Acórdão nº 8637/17.2T8CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelJORGE MANUEL LOUREIRO
Data da Resolução12 de Abril de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 6.ª secção social do Tribunal da Relação de Coimbra I – Relatório O requerente propôs contra a requerida a presente providência cautelar comum, tendo deduzido os pedidos seguidamente transcritos: “Deve ser julgada procedente, por provada, a presente providência, e por via dela ser a requerida condenada a aceitar a prestação de trabalho do autor, nos termos em que vinha aceitando, com as mesmas funções, horários, retribuições e regalias que existiam até 26 de Outubro de 2017.

Subsidiariamente, ser a requerida condenada a pagar ao requerente a retribuição integral, por referência ao quanto este recebia antes de ser suspenso preventivamente de funções, acrescido da viatura de serviço e plafond de telemóvel com internet ou, em alternativa, pagando o valor económico que tal benefício importa, nunca inferior a 300€.

Condenando-se a requerida a pagar uma sanção pecuniária compulsória de 100€ por cada dia em que incumpra o pedido supra.

”.

Alegou o requerente, em resumo, que sendo trabalhador da requerida esta suspendeu-o preventivamente do exercício de funções, de forma ilícita, de tudo resultando para si um conjunto de danos patrimoniais e não patrimoniais que descreve na petição, além de que durante a suspensão a requerida vem pagando ao requerente uma retribuição inferior à que é devida.

A requerida deduziu oposição, pugnando pela improcedência da pretensão do requerente.

Sustentou, em resumo, que é lícita a suspensão preventiva do requerente e que a retribuição que lhe vem sendo paga durante a suspensão corresponde à devida.

O procedimento prosseguiu os seus regulares termos, acabando por ser proferida decisão final que julgou improcedentes as pretensões deduzidas pelo requerente.

Não se conformando com o assim decidido, apelou o requerente, rematando as suas alegações com as conclusões seguidamente transcritas: “1. A sentença em crise fez um errado julgamento da matéria de facto e do Direito a aplicar ao caso sub judicie, designadamente: o facto dado como provado no ponto 10) não foi correctamente julgado; inexiste ordem de suspensão do trabalhador dada pelo Conselho de Administração Executiva; o direito de instaurar o processo disciplinar caducou; e, em todo caso, a suspensão preventiva do trabalhador não tem justificação.

  1. No que respeita ao erro sobre o julgamento da matéria de facto, verifica-se que o facto dado como provado no ponto 10) [O Presidente do Conselho de Administração Executivo da requerida tomou conhecimento dos factos constantes no Relatório da DAI (e atinentes ao aqui requerente), em 05.09.2017, ratificada pelo Conselho de Administração Executivo, em sessão de 28.09.2017, tendo sido deliberado, conforme proposta, instaurar processo disciplinar ao requerente, com intenção de despedimento, bem como a suspensão preventiva do mesmo.], não se encontra correctamente julgado.

  2. Porquanto, não há qualquer respaldo probatório, documental ou testemunhal, que permita concluir que a deliberação do Conselho de Administração Executivo foi no sentido de suspender preventivamente o trabalhador.

  3. O que existe é uma proposta dos Recursos Humanos dizendo que se justifica a eventual suspensão do requerente. Tal proposta, enquanto tal, incluía uma eventualidade, que em todo o caso não se encontrava justificada, a que o CAE terá simplesmente dado o seu acordo não especificando, - como se impunha-, se o trabalhador deveria ser suspenso.

  4. A fls. 81.º e 82.º do PP (despacho do conselho de administração executivo da requerida), não se pode concluir pela existência de qualquer ordem de suspensão do requerente emanada pelo CAE.

  5. Desta forma, a parte final do facto 10 dado como provado, concretamente, a parte onde se refere: bem como a suspensão preventiva do mesmo, não poderia ser dada como provada.

  6. A ser remediado o julgamento do facto 10, como se espera, inexiste qualquer ordem do Conselho de Administração Executivo ou qualquer Administrador, no sentido de suspender o requerente.

  7. Não se encontra junta aos autos qualquer acta do Conselho de Administração Executivo e, dos manuscritos insertos na proposta DRH 33.../2017-09-05, também não resulta qualquer decisão sobre a eventual suspensão do trabalhador, não se reconhecendo ao trabalhador L... quaisquer poderes para o efeito, o qual por sua vez também não podia determinar ao Instrutor que suspendesse o trabalhador.

  8. Conforme anota Diogo Vaz Marecos5 , «Salienta-se contudo que o Instrutor não poderá substituir o empregador ou o superior hierárquico em certos actos, como instaurar procedimento disciplinar, cfr. nº 4 do artigo 329.º, suspender preventivamente o trabalhador, cfr. n.º 5 do artigo 329.º e n.º 1 do artigo 354.º, comunicar a nota de culpa ao trabalhador, cfr. n.º 1 do artigo 353.º, ou proferir a sanção, cfr. n.º 1 do arigo 357.º Ao instrutor está reservada a redacção, por conta do empregador, de todos os documentos que se mostrem necessários ao procedimento disciplinar como a suspensão preventiva, a nota de culpa, a comunicação da intenção de despedir, e mesmo a decisão final. Contudo, não poderá assinar nenhum desses documentos. (…)» 10. Posto isto, notariamente inexiste qualquer decisão da empresa no sentido de suspender o trabalhador, donde a sua suspensão é inválida.

  9. Entrando na caducidade de exercício do poder disciplinar, já que a mesma influirá necessariamente na (in)existência do Direito de a entidade empregadora suspender o trabalhador.

  10. Resulta da nota de culpa reproduzida sob o ponto 18 dos factos provados: «5º Em 2017-07-14 foi dirigido à DAI um e-mail do Vogal do Conselho de Administração Executivo, com o Pelouro da área Comercial, Sr. H... (11649-8), com o seguinte teor: "Agradeço contacto urgente com a colaboradora D... (Gestora .../ 00...) a exercer funções no Balcão x.... Face aos factos que me foram descritos de natureza muito grave, interagi ontem com a DRH tendo-lhe sido disponibilizado apoio especializado. Aparentemente a estrutura não identificou a gravidade de situação, ocorrida no local de trabalho, agradeço assim que me seja dado reporte, ficando disponível para a interação necessária com as estruturas da Rede Retalho/DCC. (…)».

  11. Resulta também dos factos provados que o requerente apenas foi notificado da nota de culpa em 26 de Outubro de 2017, portanto, dizemos nós, mais de 60 dias se passaram desde que o mencionado vogal tomou conhecimento dos factos e que o requerente foi notificado da nota de culpa.

  12. Ora, não se poderá deixa de entender que alguém que vincule a entidade patronal não tenha ele próprio o poder disciplinar, de facto, H... , ou melhor H... , até outorgou (em conjunto com R...) a procuração forense constante dos autos.

  13. Dispõe o artigo 408.º, n.º 3 do Código das Sociedades Comerciais: «As notificações ou declarações de terceiros à sociedade podem ser dirigidas a qualquer dos administradores, sendo nula toda a disposição em contrário do contrato de sociedade.» 16. Este preceito, conforme anota Alexandre Soveral Martins6, «é dedicado à representação passiva da sociedade perante notificações ou declarações de terceiros à sociedade. Estabelece aquele preceito que tais notificações ou declarações podem ser dirigidas as qualquer dos administradores. O que daí resulta é que, depois de chegarem ao poder ou serem conhecidas por qualquer um dos administradores, as notificações ou declarações de terceiros produzem efeitos perante a sociedade. (…) Se o administrador que recebe a notificação ou declaração à sociedade não dá conta disso aos restantes administradores, isso já não é um problema do terceiro. Nesse caso a sociedade é que deve sofrer as consequências da escolha que efectuou.» 6 Código das Sociedades Comerciais em Comentário, Vol. VI, Almedina, 2013., P. 457-458.

  14. O artigo 329.º, n.º 2 do CT estabelece que o procedimento disciplinar se deva iniciar nos 60 dias subsequentes àquele em que o empregador, ou superior hierárquico com competência disciplinar teve conhecimento da infracção.

  15. A notificação da nota de culpa ao trabalhador ou o procedimento prévio de inquérito, quando necessário e desde que ocorra nos 30 dias seguintes à suspeita de comportamentos irregulares, seja conduzido de forma diligente e a nota de culpa seja notificada até 30 dias após a conclusão do mesmo, interrompem a contagem do prazo de caducidade (n.º 3 do artigo 353.º e artigo 352.º do Código do Trabalho).

  16. Contudo, face aos elementos do processo, em 13.07.2017 o Administrador H... tomou conhecimento dos factos. Entre essa data e a notificação da nota de culpa (26.10.2017) decorreram mais de 60 dias.

  17. Igualmente, e caso se entendesse que se em 13.07.2017, houvesse apenas suspeitas de comportamento irregular, tornando necessária a instauração de um procedimento prévio de inquérito com vista à fundamentação da nota de culpa, a verdade é que não se reconhecendo à DAI qualquer competência disciplinar, mas mesmo que se entendesse ser esse um inquérito prévio, certo é que o mesmo foi concluído e 31-08-2017 (fls. 8 do PD) e o trabalhador não foi notificado da nota de culpa 30 dias despois desta data, ou mesmo 30 dias depois da entrega desse mesmo processo aos Recursos Humanos em 5.09.2017 21. Em face da presente constatação afigura-se existir uma caducidade do procedimento disciplinar, sendo ilícito o procedimento disciplinar e, por isso, a suspensão que ao abrigo do mesmo foi determinada.

  18. Sem prescindir, inexiste de fundamento para suspender o trabalhador, dado não estar alegado qualquer inconveniente à presença do trabalhador no seu posto de trabalho no decorrer do procedimento disciplinar. Senão vejamos, 23. Conforme precedentemente foi referido, não se conhece, porque não existe nos autos, qualquer decisão emanada pelo CAE da requerida no sentido de suspender o trabalhador.

  19. Mas se entender que o CAE aceitando a proposta DRH 33.../2017-09-05 aceitou a eventualidade de o trabalhador ser suspenso, o que apenas se concede por mera cautela de patrocínio, certo é que tanto a proposta como o despacho nela inserto...

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