Acórdão nº 211/19.5YRCBR de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Janeiro de 2020
Magistrado Responsável | FALCÃO DE MAGALHÃES |
Data da Resolução | 21 de Janeiro de 2020 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I - Relatório: A) - 1) - No processo iniciado por reclamação apresentada em 22/8/2018, no CENTRO DE ARBITRAGEM DE CONFLITOS DE CONSUMO DO DISTRITO DE COIMBRA, por M...1, residente na Lousã, contra “E..., S.A.
", com sede em Lisboa, vieram contestar, quer esta empresa, quer a ...; 2) – Em 5/5/2019, veio a E..., SA, requerer o adiamento da tentativa de conciliação e eventual audiência; 3) – A 1ª intervenção do Sr. Arbitro documentada nos autos de reclamação teve lugar em sede de audiência de julgamento, realizada no dia 5/6/2019; 4) – Em 18/6/2019 foi proferida decisão pelo Sr. Arbitro, que, na procedência da reclamação, condenou as “…reclamadas a pagar o montante de 2.137,00€ acrescido de Iva à taxa legal, pago em excesso, referente ao período de 20-2- 2017 a 11-3-2018.”.
5) – Nessa decisão deu-se como provado o seguinte: 1. A reclamante é titular de contrato de energia tendo como código de ponto de entrega o nº PT 0002 ...,sito na Rua ...
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No ano de 2017 tinha contrato em regime bi-horário, com conta certa, pagando mensalmente 217 €.
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Em Dezembro de 2017 recebeu a factura de acerto anual no montante de 528,00 €, valor esse que foi debitado em conta a 5-1-2018.
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No final de Dezembro de 2017 cancelou o contrato com a E... passando em Janeiro de 2018 a ter contrato com a E...
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Por via dessa alteração a E... procedeu a novo acerto o qual foi debitado em conta a 18-2-2018 no montante de 241,82€, fechando o ano de 2017 com o pagamento total de 3.156,91€, com um gasto mensal de 263,08 €.
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Em 18-1-2018 a reclamante reportou a situação de um excesso de registo de consumo.
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Em 12-3-2018 foi colocado um novo contador em virtude da existência de uma anomalia no funcionamento do contador.
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Em 21-3-2018 a E... confirmando a existência de uma anomalia no contador.
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Em 26-2-2018 as contagens eram de 13948,5879,13544 respectivamente vazio, ponta e cheias.
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Em 12-3-2018 (mudança do contador) a empresa registou as contagens 14317,6024,13900-vazio, ponta e cheias num total de 870 kwh num período de 14 dias.
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Em 27-3-2018 nova contagem 213,85,192-vazio, ponta, cheias o que contabiliza 489 kwh em 17 dias 12. Em 27-4-2018 outra contagem 509,222,478 num total de 1209 kwh sendo o gasto nos 31 dias de 720 kwh,23,23 kwh por dia 13. O agregado familiar é constituído por três adultos.
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O contador foi sujeito a perícia no dia 6 de Março de 2019 tendo o técnico que a executou referido existir discrepância no dia e hora marcados.
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No dia da perícia pelas 10h30 o contador marcava 14-3-2018-16h 22m.
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Com referência ao período de 20-2-2017 a 11-3-2018 foi cobrado a mais à reclamante a quantia de 2.137,00 € acrescido de Iva à taxa legal.
6) – Notificada desta decisão veio a E..., SA, invocando o disposto nos n.°s 1 e 2 do art.° 45.° da Lei da Arbitragem Voluntária, expor que, em face dos factos dados como provados não estava em condições de cumprir o que foi decidido na sentença já que, entre 27 de Fevereiro de 2017 e 30 de Dezembro de 2018 a reclamante não era sua cliente.
7) – Na sequência disso, em 25/7/2019, a decisão de 18/6/2019 veio a ser rectificada, passando a valer com o seguinte dispositivo: «[…] Julgando parcialmente procedente a presente reclamação fixa-se o montante indemnizatório em 2.137,00€(dois mil cento e trinta e sete euros) acrescido de IVA à taxa legal, referente ao período de 20-2-2017 a 11-3-2018, sendo a co-responsabilidade da EDP Comercial restrita ao montante de 356,00€ (trezentos e cinquenta e seis euros), acrescido de IVA à taxa legal, referente ao período de 31-12-2017 a 11-3 2018 […]».
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– Notificada desta decisão em 29/7/2019, veio a “E..., S.A.”, invocando o disposto nas alíneas ii), v), vi) e vii) do n.º 3 do artigo 46º da Lei n.º 63/2011, de 14 de Dezembro, deduzir AÇÃO DE ANULAÇÃO DE SENTENÇA ARBITRAL contra a Reclamante M...
Pediu a anulação da referida sentença, sustentando, para alicerçar o peticionado, o que, em primeiro lugar e em síntese, se passa a expor: - A verificação extraordinária do contador foi requerida pela Ré, de acordo com a proposta apresentada pelo tribunal Arbitral, tendo o Tribunal Arbitral indicado o laboratório L... para a realização da perícia, tendo esta sido realizada em 06.03.2019, tendo sido elaborado o competente relatório; - O objectivo da perícia era, em termos práticos, verificar se o contador estava a funcionar em conformidade com os parâmetros definidos na legislação aplicável, nomeadamente na norma EN50470-3 de 2006/06, e, bem assim, se o funcionamento do contador apresentava alguma desconformidade que gerasse um incremento dos consumos registados; - Da leitura do quadro de conclusões constante da parte final do relatório, resulta que o contador estava em prefeito estado de funcionamento, deitando “por terra” a alegação da Ré de que o contador estava a funcionar incorrectamente devido a uma “anomalia”.
A decisão proferida pelo Tribunal arbitral, atendendo à reclamação da Ré - ou seja, julgando provado que o contador tinha uma anomalia e, bem assim, que essa anomalia incrementava os consumos - desconsiderou por completo os argumentos da Autora e, bem assim, do relatório pericial apresentado, sem que tivesse procurado obter esclarecimentos do Sr. Perito e sem haver prova junta aos autos que lhe permitisse ter um entendimento diferente do relatório pericial. E, sobre esta matéria, concluiu a Autora: - A pretensão da Ré não poderia proceder, “…nomeadamente por haver prova junta aos autos que lhe permitisse ter um entendimento diferente do relatório pericial.”; - Na fundamentação da sentença não é referido, explicado ou esclarecido qual o cálculo que permitiu ao Tribunal concluir que entre 31-12-2017 e 11-03-2018 a Autora facturou indevidamente à Ré a quantia de €356,00 (trezentos e cinquenta e seis euros).
- “o relatório e as suas conclusões são uma prova essencial para a boa decisão da causa é entendimento da Autora que o facto de o Tribunal não se ter pronunciado sobre o mesmo é manifestamente ilegal e fundamento para a presente anulação.”; - Ao não pronunciar-se sobre o relatório e ao não fundamentar devidamente a decisão tomada o tribunal acaba por incumprir o disposto no n.º 3 do artigo 42.º da LAV o que fundamenta a presente acção de anulação nos termos artigo 46.º n.º 3 al. a) sub. v) e vi) da LAV.
A Ré, na Oposição que deduziu, diz manter “…tudo aquilo que já alegou e invocou ao longo do processo que correu termos no Tribunal Arbitral de Coimbra”, e requerer que se determine “…que o Tribunal Arbitral retome o processo Arbitral para sanação dos vícios que existirem…”, anunciando, que, assim não sucedendo, é sua intenção “…fazer uso do disposto no artº. 46º nº. 9 da referida Lei 63/2011 de 14/12.”.
Vejamos.
II - A Lei n.º 23/96 (LEI DOS SERVIÇOS PÚBLICOS),de 26 de Julho, na redacção aplicável – a da Lei n.º 10/2013, de 28/01 – abrangendo o serviço de fornecimento de energia eléctrica, (nº 2, b), do artº 1), “…consagra regras a que deve obedecer a prestação de serviços públicos essenciais em ordem à protecção do utente.” (Artº 1.º, nº 1).
Ora, de acordo com o disposto no nº 1 do artº 15º desta Lei nº 23/96, “Os litígios de consumo no âmbito dos serviços públicos essenciais estão sujeitos a arbitragem necessária quando, por opção expressa dos utentes que sejam pessoas singulares, sejam submetidos à...
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