assim, entendo que, tal como o defensor, também o arguido deve ser notificado do despacho de conversão da pena de multa não paga em prisão subsidiária - sendo que a notificação do arguido não tem que ser efectuada por contacto pessoal, podendo ser efectuada por via postal simples, com prova de depósito, para a morada constante do termo de identidade e residência.

Sei que a jurisprudência não é unânime acerca dos termos em que deve ser feita a...

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