Acórdão nº 55/08.0TAVZL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Dezembro de 2013

Magistrado ResponsávelISABEL VALONGO
Data da Resolução10 de Dezembro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I - RELATÓRIO 1. Nos presentes autos, findo o inquérito, vieram os assistentes A...

e B...

, deduzir acusação particular contra C...

, D....

e E...

, pela prática, em autoria material, cada um de um crime de publicidade e calúnia, previsto e punido pelo artigo 183.°, n.°1, alínea a) e n.°2, do Código Penal.

Por despacho de fls. 277 o Ministério Público acompanhou as acusações particulares deduzidas.

Inconformado com tais acusações, o arguido E... veio requerer a abertura de instrução, alegando, em síntese, que as acusações particulares são nulas porque delas não consta a sua correcta identificação nem as disposições legais aplicáveis, além de que não foi o autor do artigo em causa e fora substituído nas suas funções pela Directora Adjunta Exclusiva, F...

, pelo que nenhuma responsabilidade lhe pode ser imputada.

* 2. Teve lugar a instrução e na decisão instrutória decidiu-se pela improcedência das invocadas nulidades, por além do mais, se entender ter existido apenas um lapso motivado pela epígrafe do artigo 183º do Código Penal, dando a ideia de ser um crime autónomo quando remete para os artigos 180º e 181º do mesmo diploma legal. Nessa conformidade procedeu à rectificação das acusações particulares e decidiu “pronunciar, para julgamento em processo Comum e com a Intervenção do tribunal singular, o arguido, E... pelos factos e pelas disposições legais constantes das acusações particulares de fls. 255 e 269 e seguintes, cujo teor aqui se dá por reproduzido, com a rectificação constante do Ponto II desta decisão, no que respeita à qualificação jurídica dos factos.” * 3. - 1º RECURSO O arguido E... a fls 476 a 478 veio arguir nulidades da decisão instrutória e suscitar a prescrição do procedimento criminal e antes ainda da apreciação da arguição de nulidades, interpôs recurso da decisão instrutória, de cuja motivação extraiu as seguintes conclusões: 1 - Vem o presente recuso interposto da douta decisão instrutória proferida nos presentes autos, que rectificou a qualificação jurídica dos factos constantes das acusações particulares sem ter efectuado qualquer comunicação ao ora recorrente e sem ter apreciado a prescrição do procedimento criminal.

2 - Entendeu a douta decisão instrutória não se verificar a nulidade das acusações particulares, invocada pelo ora recorrente, uma vez que "o arguido sempre sabia que estava a ser acusado de um crime contra a honra” e, portanto, se trataria de um mero “lapso de escrita motivado pela própria epígrafe do artigo 183° do Código Penal, que dá a ideia de constituir um tipo autónomo, sendo certo que remete para os tipos dos artigos anteriores - com o que ora recorrente não pode concordar, uma vez que entende ser essencial que a acusação tipifique, concretamente, o crime imputado e não apenas a sua “tipologia”, sendo que a completa omissão das disposições aplicáveis (e, portanto, da concreta moldura penal que enfrenta o arguido), não pode nunca ser tratado como “lapso de escrita”.

3 - Apesar de entender que não se verificavam as nulidades invocadas, ainda assim, decidiu a douta decisão Instrutória, “dissipar quaisquer dúvidas que se pudessem levantar sobre a qualificação jurídica dos factos constantes das acusações particulares” e proceder à rectificação da do lapso de escrita alterando a qualificação jurídica dos factos descritos nas acusações particulares para “um crime de difamação agravado ou, o crime de difamação com publicidade, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 180º nº1 e 183°, n° 1, alínea a) do Código Penai” (sublinhado nosso) 4 - Nos termos do art 303°, n°s 1 e 5 do Código de Processo Penal, estava e está o juiz de instrução obrigado a comunicar aos arguidos, designadamente, ao ora recorrente, tal alteração e a conceder-lhe, caso este o requeresse - como requereria se tal alteração lhe tivesse sido comunicada - prazo para preparação da defesa.

5 - Ora nenhuma alteração foi comunicada ao ora recorrente, nem lhe foi concedido qualquer prazo paraelaboração de defesa, nomeadamente de adequação de defesa ao tipo de crime por que passaria a ser acusado, não lhe tendo, sequer, sido permitido pronunciar-se sobre a mesma, sendo certo que o ora recorrente, no exercício de um direito que lhe assistia, não estava presente na sessão de leitura da decisão instrutória, porquanto entendeu, face ao crime emoldura penal que lhe eram imputados - diferentes daqueles por que foi pronunciado - não ser necessária a sua presença, designadamente, não vendo necessidade de prestar declarações em sede de instrução.

6 - Tal falta de comunicação e, consequentemente, a falta de possibilidade de se defender da nova qualificação jurídica imputada, configura uma insustentável preterição do direito penal e constitucionalmente consagrado de defesa do arguido, equiparando-se a uma total ausência, por culpa que lhe não é imputável, do arguido na fase de instrução, designadamente, de defesa, o que consubstancia uma nulidade insanável, nos termos dos artigos 119 nº 1, al c) do Código de Processo Penal, nulidade essa que ora se invoca para - todos os devidos e legais efeitos.

7 - Mais importa a nulidade da decisão Instrutória, nos termos do artigo 379°, n° 1, alínea b) do Código de Processo Penal, nulidade essa que ora também se invoca para todos os devidos e legais efeitos.

8 - Por outro lado, à luz da nova qualificação jurídica imposta pela douta decisão instrutória proferida, não pode já o ora recorrente - e nem os restantes arguidos, diga-se - ser responsabilizado pelo crime por que foi pronunciado, porquanto prescreveu o respectivo procedimento criminal, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 118º, nº 1 al. d), 120° e 121°, n° 3 do Código Penal, prescrição essa que ora expressamente se invoca para todos os devidos e legais efeitos.

9 - Com efeito, sendo a concreta moldura penal agora imputada ao arguido, ora recorrente, a de pena de prisão de 40 dias a 8 meses, ou pena de multa de 13 a 320 dias, aquando da notificação da acusação ao ora recorrente, estava já prescrito desde, pelo menos, 17/04/2011, como continua a estar, o procedimento criminal imputado ao ora recorrente, prescrição essa que ora expressamente se invoca para todos os devidos e legais efeitos.

10 - A prescrição do procedimento criminal é de conhecimento oficioso, pelo que podia e devia o douto tribunal a quotê-la declarado - não o tendo feito, deixou de se pronunciar sobre questão que devia apreciar, também por esta razão sendo, nos termos do artigo 379°, n° 1, al. c) do Código de Processo Penal, a douta decisão instrutória nula e sem produzir quaisquer efeitos, nulidade essa que ora expressamente se invoca para todos os devidos e legais efeitos.

11 - Ao decidir da forma explanada na douta decisão recorrida, violou o douto tribunal a quo, entre outros, os artigos 119°, al. c), 283°, n° 3, al. c), 303°, n°s 1 e 5, 311°, n° 3, al, c) e 379°, n° 1, al. c) do Código de Processo Penal, 118°. n° 1, al. d) 18° e 32° da Constituição da República Portuguesa e os preceitos, penal e constitucionalmente consagrados, da legalidade, da tipicidade, do acusatório, do contraditório e do direito de defesa do arguido.

Termos em que e nos mais de direito, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente, e,consequentemente, serem declaradas as nulidades invocadas e, em qualquer caso, a douta decisão instrutória revogada, declarando-se a extinção da responsabilidade criminal do ora recorrente por efeitos de prescrição, com todas as legais consequências.

JUSTIÇA!” * 3. 2º RECURSO O arguido E..., veio também interpor recurso do despacho que desatendeu a arguição das nulidades da decisão instrutória e da prescrição do procedimento criminal, de cuja motivação extraiu as seguintes conclusões: 1 - Vem o presente recurso interposto do douto despacho proferido nos presentes autos que desatendeu a arguição das nulidades da decisão instrutória.

2 - Entendeu o douto despacho recorrido que não existiu qualquer violação dos direitos de defesa do arguido na não comunicação da rectificação quanto à alteração da qualificação jurídica, porquanto as acusações particulares não são completamente omissas quanto à concreta moldura penal que imputam ao ora recorrente, mas “apenas não referiam se a agravação do artigo 183° se reportava ao crime de injúria ou ao crime de difamação”, ou seja, “apenas” faltava a referência ao crime principal, (sublinhado nosso) 3 - E entendeu ainda o douto despacho recorrido que, uma vez que a moldura penal é a mesma independentemente da agravação se reportar ao crime de Injúrias, ou de Difamação, não havendo, por tal motivo, qualquer agravação da posição processual do arguido, não se impunha “comunicar previamente tal rectificação ao arguido” - com o que não pode, manifestamente, concordar o ora recorrente.

4 - Com efeito, não é a moldura penal a razão de ser da obrigação de comunicação imposta pelo artigo 303° do CPP, uma vez que não é o simples facto de o arguido “apenas” enfrentar uma moldura mais leve, ou uma moldura igual, que significa que já tenha preparado a sua defesa para ela - não é nas molduras penais que os arguidos alicerçam a sua estratégia de defesa: é nos factos e nos requisitos dos tipos legais de crime que são chamados a enfrentar.

5 - Não cabe aqui a adaptação do dito popular “Quem se defende do mais, defende-se do menos”: tipos de crime diferentes implicam ou podem implicar estratégias de defesa diferentes e é um direito inalienável do arguido saber deque tipo de crime se está a defender, para cabalmente poder preparar-se, designadamente, para poder decidir se requer, ou não, determinado tipo de diligências de prova - assim é também o entendimento da esmagadora maioria da doutrina e jurisprudência.

6 - Apesar de entender que não se verificavam as nulidades invocadas pelo arguido, ora recorrente, no seu requerimento de abertura de instrução, decidiu a douta decisão instrutória, “dissipar quaisquer dúvidas que...

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