Acórdão nº 679/15.9T9ACB-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Novembro de 2019
Magistrado Responsável | JORGE JACOB |
Data da Resolução | 27 de Novembro de 2019 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Coimbra: I – RELATÓRIO: Nos autos de processo comum supra referenciados, que correram termos pelo Juízo Local Criminal de Alcobaça e originaram o presente recurso em separado, após julgamento com documentação da prova produzida em audiência foi proferida sentença, em 20 de Dezembro de 2018, decidindo nos seguintes termos: (…) Pelo exposto e nos termos das disposições legais citadas, decido: a) Condenar o arguido (…), pela prática, em autoria material, sob a forma consumada e na forma continuada, um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, previsto e punido pelo art. 107º, nº 1, com referência ao art. 105º, nº 1, ambos do R.G.I.T., em conjugação com os artigos 30º, nº 2 e 79º, nº 1, do Código Penal, na pena de cento e trinta dias de multa à taxa diária de cinco euros, perfazendo a pena de multa de seiscentos e cinquenta euros; (…) Por requerimento de 18 de Março de 2019 veio o arguido requerer o pagamento da multa em 10 prestações mensais e sucessivas de € 65,00 cada uma, tendo o M.P. promovido o indeferimento do requerido por extemporâneo, promovendo ainda a conversão da multa em prisão subsidiária, nos termos do art. 49º, nº 1, do Código Penal, por falta de bens suficientes e desembaraçados para a cobrança coerciva da pena de multa.
Foi então proferido o despacho agora em recurso, que tem o seguinte teor: Veio o arguido requerer o pagamento da multa em prestações. O Digno Magistrado do Ministério Público pugnou pelo indeferimento do requerido, por extemporâneo.
Cumpre apreciar.
Dispõe o artigo 49.º, n.º1 do Código Penal que “se a multa, que não tenha sido substituída por trabalho, não for paga voluntária ou coercivamente, é cumprida prisão subsidiária pelo tempo correspondente reduzido a dois terços, ainda que o crime não fosse punível com prisão”.
Atento o disposto no artigo 489.º, n.º1 do Código de Processo Penal, conclui-se que no caso em apreço, o arguido não está já em tempo de o pagamento da multa em prestações, uma vez que, por aplicação conjugada ainda do disposto nos artigos 47.º, n.º3, 48.º, n.º2 e no n.º1 do artigo 49.º do Código Penal e artigo 489.º, n.º1 do Código de Processo Penal, decorrido o prazo para pagamento voluntário, e não sendo possível a cobrança coerciva, nos termos do artigo 491.º, n.º1 deste diploma legal, pode ser determinado o cumprimento da prisão subsidiária.
Tem vindo a ser questão debatida na jurisprudência a natureza do prazo em causa. Defende o Digno Magistrado do Ministério público a natureza perentória de tal prazo, citando em abono da sua posição diversos acórdãos de tribunais superiores.
Como temos vindo a fazer consignar em diversos processos, discordamos de tal entendimento, afigurando-se-nos, sem quebra de vénia por distinta opinião, que não estamos perante um prazo perentório.
Como se escreveu no acórdão do Tribunal da relação do Porto (de 27/06/2018, proferido no processo n.º 273/14.1TAPRD-A.P1) que tomamos a liberdade de reproduzir por aderirmos integralmente aos fundamentos do mesmo “Afigura-se-nos que este entendimento não é consentâneo com o espírito da lei, sendo que também não é imposto pela sua letra. É manifesta a preferência do Código Penal por penas não privativas da liberdade com recurso à pena de prisão apenas como ultima ratio, preferência que as sucessivas reformas nunca deixaram de reforçar (veja-se, desde logo, o seu artigo 70.º). Essa preferência será ainda mais justificada quando está em causa a reação perante a falta de pagamento de uma pena de multa, normalmente relativa à prática de um crime de menor gravidade e onde serão menores as exigências de prevenção geral, e sendo essa falta de pagamento normalmente motivada por carências económicas e financeiras. Reflexo dessa preferência nestes casos são as várias possibilidades de evitar o cumprimento da pena de prisão subsidiária correspondente à pena de multa: pagamento diferido ou em prestações (artigo 47.º, n.º 3), pagamento a todo o tempo (artigo 49.º, n.º 2), substituição da multa por prestação de trabalho a favor da comunidade (artigo 48.º), suspensão da execução da prisão subsidiária (artigo 49.º, n.º 3). Assim sendo, contrasta claramente com esse espírito a tese que atribui natureza perentória ao prazo a que se reportam os artigos 489.º.n.º 2, e 490.º, n.º 1, do Código de Processo Penal. Essa tese faz prevalecer razões de ordem formal sobre um princípio que pode considerar-se trave mestra de todo o edifício do Código Penal. E não pode dizer-se que se trate de uma tese imposta pela letra da lei. Desta não deriva necessariamente que estejamos perante um prazo perentório. Há que salientar que o prazo de pagamento da multa referido no artigo 489.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, e para que remete o artigo 490.º, n.º 1, do mesmo Código (este relativo ao prazo de apresentação do requerimento de substituição da multa por prestação de trabalho a favor da comunidade) também não é perentório. Na verdade, o condenado pode pagar a multa a todo o tempo para evitar o cumprimento da prisão subsidiária (artigo 49.º, n.º 2, do Código Penal). Não seria coerente com este regime considerar que é perentório o prazo para requerer a substituição da multa por prestação de trabalho a favor da comunidade. No sentido de que o prazo a que se reportam os artigos 489.º.n.º 2, e 490.º, n.º 1, do Código de Processo Penal não tem natureza perentória e que o seu decurso não preclude a possibilidade de vir a ser requerida mais tarde a substituição da multa por prestação de trabalho a favor da comunidade, pronunciam-se, entre outros, os acórdãos desta Relação de 5 de julho de 2006, proc. n.º 0612771, relatado por Borges Martins; de 30 de setembro de 2009, proc. n.º 344/06.8GAVLC.P1, relatado por Olga Maurício; de 15 de junho de 2011, proc. n.º 422/08.9PIVNG-A.P1, relatado por Olga Maurício; e de 7 de julho de 2016, proc. n.º 480/13.4GPRT-A.P1, relatado por Luísa Arantes; e os acórdãos da Relação de Évora de 25 de maio de...
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