Acórdão nº 83/09.8T3ALB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Dezembro de 2013
Magistrado Responsável | ALCINA DA COSTA RIBEIRO |
Data da Resolução | 10 de Dezembro de 2013 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, os Juízes que compõem a 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I – RELATÓRIO 1 - Em processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, o Ministério Público acusou: A...
, filha de (...) e (...), natural da freguesia da Branca, Albergaria-a-Velha, nascida a 22/3/53, casada, doméstica, residente na Rua (...), Branca; B...
, filho de (...) e de (...), natural de Oliveira de Azeméis, nascido a 4/7/1946, casado, reformado, residente na Rua (...), Branca; C...
, filho de B... e de A..., natural de França, nascido a 5/5/1972, solteiro, serralheiro mecânico e civil; D...
, filha de B... e de A..., natural de França, nascida a 6/4/1976, casada, auxiliar de acção educativa, residente na Rua (...), Branca; E...
, filho de (...)e de (...), natural da freguesia da Branca, concelho de Albergaria-a-Velha, nascido a 10/5/1974, casado, mecânico, residente na Rua (...), Albergaria-a-Nova; Imputando-lhes: - aos arguidos B... e A... a prática, em co-autoria e em concurso real, de um crime de burla qualificada, p. e p. pelo art.º 217º, n.º 1 e 218º, n.º 2, al. a), por referência ao art.º 202º, al. a), todos do Código Penal, em co-autoria com os arguidos C..., D... e E...; de um crime de falsificação de documento, p. e p pelos art.º 256º, n.º 1, al. a) e 3, em co-autoria com os demais arguidos, e um crime de frustração de créditos, p. e p. pelo art.º 227º-A, n.º 1, todos do Código Penal.
- aos arguidos C..., D... e E... a prática, em co-autoria, e em concurso real, de um crime de burla qualificada, p. e p. pelo art.º 217º, n.º 1 e 218º, n.º 2, al. a), por referência ao art.º 202º, al. a), todos do Código Penal, em co-autoria com os arguidos B... e A...; de um crime de falsificação de documento, p. e p pelos art.º 256º, n.º 1, al. a) e 3, em co-autoria com os demais arguidos, e um crime de frustração de créditos, p. e p. pelo art.º 227º-A, n.º 1, todos do Código Penal.
2 - A assistente, F....
deduziu contra os arguidos, pedido de indemnização civil, no qual pede a condenação daqueles a pagarem-lhe, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, as quantias de, respectivamente, de € 24.734,37 e € 900,00, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento.
3 - Após realização da audiência de julgamento, foi proferido Sentença que decidiu da forma que, a seguir se transcreve: «Face ao exposto, o Tribunal julga a acusação totalmente improcedente e, em consequência, absolve: A) a arguida A...
, da prática, em co-autoria e em concurso real, de um crime de burla qualificada, p. e p. pelo art.º 217º, n.º 1 e 218º, n.º 2, al. a), por referência ao art.º 202º, al. a), todos do Código Penal, em co-autoria com os arguidos C..., D... e E..., de um crime de falsificação de documento, p. e p pelos art.º 256º, n.º 1, al. a) e 3, em co-autoria com os demais arguidos, e de um crime de frustração de créditos, p. e p. pelo art.º 227º-A, n.º 1, todos do Código Penal.
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o arguido B...
, da prática, em co-autoria e em concurso real, de um crime de burla qualificada, p. e p. pelo art.º 217º, n.º 1 e 218º, n.º 2, al. a), por referência ao art.º 202º, al. a), todos do Código Penal, em co-autoria com os arguidos C..., D... e E..., de um crime de falsificação de documento, p. e p pelos art.º 256º, n.º 1, al. a) e 3, em co-autoria com os demais arguidos, e de um crime de frustração de créditos, p. e p. pelo art.º 227º-A, n.º 1, todos do Código Penal.
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o arguido C...
, da prática, em co-autoria, e em concurso real, de um crime de burla qualificada, p. e p. pelo art.º 217º, n.º 1 e 218º, n.º 2, al. a), por referência ao art.º 202º, al. a), todos do Código Penal, em co-autoria com os arguidos B... e A..., de um crime de falsificação de documento, p. e p pelos art.º 256º, n.º 1, al. a) e 3, em co-autoria com os demais arguidos, e de um crime de frustração de créditos, p. e p. pelo art.º 227º-A, n.º 1, todos do Código Penal.
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a arguida D...
, da prática, em co-autoria, e em concurso real, de um crime de burla qualificada, p. e p. pelo art.º 217º, n.º 1 e 218º, n.º 2, al. a), por referência ao art.º 202º, al. a), todos do Código Penal, em co-autoria com os arguidos B... e A..., de um crime de falsificação de documento, p. e p pelos art.º 256º, n.º 1, al. a) e 3, em co-autoria com os demais arguidos, e de um crime de frustração de créditos, p. e p. pelo art.º 227º-A, n.º 1, todos do Código Penal.
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o arguido E...
, da prática, em co-autoria, e em concurso real, de um crime de burla qualificada, p. e p. pelo art.º 217º, n.º 1 e 218º, n.º 2, al. a), por referência ao art.º 202º, al. a), todos do Código Penal, em co-autoria com os arguidos B... e A..., de um crime de falsificação de documento, p. e p pelos art.º 256º, n.º 1, al. a) e 3, em co-autoria com os demais arguidos, e de um crime de frustração de créditos, p. e p. pelo art.º 227º-A, n.º 1, todos do Código Penal.
* Condeno ainda a assistente no pagamento das custas e respectivos encargos nos termos dos art.ºs 515º, n.º 1, al. a) e 518º do Código de Processo Penal e art.ºs 8º, 16º e 24º do Reg. das Custas Processuais, e cuja taxa de justiça se fixa em 3 UCs.
* Julgo totalmente improcedente o pedido de indemnização civil formulado pela demandante F..., e absolvo os arguidos/demandados do pedido.
Custas cíveis a cargo da assistente/demandante, nos termos do art.º 446º do CPC».
3 - Inconformada esta decisão, dela interpõe Recurso, a Assistente, F..., sintetizando as suas alegações, nas seguintes conclusões: 1ª. A Assistente considera que os pontos a); c); d); e); f); g); h); i); j); l) e m) dos factos dados como não provados foram incorrectamente julgados, havendo erro na apreciação da prova.
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Quanto aos pontos a) e c) dos factos dados como não provados, deveriam os mesmos ter sido dados como provados com base na prova documental, desde logo, a sentença proferida pelo 2º Juízo do Tribunal de Albergaria-a-Velha, no âmbito do processo ordinário nº. 774/04.0TBALB (fls. 427 a 435), onde consta que os ali autores alegaram na petição inicial que detêm um crédito sobre os Réus A... e B... no valor de €24.734,37 e que tais Réus (aqui Arguidos) alienaram todo o património imobiliário, doando-o aos seus filhos, de modo a tornarem impossível a cobrança daquele crédito.
Os Réus na contestação (fls. 968 e ss.) sustentaram que a doação visou ressarcir os donatários ( C... e D...) pelos pagamentos que estes fizeram aos vários credores do casal doador ( B... e A...) e a final foi proferida sentença a qual deu como provado, entre outras coisas, que os Autores instauraram contra os Réus ( B... e A...), em 20/10/1999, acção pedindo que estes fossem condenados no pagamento da quantia de Esc. 3.690.000$00, bem como dos juros de mora desde a citação até integral pagamento; no decurso desta acção, mais concretamente em 09/01/2002, os Réus celebraram escritura de doação em que doaram aos filhos C... e D..., com reserva do direito de usufruto, e estes declararam aceitar a doação, do prédio misto sito no Vale de Égua, Mundo Novo, freguesia da Branca, concelho de Albergaria-a-Velha, composto de habitação de rés-do-chão e primeiro andar, logradouro, quintal e pinhal, inscrito na matriz urbana sob o nº. (...) e na matriz rústica sob o art. (...) e descrito na Conservatória do Registo Predial de Albergaria-a-Velha sob o número 05542 e a escritura de doação teve como único propósito salvaguardar o prédio supra identificado de qualquer penhora e venda em processo de execução, e assim prejudicar o pagamento do crédito dos autores sobre os primeiros Réus ( B... e A...).
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Com base nesta sentença transitada em julgado (nomeadamente os pontos 1, 2, 3 e 7 dos factos dados como provados) e na ata de audiência de julgamento de 21/03/2006 (fls. 121 a 124 dos autos – nomeadamente a assentada do Réu G..., marido da Arguida D..., que confessa que a escritura de doação teve como propósito garantir que os Arguidos B... e A... não ficassem sem casa e sem o terreno, por causa das dívidas que tinham), deveria o Tribunal “a quo” ter extraído a conclusão de que a doação foi um negócio acordado entre os Réus ( G..., B..., A..., C... e D...) com o intuito de impossibilitar o credor de obter a satisfação do seu crédito. Ou seja, os Arguidos B..., A..., D... e C... verdadeiramente não queriam celebrar uma doação, apenas evitar um mal que se avizinhava, a condenação no pagamento da quantia peticionada contra o Arguido B... e A....
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O facto de os Arguidos B... e A... reservarem o direito de usufruto sobre o prédio doado, não pode ser encarado como estranho para quem tem a intenção de eximir-se do cumprimento das suas obrigações pecuniárias, isto porque as regras de experiência comum, ensinam-nos que quando o doador não tem efectivamente vontade em fazer uma doação ou tem receio do futuro e, sendo o mesmo prudente e precavido, reserva para si o direito ao usufruto sobre o prédio doado, isto para evitar que após a doação o donatário possa impedir o doador de ocupar o imóvel, gozando-o de forma plena e exclusiva. Para além disso, também é do senso comum que é extremamente difícil ou até mesmo impossível a venda do usufruto (e tenha-se em conta, no nosso caso, que os usufrutuários não são pessoas no início da juventude, pois o Arguido B... nasceu em 04/07/1976 – 66 anos e a Arguida A... nasceu em 22/03/1953 – 59 anos). Daí que, como decorre dos autos (fls. 475 e 476) o usufruto foi efectivamente penhorado em 16/11/2004, todavia até à presente data (Janeiro de 2013) não foi conseguida a venda do mesmo. E esta situação pelos Arguidos B... e A..., face à experiência de vida que têm e ao facto de à data da doação (09/01/2002) estarem a ser acompanhados por Advogado (no âmbito da Acção 774/04.0TBALB), era espectável. Ou seja, o facto de reservarem para si o direito de usufruto, o qual podia ser penhorado, mas com grande certeza, na prática nada significaria, pois a venda do usufruto é de difícil concretização.
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Para além da prova documental, o Tribunal “a quo” podia e devia atender à prova...
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