Acórdão nº 1582/04 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Junho de 2004

Magistrado ResponsávelDR. HELDER ROQUE
Data da Resolução01 de Junho de 2004
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA: BB e esposa CC propuseram a presente acção, com processo sumário, contra DD, todos residentes em EE, concelho de Trancoso, pedindo que, na sua procedência, se declare que os autores são donos e legítimos proprietários do prédio infradescrito, que a ré seja condenada a entregar aos autores a aludida casa, livre e desocupada, de pessoas e bens, e ainda que a ré seja, igualmente, condenada a pagar aos autores a importância que se vier a apurar em execução de sentença, pela sua ocupação, desde a citação até à efectiva entrega da mesma, invocando, para o efeito, e, em síntese, que são donos e legítimos proprietários da mencionada casa de habitação, que adveio à sua posse, por escritura de habilitação e partilha, mas que tem vindo a ser ocupada, pela ré e pelo seu falecido companheiro, a titulo de empréstimo.

Porém, os autores necessitam da casa, tendo solicitado, verbalmente, à ré, a sua entrega, que se recusa a fazê-lo, assim os impossibilitando de a ocuparem, ou de a darem de arrendamento.

Na contestação, a ré alega que habita a casa, conjuntamente com seu falecido companheiro, há mais de vinte anos, cuidando da sua conservação, pagando os respectivos impostos, colhendo todos os frutos de que a mesma é susceptível, á vista de toda a gente, incluindo dos autores, ininterruptamente, e, até ao presente, de forma pública, sem embargo ou oposição de ninguém, convencidos do exercício sobre a mesma de um verdadeiro direito de propriedade, a qual pertenceu, em compropriedade, ao seu falecido companheiro e seus filhos, mas que nunca foi reivindicada por ninguém, a não ser, agora, pelos autores.

Em reconvenção, invoca ter adquirido, por usucapião, a casa agora reivindicada, solicitando, para tanto, que se declare que é dona e legítima proprietária do imóvel, com o consequente cancelamento do registo que sobre o mesmo impende, a favor dos autores.

Na resposta à contestação, os autores alegam que, quanto muito, a ré se sentia proprietária de 1/5 da casa, tal como fez constar da declaração de óbito, por morte do seu companheiro, concluindo com o pedido de que a excepção invocada seja declarada improcedente e, no demais, como na petição inicial.

A sentença julgou a acção improcedente, por não provada, e, em consequência, absolveu a ré do pedido contra si formulado, e improcedente, por não provado, o pedido reconvencional deduzido pela ré, do qual absolveu os autores.

Desta sentença, os autores e a ré interpuseram recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: OS AUTORES: 1ª - A douta sentença violou o artigo 1311º, do Código Civil e artigo 7º do Código do Registo Predial; 2ª - A douta sentença recorrida deve ser substituída por outra que julgue a acção procedente e a reconveção improcedente.

A RÉ: 1ª - A aqui apelante provou à evidência que há mais de vinte anos, em nome próprio vem praticando actos materiais de posse no prédio identificado na alínea a) dos factos assentes; 2ª - Actos esses que fez e faz acompanhar da convicção de que exerce um verdadeiro direito de propriedade; 3ª - Adquiriu, pois, tal prédio por via da prescrição aquisitiva – usucapião; 4ª - A sentença recorrida fez uma deficiente aplicação do direito, em clara oposição dos fundamentos da decisão com a mesma decisão, pelo que deve ser declarada nula e substituída por outra que julgue procedente o pedido reconvencional formulado pela aqui apelante, com as legais consequências, nomeadamente com a ordem de cancelamento do registo do prédio descrito em A) dos factos assentes; 5ª - A sentença recorrida violou, entre outros, os artigos 1251º, 1258º, 1260º, 1261º, 1262º, 1263º, a) e d), 1265º e 1287º do Código Civil e 668º, nº 1, c), do CPC.

Nas suas contra-alegações, os autores e a ré concluem em conformidade com as posições que sustentaram nos articulados.

Na sentença apelada, declararam-se demonstrados, sem impugnação, os seguintes factos, que este Tribunal da Relação aceita, nos termos do estipulado pelo artigo 713º, nº 6, do Código de Processo Civil (CPC), mas reproduz: O prédio urbano composto por casa de habitação, com dois pavimentos e uma dependência – superfície coberta de 55 m2 e páteo com 30 m2 -, sito na freguesia de EE, concelho de Trancoso, que confronta a Nascente com António Marques Francisco, Poente com rua pública, Norte com Jesuíno de Oliveira Pacheco e Sul com António Inácio Dias Furtado, encontra-se inscrito na matriz, sob o n.º 349, e descrito na Conservatória do Registo Predial de Trancoso, sob o n° 00502, a favor dos autores, CC e marido BB - A).

Por escritura de habilitação e partilha, outorgada no Cartório Notarial de Trancoso, no dia 29 de Setembro de 1995, António Rebelo, viúvo, natural da freguesia e concelho de Santa Marta de Penaguião, e residente na freguesia de EE, Trancoso, declarou, na qualidade de cabeça de casal da herança aberta por morte de FF, que “no dia oito de Julho de 1995, na freguesia de EE, deste concelho, de onde era natural e teve a sua última residência habitual, faleceu, sem deixar testamento ou qualquer disposição de última vontade, sua mulher FF, no estado de casada em segundas núpcias dela, sob o regime de separação de bens. Que a falecida deixou como únicos herdeiros, ele como primeiro outorgante e a única filha dela e de António Augusto Pires, seu primeiro marido, a segunda outorgante Maria da Fresta. Que não há quem prefira aos indicados herdeiros ou quem com eles possa concorrer à sucessão.

Mais declarou o primeiro e a segunda outorgantes que, pela presente escritura, procedem à partilha do património da autora da sucessão, constituído este pelos bens próprios, devidamente identificados no documento complementar, que faz parte integrante desta escritura (...).

Que, em pagamento, adjudicam à interessada Maria da Fresta, todos os bens constantes das treze verbas do documento complementar, no valor global de sessenta e três mil, duzentos e dois escudos (...)” - B).

Dos prédios objecto de adjudicação, a que se alude em B), faz parte integrante, sob a verba número dois, o prédio descrito em A) - C).

A casa, referida em A), tem sido ocupada pela ré e foi ocupada pelo seu falecido companheiro, Adolfo de Almeida - 1º.

Pelo menos, uma vez, a autora solicitou, verbalmente, a entrega de tal casa, o que aconteceu, há cerca de três anos - 2º.

A ré habita, há mais de vinte anos, na casa, referida em A) - 6º.

O falecido companheiro da ré, com quem esta viveu na referida casa, desde que regressaram de África e, até falecer, sempre disse que a casa, também, lhe pertencia - 7º.

Sempre a ré e o seu companheiro habitaram a referida casa, cuidando da sua conservação, pagando os respectivos impostos, colhendo todos os frutos de que a mesma é susceptível - 8º.

Sempre o fizeram, à vista de toda a gente, incluindo dos autores - 9º.

Fizeram-no, ininterruptamente, sem oposição de ninguém - 10º.

A ré e seu companheiro sempre agiram no convencimento de estarem a tratar de algo que lhes pertencia, já que tal casa, segundo o companheiro da ré, pertencia aos cinco irmãos e, nessa perspectiva, era, também, proprietário - 11º.

Situação que ainda hoje se mantém - 12º.

Em EE, a procura de casa para arrendar não tem significado visível - 13º.

Este Tribunal da Relação considera ainda que se encontram provados, nos termos das disposições combinadas dos artigos 362º e 363º, nºs 1 e 2, do Código Civil (CC), 659º, nº 3, e 713º, nº2, do CPC Assento nº 14/94, de 26-5-1994, DR 1ª série-A, de 4-10-94.

, mais os seguintes factos: A aquisição do prédio urbano, descrito em A), a favor dos autores, encontra-se inscrita no registo predial, desde 24 de Outubro de 1995, por dissolução da comunhão conjugal e sucessão hereditária, por óbito de FF, casada que foi com António Rebelo, na separação de bens, deferida em partilha extrajudicial – Documento de folhas 7 e verso.

Adolfo de Almeida faleceu no dia 12 de Abril de 1982, sem testamento, no estado civil de solteiro – Documento de folhas 88.

Adolfo de Almeida era irmão de FF, aludida em B), no conjunto dos cinco irmãos que sucederam por óbito de seus pais.

A presente acção deu entrada em juízo, no dia 30 de Outubro de 1997 – Documento de folhas...

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