Acórdão nº 507/19.6T8LMG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelCRISTINA NEVES
Data da Resolução14 de Junho de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam os Juízes na 3ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra RELATÓRIO F... LDA., intentou a presente acção contra C...SA, Peticionando a sua condenação no pagamento de 5.658,00 euros e respectivos juros de mora desde a citação até integral pagamento, pelos danos provocados sofridos num armazém de sua propriedade e respectivo recheio, cobertos por contrato de seguro multirriscos celebrado com a R.

* Citada, a Ré contestou, aceitando a existência de contrato válido à data do sinistro, a existência do sinistro e respectivo valor e a sua responsabilidade, mas considerando que se verifica uma situação de sub-seguro, pelo que deve ser aplicada a regra da proporcionalidade, de acordo com o disposto nas cláusulas gerais 18º e 19ª do contrato celebrado.

* A A. veio apresentar resposta à matéria da excepção de existência de sub-seguro, alegando que aquando da contratação indicou todas as características do imóvel, que a área por eles referida de 90m2 para a dita proporcionalidade, não consta de lado nenhum e que o valor patrimonial do imóvel não foi condição para o seguro, nunca lhe sendo dito que existia sub-seguro.

Mais alegou que a Ré não o informou da possibilidade de aplicação da regra do sub-seguro, pelo facto do imóvel ter valor superior, violando os deveres de informação.

* Foi proferido despacho saneador, identificando-se o objeto do litígio, enunciando-se os temas da prova, e admitindo-se a prova apresentada pelas partes, após o que teve lugar a audiência final, sendo proferida sentença na qual se julgou parcialmente provada a ação e, em consequência se condenou “a Ré a pagar à A. a quantia global de 4.500,00€, correspondente ao limite do capital seguro, menos a franquia acordada, acrescida de juros de mora desde a citação.

” * Não conformada com esta decisão, impetrou a R. recurso da mesma relativamente à matéria de direito, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões, que se reproduzem: “1º- A sentença recorrida não decidiu corretamente ao não aplicou a regra da proporcionalidade, sendo que, no presente caso, estamos perante um caso de subseguro; 2º- O valor indicado, pelo segurado, como capital seguro foi de € 5.000,00; 3º- O valor do imóvel, que sofreu os danos, que foi avaliado em € 22.500,00; 4º- O valor dos danos ascende a € 4.600,00; 5º- A Ré assumiu indemnizar a Autora, aplicando a regra proporcional, prevista na Cláusula 19ª das Condições Gerais da Apólice, em virtude do capital seguro ser inferior ao valor em risco; 6º- A Ré propôs à Autora a indemnização de € 920,00, calculada da seguinte forma: € 5.000,00 : € 22.500,00 x € 4.600,00 - € 102,22 (da franquia); 7º- Nos termos do contrato, o Capital Seguro indicado foi de 5.000,00 €, pelo que o coeficiente seguro é de 22%, conforme resulta dos docºs 3 e 4, juntos com a contestação da recorrente; 8º- Dispõe a CLÁUSULA 19.ª - INSUFICIÊNCIA OU EXCESSO DE CAPITAL: 1 - Salvo convenção em contrário, se o capital seguro pelo presente contrato for, na data do sinistro, inferior ao determinado nos termos dos n.ºs 2 a 4 da cláusula anterior, o Segurador só responde pelo dano na respetiva proporção, respondendo o Tomador do Seguro ou o Segurado pela restante parte dos prejuízos como se fosse Segurador.

9º- O capital do seguro de € 5.000,00, indicado pela Autora, era inferior ao valor de reconstrução e ao valor do imóvel seguro, avaliado em € 22.500,00, estando-se perante uma situação de sub-seguro, sendo de aplicar a regra proporcional, o que determina a obrigação da Ré de suportar apenas 22% do valor dos danos; 10º- O valor do capital seguro é indicado livremente pelo tomador do seguro, indicação essa da sua responsabilidade; 11º- O seguro em causa tinha a duração de um ano, renovando-se automaticamente, sendo que, sempre que ocorria essa renovação, a tomadora do seguro, ao receber as respetivas condições particulares, juntamente com o aviso para pagamento do prémio de seguro, tomava conhecimento de que o valor do capital seguro mantinha-se inalterado, ou seja, em € 5.000,00, ficando, desta forma, cumprido o nº 2 da Cláusula 19º, das Condições Gerais e Especiais da Apólice; 12º- Uma vez que o capital seguro (€ 5.000,00) era inferior ao valor em risco (do imóvel seguro - € 22.500,00), ao valor dos prejuízos (€ 4.600,00), tem que ser aplicada a regra proporcional, de acordo com a cláusula 19ª das Condições Gerais e Especiais da Apólice, pois estamos perante uma situação de sub-seguro.

13º- Em face do exposto a recorrente só poderá ser responsável pelo pagamento à Autora do montante de € 920,00 (€ 5.000,00 : € 22.500,00 x € 4.600,00 - € 102,22); 14º-Ao não aplicar a regra de proporcionalidade, em face da insuficiência do capital seguro, a sentença recorrida violou, entre outras, as normas contantes do artº 49º, nº 1, do Regime Jurídico do Contrato de Seguro, bem como as Cláusulas 18º e 19º, das Condições Gerais e Especiais da Apólice.

Termos em que deve o presente recurso ser julgado provado e procedente, revogando-se a decisão recorrida, proferindo-se decisão que tenha em consideração o ora alegado.” * A A. interpôs contra-alegações, pugnando pela manutenção do decidido.

*** QUESTÕES A DECIDIR Nos termos do disposto nos artigos 635º, nº4 e 639º, nº1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial. Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. artigo 5º, nº3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas.

Nestes termos, a única questão a decidir que delimita o objecto deste recurso, consistem em apurar:

  1. Da existência de sub-seguro e suas consequências jurídicas; * FUNDAMENTAÇÃO DE FACTOO tribunal recorrido considerou a seguinte matéria de facto: “1) Mostra-se inscrito na matriz e registada a aquisição favor da A. um prédio misto, sito na ..., união de freguesias ... e ..., concelho ..., composto por armazém, inscrito na matriz da referida freguesia sob o art. ...62º, e descrito na CRP ... sob o n.º 255/19....

    2) Prédio esse que se destina a armazenar bens e produtos inerentes à atividade da Autora, nomeadamente para guardar produtos que vende na sua loja, como tintas, ferragens, ferramentas, materiais de construção, entre outros.

    3) No sentido de transferir a responsabilidade infortunística - adveniente de prejuízos ou danos que pudessem vir a ser causados no prédio e nos bens que ali possui e que fossem provocados por incêndio, queda de raio e explosão, tempestades, inundações, greves, tumultos e alterações de ordem pública, atos de vandalismo ou de sabotagem, atos de terrorismo, aluimentos de terras, choque ou impacto de objetos sólidos ou animais, danos por água, pesquisa, reparação e reposição por avarias, danos acidentais a canalizações subterrâneas de água, de gás e em cabos elétricos, danos em jardins, muros e vedações, quebra de vidros, derrame acidental de óleo, bens refrigerados, danos em bens do senhorio, quebra ou queda da antenas de tv, tsf e painéis solares, danos estéticos para edifício, riscos elétricos, furto ou roubo, danos à propriedade por roubo, assalto fora de casa, fenómenos sísmicos, gastos originados por sinistro - celebrou em 1 de Junho de 2017, com a C...SA, nas instalações do ..., um contrato de seguro multirriscos empresas, titulado pela apólice n.º ...09, por um ano, renovável por iguais períodos.

    4) Durante a vigência deste contrato, após renovação, mais precisamente em 28 de fevereiro de 2018, parte do prédio da autora – um anexo - sofreu vários danos, em consequência do temporal que se verificou nessa noite, com ventos fortes e chuvas.

    5) Os ventos que se fizeram sentir foram de tal forma fortes que acabaram por provocar o levantamento de várias chapas do telhado do armazém, chegando algumas a ser mesmo arrancadas e outras ficaram bastante tortas e danificadas, tendo inclusive arrancado a antena de TV que estava colocada no telhado.

    6) Para além dos estragos que o vento provocou, as chuvas fortes que se sentiram, e em consequência dos estragos provocados no telhado do armazém, as águas pluviais acabaram por se infiltrar para o seu interior, danificando as paredes e tintas.

    7) A Autora, efetuou a respetiva participação junto da Ré.

    8) Tendo sido efetuada a peritagem por perito enviado pela Ré.

    9) Nessa vistoria, além de confirmar os danos, o Sr. Perito requereu a discriminação dos danos e solicitou a entrega de diversos documentos, o que a Autora cumpriu.

    10) Tendo inclusive apresentado orçamento para a reparação dos prejuízos causados, no valor de 4.600,00 euros, acrescido de IVA o que perfaz...

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