Acórdão nº 881/10.0TBLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelTELES PEREIRA
Data da Resolução24 de Setembro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de CoimbraI – A Causa 1.

Em 12 de Fevereiro de 2010[1], T…0, Lda.

(A., Reconvinda e Apelante nesta instância) demandou a sociedade E…, S.A.

(R., Reconvinte e aqui Apelada) invocando a nulidade de um contrato-promessa de compra e venda, datado de 12 de Maio de 2005, referente à promessa de venda de um lote de terreno, contrato que está junto a estes autos a fls. 32/33 (no qual a R.

[2] assumiu a posição de promitente vendedora e a A. a de promitente compradora). Esta nulidade resultaria da preterição nesse contrato das formalidades decorrentes do nº 3 do artigo 410º do Código Civil (CC), concretamente do reconhecimento presencial das assinaturas dos promitentes[3]: “[…]26.ºO que […] releva nestes autos é a circunstância de aquela promessa ser absolutamente nula e de nenhum efeito, uma vez que a validade formal daquele negócio, compra e venda de lote de terreno para construção urbana, obrigava ao reconhecimento presencial das assinaturas dos legais representantes outorgantes na promessa, ex vi artigo 410º, nºs 2 e 3, do CC.

27.ºBem como, salvo sempre melhor opinião, a certificação, pela entidade que realiza aquele reconhecimento, da existência da respectiva licença de plano de loteamento.

27.ºFace à invalidade formal daquele título negocial, cuja consequência é a nulidade, e cujo efeito necessário nos termos do disposto no artigo 289º, nº 1 do CC, obriga à destruição do negócio com a consequente restituição em singelo de todas as contra-prestações prestadas…29.ºLogo deve ser declarado nulo e nenhum efeito o contrato promessa de compra e venda de lote de terreno para construção celebrado em 12.05.2005 entre a A. e a R. (doc. nº 4)30.ºE em consequência ser a R. condenada a restituir à A. a quantia de €50.000,00 montantes estes entregues em cumprimento da mesma promessa, acrescida de juros de mora a contar desde a data da sua citação até integral pagamento.

[…]”.

[transcrição de trecho da p.i.].

1.1.

A R. contestou afirmando a validade formal do contrato (pois está em causa a promessa de venda de um terreno rústico) e o incumprimento da promessa pela A. (que deliberadamente não compareceu na escritura visando a outorga do contrato definitivo, não obstante ter sido avisada da data e local da mesma). Assim, reconvencionalmente, peticiona a R., ora na veste de Reconvinte, que seja considerado validamente resolvido o contrato-promessa referido e, por incumprimento deste pela A., seja esta, ora como Reconvinda, condenada na perda do sinal prestado.

1.2.

Finda a fase dos articulados, foi o processo saneado e condensado a fls. 97/108, merecendo o despacho contendo tal condensação a reclamação da A. constante de fls. 110/112, apresentada nos termos do artigo 511º, nº 2 do Código de Processo Civil (CPC), na qual intentou – no que interessará à ulterior apreciação deste recurso – levar à base instrutória os artigos 26º e 27º da resposta à reconvenção de fls. 74[4].

Foi esta pretensão negada pelo despacho de fls. 131/134 que indeferiu essa reclamação[5] – este elemento decisório foi abrangido no recurso da decisão final pela A.

1.3.

Através da Sentença de fls. 160/179 – a decisão objecto do presente recurso – foi a acção julgada improcedente, na perspectiva da A. e procedente na perspectiva da R./Reconvinte[6].

1.4.

Inconformada, recorreu a A., concluindo o seguinte a rematar a motivação do recurso: “[…]II – Fundamentação 2.

Relatado o essencial do iter processual que conduziu à presente instância de recurso, cumpre apreciar os fundamentos da apelação, tendo em conta que as conclusões formuladas pela Apelante operaram a delimitação temática do objecto do recurso, isto nos termos dos artigos 684º, nº 3 e 685º-A, nº 1 do CPC[7]. Com efeito, fora das conclusões só valem, nesta sede, questões que se configurem como de conhecimento oficioso (di-lo o trecho final do artigo 660º, nº 2 do CPC). Paralelamente, mesmo integrando as conclusões, não há que tomar posição sobre questões prejudicadas, na sua concreta incidência no processo, por outras antecedentemente apreciadas e decididas. E, enfim – esgotando a enunciação do modelo de construção do objecto de um recurso –, distinguem-se os fundamentos deste (do recurso) dos argumentos esgrimidos pelo recorrente ao longo da motivação, sendo certo que a obrigação de pronúncia do Tribunal ad quem se refere àqueles (às questões-fundamento) e não aos diversos argumentos jurídicos convocados pelo recorrente nas alegações.

2.1.

Como já indicámos de passagem, o recurso apresenta dois referenciais: o despacho de fls. 131/134 (v. o item 1.2. deste Acórdão); a Sentença final de fls. 160/179. No primeiro caso (a) crítica a Apelante o despacho que decidiu as reclamações da A. quanto à não inclusão na base instrutória dos artigos 26º e 27º da resposta à reconvenção de fls. 74. No segundo caso (b), tratando-se do recurso referido à decisão final, pretende a Apelante o controlo por esta Relação das ratio decidendi cumulativas do julgamento da acção, quanto à improcedência da pretensão da A. e à procedência da pretensão reconvencional da R. Pretende a Apelante, pois, em vista da fundamentação da Sentença, que se considere a promessa nula, por invalidade do respectivo contrato, dado que as assinaturas dos promitentes teriam que ser notarialmente reconhecidas, aplicando-se quanto à forma o nº 3 do artigo 410º do CC, ou, pressupondo a validade da promessa, que se considere a mesma ainda não definitivamente incumprida, por irrelevância da interpelação admonitória realizada pela R.

Note-se que, no caso do primeiro elemento decisório recorrido, existe uma crítica aos factos, no sentido em que a Apelante pretende um aditamento ao acervo fáctico e a consideração de uma nova circunstância de facto (o número de administradores da R. cuja assinatura poderia vincular a sociedade, enquanto introdução de um fundamento adicional de nulidade do contrato-promessa aqui em causa). No segundo elemento do recurso, afora esta incidência consequencial do primeiro (afora, portanto, a incidência da invocada incompletude dos factos decorrente da parte em que o recurso se reporta ao despacho de fls. 110/112), não existe qualquer crítica ao rol dos factos (a todos os outros factos) elencados na Sentença final.

2.1.1.

Ora, com o sentido acabado de indicar, aqui deixamos nota dos factos fixados na primeira instância (rectius, os feitos constar na Sentença): “[…] 2.2. (a) Seguindo a cronologia do processo, e a própria lógica de abordagem do julgamento da acção[8], interessa-nos primeiramente o recurso na sua referenciação ao despacho de fls. 110/112 (cfr. o item 1.2. deste texto). Este despacho, recordemo-lo, decidindo uma reclamação da A. quanto à base instrutória, formulada nos termos do artigo 511º, nº 2 do CPC, recusou integrar na selecção das questões de facto controvertidas e relevantes, aquilo que a A., em sede de resposta à reconvenção da R., incluiu nos artigos 26º e 27º desse articulado. Basta ler a transcrição destes dois artigos, feita acima neste texto na nota 7, para se perceber o carácter absolutamente imprestável dos mesmos, como asserções de facto que houvesse que incluir numa base instrutória para ulterior demonstração através da prova (desde logo por não conterem esses artigos 26º e 27º a afirmação de quaisquer factos, expressando antes dúvidas sobre determinada incidência colocada como hipótese).

A questão relevante a este respeito prende-se com a circunstância do contrato-promessa, que a A. pretende seja considerado nulo através desta acção, estar assinado (cfr. fls. 33), na posição de promitente vendedora, apenas por um Administrador da U… (foi esta sociedade quem celebrou o contrato, antes da fusão com a ora R.), carecendo tal vinculação, para que fosse operante – é o que afirma a A., embora o faça sem uma base segura e só agora, já no recurso –, carece tal vinculação, dizíamos, da assinatura de dois Administradores da promitente vendedora U...

Este argumento da Apelante carece de razão.

Desde logo porque a U… (que foi, repete-se, quem celebrou o contrato-promessa de fls. 32/33 com a A.

) não é certo que não se pudesse vincular só através da assinatura de um Administrador, como decorre da simples leitura da certidão do registo comercial, por sinal junta pela própria A. com a p.i. (consta essa certidão de fls. 22/31), na referência (v. fls. 23) à “Forma de Obrigar” a sociedade[9]. Seja como for, mesmo admitindo que a U… só se obrigasse pela assinatura de dois administradores, e que a subscrição do contrato-promessa aqui em causa carecesse de mais uma assinatura face à literalidade do pacto social, mesmo admitindo tudo isto, dizíamos, o contrato-promessa sempre seria válido, face à Apelante, subscrito nesses exactos termos. Esta, aliás, “viciado” que estivesse o contrato face ao pacto social da promitente vendedora, não deixou de o assumir como relevante e vinculante em termos que afastam o controlo a posteriori, já na fase patológica do contrato, da questão da efectiva vinculação da R. aos termos desse mesmo contrato, sob pena de descaso, em injustificado benefício de quem não quer cumprir, da materialidade subjacente e dos mais elementares ditames da boa fé comportamental exigível a qualquer contraente.

Com efeito, interessa aqui recordar, como argumento lateral mas relevante, por referência ao artigo 260º, nºs 1 e 2 do Código das Sociedades Comerciais (CSC), como se opera, no confronto com terceiros, a vinculação de uma sociedade:Artigo 260º (Vinculação da sociedade)1 – Os actos praticados pelos gerentes, em nome da sociedade e dentro dos poderes que a lei lhes confere, vinculam-na para com terceiros, não obstante as limitações constantes do contrato social ou resultantes de deliberações dos sócios.

2 – A sociedade pode, no entanto, opor a terceiros as limitações de poderes resultantes do seu objecto social, se provar que o terceiro sabia ou não podia ignorar, tendo em conta as circunstâncias que o acto praticado não respeitava essa...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT