Acórdão nº 185/07.5TBANS-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Junho de 2011

Magistrado ResponsávelCARLOS GIL
Data da Resolução28 de Junho de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em audiência, os juízes abaixo-assinados da segunda secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra: 1. Relatório A 09 de Setembro de 2009, por apenso à acção executiva sob forma comum nº 185/07.5TBANS-B.C1, instaurada pelo Banco (…), SA, no Tribunal Judicial da Comarca de Ansião, J (…) deduziu oposição à referida execução pugnando pela total extinção da acção executiva, na parte que lhe diz respeito.

Em síntese, o opoente fundamenta a sua pretensão na alegada invalidade do aval que prestou por se achar incapaz de reger a sua pessoa e os seus bens, tanto que foi declarado interdito por sentença proferida a 20 de Dezembro de 2007, fixando-se o começo da incapacidade em Julho de 2001, na circunstância das livranças não terem sido apresentadas a pagamento e na ineptidão do requerimento executivo, em virtude de aí não ter sido alegada a relação subjacente às livranças exequendas.

A oposição foi liminarmente recebida, vindo o exequente a oferecer contestação em que alegou que não tinha conhecimento da alegada incapacidade do opoente na data da prestação do aval, que as livranças exequendas não carecem de protesto por falta de pagamento para ser exequíveis, pugnando pela total improcedência da oposição.

A 22 de Janeiro de 2010, o opoente foi convidado a apresentar nova petição a fim de concretizar a matéria articulada no artigo 6º da oposição, convite que o opoente acatou, sendo o articulado aperfeiçoado notificado ao exequente que manteve a posição assumida na contestação que havia já oferecido.

Proferiu-se despacho saneador em que se julgou improcedente a excepção dilatória de ineptidão do requerimento executivo e da inexequibilidade dos títulos exequendos, procedendo-se à condensação da factualidade considerada relevante para a boa decisão da causa, discriminando-se os factos assentes dos controvertidos, estes últimos a integrar a base instrutória.

As partes ofereceram as suas provas, requerendo o opoente a gravação da prova produzida no decurso da audiência de discussão e julgamento.

O exequente veio requerer que fosse dado sem efeito o seu requerimento probatório.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com registo da prova pessoal aí produzida, respondendo-se, seguidamente, à matéria vertida na base instrutória.

Proferiu-se sentença que julgou totalmente improcedente a oposição à acção executiva.

Inconformado com a sentença, o opoente interpôs recurso de apelação contra a mesma, formulando as seguintes conclusões: “ I. O tribunal a quo julgou como provado que “Pelo menos, à data de emissão dos documentos aludidos em A) a F) dos factos assentes e seu aval, já era notado, pelo menos, com o esclarecimento, por pessoa que se relacionasse próximo com o opoente J (…) que o mesmo apresentava discurso ininteligível, desorientação temporo-espacial e em relação a si próprio e alterações mnésicas;” II. Da prova testemunhal produzida resultou clara quer (1) a notoriedade da incapacidade do recorrente, quer (2) a dita incapacidade constante em L) dos factos provados: “apresenta ao corte transversal actual, entre outros sintomas, discurso por vezes ininteligível, desorientação temporo-espacial e em relação a si próprio, alterações mnésicas graves, designadamente memória de fixação, recente e de evocação e perturbações de compreensão e de cálculo, não parecendo compreender as questões colocadas e não reconhece o dinheiro.” III. E para esta decisão é relevante desde logo o depoimento das testemunhas (…) IV. Deste modo, o tribunal a quo devia ter dado como provado que “À data de emissão dos documentos aludidos em A) a F) dos factos assentes e seu aval, já era notado e por qualquer pessoa diligente ou que se relacionasse com o opoente J (…), nomeadamente o exequente, que o mesmo padecia do quadro clínico e efeitos referidos em L) dos factos assentes, e designadamente que não conseguia alcançar o sentido do declarado e exarado nos documentos referidos em A) a F) dos factos assentes.” V. Dos autos consta uma sentença de interdição, fixando a data em que o recorrente deixou de ter capacidade – Julho de 2001 - de gerir a sua pessoa e dispor dos seus bens, o que constitui uma presunção judicial, nos termos do disposto no artigo 351º do CC.

  1. As presunções são ilações que o julgador retira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido, nos termos do disposto no artigo 349º do CC.

  2. Neste sentido, o tribunal a quo devia ter articulado a prova testemunhal produzida com a sentença judicial de interdição, dando como provado o artigo 1º da base instrutória.

  3. Sem conceder, a existência de uma sentença judicial de interdição do recorrente é bastante para a anulabilidade dos avais prestados pelo recorrente.

  4. Pelo que a prestação dos avais realizados pelo recorrente são anuláveis, nos termos do disposto no artigo 257º, nº 1 do CC.

  5. A sentença recorrida viola o disposto nos artigos 257º 349º e 351º do CC.

” O recorrido contra-alegou pugnando pela total improcedência do recurso.

Colhidos os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir.

2. Questões a decidir tendo em conta o objecto do recurso delimitado pelo recorrente nas conclusões das suas alegações (artigos 684º, nº 3 e 690º nºs 1 e 4, ambos do Código de Processo Civil, na redacção aplicável a estes autos[1]), por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil 2.1 Da impugnação da resposta ao artigo 1º da base instrutória; 2.2 Da anulabilidade do aval prestado por J (...), com fundamento em incapacidade acidental. 3. Fundamentos 3.1 Da impugnação da resposta ao artigo 1º da base instrutória Enquanto o Supremo Tribunal de Justiça, apenas excepcionalmente conhece de matéria de facto (artigo 26º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais), o Tribunal da Relação, é um tribunal de instância, em regra a segunda instância (artigo 210º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa) e, como tal, conhece de direito e de facto (artigo 712º do Código de Processo Civil).

Assim, “a decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação: a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 690º-A, a decisão com base neles proferida; b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas; c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou” (artigo 712º, nº 1, do Código de Processo Civil, na redacção aplicável a estes autos e que é a que vigorava antes da entrada em vigor das alterações introduzidas pelo decreto-lei nº 303/2007, de 24 de Agosto, porquanto as alterações emergentes deste diploma, em matéria de recursos, só se aplicam a processos instaurados a partir de 01 de Janeiro de 2008 – artigos 11º e 12º, nº 1, ambos do decreto-lei nº 303/2007).

“No caso a que se refere a segunda parte da alínea a) do número anterior, a Relação reaprecia as provas em que assentou a parte impugnada da decisão tendo em atenção o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados” (artigo 712º, nº 2, do Código de Processo Civil, na redacção aplicável a estes autos).

“A Relação pode determinar a renovação dos meios de prova produzidos em 1ª instância que se mostrem absolutamente indispensáveis ao apuramento da verdade, quanto à matéria de facto impugnada, aplicando-se às diligências ordenadas, com as necessárias adaptações, o preceituado quanto à instrução, discussão e julgamento na 1ª instância e podendo o relator determinar a comparência pessoal dos depoentes” (artigo 712º, nº 3, do Código de Processo Civil, na redacção aplicável a estes autos).

“Se não constarem do processo todos os elementos probatórios que, nos termos da alínea a) do nº 1, permitam a reapreciação da matéria de facto, pode a Relação anular, mesmo oficiosamente, a decisão proferida na 1ª instância, quando repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto ou quando considere indispensável a ampliação desta; a repetição do julgamento não abrange a parte da decisão que não esteja viciada, podendo, no entanto, o tribunal ampliar o julgamento de modo a apreciar outros pontos da matéria de facto, com o fim exclusivo de evitar contradições na decisão” (artigo 712º, nº 4, do Código de Processo Civil, na redacção aplicável a estes autos).

“Se a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa não estiver devidamente fundamentada, pode a Relação, a requerimento da parte, determinar que o tribunal de 1ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados ou repetindo a prova, quando necessário; sendo impossível obter a fundamentação com os mesmos juízes ou repetir a produção da prova, o juiz da causa limitar-se-á a justificar a razão da impossibilidade” (artigo 712º, nº 5, do Código de Processo Civil, na redacção aplicável a estes autos).

No recurso em que se vise a impugnação da matéria de facto, o recorrente deve “obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnada diversa da recorrida” (artigo 690º-A, nº 1, do Código de Processo Civil, na redacção aplicável a estes autos).

“No caso previsto na alínea b) do número...

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