Acórdão nº 217/09.2PEAVR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Fevereiro de 2011
Magistrado Responsável | PAULO GUERRA |
Data da Resolução | 16 de Fevereiro de 2011 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
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No processo comum colectivo n.º 217/09.2PEAVR do Juízo de Média Instância Criminal de Aveiro, o arguido PM..., devidamente identificado nos autos, por acórdão datado de 16 de Julho de 2010, foi CONDENADO pelos seguintes crimes: a) pela prática, em autoria material, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203º, nº 1, e 204º, nº 2, alínea e), do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão (factos A do rol de factos provados); b) pela prática, em autoria material, de um crime de furto qualificado tentado, p. e p. pelos arts. 22º, nºs 1 e 2 a), 23º, nº 2, 73º, nº 1 a) e b), 203º, nº 1, e 204º, nº 2, alínea e), todos do C. Penal, na pena de 1 (um) ano e 9 (nove) meses de prisão (factos B do rol de factos provados); c) pela prática, em autoria material, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203º, nº 1, e 204º, nº 2, alínea e), do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 10 (dez) meses de prisão (factos A[1] supra); Tal Tribunal decidiu condenar o arguido, em cúmulo jurídico, na pena única de 5 (cinco) anos de prisão.
2.
Inconformado, o arguido recorreu do Acórdão, tendo finalizado a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): «1ª- O RECORRENTE FOI CONDENADO PELA PRÁTICA DE 2 (DOIS) CRIMES DE FURTO QUALIFICADO E POR 1 (UM) CRIME DE CRIME DE FURTO QUALIFICADO NA FORMA TENTADA, TENDO-LHE SIDO APLICADA UMA PENA ÚNICA DE 5 (CINCO) ANOS DE PRISÃO.
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- RELATIVAMENTE AO CRIME DE FURTO QUALIFICADO NA FORMA TENTADA DEVERIA O RECORRENTE TER SIDO ABSOLVIDO DOS MESMO EM VIRTUDE DA PROVA REALIZADA EM SEDE DE AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO NÃO SER SUFICIENTE PARA SE FORMAR UM JUÍZO DE CERTEZA QUANTO À PRÁTICA DE TAL CRIME.
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- AO NÃO PROCEDER DESSE MODO VIOLOU O TRIBUNAL AD QUO OS PRINCIPIOS DO IN DUBIO PRO REO E DA PRESUNÇÃO DA INOCÊNCIA.
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- O RECORRENTE COOPEROU COM A JUSTIÇA CONFESSANDO A PRÁTICA DOS 2 (DOIS) CRIMES DE FURTO QUALIFICADOS QUE LHE ERAM IMPUTADOS.
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- É CONVICÇÃO DO TRIBUNAL AD QUO QUE TAIS CRIMES FORAM ÚNICA E EXCLUSIVAMENTE DETERMINADOS PELA NECESSIDADE DE REALIZAÇÂO DE VALORES PARA ADQUIRIR AS DROGAS DE QUE ERA O RECORRENTE DEPENDENTE.
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- O RECORRENTE ENCONTRA-SE EM TRATAMENTO DA SUA DEPENDÊNCIA DESDE JANEIRO DE 2009, NUNCA MAIS TENDO CONSUMIDO QUALQUER TIPO DE SUBSTÂNCIA ILÍCITA.
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- O RECORRENTE ENCONTRA-SE MENIFESTAMENTE ARREPENDIDO DOS SEUS CRIMES AGORA QUE TEM CONDIÇÕES MENTAIS PARA AFERIR DA ILICITUDE DO SEU COMPORTAMENTO AO TEMPO DA PRÁTICA DOS FACTOS.
PELO EXPOSTO, A PENA DE 5 (CINCO) ANOS DE PRISÃO APLICADA REVELA-SE MANIFESTAMENTE EXCESSIVA.
TERMOS EM QUE SE REQUER RESPEITOSAMENTE SEJA DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E CONSEQUENTEMENTE · SER O RECORRENTE ABSOLVIDO DA PRÁTICA DO CRIME DE FURTO QUALIFICADO NA FORMA TENTADA, P. E P. PELOS ARTIGOS 22°, N°1, N°2, ALÍNEA A); 23°, N° 1 E N° 2; 73°, ALÍNEA A) e B); 203°, N°1 e 204°, N° 2, ALÍNEA E) DO CÓDIGO PENAL; · SER REDUZIDA A MEDIDA CONCRETA DA PENA DE PRISÃO APLICADA, NOS TERMOS DO DISPOSTO NOS ARTIGOS 72° E 73° DO CÓDIGO PENAL.
3. O Ministério Público em 1ª instância respondeu ao recurso, defendendo que: · deverá improceder o recurso na parte relativa ao erro de julgamento constante das conclusões de recurso, sendo que a prova foi apreciada livremente, mas segundo as regras da experiência comum e os depoimentos das testemunhas AC... e MA..., mostraram-se coesos, objectivos e isentos, e como tal merecedores da credibilidade que o Colectivo lhes deu; · (…) tendo em conta os factos e sua gravidade, já significativa, bem como a personalidade do arguido PM..., acima enunciada, sendo que todos os ilícitos foram cometidos num lapso temporal bastante reduzido, considera ajustado aplicar-lhe, em cúmulo jurídico, pena única de 5 (cinco) anos de prisão», opinando que «bem andou pois o Tribunal ao aplicar ao recorrente a pena única de 5 anos de prisão».
Conclui pelo pedido de improcedência de recurso.
4.
Admitido o recurso e subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se, a fls. 584-586, no sentido de que o recurso não merecer provimento, concordando com a posição do Colega de 1ª instância.
5.
Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º2, do Código de Processo Penal, foram colhidos os vistos, após o que foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419.º, n.º 3, alínea c) do mesmo diploma.
6.
Aqui se consigna que: · o arguido não se encontra preso à ordem destes autos, estando em cumprimento de pena no Pº 1587/08.5TAAVR do Juízo de Média Instância Criminal de Aveiro – cfr. despacho de fls 520.
II – FUNDAMENTAÇÃO 1.
Conforme jurisprudência constante e amplamente pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cfr. artigos 119º, n.º 1, 123º, n.º 2, 410º, n.º 2, alíneas a), b) e c) do CPP, Acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória do STJ de 19/10/1995, publicado em 28/12/1995 e, entre muitos, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242 e de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271).
Assim, balizados pelos termos das conclusões[2] formuladas em sede de recurso, as questões a decidir consistem em saber: - se há erro de julgamento quanto à factualidade B, devendo antes ser absolvido da prática do crime de furto qualificado, na forma tentada; - se a pena aplicada é excessiva.
2.
DO ACÓRDÃO RECORRIDO 2.1.
O tribunal a quo considerou provados os seguintes factos, com interesse para a decisão deste recurso (transcrição): A 1) Entre as 12.00 horas do dia 22 e as 20.00 horas do dia 23 de Janeiro de 2009, o arguido PM... dirigiu-se à residência pertencente a AG..., sita na Rua …, Aveiro, com o intuito de aí entrar e retirar os objectos e valores que encontrasse e lhe despertassem interesse, a fim de os fazer seus.
2) Aí chegado, saltou o muro do pátio existente nas traseiras e partiu o vidro, danificando também a persiana, da janela de acesso à copa junto à cozinha e entrou.
3) Já dentro da habitação, retirou e levou consigo, fazendo-os seus: · um relógio com bracelete em ouro, no valor de 450 €; · uma pulseira em ouro grossa, no valor de 1500 €; · um par de brincos em ouro, no valor de 300 €; · duas alianças em ouro, no valor de 350 €; · um fio em ouro, no valor de 380 €; · uma pulseira em ouro, no valor de 700€; · um broche prateado, com uma pedra; · dois alfinetes em prata, de lapela para gravata, com o signo Sagitário; · um broche com três golfinhos prateado; · um broche prateado com várias pedras; · um pin prateado, com o brasão do signo Sagitário; · um pin dourado, em forma de cruz, com a inscrição “Jesus”; · um relógio de peito, de senhora de marca “Lorus”, com mostrador branco; · uma pulseira/bracelete dourada; · uma parte de um fio de fantasia com quatro peças; · um broche dourado e cinzento; · uma parte de uma bracelete de relógio de senhora, prateada apenas com dois elos; · um colar de fantasia, com pedras azuis e bolas pequenas douradas; · três partes de um fio prateado, todos estes objectos de valor não apurado; · as chaves de casa e · as chaves de um veículo (objectos descritos a fls. 16 e 26 do Ap. 206/09.7PBAVR, que vieram a ser recuperados no dia 29 de Janeiro de 2009, na casa do arguido PM...).
B 4) No dia 24 de Janeiro de 2009, entre as 12.30 horas e as 13.30 horas, o arguido PM... dirigiu-se à residência pertencente a LM…, sita na Rua …, Aveiro, com o intuito de aí entrar e retirar os objectos e valores que encontrasse e lhe despertassem interesse, a fim de os fazer seus.
5) Na altura a LM… estava em casa a tomar banho e tinha o rádio ligado.
6) Aí chegado, o arguido PM...partiu a telha de fibra que tapa o gradeamento da parte inferior da marquise daquela residência, passou pelo espaço entre as grades e entrou na marquise.
7) Depois, abriu a porta de sacada que dá acesso à sala e dirigiu-se ao hall de entrada, mas apercebendo-se da presença de gente no interior da habitação, bem como de vizinhos no interior do prédio que, entretanto, o tinham descoberto, fugiu, sem nada levar consigo.
8) Naquela habitação existiam objectos e valores susceptíveis de serem retirados pelo arguido PM...de valor superior a 1000,00€.
C 9) Nesse mesmo dia, logo depois, o arguido PM... dirigiu-se para as instalações da Fundação …, sitas na Avenida …, Aveiro, com o intuito de aí entrar e retirar os objectos e valores que encontrasse e lhe despertassem interesse, a fim de os fazer seus.
10) Aí chegado, forçou o portão automático que dá acesso ao jardim.
11) Uma vez no jardim, deslocou-se à parte lateral do edifício, forçou a janela de postigo em madeira que dá acesso à cave e entrou.
12) No interior, o arguido PM...percorreu as diversas divisões, remexeu em diversas gavetas, onde se encontrava a chave de um cofre que abriu e de onde retirou diversos artigos.
13) Assim, dos locais onde se encontrava, no interior da Fundação, retirou: · Treze réplicas de moedas de colecção, em prata, banhadas a ouro amarelo, com peso total de 221,6 gramas, no valor global de 200,00€; · Um botão de punho, em ouro amarelo, com o peso de 4,2 gramas, no valor de 70,00€; · Um par de brincos, em ouro amarelo, com pedra de água marinha, com o peso de 5,8 gramas, no valor de 95,00€; · Duas alianças, em ouro amarelo, com o peso de 2,95 gramas, com o valor de 95,00€; · Um par de brincos, em ouro amarelo, com marfim, com o peso de 6,39 gramas, no valor de 20,00€; · Dois alfinetes de gravata, em ouro branco, com diamante encrostado, com o peso de 2,5 gramas, no valor de 250,00€; · Um alfinete de gravata, com o símbolo do clube “Galitos”, com o peso de 2,7 gramas, no valor de 50,00€; · Um alfinete de gravata, em ouro branco, com o peso de 0,80 gramas, no valor de 15,00€; · Dois botões de punho, em ouro amarelo, com o símbolo de uma âncora, com o peso de 8,20 gramas, no valor de 120,00€; · Uma pulseira, em ouro amarelo, com medalha e inscrição “Lembrança de meus avozinhos”, com o peso de 2,65 gramas, no valor de...
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