Acórdão nº 132/10.7GBVNO.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 02 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelISABEL VALONGO
Data da Resolução02 de Outubro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência os Juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I - Relatório 1. No 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Ourém, foi submetido a julgamento, em processo comum, com intervenção de tribunal colectivo, o arguido A...

, casado, vigilante, nascido em 16 de Junho de 1970, filho de (...) e de (...), natural da freguesia de (...), concelho de Chaves, residente na (...), Fátima, sob acusação da prática, em concurso real de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203° nº 1; de um crime de furto qualificado continuado, p. e p. pelo artigo 204° nº 2 al. e); de um crime de dano qualificado continuado, p. e p. pelo artigo 213° nº 2, al. a) e de um crime de dano qualificado, p. e p. pelo artigo 213° nº 1 al. e), todos do Código Penal.

* 2.

C...

formulou pedido de indemnização contra o arguido, pedindo a sua condenação a pagar-lhe as importâncias de € 46.207,15, a título de indemnização por danos patrimoniais e de € 15.000,00, a título de compensação por danos não patrimoniais, bem como juros de mora, à taxa legal, desde a data da notificação para contestar o pedido cível, até integral pagamento.

* 3. Por sentença de 29.02.2012 foi a acusação julgada parcialmente provada e procedente e, em consequência o arguido A... foi absolvido do crime de furto qualificado, na forma continuada, por que vinha acusado. E foi condenado o como autor material e, em concurso real de: - Um crime de furto simples, p. e p. pelo art. 203º nº 1 do CP, na pena de dezoito meses de prisão; - Um crime de dano qualificado, na forma continuada, p. e p. pelos arts. 212º nº 1 e 213º nº 2 al. a) do CP na pena de três anos e seis meses de prisão; - Em cúmulo jurídico das penas parcelares, foi o arguido condenado na pena unitária de quatro anos e dois meses de prisão.

Ao abrigo do disposto nos arts. 53º e seguintes do Código Penal, foi determinada a suspensão da execução da pena imposta ao arguido A..., acompanhada de regime de prova e, em consequência, condenado a submeter-se ao plano individual de readaptação a organizar pelo I.R.S. e pelo período de quatro anos e dois meses.

O pedido cível foi julgado parcialmente provado e procedente e, em consequência, condenado o responsável civil A... a pagar à lesada C... a importância de € 39.747,84, a título de indemnização por danos patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da notificação para contestar o pedido cível, até integral pagamento, absolvendo-se o responsável civil do remanescente do pedido.

* 4. Inconformado o arguido interpôs recurso da sentença, decidido por acórdão desta Relação exarado a fls. 606 e sgs. que determinou que o vício previsto no artigo 379.°, n.° 1 alínea a) do C. P. P. fosse expurgado cumprindo-se «o dever de enumeração, como provados ou não provados, dos factos consubstanciadores dos danos e/ou prejuízos, com o respectivo exame crítico», desse modo tendo «ficado prejudicado o conhecimento das restantes questões elencadas nas conclusões da motivação do recurso».

* Produzido novo acordão pela 1ª instância, o arguido A... , interpôs novamente recurso por não se conformar com a sua condenação como autor material e em concurso real , pela prática de : um crime de furto simples , p. e p. pelo art.° 203.°,n.° 1 , do Código Penal na pena de dezoito meses de prisão ; um crime de dano qualificado, na forma continuada , p. e p. pelos art:º s 212.°, n.º 1, e 213.°, n.º 2 , al a) do Código Penal, na pena de três anos e seis meses de prisão.

Em cúmulo jurídico de tais penas, na pena única de quatro anos e dois meses de prisão, suspensa na sua execução, acompanhada de regime de prova, com obrigação de se submeter ao plano individual de readaptação, a organizar pelo IRS, pelo período de quatro anos e dois meses contados do trânsito em julgado da decisão, sem prejuízo da possibilidade de prorrogação, o qual incluirá os seguintes deveres:

  1. Responder às convocatórias e às visitas dm técnicos do IRS e submeter-se ao plano individual de readaptação social que por aqueles vier a ser elaborado; b) Dedicar-se ao trabalho; c) Efectuar o pagamento à C... da indemnização fixada no montante de € 39.847,99, em quatro prestações anuais, até ao último dia útil de cada ano, devendo juntar documentos de quitação dos pagamentos, no prazo de trinta dias, após cada pagamento de cada prestação anual...

    Extraiu da respectiva motivação as seguintes conclusões: 1ª questão: A.

    No artigo 4.° da motivação foram identificadas seis situações demonstrativas de que o recorrente foi condenado por factos diversos dos descritos na acusação, sendo que tal condenação ocorreu fora dos casos e condições previstos no artigo 358.º, n.

    º 1, do Código de Processo Penal, porque se trata de alterações não substanciais com relevo para a decisão da causa, que não derivaram de factos alegados pela defesa, e que o tribunal a quo não comunicou ao recorrente, impossibilitando assim que ele delas se defendesse.

    B.

    Destarte, além da norma indicada na conclusão anterior, foram violadas as garantias de defesa do recorrente, consagradas no artigo 32.°, n.° 1, da Constituição, sendo, por isso, o acórdão recorrido nulo, nos termos do artigo 379.°, n.° 1, alínea b), daquele código — o que aqui se vem arguir, ao abrigo do n.° 2 deste artigo, requerendo-se que seja declarada tal nulidade e ordenada a remessa do processo ao tribunal a quo para que proceda à reabertura da audiência de julgamento e à comunicação das apontadas alterações não substanciais dos factos.

    1. questão C.

    O depoimento da testemunha B...

    - uma das provas de que o tribunal a quo se serviu para formar, decisivamente, a sua convicção em relação a grande parte da matéria de facto provada - é indirecto, porque o conhecimento que ele tem dos factos probandos resulta do que ouviu dizer ao recorrente.

    D.

    Nesse sentido, não podia ter sido valorado pelo tribunal a quo, pois o depoimento indirecto só vale relativamente ao que se ouviu dizer a outra potencial testemunha e nunca quanto a declarações de um arguido.

    E.

    Mesmo que se entenda que o artigo 129.° do Código de Processo Penal não erige uma proibição do depoimento por ouvir-dizer quando quem disse é um arguido, ainda assim o depoimento da testemunha B... não podia ter sido valorado, por não se verificar in casu nenhuma das situações ressalvadas e enumeradas, de forma categórica, na parte final do seu n.° 1.

    F.

    Sendo que não se pode equiparar a situação de impossibilidade de ser encontrado à do arguido que em audiência de julgamento invoca o seu direito ao silêncio: por um lado, porque ao regulamentar as formas admissíveis de depoimento indirecto o artigo 129.° prescreve, eoipso, as formas proibidas; por outro lado, porque isso constituiria uma inadmissível analogia in malam partem de uma norma de natureza excepcional.

    G.

    Mesmo que se faça a equiparação que acabámos de repudiar na conclusão que antecede, o depoimento da testemunha B... também não podia ter sido valorado, uma vez que o tribunal a quo não chamou o recorrente a depor - rectius, não lhe concedeu expressamente a palavra para o efeito de contraditar, querendo, os factos que essa testemunha indirecta disse ter ouvido dele.

    H.

    Em suma, o tribunal a quo serviu-se de uma prova nula e proibida pelos artigos 125.° e 129.°, n.° 1, do Código de Processo Penal, violando por isso, além destas normas, as garantias de defesa do recorrente e os princípios do contraditório, do nemo tenetur se ipsumaccusare e da imediação, consagrados nos artigos 32.°, n.

    os 1 e 5, 1.° e 2.° da Constituição, bem como o princípio da livre apreciação da prova, estatuído no artigo 127.° daquele código.

    I.

    Fundando-se o douto acórdão recorrido em provas nulas, é também ele nulo, por força do artigo 122.°, n.° 1, do Código de Processo Penal - o que aqui se vem arguir, nos termos do artigo 410.°, n.° 3, do mesmo diploma, requerendo-se que seja declarada tal nulidade e ordenada a substituição do acórdão recorrido por outro, no qual o tribunal a quo não valore o depoimento indirecto da testemunha B..., resultante do ouviu dizer ao recorrente.

    3a questão [É subsidiária das anteriores.] J Para a hipótese de se considerar que existe a nulidade arguida na conclusão anterior mas que ela, ao contrário do que aí se defende, pode ser suprida no tribunal de recurso, mediante a expurgação do depoimento indirecto, o recorrente impugna a decisão proferida sobre a matéria provada dos pontos 3 a 11 e dos pontos 12 a 52 e 55 a 66, visto que, sem essa prova proibida, nada permite concluir que tenha sido ele quem praticou os factos aí vertidos.

    K As provas invocadas pelo tribunal a quo para dar como provados os factos dos indicados pontos impõem decisão diversa da recorrida porque, ainda que conjugadamente apreciadas, são manifestamente insuficientes para se poder concluir, com o grau de certeza exigível num processo criminal, que tenha sido o recorrente o autor dos mesmos.

    L.

    Com efeito, relativamente à prova testemunhal invocada, conforme já resulta da fundamentação do acórdão, nenhuma das testemunhas aí referenciadas viu o recorrente a praticar tais factos - o que pode ser confirmado pela audição da gravação integral dos respectivos depoimentos, onde em momento algum dizem ter visto isso.

    [Os depoimentos testemunhais invocados no acórdão para fundamentar a decisão de dar como provados tais factos, mas que impõem decisão diversa da recorrida, são:

    1. Pontos 3 a 11 — sessão de 18/01/2012: 1) D...

    , com a duração de 01:26:22, iniciou-se às 11:21:50 e terminou às 12:48:11; 2) B..., numa primeira parte, com a duração de 00:05:06, iniciou-se às 16:02:25 e terminou às 16:07:31; numa segunda parte, com a duração de 00:49:53, iniciou-se às 16:09:53 e terminou às 16:59:46; 3) E...

    , numa primeira parte, com a duração de 00:11:14, iniciou-se às 17:15:31 e terminou às 17:26:45; numa segunda parte, com a duração de 00:02:46, iniciou-se às 17:36:08 e terminou às 17:38:53. B) Pontos 12 a 52 e 55 a 66— além dos dois primeiros acima indicados, ainda os seguintes da...

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