Acórdão nº 150/11.8GAPCV.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Maio de 2013

Magistrado ResponsávelLUÍS COIMBRA
Data da Resolução08 de Maio de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 5ª Secção, Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra I – RELATÓRIO: No âmbito do Processo Comum (Singular) nº 150/11.8GAPCV do Tribunal Judicial de Penacova, foram julgados os arguidos: - A...

, filho de (...) e de (...), natural da freguesia de (...), concelho de Carregal do Sal, nascido a 17/01/1988, solteiro, desempregado, residente na (...), Carregal do Sal; e -B...

, filho de (...) e de (...), natural do Congo, nascido a 20/07/1980, solteiro, desempregado, residente na (...), Santa Comba Dão.

que vinham acusados da prática, em co-autoria, de um crime de furto qualificado, na sua forma tentada, previsto e punido pelos artºs 22º, 23º, 203º e 204º, nº 1, alínea f) e nº 2, alínea e), todos do Código Penal.

Realizada audiência de julgamento, foi proferida a sentença (fls. 208 a 222) onde se decidiu: “- Condenar o arguido A... pela prática, em co-autoria e na forma tentada, de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artºs 22º, 23º, 73º, 202º, alínea e), 203º n.º 1 e 204º, nº 2, alínea e) do Código Penal, na pena de 9 (nove) meses de prisão; - Condenar o arguido B... pela prática, em co-autoria e na forma tentada, de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artºs 22º, 23º, 73º, 202º, alínea e), 203º n.º 1 e 204º, nº 2, alínea e) do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão; - Suspender a execução da pena de prisão aplicada aos arguidos pelo período de um ano; - Condenar cada um dos arguidos no pagamento das custas do processo (artº 8º do Regulamento Custas Processuais), fixando a de taxa de justiça em 2 UC – artºs 374º, n.º 4, 513º, n.º 1 e 514º, n.º 1 do Cód. Processo Penal.

* Remeta boletins ao registo criminal.

* Declaro perdidos a favor do Estado os objectos apreendidos nos autos a fls. 16 – artº 109º do Cód. Penal.” Inconformado com o assim decidido, recorreu apenas o arguido B...

, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): “CONCLUSÕES 1. O ora recorrente foi condenado, pela prática, em, co-autoria, na forma tentada de um crime de furto qualificado p. e p. pelos art.° 22°, 23°, 73° 202° alínea e), 203° n.° 1 e 204°n.° 2 alínea e) do Código Penal, na pena 9 (nove) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 (um) ano.

  1. O recorrente considera incorrectamente julgados os pontos de facto supra assinalados sob os números 3), 4) e 5), já que as provas (gravadas no sistema integrado de gravação digital) impõem uma decisão diversa da recorrida; ou seja, a matéria de facto constante daqueles pontos deveria ter sido julgada NÃO PROVADA.

  2. Assim, deveria ter sido dado como NÃO PROVADO, que os arguidos soubessem que no interior do estabelecimento do ofendido se encontravam vários motociclos, ciclomotores, acessórios e equipamento bem como máquinas que compõem a oficina que apoia o stand de vendas dos referidos veículos, cujo valor ascendia a várias dezenas de milhares de euros.

  3. Deveria ter sido dado como NÃO PROVADO que os arguidos, com o propósito de se apropriarem do que conseguissem retirar do estabelecimento do ofendido, se tivessem munido dos bens que lhes foram apreendidos e que se encontram examinados e avaliados a fls. 17, por forma a melhor executarem a acção a que se propuseram.

  4. Deveria ter sido dado como NÃO PROVADO que os arguidos acederam ao terraço onde se encontravam os anexos, através do armazém inacabado e, pelo menos um deles, entrou pelo buraco da janela, que se encontrava a 2 metros do solo, no rés-do-chão.

  5. Os meios de prova que impunham uma decisão em sentido diverso são as declarações dos dois arguidos bem como das três testemunhas arroladas pela Acusação, gravadas no sistema integrado de gravação digital, cujas passagens se encontram melhor identificadas supra.

  6. Em consequência, o Tribunal “ a quo” deveria ter absolvido, sem qualquer espírito de dúvida razoável, o arguido do crime ou, pelo menos, deveria ter aplicado o princípio fundamental de processo penal “in dubio pro reo”, tendo havido, face à prova produzida, violação do disposto no art° 410 n.° 2 al. c) do Cód. Proc. Penal e art°s. 32°, n.° 2 e n.° 5, e 2.° da CRP.

  7. Acresce que, não ficou demonstrado qual dos arguidos praticou actos de execução do crime de furto qualificado.

  8. As testemunhas arroladas pela Acusação não lograram identificar qual dos arguidos — se é que algum foi; viu no interior do estabelecimento e qual é que estava no seu exterior, mormente encostado ao veículo automóvel que os transportava.

  9. A douta sentença recorrida, deu como não provado: — Que tenham entrado os dois arguidos pelo buraco da janela, nas instalações do ofendido; — Que tenha sido o arguido A... a fazer barulho com o ferro.

  10. Nos termos do artigo 22° do Código Penal, há tentativa quando o agente praticar actos de execução de um crime que decidiu cometer. Em momento prévio poder-se-á verificar a existência de actos preparatórios que, porém, não são puníveis — Cfr. Art.° 21° do CP. Enuncia este artigo o principio de que a preparação de uma infracção penal e os actos em que se traduz não devem ser, como tais, puníveis.

  11. Na síntese de Figueiredo Dias haverá acto de execução e portanto tentativa, quando um certo acto preencha um elemento constitutivo de um tipo de ilícito ou — apreciado na base de um critério de idoneidade, normalidade ou experiência comum, ou na base do plano concreto de realização — apareça como parte integrante da execução típica — Sumários de Direito Penal pag. 21.

  12. Ora, resultou da prova produzida em audiência de julgamento, que as testemunhas arroladas pela Acusação, viram apenas uma pessoa que deduziram ser um dos arguidos — no interior do estabelecimento do ofendido.

  13. Mais, após terem encetado uma perseguição a essa pessoa viram um dos arguidos, em local afastado do estabelecimento, junto ao veículo automóvel. Nada mais.

  14. Não resultou provado qual a motivação deste arguido. Não resultou demonstrado se este sabia sequer que o outro arguido (se é que era ele) se encontrava no interior do estabelecimento do ofendido. Não foi provado se havia delineado um plano conjunto para a prática do crime.

  15. Atenta a falta de demonstração probatória do acima exposto, no limite, teríamos que este arguido seria autor apenas de actos preparatórios.

  16. Assim, um problema de enorme importância se levanta: Qual dos arguidos praticou actos de execução e qual deles nada praticou ou, no máximo, se ficou pelos actos preparatórios? Pergunta que, porém, fica sem resposta dado que as testemunhas arroladas pela Acusação não lograram identificar a participação de cada arguido na factualidade sub judice.

  17. A admissibilidade da tentativa do co-autor que não chega a realizar a sua parte da execução, constituiu uma inadmissível antecipação da tutela penal, que suprime a fronteira entre os actos preparatórios e os actos de execução, pondo definitivamente em causa o princípio constitucional da ofensividade.

  18. O início da tentativa na co-autoria só se verifica quando cada um dos co-autores pratica o seu primeiro acto de execução (mesmo do acto previsto no artigo 22° n.° 2 al. c), de acordo com a decisão conjunta dos co-autores (teoria individual, partilhada por Conceição Valdágua, 1986: 207 a 219 e Figueiredo Dias, 2007: 822. — Comentário ao Código Penal à Luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 2 Ed. pag. 135.

  19. Desta sorte, atento o exposto, não tendo as testemunhas logrado identificar qual dos arguidos praticou actos de execução, permanecendo a dúvida quanto a essa questão, ainda que com apelo ao princípio in dúbio pro reo, deverá o ora recorrente ter sido absolvido da prática do crime por que vinha acusado.

  20. Ao decidir na forma exposta, o tribunal a quo violou o estatuído nos artigos 21°, 22°, 23°, 26° do CPenal.

    Nestes termos e, sobretudo naqueles que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se o douto acórdão proferido, nos termos supra expostos, com o que Vossas Excelências farão seguramente JUSTIÇA.” * O Ministério Público junto da 1ª instância, a fls. 264 e 265, respondeu ao recurso, concluindo que deve ser negado provimento ao mesmo.

    O recurso foi admitido por despacho de fls. 267.

    Nesta instância, a fls. 275 a 276vº, o Exmº Procurador-Geral Adjunto sufragando a posição assumida pelo M.P. em 1ª instância, emitiu parecer no sentido de que deverá improceder o recurso e mantida, na íntegra, a sentença recorrida.

    No âmbito do art.º 417º, nº 2 do Código Penal, não foi apresentada resposta.

    Foram colhidos os vistos legais e realizou-se a conferência.

    1. FUNDAMENTAÇÃO Constitui jurisprudência corrente dos tribunais superiores que o âmbito do recurso se afere e se delimita pelas conclusões formuladas na motivação apresentada (art 412º, nº 1, in fine, do Código de Processo Penal), sem prejuízo das que importe conhecer, oficiosamente por obstativas da apreciação do seu mérito, como são os vícios da sentença previstos no artigo 410.º, n.º 2, do mesmo diploma, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito (Ac. do Plenário das Secções do S.T.J., de 19/10/1995, D.R. I – A Série, de 28/12/1995).

    No caso vertente, e vistas as conclusões do recurso, as questões a suscitadas são as seguintes: 1. - Saber se ocorreu o vício do artigo 410º nº 2 c) do Código de Processo Penal; 2. - Impugnação da matéria de facto: a alegada falta de prova dos factos dados como provados nºs 3, 4 e 5; 3. - Saber se ocorreu violação do princípio do in dubio pro reo.

  21. Saber se, quanto muito, apenas poderão ter ocorrido actos preparatórios.

    (Embora tenha pouca relevância para o objecto de recurso, importa aqui chamar a atenção do recorrente que, tal como resulta da parte dispositiva da sentença recorrida, a condenação do mesmo foi na pena de 6 meses de prisão, suspensa na sua execução (e não na pena de 9 meses de prisão, suspensa na execução, conforme o mesmo refere no seu recurso - esta pena de 9 meses foi aplicada ao co-arguido A...).

    É o seguinte o teor da...

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