Acórdão nº 175/09.3GCFVN-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelHELENA BOLIEIRO
Data da Resolução12 de Abril de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – Relatório 1.

Por despacho de …. de 2017, o Mmo. Juiz do Juízo de Competência Genérica de Figueiró dos Vinhos – Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, decidiu, nos termos do disposto no artigo 56.º, n.

os 1, alínea b), e 2 do Código Penal, revogar a suspensão da execução da pena de 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de prisão aplicada ao arguido A…, com os demais sinais dos autos, e o consequente cumprimento da referida pena única de prisão em que fora condenado no acórdão de cúmulo jurídico transitado em julgado em ….2014.

  1. Inconformado com a decisão, dela recorreu o arguido, finalizando a motivação com as seguintes conclusões (transcrição): “1ª) O presente recurso é manifestação do inconformismo do recorrente face à decisão do Tribunal a quo, que revogou a suspensão da execução da pena de prisão de 4 anos e 8 meses aplicada no âmbito dos presentes.

    1. ) Foi determinante para a decisão sob recurso, a condenação do recorrente pela comissão de ilícitos durante o período de suspensão da execução da pena de prisão.

    2. ) Por outro lado, terão sido irrelevantes para o Tribunal a quo, na tomada desta decisão, os relatórios da Direcção Geral dos Serviços Prisionais e Reinserção Social, bem como o depoimento prestado pelo Técnico desta direcção que acompanha o arguido.

      4º) Deste depoimento resultam de forma clara, os esforços encetados pelo arguido para combater a sua adição ao álcool, o acompanhamento clinico de que tem beneficiado para tal desiderato, e o empenho que o arguido coloca na sua recuperação (11:57:40).

    3. ) Afigura-se assim a revogação da pena inoportuna, injusta e mais não é do que fazer tábua rasa de todos os esforços e sinergias que, passando pelo arguido e envolvendo uma série de pessoas e entidades, foram efectuados.

    4. ) As justificativas do Tribunal para concluir pela revogação da suspensão da execução da pena in casu, eram válidas e impunham-se a … de 2016.

    5. ) Aquando da elaboração do despacho recorrido, porquanto fica plasmado nas conclusões anteriores, as mesmas revelam-se incompreensíveis, injustas e até desatentas”.

  2. Admitido o recurso, respondeu o Digno Magistrado do Ministério Público pugnando para que lhe seja negado provimento e apresentando as seguintes conclusões (transcrição): “1. Por despacho datado de ….2017, foi revogada a suspensão da execução da pena de 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de prisão em que o arguido foi condenado nos presentes autos e determinado o seu efectivo cumprimento.

  3. Entendemos resultar dos autos, por um lado, que o plano de reinserção social aplicado e homologado visava crucialmente a consciencialização do arguido para o desvalor das suas condutas e o impacto que os seus relacionamentos, adições e fraca adesão a compromissos sociais detinham sobre os seus comportamentos criminosos.

  4. E, enquanto o comportamento do arguido, ao longo da suspensão da execução da pena, revelou fragilidades patentes no cumprimento das indicações e comparência nas consultas agendadas pela DGRSP, o Tribunal a quo manteve a confiança e o juízo de prognose favorável de que o arguido, no decurso do acompanhamento iria, a certa altura, consciencializar-se de que tinha de actuar de acordo com o direito, o que afinal se revelaria essencial para a sua inserção social.

  5. Todavia, a condenação do arguido, pela prática de crimes idênticos, em pena de prisão, infirmou definitivamente qualquer juízo de prognose favorável que o Tribunal tivesse mantido.

  6. Revelou ainda, de forma inevitável, que toda a fé processual que o Tribunal havia mantido no acompanhamento do arguido pela reinserção social, se tivesse por irremediavelmente abalada.

  7. Na verdade, podemos dizer que, pese embora o comportamento do arguido se tenha modificado, nos últimos meses com uma evolução positiva, no âmbito do acompanhamento pela DGRSP, tal não poderá, de forma alguma, fazer-nos concluir que o acompanhamento que visava a inexistência da prática de crimes, tivesse um resultado positivo.

  8. Dir-se-á, indo ainda mais além que, tal evolução positiva do arguido ocorre já em situação de reclusão, uma vez que o arguido ao longo de todo o processo apenas demonstrou a sua inadequação de, em liberdade, se coadunar de acordo com o direito.

  9. Ora, a conduta do arguido revelada ab initio e logo após o trânsito em julgado da decisão, é reveladora do seu total desinteresse e desprezo pela decisão aqui proferida, indica uma falta de capacidade da pena aplicada, para apontar ao arguido o rumo certo no domínio da valoração do seu comportamento de acordo com as exigências do direito penal, não se denotando auto-responsabilização pelo comportamento posterior, revelando sim, um firme propósito em manter as condutas delituosas que levaram à aplicação da pena nestes autos.

  10. É por demais evidente que o juízo de prognose favorável realizado e que determinou a suspensão da execução da pena de prisão, perspectivando-se que o arguido mantivesse uma conduta conforme com o direito, não foi, de forma alguma alcançado.

  11. As razões de prevenção geral e especial apenas poderão ser atingidas com o cumprimento da pena de prisão, para que este possa, dessa forma, interiorizar o desvalor das suas condutas e porque se revela indispensável para a tutela do ordenamento jurídico”.

  12. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, na intervenção a que alude o artigo 416.° do Código de Processo Penal (doravante CPP), emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, acompanhando a posição assumida pelo Ministério Público da 1.ª instância. 5.

    Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2 do CPP, não foi apresentada qualquer resposta.

  13. Efectuado exame preliminar e colhidos os vistos, foram os autos à conferência.

    Cumpre agora decidir.

    * II – Fundamentação 1.

    Dispõe o artigo 412.º, n.º 1 do CPP que a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido.

    Constitui entendimento constante e pacífico que o âmbito dos recursos é definido pelas conclusões formuladas na motivação, as quais delimitam as questões que o tribunal ad quem tem de apreciar Na doutrina, cf. Germano Marques da Silva, Direito Processual Penal Português, vol. 3, Universidade Católica Editora, 2015, pág.335; Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos Penais, 8.ª ed., Rei dos Livros, 2011, pág.113. Na jurisprudência, cf., entre muitos, os Acórdãos do STJ de 25-06-1998, in BMJ 478, pág.242; de 03-02-1999, in BMJ 484, pág.271; de 28-04-1999, CJ/STJ, Ano VII, Tomo II, pág.193.

    , sem prejuízo das que sejam de conhecimento oficioso Cf. Acórdão do STJ de Fixação de Jurisprudência n.º 7/95, de 19-10-1995, publicado no Diário da República, Série I-A, de 28-12-1995.

    . Atentas as conclusões apresentadas, que traduzem de forma condensada as razões de divergência do recorrente com a decisão impugnada, a questão a decidir prende-se com a verificação dos pressupostos que fundamentam a revogação da suspensão da execução da pena única de 4 anos e 8 meses de prisão aplicada ao recorrente nos presentes autos.

    * 2.

    O despacho recorrido 2.1.

    O despacho recorrido tem o seguinte teor: “Por acórdão transitado em julgado a ….2014, foi o arguido A… condenado na pena única de 4 anos e oito meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, suspensão essa acompanhada cumulativamente de regime de prova assente em plano individual de readaptação social (mediante plano a elaborar pelos serviços de reinserção social; deve ainda o arguido apresentar-se e(ou) responder a todas as convocatórias que para o efeito lhe venham a ser feitas pelo Tribunal e pelos técnicos de reinserção social, e sem prejuízo de o plano de readaptação poder vir a ser completado posteriormente pelos aludidos serviços) cfr. fls. 1421 a 1432.

    Originalmente nos presentes autos o arguido havia sido condenado por sentença transitada em julgado em ….2012, pela prática em ….2009. de um crime de furto qualificado, na pena de 3 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período e sujeita a regime de prova assente num plano individual de readaptação social fixado e acompanhado pelos Serviços competentes cfr. fls. 651 a 668.

    Entre as diversas penas cumuladas contam-se ainda a aplicada nos auto 51/08.7GBPTG pela prática em ….2008 de dois crimes de detenção de arma proibida de 2 anos e 6 meses de prisão suspensa por igual período e no processo 10/09.2GBNIS pela prática em ….2009 de um crime de furto qualificado na forma tentada na pena de 6 meses de prisão substituída por trabalho.

    Por decisão datada de ….2016 foi decidido não revogar a suspensão da pena de prisão aplicada, não obstante as suas faltas de comparecimento quando convocado pela DGRSP – cfr. fls. 1823 a 1830.

    Porém o arguido, durante o período da suspensão, ou seja, a partir de ….2014, foi ainda condenado, por decisão já...

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