Acórdão nº 36/20.5T8ALD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelFONTE RAMOS
Data da Resolução16 de Março de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Apelação 36/20.5T8ALD.C1 Relator: Fonte Ramos Adjuntos: Alberto Ruço Vítor Amaral Sumário do acórdão: 1. Na sua qualidade de concessionária, nos termos de contrato administrativo, a Ascendi Beiras Litoral e Alta, Auto-Estradas das Beiras Litoral e Alta, S. A., apesar da sua natureza privada, está sujeita ao regime específico da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas de direito público (art.º 1º, n.º 5 da Lei n.º 67/2007, de 31/12).

  1. Consequentemente, a competência para preparar e julgar a acção que tem por objecto a sua responsabilidade civil extracontratual por danos ocasionados, designadamente, pela violação dos deveres de conservação e vigilância da via pública concessionada recai sobre os tribunais administrativos [art.º 4º, n.º 1, alínea h) do ETAF].

    Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Em 02.6.2020, L... instaurou, no Tribunal Judicial da Comarca da Guarda (Juízo de Competência Genérica de Almeida), a presente acção declarativa comum contra Ascendi Beiras Litoral e Alta, Auto-Estradas das Beiras Litoral e Alta, S. A., pedindo que seja condenada a pagar-lhe a indemnização de €3.461,79 pelos danos emergentes do acidente aludidos nos autos, os juros a contar da data da interpelação (13.6.2017) até integral pagamento e a sanção pecuniária compulsória.

    Alegou, em síntese: no dia 12.6.2017, pelas 21.30 horas, na A25, ao km 189,9, concelho de Almeida, quando conduzia a sua viatura automóvel ligeira de passageiros, matrícula P..., à saída do tabuleiro da ponte sobre o Rio Côa, o veículo foi embatido na parte inferior da carroçaria por uma chapa metálica com 1,20 m x 0,24 m, que se alçou do chão (estava solta, mas apoiada no chão, e confundida com este), causando-lhe os danos patrimoniais indicados na petição inicial (p. i.), sendo que à Ré, concessionária da citada auto-estrada, incumbia manter a faixa de rodagem livre e desimpedida para permitir a circulação de veículos, sem perigo; não o tendo feito, foi a única culpada por aquele evento danoso.

    A Ré, citada, não contestou.

    [1] Observado o contraditório quanto à eventual incompetência em razão da matéria[2], por decisão de 20.10.2020, a Mm.ª Juíza a quo declarou a incompetência em razão da matéria do Tribunal recorrido para apreciação da presente lide, considerando materialmente competentes os tribunais administrativos e fiscais e, em consequência, absolveu a Ré da instância.

    Inconformado, o A. apelou formulando as seguintes conclusões: ...

    A Ré respondeu concluindo pela improcedência do recurso.

    Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, questiona-se a competência em razão da matéria para conhecer do objecto do litígio.

    1. 1. A matéria a considerar é a que resulta do relatório que antecede.

  2. Cumpre apreciar e decidir com a necessária concisão.

    Os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo, nos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais, nos termos compreendidos pelo âmbito de jurisdição previsto no art.º 4º deste Estatuto (art.º 1º, n.º 1, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19.02, na redacção conferida pela Lei n.º 114/2019, de 12.9); compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais (art.º 212º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa/CRP).

    Compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham por objecto questões relativas a, designadamente, responsabilidade civil extracontratual dos demais sujeitos aos quais seja aplicável o regime específico da responsabilidade do Estado e demais pessoas colectivas de direito público (art.º 4º, n.º 1, alínea h) do ETAF).

    São da competência dos tribunais judiciais as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional (art.ºs 64º, do CPC e 40º, n.º 1, da Lei da Organização do Sistema Judiciário/LOSJ, aprovada pela Lei n.º 62/2013, de 26.8) - os tribunais judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais (art.º 211º, n.º 1, da CRP).

    As disposições que, na Lei n.º 67/2007, de 31.12 (que aprovou o regime de responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas), regulam a responsabilidade das pessoas colectivas de direito público, bem como dos titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes, por danos decorrentes do exercício da função administrativa, são também aplicáveis à responsabilidade civil de pessoas colectivas de direito privado e respectivos trabalhadores, titulares de órgãos sociais, representantes legais ou auxiliares, por acções ou omissões que adoptem no exercício de prerrogativas de poder público ou que sejam reguladas por disposições ou princípios de direito administrativo (art.º 1º, n.º 5 da referida Lei).

    Nas auto-estradas, com ou sem obras em curso, e em caso de acidente rodoviário, com consequências danosas para pessoas ou bens, o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança cabe à concessionária, desde que a respectiva causa diga respeito a: a) Objectos arremessados para a via ou existentes nas faixas de rodagem; b) Atravessamento de animais; c) Líquidos na via, quando não resultantes de condições climatéricas anormais (art.º 12º, n.º 1 da Lei n.º 24/2007, de 18.7 - sob a epígrafe “Responsabilidade -, diploma que define direitos dos utentes nas vias rodoviárias classificadas como auto-estradas concessionadas, itinerários principais e itinerários complementares). 3. Sabemos que a competência material do tribunal se afere em função dos termos em que o autor fundamenta ou estrutura a pretensão que quer ver reconhecida[3] e que o...

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