Acórdão nº 875/11.8TATNV.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Maio de 2013

Magistrado ResponsávelFERNANDA VENTURA
Data da Resolução15 de Maio de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 5.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: I. Relatório: 1. Nos presentes autos que correm seus termos no Tribunal Judicial de Torres Novas, 1º juízo, o assistente A...

, veio requerer a ABERTURA DA INSTRUÇÃO, por considerar que deveria ter sido deduzida acusação contra B...

.

Foi proferido despacho sobre a admissibilidade da instrução requerida concluindo-se: (...) Por todo o exposto, impõe-se a rejeição do requerimento de abertura da instrução apresentado pelo assistente B..., o que decido, (cfr. artigo 287.º, n.º3, parte final do C.P.P.).

(Sendo que a referência a C... se deve a mero lapso de escrita já que, como veio sendo identificado o assistente se chama A...) 2.

Inconformado, o assistente interpôs recurso da decisão, tendo formulado na respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: 1- O presente recurso tem como objecto o despacho de rejeição do requerimento de abertura de instrução por inadmissibilidade legal.

2- O Tribunal “ a quo” considera a fols., no seu despacho de rejeição que o requerimento do assistente para abertura de instrução não contém os requisitos de uma acusação, com indicação do agente, a narração dos factos que integram o crime, bem como as normas jurídicas aplicáveis não pode haver legalmente pronúncia do arguido.

3- Considerando ainda o Tribunal “a quo”, “ constata-se da sua leitura que a assistente não refere absolutamente nada relativamente ao elemento subjectivo”.

4- Tanto o Tribunal “a quo”, refere que “falta o elemento subjectivo, e que não descreve a factualidade”.

5- A verdade é que o assistente imputa ao arguido no seu Requerimento de abertura de instrução e identifica o mesmo no seu artigo 26° ( B...), narra os factos, a conduta, a acção que levou à prática de um crime de abuso de confiança, pelo o arguido, toda a acção foi narrada, bem como quem foi o seu autor. A factualidade está lá.

6- Portanto não estamos perante insuficiente factualidade, sabendo através de tal requerimento de abertura de instrução quem, quando e onde é que foram praticados e que esses factos constituem crime, no caso em apreço um crime de abuso de confiança.

7- Requerendo ainda para o efeito diligências de prova, que não foram tidas em conta e que deveriam ter sido consideradas, nomeadamente o depoimento da companhia de seguros de assistência em viagem, bem como o depoimento de D..., E..., F.. e G... , m. i. nos autos.

8- Obviamente o recorrente não concorda com a rejeição do requerimento de abertura de instrução por inadmissibilidade legal.

9- O tribunal “a quo” não observou os requisitos exigidos no artigo 287° para o requerimento de abertura de instrução, já que este era legalmente admissível.

10- Já que correspondia aos factos infracção criminal, ou seja, não há falta de tipicidade, não havendo obstáculo à abertura de instrução.

11- A par dos requisitos do artigo 287° em que o requerimento de abertura de instrução não está sujeito a formalidades especiais mas deve conter em súmula as razões de facto e de direito de discordância relativamente a não acusação, a indicação dos actos de instrução que pretenda levar a cabo, os meios de prova não considerados, bem como a remissão para o seu artigo 283° alíneas b) e c), do Código de Processo Penal.

12- Ora no caso concreto não podemos deixar de alegar que os mesmos foram observados.

13- O assistente relatou os mesmos, incluindo o lugar e o momento da prática dos factos, e a motivação da sua prática, bem como o grau de participação do denunciado, identificando-o, e ainda as circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deva ser aplicada, obedecendo assim aos requisitos do 283° do C.P.P.

14-Indicando ainda de forma expressa e inequívoca as disposições aplicáveis, os requisitos do crime de abuso de confiança, previsto e punido nos termos do artigo 205° n. ° 1 e n.° 4 do Código Penal.

15- O assistente relata sem qualquer dúvida a acção, que entregou o seu veículo automóvel, marca Land Rover, com a matrícula x..., ao B..., para o reparar, que o mesmo não obteve mais notícias sobre o seu veículo, nem nunca mais o viu, que o arguido se apoderou dele, e que após ter sido solicitado para o entregar não o entregou, tendo ficado com ele.

16- Se o fez seu, por título não translativo da propriedade, dando-lhe um destino diferente para que foi confiado, dispondo dela como se fosse sua, com o propósito de não a restituir, então há falta de tipicidade? 17- Na verdade o assistente não deixou de cumprir com os formalismos legais exigidos pelo disposto no artigo 287° do código de Processo Penal.

18- Sem prescindir sempre se dirá que o requerimento a pedir a instrução não tem que obedecer a formalidades especiais, não se exigindo sequer que seja articulado.

19- Contudo não se deixou de observar algumas exigências, como as indicações à matéria de facto e de direito, que pela sua subsistência, possam infirmar acusação ou arquivamento.

20- Tratando-se de uma fase judicial, a sua estrutura eminentemente acusatória deverá apresentar-se integrada pelo principio da investigação e por isso o juiz de instrução não está limitado ao material probatório apresentado pela acusação, mas deve instruir autonomamente o facto em apreciação, Prof. Figueiredo Dias, in Para uma reforma global do processo penal português.

21- Se do próprio requerimento de abertura de instrução resultar falta de tipicidade da conduta, ausência de queixa, entende-se que ainda assim a instrução não deverá ser logo recusada por inadmissibilidade.

22- O legislador não quis um âmbito tão largo de denegação da instrução, como O Tribunal “a quo” denegou.

23- A este respeito o Ac. RL de 12 de Julho de 1995; CJ, XX, Tomo 4, 140; refere que “ a insuficiência dos factos, suas consequências e seus autores não integra o conceito de inadmissibilidade legal, a que se refere o n. ° 2 do artigo 287° do C.P.P. e por isso a sua reapreciação está vedada para justificar a recusa da instrução.

24- Pelo que neste caso o Tribunal “a quo” deveria proceder do seguinte modo quanto ao assistente, notificá-lo para que complete o requerimento com os elementos que omitiu e que não deveriam ter sido omitidos.

25- E se então o assistente, no caso em apreço, não completasse o requerimento, o juiz não procederia à instrução.

26- E tal não foi observado pelo Tribunal “a quo”, que perante tal não considerou tais formalismos, rejeitando liminarmente o requerimento de abertura de instrução, por inadmissibilidade legal, por parte do assistente, A....

27- Pelo o exposto, o Tribunal a quo, violou os artigos 287° n.° 2 do código de Processo Penal, com remissão para o 283° alínea b) e C), do Código de Processo Penal.

3- O Ministério Público apresentou resposta onde, expressando a sua concordância na íntegra com a decisão proferida e seus fundamentos entende que o despacho recorrido deve manter-se e, consequentemente, deve ser negado o provimento ao recurso.

4- Neste Tribunal da Relação, o Ministério Público, com vista nos autos, emitiu parecer onde concluiu que deve manter-se a decisão recorrida (parecer de fols.151 a 152).

5- Colhidos os vistos e remetidos os autos a conferência, cumpre apreciar e decidir.

  1. Fundamentação: 1. Poderes cognitivos do tribunal da quem e delimitação do objecto do recurso: Conforme Jurisprudência constante e pacífica, são as conclusões extraídas pelos recorrentes das respectivas motivações que delimitam o âmbito dos recursos, sem prejuízo das questões cujo conhecimento é oficioso, indicadas no art. 410.º, n.º 2 do Código de Processo Penal (cfr. Ac. do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19 de Outubro, publicado no DR, 1-A de 28-12-1995).

Assim, no caso sub judicie: Determinar se o requerimento de abertura de instrução apresentado pela recorrente deveria ou não ter sido rejeitado com fundamento na sua inadmissibilidade legal; neste âmbito se apreciará a admissibilidade do convite ao aperfeiçoamento.

  1. Dos factos: A..., veio requerer a ABERTURA DA INSTRUÇÃO, por considerar que deveria ter sido deduzida acusação contra B....

    Alega, para tanto, que o arguido incorreu na prática de um crime de abuso de confiança, previsto e punível pelo artigo 205°, n.ºs 1 e 4, alínea a) do Código Penal.

    Dado que.

    ..

    1. O denunciante deslocou-se com o seu filho, E... ao “Stand I...”, sito em Santarém, tendo o denunciado vendido ao aqui denunciante um veículo automóvel, de marca Land Rover, com a matrícula x..., no valor de € 7500, com o qual celebrou de imediato um contrato de crédito ao consumo, para a aquisição do veículo automóvel com reserva a favor da instituição financeira “J...

      SA”.

    2. Acontece que em Maio/Junho de 2010, o carro sofreu uma nova avaria no motor, quando o seu filho, E...se dirigia para Vila Nova de Mil Fontes, local onde residia a sua namorada, G.... Em virtude desta avaria o carro foi rebocado para o stand do denunciado pelo reboque do seguro do denunciante.

    3. Tendo o denunciante se deslocado para Santarém para o Stand para trazer o seu filho de volta para casa, uma vez que lá deixado o veículo pelo pronto-socorro o mesmo necessitaria de regressar a casa.

    4. Quando ambos chegaram ao stand a Santarém com o carro rebocado o referido Stand ainda estava fechado, pelo que tiveram de aguardar a chegada do denunciado.

    5. Assim que este chegou reclamaram a avaria no motor do carro e pediram que o mesmo resolvesse o problema, já que era a segunda avaria no motor no espaço de dois meses, já que a primeira avaria e a sua reparação tinha sido em Março de 2010. Perante nova avaria o denunciante solicitou que o mesmo fosse reparado ou substituído por outro em melhores condições, a que o mesmo acedeu tendo ficado com o carro e as chaves do mesmo nas suas instalações, tendo o denunciante e o seu filho abandonado o local, e regressado a casa.

    6. Não obtiveram mais nenhum esclarecimento.

    7. Dias mais tarde a esposa do ofendido recebeu uma chamada telefónica do stand a dizer que o carro tinha desaparecido.

    8. Devido a esta situação o...

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