Acórdão nº 179/10.3GBVNO.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelPAULO GUERRA
Data da Resolução26 de Outubro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I - RELATÓRIO 1.

No processo comum singular n.º 179/10.3GBVNO do 2º Juízo do Tribunal Judicial da Guarda, por sentença datada de 10 de Março de 2011, foi decidido condenar o arguido A...

: · pela prática, em autoria material, na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo art.º 143.º, n.º1 do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 5,00, o que perfaz a quantia global de €600,00 (seiscentos) euros; · a pagar ao demandante B... a quantia de €800,00 (oitocentos euros) a titulo de danos morais sofridos com a actuação do demandado acrescido de juros de mora à taxa legal contados desde a notificação do pedido cível ao demandado e até efectivo e integral pagamento; · a pagar ao demandante B... a quantia de €293,10 (cento e dezoito euros e vinte e oito cêntimos) a titulo de danos patrimoniais sofridos com a actuação do demandado acrescido de juros de mora à taxa legal contados desde a notificação do pedido cível ao demandado e até efectivo e integral pagamento; · a pagar ao demandante Hospital de WW... EPE a quantia de 111,50€ a titulo de danos patrimoniais sofridos com a actuação do demandado acrescido de juros de mora à taxa legal contados desde a notificação do pedido cível ao demandado e até efectivo e integral pagamento; · nas custas criminais do processo, com taxa de justiça que se fixa em 2 UC.

2.

Inconformado, o arguido recorreu da sentença, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): «1. O depoimento da testemunha D..., não é merecedor de qualquer credibilidade, uma vez que está recheado de contradições e é inverosímil face às regras da experiência; 2. O depoimento daquela testemunha, único meio de prova que foi produzido em Audiência de julgamento a respeito das alegadas ofensas corporais, levanta dúvidas insanáveis; 3. Afiguram-se-nos erróneas as conclusões das alíneas a) a i) da matéria de facto dada como provada na douta sentença ora posta em crise; 4. As dúvidas são mais que as certezas, motivo pelo qual o Tribunal recorrido devia ter aplicado o princípio in dubio pro reo e absolvido o arguido, o que não fez; 5. O ónus da prova cabe à acusação e não à defesa e, sendo um direito do arguido manter- se em silêncio sobre os factos de que é acusado, não pode ser prejudicado por esse motivo, como entende que o foi na douta sentença recorrida; 6. Nos termos da alínea a) e b) do n° 3 do art° 412° do Cód. Proc. Penal, deverão ser consideradas como não provadas as alíneas a) a i, dos “factos provados” por ausência de prova credível e segura da sua verificação; 7. Deve o arguido ser absolvido da acusação e, bem assim, dos pedidos cíveis contra si formulados; 8. Subsidiaria e cautelarmente, entende o arguido ser as condenações aplicadas excessivamente severas e desproporcionadas em relação aos factos apurados, à culpa, à sua personalidade e às exigências de prevenção; 9. Deve ser reduzida a pena de multa aplicada para, no máximo, metade do valor, o que permitirá sancionar convenientemente a conduta, bem como acautelar a defesa da sociedade e a prevenção da criminalidade; 10. A douta sentença recorrida considerou um período de incapacidade superior ao que resulta dos “factos provados” pelo que, incorreu na nulidade prevista no art° 379°, n° 1, alínea b), do Cód. Proc. Penal, o que se invoca com legais consequências; 11. Subsidiaria e cautelarmente deve a quantia arbitrada a título de danos morais ser reduzida, no máximo, para metade daquela que foi aplicada na douta sentença recorrida por tal ser adequado e proporcional às reduzidas consequências que terão resultado da acção do arguido; 12. Ainda subsidiaria e cautelarmente deve ser reduzida para, no máximo, o valor de 106,58 € a quantia atribuída a título de danos patrimoniais pois, apenas resultou provado um período de incapacidade para o trabalho (baixa) de 8 dias; 13. Existe erro notório na apreciação da prova; 14. A sentença, embora douta, foi incorrectamente julgada; 15. Para além do mais violou, entre outras, as seguintes disposições legais – artigo 143°, n° 1 do Cód. Penal; art°s 126°; 379°, n° 1, alínea b) e 410°, n° 2, alínea b) e c), do Cód. Proc. Penal.

TERMOS EM QUE, NOS DEMAIS E MELHORES DE DIREITO QUE V. EXCIAS MERETISSIMOS JUIZES DESEMBARGADORES HÃO-DE SUPRIR, DEVE O PRESENTE RECURSO SER ADMITIDO E JULGADO PROCEDENTE E, EM CONSEQUÊNCIA, SER:

  1. O ARGUIDO ABSOLVIDO DA PRÁTICA DO CRIME DE OFENSAS CORPORAIS SIMPLES E DOS PEDIDOS DE INDEMNIZAÇÃO CIVEIS, COM BASE NO PRÍNCIPIO IN DUBIO PRO REO, B) CAUTELARMENTE E, CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA, SER A PENA DE MULTA E O VALOR DA INDEMNIZAÇÃO POR DANOS NÃO PATRIMONIAIS REDUZIDAS PARA, NO MÁXIMO, METADE DOS RESPECTIVOS VALORES E A INDEMNIZAÇÃO POR DANOS PATRIMONIAIS FIXADA EM QUANTIA NÃO SUPERIOR A 106,38 €», 3.

O Ministério Público em 1ª instância respondeu ao recurso, defendendo o sentenciado.

4.

Admitido o recurso e subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se, a fls. 164-166, aderindo à argumentação do Colega de 1ª instância, peticionando a final a total improcedência do recurso.

5.

Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, foram colhidos os vistos, após o que foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419.º, n.º 3, alínea c) do mesmo diploma.

II – FUNDAMENTAÇÃO 1.

Conforme jurisprudência constante e amplamente pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cfr. artigos 119º, n.º 1, 123º, n.º 2, 410º, n.º 2, alíneas a), b) e c) do CPP, Acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória do STJ de 19/10/1995, publicado em 28/12/1995 e, entre muitos, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242 e de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271).

Assim, balizados pelos termos das conclusões[1] formuladas em sede de recurso, as questões a decidir prendem-se com o seguinte: a)- existe a nulidade da sentença prevista no artigo 379º/1 b) do CPP? b)- houve ou não erro de julgamento quanto à factualidade a) a i) do rol de factos provados? c)- foi violado o princípio do «in dubio pro reo»? d)- houve erro notório na apreciação da prova? e)- a pena de multa foi exagerada? f)- é recorrível a decisão cível? 2.

DA SENTENÇA RECORRIDA 2.1. O tribunal a quo considerou provados os seguintes factos, com interesse para a decisão deste recurso (transcrição):

  1. No dia … de 2010, cerca das 09 horas e 30 minutos, quando se encontravam junto à Rotunda …, área desta comarca, gerou-se um desentendimento entre o ofendido B… e o arguido.

  2. Na sequência desse desentendimento, o arguido, com as suas mãos, empurrou o ofendido, tendo este se desequilibrado e caído contra o solo, onde bateu com a cabeça, com a face e com o punho direito.

  3. Ao actuar da forma supra descrita o arguido provocou, de modo directo e necessário, ao ofendido, que é o beneficiário n.º 095185812 da Segurança Social, ferida do lábio superior com 0,5 cm de comprimento, dor no punho direito com edema, cefaleias na região frontal direita e traumatismo do punho direito.

  4. Lesões essas que determinaram ao ofendido, pelo menos, um período de 10 [dez] dias para a cura, 5 [cinco] dos quais, com afectação da capacidade de trabalho geral, e 8 [oito] com afectação da capacidade para o trabalho profissional.

  5. O arguido bem sabia que com o seu comportamento acima descrito molestava fisicamente o ofendido e lhe causava ferimentos, dores e padecimento, objectivo que logrou alcançar e quis fazê-lo.

  6. O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente.

  7. Bem sabendo que o seu comportamento era e é proibido e punido por lei penal.

  8. O demandante sofreu fortes dores e incómodos com a agressão física perpetrada pelo demandado.

  9. Em consequência da agressão o demandante ficou de "baixa" num período de 22 dias.

  10. O subsídio de doença que o demandante recebeu foi de € 17,65/ dia.

  11. Face à agressão o demandante foi tratado no Hospital, tendo pago € 8,40.

  12. Na sequência da agressão, o ofendido foi transportado de ambulância para o Hospital tendo pago aos Bombeiros Voluntários de Fátima a quantia de € 30,60.

  13. Na sequência dos factos referidos supra B... recebeu tratamento hospitalar no Hospital de WW... EPE.

  14. O tratamento efectuado importa na quantia de €111,50.

  15. Do CRC do arguido nada consta.

    Mais se provou que: p) Aquando do referido em b) o ofendido estava em cima de uma bicicleta.

  16. O ofendido auferia o salário médio mensal de cerca €1000,00.

  17. O arguido está desempregado, vive com os pais».

    2.2. Quanto A FACTOS NÃO PROVADOS, temos o seguinte, com interesse para a sorte deste recurso: «1.

    O demandante, em média, auferia mensalmente, pelo menos, € 1 400,00».

    2.3. Para formar a sua convicção, argumentou assim o tribunal «a quo», na parte que interessa à economia decisória deste recurso: «O tribunal formou a sua convicção quanto aos factos provados: - nas declarações de D..., que assistiu aos factos descritos na acusação e que em audiência, e após ter visualizado o arguido, não teve duvidas em lhe atribuir a autoria dos mesmos.

    - tiveram-se em conta as declarações de F..., mulher do queixoso e que não obstante esta qualidade depôs com isenção e credibilidade e que descreveu das lesões e consequências a nível pessoal e patrimonial que o acto perpetrado pelo arguido (ao qual não assistiu) teve para o seu marido.

    Mencionou do salário médio mensal auferido por este.

    Considerou-se o Exame médico-legal de fls. 53 e ss que atesta as lesões padecidas pelo ofendido.

    Documentos de fls. 75, 80 e 81, 82, 83 a 85, 86 e 87, que atestam, respectivamente o seguinte: valor do tratamento prestado ao ofendido; período de incapacidade para o trabalho sofrido pelo ofendido; percentagem de remuneração paga ao ofendido no período de incapacidade; retribuições mensais recebidos pelo ofendido, pagamento pelo ofendido de taxa de urgência...

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